A existência marginária e popular de Belarmino Fragoso - engraxador, colorista de fotografias - antigo campeão de boxe, através de um "questionário psicológico", que logo salta para o universo social e urbano onde se inscreve: das origens humildes, com a força embargada das palavras cruas - sobre o drama que constitui a sua vida, realçando as irregularidades e explorações de que foi vítima - o inquérito dissolve-se na cadência excêntrica e nostálgica, da Lisboa crepuscular...
Belarmino (1964, Fernando Lopes) é o registo biográfico de Belarmino Fragoso, homem de biscates, homem da vida. Belarmino é um filme de difícil enquadramento, apenas que faz parte do chamado Cinema Novo Português com todas as múltiplas influências e constrangimentos dos seus intervenientes, autores e contexto.
Debruçando-se sobre as vicissitudes da vida do pugilista, Lopes desmonta a dura realidade do seu personagem e país: humilde, marginal, decadente, analfabeto, explorado, com fome. Em tom de entrevista, com perguntas disparadas fora de campo, é a resposta confessional, na primeira pessoa, que elucida acerca de Belarmino. A tela branca sugere uma neutralidade no seu relato – relato que apenas informa, apresenta factos, dados, opiniões. Para conhecer Belarmino Fragoso é necessário acompanhá-lo, pois são os vários espaços da cinzenta Lisboa que paradoxalmente abrem as portas ao seu mundo interior. O “Belarmino Fragoso” constrói-se nos espaços onde deambula, uma Lisboa entre tantas, que é o próprio Belarmino. O espaço apresenta-se como o alter-ego da pessoa, as imagens chegam com um travo voyeur. Os percursos de Belarmino traçam à vez os seus desejos e conflitos interiores. Os “territórios belarminianos” transmitem as suas emoções, os seus devaneios, e tudo aquilo que não é dizível. Inexorável campo sem contra-campo, Belarmino está sempre presente, confinado. Não se vê Belarmino à deriva em Lisboa, está-se “dentro do Belarmino” e desse modo abre-se a janela de uma cidade.
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