Jeanne Dielman, uma jovem e solitária viúva, vive só com o seu filho Sylvain, segundo uma ordem de acontecimentos imutável: enquanto o filho está na escola trata do apartamento, faz as tarefas caseiras, e de tarde recebe os clientes aos quais se prostitui. Uma manhã, o despertador toca uma hora mais cedo perturbando a mecânica quotidiana e moribunda de Jeanne.
O título desde filme de Chantal Akerman, " Jeanne Dielman, 23, Quai du Commerce, 1080 Bruxelles", diz-nos tudo e nada, ao mesmo tempo. Temos o nome de uma mulher, e uma morada, que superficialmente nos fornece informações sobre a sua identidade, mas nada nos diz sobre a própria mulher: o que ela pensa, o que ela sente, o que ela ama, o que ela teme - na essência, o que ela é, a sua verdadeira identidade. E é precisamente essa falta de identidade que nos direcciona o filme, e nos mantém interessados, apesar de ser tão desprovido de eventos que poderíamos considerar de enorme importância dramática. O título, então, estabelece a personagem principal do filme (que aparece praticamente em todas as sequências do filme), o local onde a acção tem lugar, mas nada mais do que isso.
Conforme o filme se vai desenvolvendo ficamos a conhecer a rotina diária de Jeanne, que consiste quase exclusivamente do trabalho doméstico, como cozinhar, limpar, fazer a cama, passar e dobrar roupa, e tudo isto é pontuado com o barulho dos seus saltos na madeira, e o ritual de acender e apagar luzes á medida que ela sai e entra das divisões da casa.
Akerman mantém-nos sempre a uma distância de segurança de Jeanne, recusando-se a entrar na sua mente, transportando para nós a obrigatoriedade de a tentar compreender. Gradualmente vamos ficando a saber dos detalhes da sua vida, mas ela nunca se revela completamente. Embora Jeanne supostamente seja uma mulher normal, Akerman não escolheu uma desconhecida para interpretar este papel. Delphine Seyrig tinha já atrás de si uma carreira bastante importante, que incluía filmes como "L'année Dernière à Marienbad" e "Muriel" de Resnais, "Baisers Volés" de Truffaut, ou "Le Charme Discret de la Bourgeoisie", de Buñuel, que lhe tinham dado uma estatuto de estrela entre os filmes considerados "de arte". Assim, Jeanne era, ao mesmo tempo, uma mulher comum, e uma mulher muito específica, que dá ao filme um duplo sentido, cortando a banalidade do trabalho oculto, e expõe os recantos obscuros escondidos.
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