As primeiras curtas metragens de Alain Resnais têm como denominador comum a pintura. Pequenos filmes de homenagem e análise à obra de três pintores relevantes, através de curtos documentários evocativos. Nota-se de imediato uma característica que nunca abandonará a sua longa carreira: a incorporação no universo do cinema de outras formas artísticas. Mais tarde, esse movimento levá-lo-á a abordar de forma explícita a escultura, a banda desenhada, a música e o teatro, embora de modo menos sistematizado do que aqui sucede, uma vez que se tratam de filmes de ficção.
Van Gogh de 1948 parte de uma ideia particularmente interessante: fazer uma biografia do pintor holandês exclusivamente através dos seus quadros. Desse ponto de vista, o documentário é relativamente tradicional, com os seus 18 minutos de duração a repartirem-se pela sua juventude na Holanda, a sua estadia em Paris, o período conturbado de Arles que desemboca no seu suicídio final. Claro que o carácter autobiográfico de grande parte dos seus quadros. facilita o propósito de Resnais de ilustrar as palavras exclusivamente com a extensa obra do pintor. É esse propósito que lhe confere um estilo menos convencional, uma vez que nunca vemos mais nada além dos quadros. Curiosamente, como o filme é a preto e branco, ficamos privados da dimensão da cor, o que transmite uma sensação estranha, mas possibilita uma nova perspectiva de contemplação.
Guernica parte de uma colaboração entre Alain Resnais e Robert Hessens. A abordagem é significativamente diferente da de Van Gogh. Aqui todos os vestígios de convencionalismo foram postos de parte. O documentário de treze minutos serve sobretudo para ilustrar o poema de Paul Eluard que é recitado por Maria Casares. Em momento algum se trata da análise do quadro de Picasso. Os realizadores recorrem a várias obras do pintor, mas também a títulos de jornal, onde se destacam palavras, como destruição, barbárie e fascismo. Aliás as imagens do quadro surgem apenas a partir de meio do documentário e sempre de forma parcial e detalhada, concentrando-se em alguns pormenores em detrimento de uma visão de conjunto. Nesse sentido, Guernica corresponde a uma visão sobretudo emocional e onde os aspectos políticos se sobrepõem de forma evidente aos estéticos. Um documentário quase panfletário (no melhor sentido do termo) ao mesmo tempo triste e magoado, mas esperançoso de que as duas mil mortes na pequena cidade basca em 1937, no primeiro bombardeamento da história de humanidade, não tenham sido em vão.
Gaugin era originariamente um de sete segmentos de um documentário chamado Pictura: An Adventure In Art, realizado por sete cineastas diferentes, cabendo a Alain Resnais o quinto, com cerca de doze minutos. A estrutura é bastante semelhante â de Van Gogh com o texto de Gaston Diehl e a narração de Martin Gabel. Mais uma vez, o documentário socorre-se das obras de Paul Gaugin, mas mais do que autobiográfico, o texto enfatiza a decisão do pintor de se consagrar à arte, abandonando um emprego estável e a família, para passar por inúmeras provações, designadamente a fome. Narrado na primeira pessoa, Gaugin, traça uma distinção entre a vida torturada em França, atormentado pela miséria e pela incompreensão e a decisão de se radicar no Taiti, onde terá encontrado a serenidade que tanto desejou. Gradualmente, as palavras vão-se extinguindo e fica apenas a música a acompanhar a beleza poderosa das imagens. * Texto de Jorge Saraiva
Van Gogh (1948)
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Guernica (1950)
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Gauguin (1951)
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