segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013
O Denunciante (Le Doulos) 1962
"Bob le Flambeur" de 1956, que é amplamente considerado como uma espécie de filme de gangsters, mas "Le Doulos" foi o primeiro filme de Melville a destilar puramente o género, inspirado tanto pelos códigos morais do ciclo de gangsters dos anos 30 como pelas obscuras e cínicas maquinações do filme noir. E, enquanto "Bob le flambeur" era um estudo de uma personagem fundamentalmente parisiense, profundamente enraizada na cultura do pós-Segunda Guerra Mundial na Europa, "Le Doulos" parece que poderia ser definido como no submundo de Chicago ou Nova York, trazendo assim a fruição da obsessão de Melville por tudo o que era americano.
"Le Doulos" era baseado num romance de 1957 de Pierre Lesou, que viria a dizer que preferia a adaptação ao cinema de Melville ao seu livro. A história, tanto no romance como no filme, é um conto densamente baseado no engano em que os personagens desesperados manipulam aqueles à sua volta, num duplo esforço para preservar as suas próprias vidas e descobrir quem é leal, e quem não é (a lealdade é um dos temas principais do filme, e a sua manutenção ou a traição conduzem as acções dos personagens). O foco da história é dividido entre dois personagens principais, e ambos permanecem opacos até aos momentos finais do filme. Vimos pela primeira vez Maurice Faugel (Serge Reggiani), que é introduzido a andar debaixo de uma ponte sombria num rastreamento fatalista logo depois dos créditos de abertura. Vestindo o casaco icónico de um gangster, ele claramente caminha para a morte, embora, neste caso, não seja a sua, mas sim a do seu amigo Gilbert (René Lefèvre), a quem ele mata a sangue frio. Maurice depois rouba um saco de jóias que Gilbert tinha no seu poder de um assalto anterior, e enterra-as debaixo de um poste de electriciadade, uma acção que vai desencadear uma cadeia inexorável de acontecimentos.
Saltamos então para o outro personagem principal, Silien (Jean-Paul Belmondo, então já um ícone internacional, dois anos depois de Acossado de Jean-Luc Godard), um amigo de Maurice, de quem pairam rumores de ser um informante da polícia (o título do filme "doulos" na gíria significa "delator"). Maurice fala a Silien sobre um roubo que ele anda a planear, e quando o roubo é frustrado pela polícia, resultando na morte de um policia, parece que o estatudo de Silien de informante foi confirmado. Os truques de Melville na narrativa vão muito para lá do óbvio, o que significa que as perguntas nunca são respondidas à primeira instância, cada personagem mente em algum ponto, o que sublinha outro dos temas mais importantes do filme: a natureza do engano, e como é necessária para a sobrevivência, mas também como fonte constante da morte. E assim, Melville brinca com a mais cruel ironia do submundo.
Mesmo que seja considerado o primeiro filme verdadeiramente de gangsters de Melville, depois de o assistirmos, pensamos que Melville já os vinha a fazer desde há anos. E claramente tinha absorvido a visão do mundo dos gangsters de incontáveis filmes americanos, que amava muito acima dos inferiores filmes de gangsters franceses, que tinham saturado o mercado francês na década de 50 (numa entrevista para a televisão, Melville desligou-se do filme de gangsters francês, lembrando que o único e verdadeiro que ele se lembrava era a obra-prima de 1955, "Rififi", que não foi por acaso que foi dirigido pelo expatriado americano Jules Dassin). O filme é infundido com um sentido perverso da violência, que é sugerido pela primeira vez no crime de abertura inesperado, e é solidificado quando a conversa casual de Silien com a namorada de Gilbert, Therese (Monique Hennessy), se transforma de repente e bruscamente, numa crueldade, lembrando-nos que cada interacção, não importa que seja benigna, pode ficar obscura. Trabalhando com o veterano diretor de fotografia Nicolas Hayer, Melville dá a "Le Doulos" uma sensação clássica do Noir que, como outros já apontaram, cria um universo fechado que é completamente artificial, mas também extremamente atraente. O uso de Melville de sombras escuras, ângulos inclinados, e movimentos de câmera fluidos impregnam ao filme o seu fatalismo crucial, e como personagens entrando e saíndo das sombras, somos lembrados da dualidade moral, e do facto de que nada pode ser confiável até à última cena do filme.
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