Mostrar mensagens com a etiqueta Manuel Mur Oti. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Manuel Mur Oti. Mostrar todas as mensagens

sábado, 20 de junho de 2020

Orgullo (Orgullo) 1955

Depois de anos a estudar no estrangeiro, Laura Mendoza, herdeira de grandes terras, com uma rivalidade que já vem de várias gerações com os vizinhos por causa do controle da água de um rio: os Alzaga. A rivalidade vai reacender quando Laura se apaixona pelo herdeiro dos Alzaga.
Manuel Mur Oti, de quem já  vimos dois filmes neste ciclo, é uma das grandes injustiças do cinema espanhol, há décadas esquecido pelo público, e desprezado pela crítica (que também não conhecia muito bem o seu trabalho), sendo mais visto apenas nos últimos anos, graças ao aparecimento dos seus filmes na internet. Foi acusado de ser um cineasta pedante, melodramático e pretensioso, de enorme ego e ambição excessiva, que acabaram por prejudicar a sua carreira. Essa foi a mensagem que foi passada através de gerações, no entanto isso não é verdade, e descobrimos à medida que vemos os seus filmes.
"Orgullo" era o seu quarto filme (não vimos o primeiro neste ciclo), e surpreende porque tem todos os elementos de um western épico de Hollywood, mas é passado em Castilla. Um maravilhoso e espectacular “gazpacho-western” em que o Monument Valley é substituido pelos picos da Europa,e as canções folclóricas americanas pelas "jotas castellanas", com reminiscências de "The Big Country" de Wyler, e "Westward the Womem" de Wellman, mas também de John Ford e Anthony Mann, que surpreenderá por ter sido filmado na Espanha Negra dos anos cinquenta, e por ter permanecido escondido durante tanto tempo.
Podem ler um texto maravilhoso sobre o filme do nosso amigo João Palhares, para o site À Pala de Walsh, aqui
Legendas em inglês.

Link
Imdb

segunda-feira, 15 de junho de 2020

Condenados (Condenados) 1953

A acção passa-se numa localidade na região espanhola de "La Mancha", onde uma mulher, "Aurelia" (Aurora Bautista) trabalha nas suas terras com a ajuda de um jovem estranho (Jose Suarez), acabado de chegar a esta localidade. O marido de Aurelia (Carlos Lemos) está na prisão por um crime cometido por um ataque de ciúmes, e tudo vai bem até que o marido recupera a liberdade trazendo consigo os fantasmas que rodeiam a sua alma.
Adaptação de uma peça de teatro homónima de Jose Suarez Carreño, vencedor do "Lope de Vega" de 1951, que nos mostra uma Castilla tão seca como os seus habitantes, homens e mulheres. É um dos melhores exemplos da  chamada "España Negra", e dos valores morais mais difíceis no pós-guerra civil espanhola, e provavelmente não encontrará uma ocasião mais propícia a esta forte tragédia, assinada por Manuel Mur Uti, em 1953.
É uma espécie de continuação de "Cielo Negro", estreado dois anos antes, e conta outra história baseada numa personagem feminina, Aurélia, num massacre continuo, que aparece como a causa e a consequência, e como isso encaixa claramente na cultura patriarcal daqueles tempos. A personagem de Aurélia é interpretada por Aurora Bautista no auge da sua carreira, depois de interpretar filmes como "Agustina de Aragon", "Pequeñeces" ou "Locura de amor."
Legendas em espanhol.

Link
Imdb

segunda-feira, 8 de junho de 2020

Cielo Negro (Cielo Negro) 1951

As desventuras de Emilia (Susana Canales), uma humilde costuereira que toma emprestado um vestido de luxo da casa de moda onde trabalha para tentar deslumbrar um colega de trabalho por quem ela se apaixonou.
"Cielo Negro" fecha com uma das sequências mais significativas de todo o cinema espanhol, um longo travelling no qual a câmara segue Emilia, do viaduto da rua Bailén até à basílica de San Francisco el Grande, em Madrid. Um travelling que não deixa de ser um reflexo do país do momento, do julgamento sobre o papel feminino na sociedade na Espanha de meados do Século XX. É uma fotografia da personalidade da personagem, mas não deixa de ser, em nenhum momento, a essência clara e magistral do Cinema. Sem ter de aceitar ou repudiar a mensagem religiosa da submissão, o planeamento, a encenação e a realização dos dez minutos finais deste filme são dignos de estudo, e merecem os maiores elogios. A cena é feita a partir da visão de Emília, a sua predeterminação ao fracasso, à solidão, à decepção pela espécie humana. "Cielo Negro" é a história de um sonho que se transformou em pesadelo, de um amor platónico que foi levado ao engano pelo egoísmo e maldade dos homens.
Realizado por Manuel Mur Oti, que começou a fazer filmes aos 41 anos, quase por acaso, depois de ser extremamente bem sucedido numa série de outras carreiras, como escritor, poeta, argumentista, advogado, e até perfumista. O papel da mulher na sociedade é um dos focos maiores no trabalho de Mur Oti, como se vê aqui neste filme, que embora não fosse o seu primeiro, era a sua revelação.
Legendas em inglês.

Link
Imdb

quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

Cielo Negro (Cielo Negro) 1951


"Se nos mês passado lembrámos aqui Cottafavi e a ironia da sua carreira, agora chegou a vez de Manuel Mur Oti, cineasta espanhol da geração de Luis García-Berlanga e Carlos Saura, que começou a fazer cinema aos 41 anos e que, apesar da boa recepção pelo público e pela crítica da generalidade dos seus filmes (chamavam-no “el genio”), caiu no esquecimento a partir da morte do General Franco. A explicação para tal é simples. É que com a entrada de um novo regime eram precisas obras que simbolizassem a ruptura, não os sucessos comerciais, feitos com o apoio e graças de uma ditadura e do seu líder.
Ao vermos um dos seus melhores filmes Cielo Negro (o segundo de uma carreira de 17), temos precisamente os temas queridos da ditadura como a importância da religião cristã ou a materialização do melodrama nos dilemas do amor como marcas de um género e de uma “atmosfera”. Contudo, a sua protagonista, Emília (Susana Canales), uma jovem que sempre viveu com a mãe, que nunca teve um namorado, que nunca foi à verbena (festa), que vê muito mal, não é o protótipo de mulher submissa que esperaríamos. Há nela uma força (apesar da inocência) com que agarra o homem que quer para namorado, com que rouba o vestido para a festa, com que obriga o poeta impostor [Fernando Rey instigado pela antagonista Lola (a presença da actriz portuguesa Teresa Casal, à data mulher de Arthur Duarte)] a prolongar a farsa até à morte da mãe. Uma força que em último instinto a impele a pôr a hipótese do suicídio.
É por sobre essa força que Mur Oti se revela como cineasta. Ao contrário de muitos filmes feito no Estado Novo em Portugal onde o folhetim era tudo e a expressividade cinematográfica algo raro, Cielo Negro controla a tragédia lacrimejante (o filme da ceguinha como lhe chamavam), com absoluta certeza. Eis alguns traços:
1. A ponte da cena final vista logo no primeiro plano do filme, a partir de casa de Emília, quando tudo estava bem (quando ainda não chovia). Se esse plano inicial nos mostra a simbologia da vida de Canales antes do amor, com os pássaros na gaiola à janela, a saída lá para fora revela o preço da liberdade;
2. A cegueira. Antes desta ser apresentada como elemento da tragédia [como o é por exemplo em Magnificent Obsession (Sublime Expiação, 1954) de Douglas Sirk] ela é, logo no início, trabalhada na relação com espaço: é o dia tan hermoso de Emília, onde o céu surge pequenino emparedado entre linhas de cimento; ou são os gerânios que ela pergunta à mãe se estão à janela da vizinha, ao que esta mente ante a visão das meias estendidas; ou essa sequência tão erótica quanto difusa da ida à festa com o amado Fortún. Como se a sua alegria que são 75 minutos e depois duas horas (ela conta o tempo que passa) fosse só uma questão de música, de luzes (os fogos de artifícios são estrelas) da proximidade dos corpos. Nessa sequência ela tira os óculos à boneca que ganha nas rifas, como o fizera a si própria antes de sair de casa. Mais do que se impor a beleza, Emília quer impor-se a cegueira, para poder amar Fortún por breves instantes (para ir-se à felicidade é preciso ir-se sin gafas), ainda que ele seja boémio, ainda que ele não a queira da mesma maneira. Esse acto perfeitamente edipiano, a auto-cegueira é uma etapa de crescimento que depois se converte numa inevitabilidade. É quando Emília sabe que vai ficar cega e que não pode trabalhar, o momento em que realmente “vê”: como se a cegueira física fosse o preço a pagar pela clarividência interior. 
3. E quase nos esquecíamos da sequência final. A mãe morreu. Ela ficará cega. Tudo aponta o trágico. Emília revolta os olhos e sai. Junta às escadas perguntam-lhe: “¿A dónde vas Emília? Sube!”. Mas Emília desce. E nós sabemos onde vai. Sai para a rua. Chove, chove sempre. Voltamos a ver a ponte ainda com mais certeza de uma tragédia. Corre, resoluta, mesmo cega sabe o caminho. Quando chega à ponte vira-se para nós e sentimos outra vez essa força, essa espécie de abertura do ser ante o sofrimento extremo. Vira-nos costas, debruça-se sobre a ponte e a câmara com ela. Lá em baixo passa um eléctrico. Mur Oti põe a câmara junto ao solo para nos dar a distância. Mas é no último momento que Emília ouve os sinos, inesperados, belos, que numa torrente demencial a chamam. Das igrejas, de todas. A salvá-la. E para quem tinha dúvidas desse milagre rosseliniano no final, esses sinos não lhe pedem que viva, intimam-na a fazê-lo. E depois é o regresso à vida com os sinos “celestiais” cada vez mais intensos. Já se foi o vestido comido pelas traças e só há um xaile sobre os ombros a amparar da chuva num travelling inenarrável, considerado por muitos o mais belo de toda a história do cinema."
* Texto escrito pelo próprio Carlos Natálio, para o site À Pala de Walsh. Daqui.
Legendas em Inglês

Link
Imdb