Em Elena, a realizadora brasileira Petra Costa transparece-se para o grande ecrã com o intuito de narrar a sua tragédia de vida, por vezes essas consistirem a verdadeira matéria da nossa natureza emocional. Para a jovem, esse impulso trágico surgiu sob a forma do suicídio da sua irmã, o luto que lhe trouxe até aqui, a um dos pertinentes trabalhos de conjuntura, que chega sob a forma / pretexto de documentário. Digo pretexto, porque sob essa oferenda de conto e reconto nasce uma encenação, a da dor sentida, expressada e metaforizada pela omnipresença da lua e dos corpos flutuantes que se vão ajuntando como um comício de almas. Como primeira obra, Petra Costa levou a sua experiência a um cerco de intimidade, essa no qual sentimos estranhos invasores - os americanos empregariam o termo “home invader”, por cá solicita-se “soul invader” - a forçosa entrada numa dimensão pessoal e familiar. Elena une as façanhas da simplista competência do formato documental com o arthouse poético e por vezes dotado de umbiguismo das escolas de Nova Iorque. Petra Costa partiria deste filme para uma colaboração de dois “mundos” em Olmo e a Gaivota (este estreado em território português), onde passaria do convite ao incómodo criminador para a iniciativa ao incómodo alheio. Entre as duas obras evidencia-se uma vontade de fundir a ficção com o documentário de raiz, essa procura de narrativas em realidades vincadas. Elena, sem estreia comercial em Portugal, tendo passado no FEST de Espinho e no FESTin de Lisboa, foi ignorado pelos canónicos críticos e pela cinefilia lusa, porém, é um filme a merecer a sua descoberta e redescoberta. Quem sabe se teremos nome no Cinema do futuro.
O texto e a escolha do filme são da autoria do Hugo Gomes.
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