terça-feira, 11 de abril de 2017

Oito Desaparecidas (Lured) 1947

Oito Desaparecidas (Lured) marca de uma forma declarada a entrada de Sirk no filme noir, numa espécie de thriller com laivos de Hitchcock. Retoma a colaboração entre o realizador e George Sanders que se iniciara em Escândalo em Paris, o seu filme anterior. 
O filme é um remake de Pieges de Robert Siodmak, realizado em França em 1939. Como não tive oportunidade de o ver, não tenho possibilidades de fazer comparações. No caso vertente de Lured, trata-se de mais uma obra subestimada de Douglas Sirk, um pouco como sucedeu à maioria das suas realizações da década de 40, ofuscadas pelos melodramas dos anos seguintes e que se tornariam nos seus filmes mais populares e conhecidos. Mas foi exactamente o sucesso desses melodramas que abriu portas para o interesse pelos seus filmes anteriores, tanto da sua fase alemã, como dos seus primórdios em Hollywood que foi recuperada para este ciclo. Lured é um desses casos. Referi Hitchcock e o paralelismo com alguns dos seus filmes mais famosos desse período e a comparação não me parece descabida, tanto no conteúdo, como em alguns aspectos formais. Em Londres somos introduzidos a um serial killer, uma espécie de nova versão de Jack o Estripador, aqui com requintes poéticos que remetem para a obsessão pela morte de Charles Baudelaire. Há igualmente todo o processo para a polícia desvendar o possível criminoso, com todos os ingredientes comuns neste tipo de filmes: mistério, um desenvolvimento do argumento que nos leva a caminhar numa determinada direcção, para depois percebermos que as pistas são falsas e dão-nos abertura para percebermos quem de facto é o verdadeiro responsável. Hitchcock é imbatível neste tipo de filmes, mas Sirk não lhe fica muito atrás. O filme é ágil e desenvolto, com um ritmo muito vivo e sem quebras, prendendo de imediato a atenção do espectador. Mais na década 40 do que na seguinte, Sirk não ficou preso a um único tipo de filmes, movimentando-se com versatilidade por diferentes géneros. A direcção de actores é, como de costume, excelente, com a particularidade do papel principal pertencer a uma mulher, no caso, Lucille Ball. A cena mais interessante do filme, no entanto, deve-se à presença do mítico Boris Karloff, o célebre actor britânico de filmes de terror, sobretudo conhecido pelos seus papéis em filmes como Frankenstein, Scarface ou The Lost Patrol. Embora aqui tenha apenas um pequeno papel e numa lateralização ao contexto geral do argumento, temos um Karloff ao nível do que o conhecemos em muitas das personagens que encarnou: estranho, alucinado e completamente distante da realidade. 
Lured teve reacções mistas na altura da sua saída. Recentemente foi alvo de uma edição em blu-ray num pack que inclui o anterior Escândalo em Paris. Alguns críticos consideraram-no o menos interessante dos dois, referindo o mimetismo face à versão original. Não sei
se partilho essa opinião, uma vez que gosto muito de ambos. Sem ser uma obra prima, merece um visionamento atento, sobretudo para se descobrir outra faceta do realizador, normalmente menos conhecida. 
*texto de Jorge Saraiva.

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