Tatsuya Nakadai interpreta um samurai perseguido pela culpa pela sua parte inconsciente no massacre de uma pequena aldeia. Agora é um ronin, e fica a saber que o seu antigo clan pretende fazer outro massacre a outra aldeia. Determinado a detê-los, ele irá passar por grandes dificuldades, na tentativa de se redimir do erro do passado.
"Goyokin", de Hideo Gosha, é um filme absorvente, incrível visualmente, embora pouco visto, de entre os filmes de samurais, que consideras temas como a honra, o dever e a lealdade, mas fá-lo com um toque dinâmico, e uma sensação não muito subtil de indignação com o derramamento de sangue, para ganho pessoal ou político.
Ao longo do filme, Gosha encontra maneiras criativas de ensaiar a acção (uma sequência envolvendo um Nakadai capturado é extremamente inteligente), com confiança, que demora o seu tempo para que o público compreenda os pormenores do que está a acontecer, e usando o mesmo método de Kurosawa, que coreografava as suas cenas de modo a que o espectador pudesse perceber o local geográfico onde estavam situados, e a relação entre os personagens que estavam de cada lado.Outros aspectos da produção eram impecáveis, como a fotografia deslumbrante de Kozo Okazaki, ou a superba banda sonora de Masaru Sato.
O filme parece ter sido uma colisão feliz de talentos de fontes diferentes. Era uma co-produção entre a Tokyo Eiga (uma divisão da Toho) e a Fuji Television, com quem Gosha tinha contrato. A maior parte dos actores eram free-lancers, embora Ruriko Asaoka há anos que tinha contrato com a Nikkatsu, e Natsuyagi fosse emprestado pela Toei. O sucesso desta e de outras grandes produções do final dos anos sessenta levaria a mais do mesmo em 1970-71, muitas vezes com combinações entre Nakamura, Asaoka, Toshiro Mifune, Shintaro Katsu, e Shintaro Ishihara, mas nenhum deles iria atingir a grandeza de "Goyokin".
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segunda-feira, 27 de julho de 2015
domingo, 26 de julho de 2015
Kill! (Kiru) 1968
Dois Ronins Genta (Nakadai) e Hanjiro (Takahashi) viajam até uma cidade empoeirada atraídos pelo facto de saberem que um chefe local procura espadachins. Uma vez lá ficam a saber que este chefe é um bandido, e cruza com sete jovens samurais, que pretendem assassinar o chefe.Genta avisa os sete jovens sobre o mal que eles estão a fazer, e é ignorado. Os dois ronins vão dar consigo em diferentes lados da barricada, quando Hanjiro se junta ao lider local Ayuzawa (Koyama), e Genta fica com os jovens samurais. Ayuzawa ordena aos seus homens para localizarem os samurais, e contrata um grupo de ronins para os matarem.
Realizado por Kihachi Okamoto, é um filme reminiscente do spaghetti western, salpicando a sua história de sete aprendizes de samurais em luta contra um corrupto poderoso, com uma banda-sonora muito peculiar de Masuru Sato, claramente influenciada por Morricone, e onde não faltam as cidades empoeiradas dos spaghetti westerns. De facto, pode ser visto como próximo da sequela de "Yokimbo", "Sanjuro", já que ambos os filmes partilham a mesma fonte. No entanto, enquanto "Sanjuro" girava em torno da personagem de Mifune, falta ao filme de Okamoto o foco numa personagem idêntica, e é fácil para o espectador se perder no meio das duplas e triplas traições que ocorrem ao longo do enredo. Mas, para um filme desta envergadura, o enredo acaba por ser o menos importante, já que a acção é para onde deve estar virada a nossa atenção.
Em vez de defender a lealdade e o serviço como a maioria dos filmes de samurais fazia, termina com os samurais a deixarem o seu mestre, e as prostitutas e as prostitutas libertadas das suas obrigações. Em 1968, um filme com esta mensagem, tinha muito mais a ver com os ideais de JFK ou Martin Luther King. Com todo este material intelectual, as lutas também acabam por ser muito bem feitas, e o humor funciona como o de muitos filmes cómicos americanos. E depois, também temos o prazer de ver um Tatsuya Nakadai em forma, que é sempre um filme dentro de outro filme.
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Realizado por Kihachi Okamoto, é um filme reminiscente do spaghetti western, salpicando a sua história de sete aprendizes de samurais em luta contra um corrupto poderoso, com uma banda-sonora muito peculiar de Masuru Sato, claramente influenciada por Morricone, e onde não faltam as cidades empoeiradas dos spaghetti westerns. De facto, pode ser visto como próximo da sequela de "Yokimbo", "Sanjuro", já que ambos os filmes partilham a mesma fonte. No entanto, enquanto "Sanjuro" girava em torno da personagem de Mifune, falta ao filme de Okamoto o foco numa personagem idêntica, e é fácil para o espectador se perder no meio das duplas e triplas traições que ocorrem ao longo do enredo. Mas, para um filme desta envergadura, o enredo acaba por ser o menos importante, já que a acção é para onde deve estar virada a nossa atenção.
Em vez de defender a lealdade e o serviço como a maioria dos filmes de samurais fazia, termina com os samurais a deixarem o seu mestre, e as prostitutas e as prostitutas libertadas das suas obrigações. Em 1968, um filme com esta mensagem, tinha muito mais a ver com os ideais de JFK ou Martin Luther King. Com todo este material intelectual, as lutas também acabam por ser muito bem feitas, e o humor funciona como o de muitos filmes cómicos americanos. E depois, também temos o prazer de ver um Tatsuya Nakadai em forma, que é sempre um filme dentro de outro filme.
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Samurai Rebellion (Jôi-Uchi: Hairyô Tsuma Shimatsu) 1967
No Japão, em 1725, durante um tempo de paz, Isaburo um samurai veterano pertence a um clã local, leva uma vida tranquila com o filho e a esposa. Mas um dia, a sua honra e os seus princípios morais entram em conflito aberto com os do seu clã. O confronto é inevitável e vai ter consequências inesperadas.
Masaki Kobayashi apresenta-nos um exame sublime e assombroso da desumanidade, conformidade e abuso do poder, em Samurai Rebellion. Através de composições altamente formalizadas e meticulosas, Kobayashi reflecte o rígido código de conduta, o comportamento estruturado e a supressão da vontade individual que definem a existência diária sob o domínio de Tokugawa. As sequências panorâmicas em exteriores contrastam com o isolamento do interior do país, que servem também para reforçar um sentimento de aprisionamento e inevitabilidade da classe social, a intrasigência de Takahashi em aceitar a recusa da oferta a Isaburo.
Em "Samurai Rebellion", tal como no mais famoso filme de Kobayashi, "Harakiri", todo o sistema político do Japão feudal, e o código samurai de fidelidade (Bushido),são colocados em conflito directo com as bases sociais mais íntimas do casamento e da família. Desta forma, Kobayashi expõe a falência moral e a falta de compaixão de um código que não valoriza o ser humano individual. Ichi é a catalisadora desta revelação. A sua união sexual com Matsudaira é falsa porque não é construída sobre o amor e respeito mútuo. O bushido falha como sistema para governar as suas vidas de verdadeiros seres humanos, quando se exige que deixe um verdadeiro relacionamento a fim de proteger a honra.
Ganhou o FIPRESCI Prize no festival de Veneza de 1967.
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Masaki Kobayashi apresenta-nos um exame sublime e assombroso da desumanidade, conformidade e abuso do poder, em Samurai Rebellion. Através de composições altamente formalizadas e meticulosas, Kobayashi reflecte o rígido código de conduta, o comportamento estruturado e a supressão da vontade individual que definem a existência diária sob o domínio de Tokugawa. As sequências panorâmicas em exteriores contrastam com o isolamento do interior do país, que servem também para reforçar um sentimento de aprisionamento e inevitabilidade da classe social, a intrasigência de Takahashi em aceitar a recusa da oferta a Isaburo.
Em "Samurai Rebellion", tal como no mais famoso filme de Kobayashi, "Harakiri", todo o sistema político do Japão feudal, e o código samurai de fidelidade (Bushido),são colocados em conflito directo com as bases sociais mais íntimas do casamento e da família. Desta forma, Kobayashi expõe a falência moral e a falta de compaixão de um código que não valoriza o ser humano individual. Ichi é a catalisadora desta revelação. A sua união sexual com Matsudaira é falsa porque não é construída sobre o amor e respeito mútuo. O bushido falha como sistema para governar as suas vidas de verdadeiros seres humanos, quando se exige que deixe um verdadeiro relacionamento a fim de proteger a honra.
Ganhou o FIPRESCI Prize no festival de Veneza de 1967.
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quinta-feira, 23 de julho de 2015
Harakiri (Seppuku) 1962
No Japão feudal do século 17, Hanshiro Tsugumo (Tatsuya Nakadai), um velho samurai desempregado, bate à porta de um poderoso senhor. Recebido por Kageyu Saitô (Rentarô Mikuni), o líder do clã, Tsugumo pede-lhe permissão para cometer suicídio por harakiri na sua residência. Mas quando o velho samurai indaga sobre um samurai mais jovem que cometeu suicídio, um pouco antes da sua chegada, as coisas tomam um rumo inesperado.
"Seppuku" é uma história de tradições injustificadas que levam a actos vergonhosos e mortes. É uma crítica à sociedade japonesa dos anos sessenta, que uma uma história de samurais como objecto, mas cujos principais pontos são mais comuns tanto ao ocidente como ao oriente dos dias actuais, assim como a idéia de trabalhar uma vida inteira para uma empresa, já não existe. O filme explora muitas questões, incluindo obrigações conflitantes, a adesão ao ritual e à tradição, honra virtual vs. honra verdadeira, corrupção política, a lealdade para com a profissão vs lealdade para com a família.
Masaki Kobayashi não se opõe ao gosto pelos filmes violentos, por isso ele não vê qualquer necessidade de destruir o envolvimento do público ou tornas as sequências de batalha extremamente desagradáveis com excesso de gore, ou abuso de efeitos especiais. As lutas são espectáculos deslumbrantes e absolutamente emocionantes de se ver, principalmente graças ás horas de montagem que levaram o filme a ser concluído.
"Harakiri" é uma pequena obra-prima com uma tensão em crescendo, revelando os factos progressivamente, e com contenção cinemática, cujo drama é potentemente infundido com conotações político-sociais, nada paradas no tempo e no lugar.
Kobayashi dois anos mais tarde viria a realizar outro dos grandes filmes japoneses dos anos sessenta, "Kwaidan", e aqui ganhou o grande prémio do Jurí no Festival de Cannes, de 1963.
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"Seppuku" é uma história de tradições injustificadas que levam a actos vergonhosos e mortes. É uma crítica à sociedade japonesa dos anos sessenta, que uma uma história de samurais como objecto, mas cujos principais pontos são mais comuns tanto ao ocidente como ao oriente dos dias actuais, assim como a idéia de trabalhar uma vida inteira para uma empresa, já não existe. O filme explora muitas questões, incluindo obrigações conflitantes, a adesão ao ritual e à tradição, honra virtual vs. honra verdadeira, corrupção política, a lealdade para com a profissão vs lealdade para com a família.
Masaki Kobayashi não se opõe ao gosto pelos filmes violentos, por isso ele não vê qualquer necessidade de destruir o envolvimento do público ou tornas as sequências de batalha extremamente desagradáveis com excesso de gore, ou abuso de efeitos especiais. As lutas são espectáculos deslumbrantes e absolutamente emocionantes de se ver, principalmente graças ás horas de montagem que levaram o filme a ser concluído.
"Harakiri" é uma pequena obra-prima com uma tensão em crescendo, revelando os factos progressivamente, e com contenção cinemática, cujo drama é potentemente infundido com conotações político-sociais, nada paradas no tempo e no lugar.
Kobayashi dois anos mais tarde viria a realizar outro dos grandes filmes japoneses dos anos sessenta, "Kwaidan", e aqui ganhou o grande prémio do Jurí no Festival de Cannes, de 1963.
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quarta-feira, 22 de julho de 2015
Sanjuro (Tsubaki Sanjûrô) 1962
"O sucesso comercial e de crítica de "Yojimbo" foi tal que Akira Kurosawa foi pressionado a escrever, contra vontade, uma sequela. Os elementos marcantes no primeiro filme (mistura inusitada entre comédia, tragédia e ultra-violência) mereceriam um novo doseamento em "Sanjuro": em termos de swordplay, menos quantidade, mais qualidade; o negrume seria quase extirpado, em virtude de um acréscimo de humor físico, entre o slapstick e a auto-caricatura.
"Sanjuro" é um entretenimento assumidamente light, ao pé de "Yojimbo", sem, no entanto, fugir àquilo que é apanágio desta faceta da obra de Kurosawa: narrativa inteligente e simples, acção minuciosamente coreografada e personagens carismáticas.
Na realidade, apesar de ambos serem autênticos cocktails cinematográficos (western + musical + filme de acção puro e duro), "Sanjuro" é assumidamente mais directo e acessível que "Yojimbo": a acção e a comédia consomem cada partícula do filme, não havendo tanta preocupação em retratar as personagens e o seu modus vivendi na sociedade japonesa de meados do século XIX.
O filme começa com um grupo de 9 jovens, e inexperientes, samurais dispostos a arriscar as suas vidas no combate contra a corrupção. A sua reunião é interrompida pela intromissão de Sanjuro, que, aparentemente de forma desinteressada, se junta ao grupo. O seu sangue-frio e argúcia tornam-no num líder incontestável no seio do movimento, mas, do lado dos "maus", haverá quem lhe faça frente. E é o duelo final, aquele que Kurosawa descreveu no seu argumento como sendo "inefável", o zénite de "Sanjuro": a simetria e a suspensão irrespirável que se estilhaçam num golpe relampejante. Kurosawa não cedeu, mesmo após dois filmes, e manteve Sanjuro, ou o "homem sem nome", que vai e vem, deixando um rasto de sangue atrás, como um invencível Deus da guerra. Não me interpretem mal, Sanjuro é justo e bom, mas também é alguém que odeia a paz: enquanto esta subsistir, ele diz "See ya later"."
Por Luís Mendonça, daqui.
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"Sanjuro" é um entretenimento assumidamente light, ao pé de "Yojimbo", sem, no entanto, fugir àquilo que é apanágio desta faceta da obra de Kurosawa: narrativa inteligente e simples, acção minuciosamente coreografada e personagens carismáticas.
Na realidade, apesar de ambos serem autênticos cocktails cinematográficos (western + musical + filme de acção puro e duro), "Sanjuro" é assumidamente mais directo e acessível que "Yojimbo": a acção e a comédia consomem cada partícula do filme, não havendo tanta preocupação em retratar as personagens e o seu modus vivendi na sociedade japonesa de meados do século XIX.
O filme começa com um grupo de 9 jovens, e inexperientes, samurais dispostos a arriscar as suas vidas no combate contra a corrupção. A sua reunião é interrompida pela intromissão de Sanjuro, que, aparentemente de forma desinteressada, se junta ao grupo. O seu sangue-frio e argúcia tornam-no num líder incontestável no seio do movimento, mas, do lado dos "maus", haverá quem lhe faça frente. E é o duelo final, aquele que Kurosawa descreveu no seu argumento como sendo "inefável", o zénite de "Sanjuro": a simetria e a suspensão irrespirável que se estilhaçam num golpe relampejante. Kurosawa não cedeu, mesmo após dois filmes, e manteve Sanjuro, ou o "homem sem nome", que vai e vem, deixando um rasto de sangue atrás, como um invencível Deus da guerra. Não me interpretem mal, Sanjuro é justo e bom, mas também é alguém que odeia a paz: enquanto esta subsistir, ele diz "See ya later"."
Por Luís Mendonça, daqui.
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terça-feira, 21 de julho de 2015
Yojimbo, o Invencível (Yojimbo) 1961
Sanjuro, o samurai solitário, qual John Wayne nipónico, chega a uma pequena comunidade, dividida entre dois gangs, com um objectivo em mente: negociar o seu futuro. A sua chegada é notada, depois deste exibir uma extrema agilidade no manejo da espada, deitando abaixo, sem pestanejar, um punhado de malfeitores. O sangue-frio e a forma implacável como ceifa vidas - "uma morte por segundo", queria Kurosawa - fazem deste o mais cobiçado guerreiro da vila. Mas Sanjuro é arguto, tacteando cinicamente o terreno nos dois lados da barricada, antes de tomar partido.
"Yojimbo" é um filme de acção, pincelado com um humor negro mordaz, ou um western tresloucado e, para o seu tempo, ultra-violento (membros decepados e algum sangue jorrado) desenrolado em pleno Japão do século XIX. O (anti-)herói desta trama é apresentado como sendo o mais consciencioso "homem de guerra", enriquecendo à custa dos autênticos massacres que executa. Mas até tem, vamos descobrindo, o coração no sítio...
Na senda de "Seven Samurai", Akira Kurosawa cria um objecto raro: visual e sonicamente assombroso, com a utilização magistral do widescreen e de efeitos sonoros inovadores (para além dos temas musicais desconcertantes, o som do esquartejar da espada e do vento empoeirado são elementos fulcrais nas cenas de acção) e exemplar na escrita, pejada de reviravoltas, jogos mentais e algumas deliciosas bizarrias (exemplo da buñueliana "mão de boas-vindas" que Sanjuro vê na boca de um cão vadio, mal entra na conturbada vila).
Para mais, "Yojimbo" vai beber ao carisma imenso do seu actor principal, o braço direito de Kurosawa: Toshirô Mifune. Ele reinventa o género do cowboy solitário, lacónico (falando, sem falar), cerebral e, acima de tudo, cool. Em certa medida, esta composição de Mifune esteve na origem da carreira de Clint Eastwood, já que "Per un pugno di dollari" de Sergio Leone, o seu primeiro grande sucesso, é um remake de "Yojimbo".
O círculo completou-se em 2006, quando Eastwood homenageou o legado Kurosawa-Mifune com uma obra colossal: "Letters From Iwo Jima".
Por Luís Mendonça, daqui.
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"Yojimbo" é um filme de acção, pincelado com um humor negro mordaz, ou um western tresloucado e, para o seu tempo, ultra-violento (membros decepados e algum sangue jorrado) desenrolado em pleno Japão do século XIX. O (anti-)herói desta trama é apresentado como sendo o mais consciencioso "homem de guerra", enriquecendo à custa dos autênticos massacres que executa. Mas até tem, vamos descobrindo, o coração no sítio...
Na senda de "Seven Samurai", Akira Kurosawa cria um objecto raro: visual e sonicamente assombroso, com a utilização magistral do widescreen e de efeitos sonoros inovadores (para além dos temas musicais desconcertantes, o som do esquartejar da espada e do vento empoeirado são elementos fulcrais nas cenas de acção) e exemplar na escrita, pejada de reviravoltas, jogos mentais e algumas deliciosas bizarrias (exemplo da buñueliana "mão de boas-vindas" que Sanjuro vê na boca de um cão vadio, mal entra na conturbada vila).
Para mais, "Yojimbo" vai beber ao carisma imenso do seu actor principal, o braço direito de Kurosawa: Toshirô Mifune. Ele reinventa o género do cowboy solitário, lacónico (falando, sem falar), cerebral e, acima de tudo, cool. Em certa medida, esta composição de Mifune esteve na origem da carreira de Clint Eastwood, já que "Per un pugno di dollari" de Sergio Leone, o seu primeiro grande sucesso, é um remake de "Yojimbo".
O círculo completou-se em 2006, quando Eastwood homenageou o legado Kurosawa-Mifune com uma obra colossal: "Letters From Iwo Jima".
Por Luís Mendonça, daqui.
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segunda-feira, 20 de julho de 2015
A Fortaleza Escondida (Kakushi-Toride no San-Akunin) 1958
A princesa Yukihime sobreviveu à destruição da sua família na sequência das grandes guerras civis que assolavam o Japão feudal e esconde-se nas montanhas, fazendo-se passar por uma simples camponesa. Sob a protecção do general Rokurota, a princesa - que conseguiu esconder parte do ouro que pertencia ao fabuloso tesouro da sua família - parte em busca de um território seguro e de um foraleza secreta. Dois marginais errantes, Tahei e Matashiki, juntam-se à princesa e ao general nesta incrível odisseia recheada de perigos e aventuras.
Há sempre um ligeiro choque estético ao assistir a um filme de Akira Kurosawa. As suas obras, mesmo que sejam de entretimento, como este "A Fortaleza Escondida", são tão sensualmente vivas, e hoje em dia parecem muito mais modernas do que os filmes de Hollywood daquela época. "A Fortaleza Escondida" é um épico de comédia de acção, produzido pelos Toho Studios, e mesmo por resvalar para a comédia, era um dos filmes menos esperados do realizador Kurosawa, sobretudo por ter sido feito no ano a seguir a "Trono de Sangue". Mas trata de uma maneira divertida temas que o próprio Kurosawa poderia transformar na mais cruel anatomizações da natureza humana.
"A Fortaleza Escondida" foi citado por George Lucas como base para o seu primeiro "Star Wars", principalmente na forma como a história de desenvolve, através dos olhos de dois personagens cómicos. Toda a narrativa de "Star Wars" mostra a forte influência do realizador japonês. Rokoruta (Toshiro Mifune) faz lembrar tanto Han Solo como Luke Skywalker, na sua relação protetora e obediente, de amor e ódio com a princesa. Também há o vilão preferido do público, quando Rokoruta encontra um velho amigo Hyoe Tadokoro (Susumu Fujita), que comanda as tropas para Yanama. Tadokoro é derrotado num duelo mas Rokoruta não o mata, e o villão vai aparecer mais tarde cheio de cicatrizes no rosto. Tudo isto é comum a este filme, e a "Star Wars".
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Há sempre um ligeiro choque estético ao assistir a um filme de Akira Kurosawa. As suas obras, mesmo que sejam de entretimento, como este "A Fortaleza Escondida", são tão sensualmente vivas, e hoje em dia parecem muito mais modernas do que os filmes de Hollywood daquela época. "A Fortaleza Escondida" é um épico de comédia de acção, produzido pelos Toho Studios, e mesmo por resvalar para a comédia, era um dos filmes menos esperados do realizador Kurosawa, sobretudo por ter sido feito no ano a seguir a "Trono de Sangue". Mas trata de uma maneira divertida temas que o próprio Kurosawa poderia transformar na mais cruel anatomizações da natureza humana.
"A Fortaleza Escondida" foi citado por George Lucas como base para o seu primeiro "Star Wars", principalmente na forma como a história de desenvolve, através dos olhos de dois personagens cómicos. Toda a narrativa de "Star Wars" mostra a forte influência do realizador japonês. Rokoruta (Toshiro Mifune) faz lembrar tanto Han Solo como Luke Skywalker, na sua relação protetora e obediente, de amor e ódio com a princesa. Também há o vilão preferido do público, quando Rokoruta encontra um velho amigo Hyoe Tadokoro (Susumu Fujita), que comanda as tropas para Yanama. Tadokoro é derrotado num duelo mas Rokoruta não o mata, e o villão vai aparecer mais tarde cheio de cicatrizes no rosto. Tudo isto é comum a este filme, e a "Star Wars".
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domingo, 19 de julho de 2015
Trono de Sangue (Kumonosu-jô) 1957
No Japão do século XVI, os samurais Washizu e Miki encontram uma feiticeira de regresso para casa, depois de vencerem uma batalha. Ela prevê que Washizu venha a ser o Senhor do Castelo do Norte. Este é o início de uma sangrenta luta pelo poder.
"Trono de Sangue" é uma revisão de "Macbeth", de William Shakespeare, por Akira Kurosawa, através da lente histórica do Japão feudal, e as convenções estéticas do Teatro Noh. É uma obra-prima de imagens expressivas. Violento e intensamente melodramático, filtra os temas da ganância, do poder, e da luxúria, através dos elementos visuais que são tão ricos e texturizados que assumem uma vida própria. Os elementos naturais do nevoeiro, chuva, e os emaranhados impenetráveis de uma floresta infestada por espíritos, tornam-se personagens que medeiam a história de um guerreiro que perde a sua humanidade em busca pelo poder.
A ganância e o egoísmo já tinham sido elementos importantes no filme da descoberta de Kurosawa, "Rashomon" (1950), mas aqui elas assumem um tom ainda mais escuro, à beira do Niilismo. Um destino pesado paira sobre tudo o que acontece em "Trono de Sangue", e os personagens no fim parecem fantoches, e as suas débeis tentativas para orientar a sua vida foram passageiras, como a névoa perpétua que assombra a paisagem vulcânica desolada.
Os actores de Kurosawa trabalham num estilo grandioso, que tem a tendência a chocar algumas pessoas, como involuntariamente cómico (as contorções faciais de Mifune são uma reminiscência de máscaras bizarras), mas dado o design visual luxuoso as interpretações não podiam ser mais adequadas. Mifune, em particular, canaliza toda a luxúria e a agressividade de Washizu, com o seu comportamento a ficar cada vez mais estranho à medida que o filme avança.
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"Trono de Sangue" é uma revisão de "Macbeth", de William Shakespeare, por Akira Kurosawa, através da lente histórica do Japão feudal, e as convenções estéticas do Teatro Noh. É uma obra-prima de imagens expressivas. Violento e intensamente melodramático, filtra os temas da ganância, do poder, e da luxúria, através dos elementos visuais que são tão ricos e texturizados que assumem uma vida própria. Os elementos naturais do nevoeiro, chuva, e os emaranhados impenetráveis de uma floresta infestada por espíritos, tornam-se personagens que medeiam a história de um guerreiro que perde a sua humanidade em busca pelo poder.
A ganância e o egoísmo já tinham sido elementos importantes no filme da descoberta de Kurosawa, "Rashomon" (1950), mas aqui elas assumem um tom ainda mais escuro, à beira do Niilismo. Um destino pesado paira sobre tudo o que acontece em "Trono de Sangue", e os personagens no fim parecem fantoches, e as suas débeis tentativas para orientar a sua vida foram passageiras, como a névoa perpétua que assombra a paisagem vulcânica desolada.
Os actores de Kurosawa trabalham num estilo grandioso, que tem a tendência a chocar algumas pessoas, como involuntariamente cómico (as contorções faciais de Mifune são uma reminiscência de máscaras bizarras), mas dado o design visual luxuoso as interpretações não podiam ser mais adequadas. Mifune, em particular, canaliza toda a luxúria e a agressividade de Washizu, com o seu comportamento a ficar cada vez mais estranho à medida que o filme avança.
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sexta-feira, 17 de julho de 2015
Os Sete Samurais (Shichinin no Samurai) 1954
No século XVI, durante a era Sengoku, quando os poderosos samurais estavam com os dias contados pois eram agora desprezados pelos seus aristocráticos senhores. Kambei, um guerreiro veterano sem dinheiro, chega em uma aldeia indefesa que foi saqueada repetidamente por ladrões assassinos. Os moradores do vilarejo pedem a sua ajuda, fazendo com que Kambei recrute seis outros ronins, que concordam em ensinar os habitantes como se defender em troca de comida.
No seu ponto central, a sua história é tão simples que podia ser sumarizada a uma única frase: Uma pequena vila agrícola japonesa é ameaçada por bandidos, e contrata 7 ronin (samurais sem mestre) para os proteger. O mesmo podia ser dito das maiores peças de Shakespeare, ou de algumas das melhores histórias de Hemingway, ou de alguns dos maiores filmes de Chaplin, porque todos estes são factos que nos lembram que o que é épico sobre uma história, nem sempre é a complexidade da narrativa em si, mas sim a convicção com que ela é contada. Este é um filme que poderia ter sido mais um filme de época japonês, mas a atenção cuidada de Kurosawa, personagem a personagem, e as suas questões sociais, elevam "Os Sete Samurais" acima das suas raízes, garantido ao filme um lugar no panteão, não só dos grandes filmes japoneses, como também dos grandes filmes mundiais. De todos os tempos.
Akira Kurosawa tinha já realizado, ou co-realizado, 14 filmes, quando fez esta obra em 1954, incluindo "Rashomon" que o grande crítico francês André Bazin escreveu: "pode ser dito verdadeiramente que abriu as portas do Ocidente para o cinema japonês. Se "Rashomon" abriu as portas, "Os Sete Samurais" arrancou-lhe as dobradiças, não só pela sua popularidade e aclamação em todo mundo, como pela sua profunda afinidade e ligação temática e visual, com o western americano. Muito facilmente esta pequena aldeia do Japão, podia ser transportada para uma cidade ou fronteira do Oeste americano.
A cada um dos sete samurais é dada uma personalidade única, e um conjunto de dons, o que os torna intrigantes como indivíduos, e nas suas interacções com os outros. Os dois nomes que mais facilmente nos lembramos, são interpretados pelos dois actores preferidos de Kurosawa, Takashi Shimura e Toshirô Mifune, que apareceram juntos em 15 dos 30 filmes do realizador. Shimura interpreta Kambei Shimada, o primeiro samurai contratado pelos camponeses, e o líder do grupo. Shimada é um nobre ronin de grande habilidade, mas lutou todas as suas batalhas do lado perdedor. Shimura impregna o seu personagem com um sentido profundo de honra e nobreza, inspirando os outros ao seu redor. Acreditamos que qualquer outro samurai lutaria ao seu lado, sem promessas de ganhos monetário ou fama.
O personagem de Mifune é quase o oposto. O seu Kikuchiyo é um intriguista, impostor, que no entanto inspira os outros com o seu entusiasmo (como um caponês que se eleva ele próprio à classe Samurai, refletindo as crenças de Kurosawa na democracia e na mobilidade social). No início do filme, ele é pouco mais do que uma piada, um cão vadio que late muito mas não consegue ser respeitado, mas no final, ele alcança uma espécie de redenção, pela sua tenacidade e espírito. Ao longo do filme, Mifune é a principal fonte cómica, a saltar, gritar e berrar com os camponeses pela sua falta de habilidade a lutar. Kurosawa foi claramente influenciado por John Ford, não apenas no âmbito e grandiosidade temática dos seus filmes, mas também no uso do humor obsceno, para distrair entre batalhas.
Goi nomeado para dois Óscares, e ganhou o Leão de Prata em Veneza.
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No seu ponto central, a sua história é tão simples que podia ser sumarizada a uma única frase: Uma pequena vila agrícola japonesa é ameaçada por bandidos, e contrata 7 ronin (samurais sem mestre) para os proteger. O mesmo podia ser dito das maiores peças de Shakespeare, ou de algumas das melhores histórias de Hemingway, ou de alguns dos maiores filmes de Chaplin, porque todos estes são factos que nos lembram que o que é épico sobre uma história, nem sempre é a complexidade da narrativa em si, mas sim a convicção com que ela é contada. Este é um filme que poderia ter sido mais um filme de época japonês, mas a atenção cuidada de Kurosawa, personagem a personagem, e as suas questões sociais, elevam "Os Sete Samurais" acima das suas raízes, garantido ao filme um lugar no panteão, não só dos grandes filmes japoneses, como também dos grandes filmes mundiais. De todos os tempos.
Akira Kurosawa tinha já realizado, ou co-realizado, 14 filmes, quando fez esta obra em 1954, incluindo "Rashomon" que o grande crítico francês André Bazin escreveu: "pode ser dito verdadeiramente que abriu as portas do Ocidente para o cinema japonês. Se "Rashomon" abriu as portas, "Os Sete Samurais" arrancou-lhe as dobradiças, não só pela sua popularidade e aclamação em todo mundo, como pela sua profunda afinidade e ligação temática e visual, com o western americano. Muito facilmente esta pequena aldeia do Japão, podia ser transportada para uma cidade ou fronteira do Oeste americano.
A cada um dos sete samurais é dada uma personalidade única, e um conjunto de dons, o que os torna intrigantes como indivíduos, e nas suas interacções com os outros. Os dois nomes que mais facilmente nos lembramos, são interpretados pelos dois actores preferidos de Kurosawa, Takashi Shimura e Toshirô Mifune, que apareceram juntos em 15 dos 30 filmes do realizador. Shimura interpreta Kambei Shimada, o primeiro samurai contratado pelos camponeses, e o líder do grupo. Shimada é um nobre ronin de grande habilidade, mas lutou todas as suas batalhas do lado perdedor. Shimura impregna o seu personagem com um sentido profundo de honra e nobreza, inspirando os outros ao seu redor. Acreditamos que qualquer outro samurai lutaria ao seu lado, sem promessas de ganhos monetário ou fama.
O personagem de Mifune é quase o oposto. O seu Kikuchiyo é um intriguista, impostor, que no entanto inspira os outros com o seu entusiasmo (como um caponês que se eleva ele próprio à classe Samurai, refletindo as crenças de Kurosawa na democracia e na mobilidade social). No início do filme, ele é pouco mais do que uma piada, um cão vadio que late muito mas não consegue ser respeitado, mas no final, ele alcança uma espécie de redenção, pela sua tenacidade e espírito. Ao longo do filme, Mifune é a principal fonte cómica, a saltar, gritar e berrar com os camponeses pela sua falta de habilidade a lutar. Kurosawa foi claramente influenciado por John Ford, não apenas no âmbito e grandiosidade temática dos seus filmes, mas também no uso do humor obsceno, para distrair entre batalhas.
Goi nomeado para dois Óscares, e ganhou o Leão de Prata em Veneza.
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quarta-feira, 15 de julho de 2015
A Idade de Ouro dos Filmes de Samurais
Os anos 50 marcaram o pico da indústria japonesa de cinema. Seis produtoras, as Shochiku, Toho, Shintoho, Daiei, Toei (a partir de 1951) e a Nikkatsu (a partir de 1954), lançavam 2 filmes por semana, 100 filmes por ano. A produção anual excedia os 500 filmes, e todas as produtoras prosperavam no ramo do cinema.
Com a televisão ainda por penetrar no mercado de diversão, o cinema era o principal entretimento para o público geral. Assim, quase cada filme que era lançado era um sucesso garantido.
Desde o final da Segunda Guerra Mundial que a ocupação aliada restringia os filmes que promoviam os valores feudais, colocando o kibosh entre os mais vistos do género de acção. Os ocupantes partiram em 1952, e ficou claro que estava a chegar uma era dourada para os filmes de Samurais, ao mesmo tempo da década dourada do cinema japonês. Durante os anos seguintes, estes filmes representavam mais de um terço da indústria de então, que já se fixava em mais de 500 filmes por ano.
Tão popular como era o Western na América, encontrávamos filmes baseados em figuras lendárias, como Musashi Miyamoto ou o fora da lei Chuji Kunisada. Contos históricos permitiam aos cineastas japoneses reinterpretarem a tradição para um assunto mais moderno, no pós-guerra.
Entretanto, os festivais internacionais divulgavam alguns dos realizadores mais importantes daquele país, como Akira Kurosawa, Masaki Kobayashi ou Hiroshi Inagaki, e introduziam este período de ouro para cinéfilos de todo o mundo.
Akira Kurosawa tornava-se no mais famoso realizador deste género, que acabaria por prosperar, pelo menos, até final da década de sessenta, embora continuasse a resistir até aos dias de hoje.
Este pequeno ciclo, tem o objectivo de dar uma breve passagem sobre este período de ouro dos filmes de Samurais, onde veremos um total de 10 dos seus filmes mais interessantes.
Aqui está o alinhamento para os próximos dias:
- Os Sete Samurais (1954, de Akira Kurosawa)
- Trono de Sangue (1957, de Akira Kurosawa)
- A Fortaleza Escondida (1958, de Akira Korosawa)
- Yojimbo (1961, de Akira Kurosawa)
- Sanjuro (1962, de Akira Kurosawa)
- Harakiri (1962, de Masaki Kobayashi)
- Samurai Rebellion (1967, de Masaki Kobayashi)
- Kiru (1968, de Kihachi Okamoto)
- Goyokin (1969, de Hideo Gosha)
- Lady Snowblood (1973, de Toshia Fujita)
Espero que o ciclo seja do vosso agrado. Até breve.
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