domingo, 30 de julho de 2017

12 Macacos (12 Monkeys) 1995

No ano de 2035, James Cole (Bruce Willis) aceita a missão de voltar ao passado para tentar decifrar um mistério envolvendo um vírus mortal que levou à morte da maior parte da humanidade. Tomado como louco, no passado, ele tenta provar a sua sanidade a uma médica (Madeleine Stowe), a sua única esperança de mudar o futuro.
Inspirado pela curta metragem que vimos no início deste ciclo, "La Jetée", de Chris Marker, o realizador Terry Gilliam continua a sua examinação do real vs surreal neste já clássico da ficção científica. Num estilo que já era muito próprio de Gilliam, o filme salta pelo tempo à sua vontade, criando com sucesso os seus vários mundos (cada qual com os seus próprios graus de sombras). 
Um dos maiores sucessos comerciais de Terry Gilliam, "Twelve Monkeys" contém a mesma fórmula de realismo mágico, paranoia, e visuais espectaculares que animaram todo o seu trabalho, embora de um forma mais discreta. Há aqui muitos paralelos com o seu filme anterior "Brazil", de 1985, por vezes dando a impressão que é um clone, cirurgicamente alterado para o mainstream. Para além da incerteza do que é real, há a confusão de um inocente com um criminoso, o amigo traiçoeiro, e aquele favorito obscurecimento contra-racional de Gilliam, o destino romântico revelado pelos sonhos.
Foi um dos filmes que revelou Brad Pitt, garantindo-lhe uma nomeação para o Óscar de Melhor Actor Secundário, no ano em que ele também entrou em "Sete Pecados Mortais", de David Fincher.

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sábado, 29 de julho de 2017

Ghost in the Shell: Cidade Assombrada (Kôkaku Kidôtai) 1995

Passado no ano de 2029, onde a existência humana está interligada com a tecnologia e o mundo se tornou numa grande rede, o hacking é o crime do momento. Section 9 é a agência designada para reprimir os hackers, que está ocupada a lutar contra o super-hacker do mundo, The Puppet Master. Para combater a tecnologia, usam a tecnologia, com uma força policial composta por cyborgs e humanos aumentados por partes cibernéticas para ajudá-los nas suas habilidades de investigação e combate contra criminosos que estão a usar a mesma tecnologia para com os seus dispositivos.
O nosso protagonista na Section 9 é um cyborg chamado The Major, Motoko Kusanagi, que descobre que o famoso Puppet Master é assim chamado por causa da sua habilidade em controlar as pessoas com a tecnologia implantada dentro delas, bem como a capacidade de implantar e mudar as suas memórias. A única coisa que separa a humanidade destas réplicas são os "ghosts", ou seja, a consciência ou alma que reside na humanidade.
"Ghost in the Shell" respira a nostalgia de experiências complexas de ficção cientifica, como "The Matrix". Se estiver a ser visionado pela primeira vez, é natural que o espectador não esteja em sintonia com tudo o que o filme tem para oferecer. Tal como nos outros filmes do cyberpunk, a acção é passada num futuro próximo, onde a Terra é dominada pela tecnologia, os computadores comandam tudo o que nos pode levar a algum lugar, e os cyborgs andam misturados com os humanos. Este é o ambiente para um filme de Cyberpunk perfeito, e "Ghost in the Shell" é, sem dúvida, um dos melhores. A complexidade deste filme de anime é enorme. Nada é o que parece. Quando pensamos que temos descoberto o Puppet Master, logo percebemos o quanto estamos enganados.Quanto mais mergulhamos na história, mais assustadoras as coisas se tornam. 
Realizado por Mamoru Oshii, tal como "Akira", teve grande influência sobre os filme de anime posteriores, e também sobre muitos filmes de origem cyberpunk, como "The Matrix" (1999).

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quinta-feira, 27 de julho de 2017

Até ao Fim do Mundo (Bis ans Ende der Welt) 1991

Num futuro próximo, em 1999, assaltantes de bancos fazem amizade com Claire (Dommartin) e pedem a sua ajuda para levantar uma quantia em dinheiro em Paris. No caminho ela cruza com Sam Farber (William Hurt), um fugitivo da CIA. Sam alega que as acusações contra ele são falsas e os policias querem apoderar-se de um aparelho que o seu pai inventou na tentativa de encontrar a cura para a cegueira da sua mulher.
 Com a máquina em questão, é possível captar as imagens do cérebro e gravar sonhos e visão para reproduzir as imagens em outros cérebros. Agora a fugir dos ladrões e da CIA, o casal passa por vários países e chega à Austrália, onde está o pai de Sam, com a esperança de recuperar as gravações que fez para sua mãe cega. A criação e a operação de tal máquina contrastam com a deterioração da situação do mundo, quando a existência da humanidade é ameaçada por um satélite nuclear que cai na direção a Terra. Uma odisseia para a era moderna que, assim como a Odisseia de Homero, procura restaurar a luz, numa reconciliação espiritual entre um pai obcecado e o seu filho abandonado. 
Wim Wenders cria uma épica meditação visual ressonantemente lírica sobre a ligação, comunicação, sobre as imagens e o significado da visão humana em "Until the End of the World". Desdobrado em três partes, interligadas por uma trilogia narrativa abrangente, o filme reflete a intertextualidade das imagens no processo criativo, desde a invocação de observações e experiências pessoais de Eugene, até aos rascunhos das suas novelas de ficção ao próprio subconsciente do realizador. É um orgulho deste filme ter sido filmado em quase todos os continentes, apenas África, América do Sul e a Antártica ficaram de fora, embora Wim Wenders bem tivesse tentado. A perseguição ao longo de todo o mundo tem um clima alegre e cativante, mantendo os seus segredos ao longo do caminho. 
Wenders foi obrigado a lançar uma primeira versão, bastante incompleta, com um pouco mais de duas horas e meia, que foi bastante mal recebida. Mas o realizador continuou a editar o filme, até que chegou a uma versão com mais de cinco horas, lançada em 2010, essa sim uma obra prima, sendo essa a que podem encontrar nos links em baixo. Lisboa foi uma das várias cidades por onde passam os nossos heróis.

Parte 1
Parte 2
Parte 3
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terça-feira, 25 de julho de 2017

Tetsuo - O Homem de Aço (Tetsuo) 1989

Tetsuo mostra a intersecção do homem e uma tecnologia pós-industrial acompanhada por um espectáculo por parte da banda-sonora e efeitos especiais. Realizado a preto e branco, o que ainda mais acentua o lado obscuro e alucinatório de toda a narrativa, a história começa com um punk a ser atropelado por um motorista que se põe em fuga. Gravemente ferido, o jovem punk reconstrói o seu corpo mutilado com pedaços de metal, tornando-se um bizarro robopunk. A partir daí o contágio metálico só tende a aumentar...
Shinya Tsukamoto era ainda um novato com 29 anos de idade, quando teve a ideia para a sua terceira obra, uma história de terror surreal onde um homem percebe que se está a transformar numa máquina. Com um orçamento muito reduzido, Tsukamoto fez praticamente tudo no filme, desde a produção, argumento, montagem, incluindo algumas sequências em stop motion, para a criação do homem de ferro. O resultado seria um clássico de culto do movimento cyberpunk, que nos levava numa viagem pelo mundo da fantasia, bem como ao lado mais sujo da sociedade japonesa. 
Tal como o seu irmão de sangue David Lynch, Tsukamoto manteve o seu rumo artístico, e recusou-se a fazer filmes mais convencionais, ou comercialmente viáveis. Quando Lynch tentou o mercado mais mainstream com obras como "The Elephant Man" ou "Dune", os resultados ainda foram diferentes de todos os outros, e o mesmo aconteceu com Tsukamoto, em filmes como "Hiruko, the Goblin" ou "Sôseiji". "Tetsuo" não era o primeiro filme do realizador, mas os dois primeiros, uma curta de 1986, "Futsu saizu no kaijin" (A Phantom of Regular Size) e uma média metragem de 1987 "Denchu Kozo no boken" (The Adventures Of Electric Rod Boy) foram filmados com uma câmara de  8 milímetros, e foram vistos por uma audiência muito reduzida". "Tetsuo" foi o primeiro filme a ser pensado para um público cinematográfico, e foi o que colocou o realizador no mapa do cinema de culto. 
 Legendas em inglês, embora o filme tenha muito poucos diálogos.

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domingo, 23 de julho de 2017

Akira (Akira) 1988

"A obra-prima animada de Katsuhiro Ôtomo é o pináculo da ficção científica apocalíptica japonesa. O argumento é enganadoramente simples: no futuro caótico de neo-Tóquio (assim chamado por substituir o Tóquio original, destruído por um cataclismo misterioso no fim do século XX), Kaneda, um membro adolescente de um gang de motards, descobre que o seu antigo melhor amigo Tetsuo se transformou num telepata homicida com a vontade e poder de matar centenas de pessoas. Relutantemente Kaneda junta-se a um grupo de terroristas anti-governamentais à procura do misterioso Akira, um telepata ainda mais poderoso que Tetsuo.
O génio de Ôtomo consiste em relacionar o apocalipse com a raiva dos adolescentes desiludidos. No fim de contas, para um adolescente, cada emoção é apocalíptica. Portanto imagine-se que um adolescente tem poderes extra-sensoriais que aumentam exponencialmente as suas emoções, e imagine-se que esse adolescente era um dos mais revoltados e zangados de todos. Pense-se nisso e depois nas maiores cenas de devastação imagináveis, e eis "Akira". A energia de "Akira" como filme de acção é mais poderosa que a adrenalina de uma corrida a 250 km por hora. A obra fornece uma oportunidade para uma exploração séria das ideias e metáforas que assolam a psique japonesa, nomeadamente o colapso social, o mau-estar geral, e a perpétua ambivalência em relação ao poder militar. Não é uma coincidência que as principais forças da oposição na história sejam motards adolescentes, marginais aspirantes a revolucionários, e as forças armadas.
Acima de tudo, a história de Akira é alimentada pelo medo da sociedade em relação à sua juventude - selvagem, incontrolável, caótica. Tetsuo é um adolescente chateado até ao limite, mas com suficiente poder para provocar dúzias de mortes, e há uma razão para tanto o governo como os militares temerem o enigmático Akira, para sempre preso numa perpétua meninice. Estamos perante uma adolescência que causa destruição numa escala épica - trazendo de volta memórias das bombas lançadas sobre o Japão na II Guerra Mundial e os persistentes medos colectivos de aniquilação. A fascinação da cultura pop japonesa com o Apocalipse vai além da mera admiração, tornando-se frequentemente uma exaltação, o que não será muito saudável, mas dá azo, sem dúvida alguma, a excelentes histórias." 
* Texto de Adisakdi Tantimehd, "1001 Filmes Para Ver Antes de Morrer".

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sábado, 22 de julho de 2017

Jogos de Guerra (Wargames) 1983

Um jovem especialista em computadores liga-se acidentalmente a um super-computador secreto que tem o controlo de todo o arsenal nuclear dos Estados Unidos. Desafia-o para um jogo entre a América e a Rússia, e inocentemente começa a contagem decrescente para a Terceira Guerra Mundial. Será que ele consegue convencer o computador que apenas queria fazer um jogo e não começar uma guerra verdadeira?
Embora "Jogos de Guerra" seja considerado principalmente uma aventura de ficção cientifica juvenil, na altura do seu lançamento foi levado muito a sério, graças ao medo predominante da guerra nuclear, adicionado ao facto de na altura a maioria das pessoas não saberem como os modems e os computadores funcionavam. A ponderação de algumas questões muito reais levou o filme a ser nomeado para três Óscares, incluindo o de melhor argumento, para Lawrence Lasker e Walter F. Parks, que alguns anos mais tarde revisitariam o tema "hacker", no filme "Sneakers" de Phil Alden Robinson. 
Alguns aspectos estão reconhecidamente datados, mas "Wargames" nos dias correntes ainda consegue ser um thriller fascinante e inteligente, com interpretações fantásticas de um elenco muito capacitado. Matthew Broderick faz um herói relutante perfeito, parecendo igual a qualquer um dos nossos vizinhos, o que favorece a opinião de que esta calamidade poderia acontecer um qualquer altura e qualquer canto do mundo. 
Para apreciar "WarGames" adequadamente têm de ser ignorados alguns buracos no argumento, saltos de lógica e algumas imprecisões. John Badham, um dos realizadores mais prolíficos dos anos oitenta, está atrás das câmaras.

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sexta-feira, 21 de julho de 2017

Experiência Alucinante (Videodrome) 1983

"Um filme que inaugura novos terrenos no movimento independente / comercial de Hollywood, nos anos 80.  A história de Cronenberg sobre as transformações horríveis criadas pela exposição à violência televisiva tematiza de modo inteligente os próprios problemas do realizador com os censores, distribuidores e grupos feministas, devido à sua exploração de imagens sexuais violentas nas suas obras anteriores. Max Renn (James Woods) é um operador de canal cabo, cuja cínica comercialização de sexo e violência se volta contra ele, quando o seu abdómen subitamente desenvolve uma abertura em forma de vagina na qual, entre outros objectos, podem ser inseridas cassetes audio. O filme, no qual fantasias sadomasoquistas e a mudança de sexo têm funções-chave, termina tragicamente com a auto-destruição de Max.
Em vários aspectos a encarnação formal mais ambiciosa dos temas característicos de Cronenberg, "Videodrome" começa como um thriller comercial bastante convencional, apenas para se transformar a meio numa fantasia subjectiva do tipo mais escandaloso e inusitado. Visualmente rico, "Videodrome" é também provocador a nível intelectual pela sua inquietante meditação sobre a perversidade polimórfica e interpenetração entre os domínios públicos e subjectivos da experiência. Cronenberg foi elogiado e condenado pelo seu tratamento flúido dos géneros sexuais (um sequência no final do filme em que duas mulheres adquirem pénis numa espécie de reposta à "vaginação" de Max foi cortada por ser muito pertubadora para o público comum). Mas mesmo na sua forma "censurada", "Videodrome" permanece como um dos mais estranos filmes de Hollywood, demasiado chocante e idissioncrático para ser apenas um falhanço comercial. "  * Texto de R. Barton Palmer

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quinta-feira, 20 de julho de 2017

Kamikaze ’89 (Kamikaze 1989) 1982

Num futuro próximo onde "a combinação" controla a televisão e as notícias, uma ameaça de bomba traz o super polícia Jansen para a sede desta coligação. Nada acontece, mas o seu chefe dá-lhe quatro dias para resolver esta questão. Coisas estranhas começam a acontecer: no primeiro dia há um assassinato na "combinação", vagas referências aos inimigos desta associação, e o sobrinho do chefe confessa ter feito a ameaça de bomba, embora não tenha feito. Jansen continua focado, entrevistando funcionários que receberam prémios especiais. Ele estará atrás de algo grande, ou a ameaça de bomba foi apenas uma brincadeira? O que é que estará escondido no 31º piso da sede desta estranha associação?
"Kamikaze ’89" trás-nos uma visão distópica de 1989, filmada em 1982, envolvendo fatos em pele de leopardo, assassínios, conspirações corporativas, estrelas porno, e uma fantástica banda sonora electrónica dos Tangerine Dream. O filme é dirigido por Wolf Gremm, um relizador alemão mais conhecido pelo seu trabalho na televisão, mas, teve muito mediatismo por ter sido a última aparição no cinema de Rainer Werner Fassbinder, que morreu apenas um mês antes da estreia nos cinemas. É também uma lembrança de como o futuro parecia ser no inicio dos anos oitenta, muito antes de sabermos como seria. 
"Kamikaze ’89" incorpora muitos dos truques visuais do proto-cyber-punk dos anos 80, mas de uma forma geral era um filme muito estranho e maravilhoso, e os fãs de Fassbinder estarão cientes de que ele dirigiu um filme de mistério futurista para a TV alemã, "World on a Wire" (1973) também ele passado num elegante edifício institucional. Embora não tenha dirigido este filme a sua presença domina com o estilo da sua aura. Trouxe consigo alguns dos actores que o costumavam acompanhar (Günther Kaufmann, Brigitte Mira, e também o próprio realizador, Wolf Gremm que vinha de "Querelle"), além do seu fotógrafo, Xaver Schwarzenberger e Juliane Lorenz, fazendo deste trabalho praticamente um filme seu. Franco Nero, que já havia trabalhado com ele em "Querelle", aparece aqui de novo.
Legendas em Inglês

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terça-feira, 18 de julho de 2017

Fahrenheit 451 - Grau de Destruição (Fahrenheit 451) 1966

Num futuro próximo os livros foram proibidos. Com cada casa equipada com ecrãs de televisão, não há necessidade para comunicação escrita. Embora os livros tenham sido proibidos, ainda há alguns desviados da sociedade que insistem em tê-los. É por isto que esquadras de implacáveis bombeiros patrulham a cidade, procurando livros para os queimarem sem piedade. Um desses bombeiros chama-se Montag, que adora o seu trabalho, e vive feliz com a sua esposa, Linda. Um dia ele espera vir a ser promovido para poder ter outro ecrã na sua casa. Um encontro fortuito com outra mulher vai mudar a sua vida para sempre, e a sua opinião em relação aos livros...
De todos os filmes que François Truffaut fez, "Fahrenheit 451" é o menos típico da sua carreira. A primeira de duas incursões no território da ficção científica, sendo a outra uma aparição como actor convidado em "Encontros Imediatos de Terceiro Grau", de Steven Spielberg. Os fãs mais sérios de Truffaut tendem a esquecer este filme, em parte porque é um filme de género, em parte porque é falado em inglês, e em parte porque as suas falhas foram muito publicitadas. A sua produção foi a mais prolongada de toda a carreira do realizador, e foi um fracasso na estreia, tanto de crítica como de público, e um passo atrás para o mais proeminente realizador da Nouvelle Vague. É um filme que é fácil de se criticar, mas teve as suas razões para ser o primeiro filme de Truffaut a cores.
A obsessão de Truffaut em fazer este filme data de 1960, quando o produtor Raoul Lévy lhe emprestou um exemplar do famoso livro de Ray Bradbury com o mesmo título. Apesar de Truffaut não ter grande interesse pela ficção cientifica, ficou fascinado e perturbado pela premissa central do livro, a ideia de que em algum ponto do futuro a escrita seria fora da lei, e os livros seriam queimados, como parte de uma estratégica maligna de obliterar a individualidade do ser humano. Para Truffaut, um rato das bibliotecas, era uma visão do Inferno, e viu ali imediatamente sumo para fazer uma metáfora muito interessante, evocando fortes memórias da ocupação Nazi e do Holocausto. Durante uma digressão em 1962 para promover "Jules e Jim" na América, Truffaut arranjou um tempo para se encontrar com Ray Bradbury em Nova Iorque. Bradbury tinha pouco interesse em adaptar este livro, e tentou, em vez disso, persuadi-lo a fazer uma versão das suas "Crónicas Marcianas". Truffaut declinou, e Bradbury concordou em vender-lhe os direitos de "Fahrenheit 451" sem ajudar no argumento. 
Quando viu o filme, o escritor escreveu uma carta a Truffaut a agradecer pelo filme, por ter feito uma adaptação tão fiel ao seu livro. Apesar dos resultados a nível de crítica e público não terem sido nada favoráveis, foi um filme que foi ganhando uma respeitável reputação com o passar dos anos. Hoje, é considerado um clássico menor da ficção científica, e, paradoxalmente, é o filme mais conhecido do realizador. 

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segunda-feira, 17 de julho de 2017

The Creation of the Humanoids (The Creation of the Humanoids) 1962

Depois de intensas guerras nucleares a humanidade vive restrita num mundo cheio de radiações e baixa taxa de natalidade. O auxílio das máquinas é essencial, mas o desenvolvimento de humanoides robots cada vez mais "humanos" causa conflitos entre parte da sociedade. Os andróides vão revoltar-se contra os seus mestres, e vão à guerra contra o resto da humanidade.
Filme independente da Genie Productions, é surpreendentemente profundo para um filme de baixo orçamento. Tem todas as marcas habituais num filme de série B: cenários simples, interpretações marginais, filmagens de stock, mas tem um argumento muito acima da média, muito mais pensativo do que os outros filmes de ficção cientifica da época. Sem grandes efeitos especiais, é passado num futuro pós-nuclear da Terra, e conta-nos uma história sobre a dependência da humanidade, e o medo dos robots que criaram.
"The Creation of the Humanoids" tem algumas boas idéias de ficção cientifica, que funcionam como uma parábola para o crescente movimento dos direitos civis dos Estados Unidos, bem como uma observação ainda mais ampla da tensão entre necessidade de bloqueio de segurança psicológica que se manifesta como sentimento reacionário na face das rápidas mudanças cientificas, e a sua viagem para um clímax que  contempla uma nova fronteira para a consciência e a humanidade.
O argumentista Jay Stills pediu emprestados elementos de duas histórias de robots anteriores. O nome veio do livro escrito em 1947 por Jack Williamson: "Humanoids". Da história de Williamson, Stills foi buscar uma população de servos robots mecânicos programados para fazer "o bem" para a humanidade. Da peça de Kavel Capek "R.U.R. (Rossum's Universal Robots)"  ele foi buscar alguns elementos básicos da história, incluindo um robot para criar uma nova criação.

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sábado, 15 de julho de 2017

Cyberpunk

Cyberpunk é um subgénero da ficção cientifica altamente estilizado que combina tecnologia avançada e ciência, junto com uma sociedade tipicamente desintegrada no meio de uma ruptura radical de uma mudança na ordem social. Normalmente é passada num momento do futuro não muito distante, principalmente distópio e pós-industrial e foca-se nos aspectos indústrias “high tech, low life”.
O Cyberpunk pede emprestado muitas técnicas e características do film noir e do filme de detectives duros, e muitas vezes toma uma perspectiva pós-modernistas sobre as falhas de uma sociedade tecnológica. A visão do cyberpunk de um futuro distorcido e distópico contrasta com as visões geralmente utópicas do futuro popular nas décadas de 40 e 50.
O Cyberpunk começou como um movimento literário mas tornou-se um organismo da subcultura. A origem do termo em si vem do livro "Cyberpunk" de Bruce Bethke, lançado em 1983. Desde aí há uma série de autores que geralmente são aceites para fazer parte do corpo do Cyberpunk, entre os quais William Gibson (Gibson é considerado o fundador do Cyberpunk), Bruce Sterling, Pat Cadigan, Rudy Rucker, John Shirley e Lewis Shiner. Também há uma série de livros precursores com temas e imagens fortes que mais tarde foram associados ao género Cyberpunk: "The Demolished Man" (1953) e "The Stars My Destination" (1956) de Alfred Bester, "Do Androids Dream of Electric Sheep?" (1968) de Phillip K. Dick, "Dr. Adder" (Escrito em 1972, mas publicado em1984) de K.W. Jeter, "Gravity’s Rainbow" (1973) de Thomas Pynchon, "The Shockwave Rider" (1975) de John Brunner, e "True Names" (1981) de Vernor Vinge.
Este ciclo será longo, terá cerca de um mês, e mais de 20 filmes. Pretende visitar não apenas os filmes mas também alguns livros que marcaram este género, e que serão publicados em PDF. Iremos deixar de fora alguns filmes que não precisarão de muita exposição, como "The Matrix", mas outros já bem conhecidos serão inevitáveis, mas esta será, sobretudo, uma viagem pelo underground deste popular sub-género.
O mais importante filme do Cyberpunk é "Blade Runner", e já se encontra disponível no blog, aqui.
A nossa viagem pelos filmes do Cyberpunk vão começar um pouco atrás, aos anos 60, e vai acompanhar a evolução deste subgénero até aos dias actuais. Espero que gostem do ciclo. Até amanhã.


quinta-feira, 13 de julho de 2017

Mel (Bal) 2010

Yusuf (Bora Altas) é uma criança que mora com os pais numa isolada área montanhosa. Para ele, a região de floresta torna-se um verdadeiro mistério e aventura a partir do momento em que ele acompanha o pai em um dia de trabalho. O filme acompanha sua incrível jornada pela busca de algum sentido a sua vida.
"Semih Kaplanoglu demonstra uma capacidade imaculada para se colocar entre o olhar dos adultos e o do miúdo protagonista, neste pertinente retrato da Turquia profunda.
 Urso de Ouro no Festival de Berlim, "Mel" é o terceiro tomo da trilogia que fez de Semih Kaplanoglu o cineasta turco contemporâneo mais conhecido internacionalmente a seguir a Nuri Bilge Ceylan. Os nomes dos outros dois filmes da trilogia são tão nutritivos como o deste: "Ovo" (que ganhou um prémio na primeira edição do Estoril Film Festival) e "Leite".
Mas é com o "Mel" que ele chega às salas portuguesas, e se ao espectador recém-chegado ficará a escapar o desenho do conjunto dos três filmes, conhecê-lo não é indispensável à fruição deste filme. De certo modo, "Mel", no seu conflito essencial, ilumina, ou pelo menos resume, o que está em causa na trilogia: um olhar sobre a província turca, captado na bifurcação entre um modo de vida tradicional (as coisas que a terra dá, ainda que por intermédio dos animais: os ovos, o leite, o mel) e a perspectiva de uma outra coisa, muito mais difusa, a que se podia chamar a "modernidade". De uma maneira que o filme não resolve (e a não-resolução é o seu ponto), o miúdo protagonista simboliza esse impasse, no à-vontade da sua relação com a natureza (as abelhas do pai, a floresta) e na falta de à-vontade com as coisas da escola (a dificuldade em aprender a ler como uma "resistência", digamos, atávica).Imaginamos que este conflito, que o filme expõe sem retórica nenhuma e numa subtileza a toda a prova, é pertinente enquanto retrato da profunda Turquia contemporânea. O que serve, em todo o caso, como medida da inteligência de "Mel". Mas não é forçosamente aquilo que mais o distingue. Antes uma capacidade, imaculada, de se colocar entre o olhar dos adultos e o olhar do miúdo protagonista, para der a ver um mundo que é sempre, ao mesmo tempo, muito misterioso e muito familiar - características que marcam, em especial, toda a relação com a natureza (a terra e as árvores, mas também o céu e as nuvens), com os seus silêncios mas sobretudo com os seus ruídos (os seres humanos de "Mel" falam pouco, mas em compensação a natureza palra que se farta). E Kaplanoglu confirma-se como um adepto do plano-sequência expectante e desafectado: a cena em que dá o badagaio ao pai do miúdo é extraordinária."
* Por Luis Miguel Oliveira, daqui

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quarta-feira, 12 de julho de 2017

My Only Sunshine (Hayat Var) 2008

Hayat tem 14 anos, já não é uma criança mas ainda não é uma mulher. Vive com o pai e o avô, que sofre de asma, em Istambul. O pai trabalha como pescador mas faz a maioria do seu dinheiro em transacções desonestas. Fornece os grandes navios que esperam a passagem do estreito com álcool, mulheres e outras mercadorias. Ainda mais corrosiva do que a pobreza desta família são a insensiblidade e a indiferença castradora que os protagonistas expõem a si mesmos e acima de todos a Hayat.
Um drama sobre a entrada na idade adulta que interroga a identidade numa cidade geopoliticamente extraordinária como Istambul, que atravessa o passado e o futuro, o Ocidente e o Oriente, a tradição e a modernidade. Crescer nem sempre é fácil. Vivendo numa casa velha, rodeada de pobreza, e enfrentando bullying na escola, Hayat tem montes de problemas, todos agravados pelo baixo status das mulheres na sociedade turca tradicional. No papel central, Elit Iscan transmite uma confiança que desmente a sua idade. Ela não é dem
onstrativa mas silenciosamente resiliente interpretando a retirada comum ás crianças em tais circunstâncias. 
Quinto filme de Reha Erdem, de quem já tinhamos visto neste ciclo a sua obra de estreia "A Ay". Ganhou o Prémio do Júri "Tagesspiegel" no festival de Berlim.

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segunda-feira, 10 de julho de 2017

Outono (Sonbahar) 2008

Condenado à prisão, em 1997, como um estudante universitário de 22 anos, Yusuf é libertado por razões de saúde dez anos depois. Volta para a sua aldeia no leste da região do Mar Negro, onde é recebido apenas pela mãe doente e idosa. Acontece que o pai morreu quando ele estava na prisão e a irmã casou-se e mudou para a cidade. Os factores económicos fazem com que exclusivamente pessoas de idade morem nas aldeias das montanhas, e a única pessoa que vê é Mikail, um seu amigo de infância. Quando o outono lentamente cede lugar ao inverno, Yusuf vai com Mikail a uma taverna, onde conhece Eka, uma bela e jovem prostituta georgiana. Nem a época nem as circunstâncias são apropriadas para estas duas pessoas de mundos diferentes se apaixonarem. 
Um filme sobre a memória colectiva, e as cicatrizes irremediáveis da história política recente, gerações, ideais e tradições perdidas. A primeira longa metragem de Ozcan Alper é filmada em grande parte na linguagem Hemshin ou Hemshinli (descendentes dos arménios de Hemshin, que se converteram ao islão no século 17), através de vozes e canções da terra, e as marés, de marés calmas a ondulações turbulentas, enquanto o Outono se deixa envolver calmamente pelo Inverno. A cultura Hemshin é documentada com detalhes antropológicos. O cruzamento do filme com a literatura, particularmente com Chekhov, está relacionada com a influência dos autores russos em Alper, mas também vem da proximidade de Hopa, local onde se passa parte da acção, com a antiga União Soviética (a actual Geórgia fica a 18km). 
Ganhou uma série de prémios por esse mundo fora.

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domingo, 9 de julho de 2017

Destino (Yazgi) 2001

Musa, um contador que trabalha com a alfândega, acredita no vazio e no absurdo da existência. Ele não luta para mudar a vida, deixa-se levar, juntamente com os acontecimentos porque acha que tudo segue para o mesmo fim. A morte da sua mãe não o afecta. Embora ele a ame, a sua morte não o deixa triste. E este facto vai ter consequências pesadas no seu futuro.
O primeiro filme da trilogia de Zeki Demirkubuz "Tales About Darkness" é vagamente baseado numa obra de Albert Camus de 1942, "L’Étranger", com a história a ser bastante alterada, embora a intertextualidade com Dostoyevsky seja um elemento comum em ambas as obras. A noção de liberdade e a consciência de liberdade com fontes de sofrimento que podem cessar o custo do sofrimento humano são parte integrante deste trabalho de Camus. 
Demirkubuz cria o seu filme dentro da realidade sócio-política da Turquia. Musa é o arquetipo do cidadão comum, apolitizado no rescaldo de várias intervenções militares. Vive entre a casa e o trabalho, sem questionar a razão que está por trás das coisas. Quando o seu vizinho lhe pede para escrever uma carta para atraír a namorada com o fim de lhe "ensinar uma lição" ele concorda em evitar o confronto sem reflectir sobre as consequências da acção sobre a mulher. Preso pelo crime de outra pessoa, Musa não se defende. Porquê lutar por uma injustiça quando não se tem confiança no sistema de justiça? A violência e a miséria tornam-se a rotina com a invasão do espaço privado pelos ecrãs de televisão. Enquanto Musa observa o ecrã da televisão sem emoções, a câmera de Demirkubuz vira-se para janela e os pobres a procurarem por comida no lixo aparecem como uma imagem borrada, que não é notada por Musa.
O filme é rodado num estilo minimalista, com muito poucos movimentos de câmera. Começa com Musa a abrir a porta do seu apartamento e a luz a acender-se, e termina com a luz a apagar-se. A porta é algo essencial nos filmes de Demirkubuz, assim como nos de Nuri Bilge Ceylan. Aparece como um objecto que faz conexão com o que está fora e o que está dentro. Pode proibir a rua, ou pode proibir a sala num sistema de tradições e proibições.

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sexta-feira, 7 de julho de 2017

Clouds of May (Mayis Sikintisi) 1999

O mês de maio numa pequena cidade parece ser mais quente e sombrio do que os anos anteriores. Ainda assim, todos parecem felizes, apesar das suas pequenas preocupações. No entanto, esta felicidade é um pouco perturbada pela chegada de Muzaffer, que quer fazer um filme na cidade onde passou a sua infância.
O segundo filme do que Nuri Bilge Ceylan considera uma tetralogia, e que inclui também "Kasaba " (1997), "Uzak" (2002) e "İklimler" (2006) que pode ser chamada de "retrato de um artista da província como um intelectual urbano". Filmado na mesma pequena cidade de Yenice que também fora usada em "Kasaba", onde Ceylan passou a sua infância, ressaltando os sentimentos de obrigação e culpa ao filmar com actores não profissionais em situações do quotidiano, principalmente se eles são membros da sua família. Muzaffer (Muzaffer Özdemir) é um realizador independente (o alter-ego de Ceylan) que trabalha em projectos comercialmente inviáveis, para o desânimo dos seus pais. O seu regresso a casa para usar a familia no seu projecto "Kasaba", e principalmente o seu comportamento egoísta pouco sincero, perturba a sua tranquilidade. O pai, que é representado pelo próprio pai do realizador, está prestes a perder a terra. O primo Saffet (Mehmet Emin Toprak) está a sufocar nesta atmosfera claustrofóbica tendo novamente falhado os exames de admissão à universidade. 
Uma série de marcas utilizadas por Kiarostami são aqui evidentes, incluindo um quadro da paisagem rural, um interesse não sentimental em crianças, e uma curiosidade discreta da forma como a realidade do filme é paralela e cruza com a vida comum. Não há grandes momentos, apenas eventos comuns do dia a dia que interessam apenas aos protagonistas. O formato "filme dentro do filme" procura capturar a essência da vida numa pequena cidade. Faz isso de uma forma tão gentil, perceptiva graças ás interpretações naturais dos membros do elenco não profissionais. 

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quinta-feira, 6 de julho de 2017

Inocência (Masumiyet) 1997

Entre as paredes em ruínas de hotéis degradados, bares sórdidos e cidades esquecidas, três párias, prisioneiros do seu amor, vivem uma roda-viva. Um deles é uma prostituta, o segundo o seu chulo/guarda-costas e outro um jovem ingénuo, recém saído da prisão, mas que está preso num círculo de fogo. A miséria das suas vidas só é mais intensa à medida em que se apegam a coisas que nunca tiveram. A sociedade tem voltado as costas para os três, Bekir, Ugur e Yusuf, mas eles continuam procurando o amor nos lugares mais improváveis.
Do título do filme à narrativa, o realizador
Zeki Demirkubuz, no seu filme revelação, questiona os valores morais de uma sociedade masculinizada, ressalvando a sua variabilidade. Ironicamente a "honra" da dona de casa oprimida é a a sua maldição, enquanto que o seu trabalho "sexual" é a sua libertação. O encontro de Yusuf com a família é crucial na sua transformação de um homem que mata pela honra da família a um homem disposto a se tornar proxeneta de uma prostituta e a recompor a família, se ela aceitar. Embora os julgamentos morais permaneçam constantes, ele adquiriu compaixão. 
Evocando a intensidade emocional de um filme de Ingmar Bergman com a combinação idiossincrática de humor discreto e melodrama, "Inocência" é elegante, incrivelmente complexo e um estudo minucioso de obsessões. Mas, para além da obsessão psicológica que define a interminável jornada de Bekir e Ugur para lugar nenhum, o enquadramento da sua relação através da sua perspectiva da inocência, primeiro através da criança muda de Ugur, e depois através do bem intencionado Yusuf, Demirkubuz apresenta um retrato intrigante, não só de uma personalidade flexível, mas também da hipocrisia inerente aos relacionamentos abusivos, onde a crueldade é racionalizada por uma sensação de vitimização indefesa.

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quarta-feira, 5 de julho de 2017

Somersault in a Coffin (Tabutta Rövasata) 1996

 Mahsun está desempregado. vive em Rumelihisari, um dos mais antigos e pitorescos bairros de Istambul, e tenta manter-se vivo com a ajuda dos pescadores locais. Mahsun adora carros, rouba-os de noite para de manhã os limpar e devolvê-los aos seus donos.
Um marco no início do Novo Cinema Turco. Derviş Zaim filmou a sua primeira obra em apenas 24 dias, no entanto, o projecto existia há 8 anos. O orçamento era mínimo, os actores, à excepção de dois, eram não profissionais. No entanto, o filme ganhou vários prémios, nacionais e internacionais, e o filme teve bons resultados nas bilheteiras. A sua originalidade reside na forma como alterna neo-realismo e fantasia. A história, os cenários, os diálogos, as interpetações, é tudo muito simples, e a música de fundo cria um grande ambiente com eficácia, com a sua abordagem minimalista a ser uma partida importante do cinema tradicional turco.
Tentar fazer um filme "no budget" não foi uma tarefa fácil, de acordo com  Derviş Zaim, que começou a pensar neste projecto underground quando ainda estudava em Londres. Ele queria contar a história de um vagabundo que antes conhecera, um ladrão que roubava e lavava carros para depois os devolver. Ahmet Uğurlu, um actor reconhecido oferecera-se para o papel principal. Tuncel Kurtiz, outro actor reconhecido internacionalmente aceitou ficar com um papel secundário, com grande parte do restante elenco a ser preenchido por pescadores ao longo do Bósforo. 
O título original do filme utiliza uma expressão futebolística, "rövaşat", que significa pontapé de bicicleta, que em inglês foi traduzido para "sommersault ", salto mortal. São duas coisas que não são prováveis em sitios apertados, e o filme tenta empurrar fronteiras. Mahsun e os outros à sua volta tentam trazer equilíbrio ás suas vidas - uma casa, um abrigo, alhguém para amar - em condições impossíveis, mas também rejeitar esse equilíbrio que os torna pessoas tão dramáticas. "Tabutta Rövaşata" apresenta uma maturidade incrível para um filme de estreia, e merece ser visto.

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terça-feira, 4 de julho de 2017

O Bandido (Eskiya) 1996

A épica aventura do lendário bandido Baran, depois da sua libertação da cadeia. Após ter ficado preso durante 35 anos não seria de estranhar que fosse encontras as coisas bem diferentes, porque o mundo mudou drasticamente. Ainda assim, Baran fica chocado quando descobre que a sua aldeia natal está agora debaixo de água, por causa da constução de uma barragem. Parte então para Istambul, para se vingar do seu ex-melhor amigo que o denunciou e ficou com a sua amante. Pelo caminho faz amizade com Cumali, um punk durão que simpatiza consigo. 
Desde o final da década de oitenta que o cinema turco tinha embarcado numa crise criativa e também financeira, com os seus filmes a terem poucas hipóteses de combater contra os ocidentais. "O Bandido", exibido no Féstroia em 1998, foi um dos poucos que conseguiu inverter essa tendência, sendo visto no seu país de origem por 2,5 milhões de espectadores, e conquistando prémios valiosos como o Bogey Award na Alemanha. e  o Golfinho de Ouro no Féstroia. A grande fatia da audiência era feminina, sobretudo donas de casa, que durante anos se tinham mantido afastadas do cinema. 
Algumas criticas da época mostravam uma tendência para classificar o filme, não como uma obra de ficção, mas como um espelho, que reflectia a vida dura vivida no país. Isto era sintomático no sentido que os países ocidentais queriam filmes realistas, que demonstrassem as dificuldades vividas pelos países orientais. Stephen Snitzer, que viveu alguns anos na Turquia, escreveu no New York Times que "The Bandit" causou um enorme escândalo na Turquia que intimidou um enorme número de políticos que trabalhavam naquele país. 
O realizador era Yavuz Turgul, que começou a sua carreira a escrever argumentos para Ertem Egilmez, que contribuíu para a formação do Yesilçam, o popular cinema dos anos 60 e 70, semelhante ao que se fazia em Hollywood. Já aqui vimos um trabalho de Turgul como argumentista, "Zügürt Aga", de Nesli Colgecen.

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domingo, 2 de julho de 2017

Criadores de Stop-Motion: Lotte Reiniger e a Arte das Silhuetas

Lotte Reiniger, pioneira no mundo do filme de animação, e um exemplo para as mulheres na indústria cinematográfica, nasceu em 1899, em Berlim. Os seus filmes hipnóticos, cuidadosamente elaborados a partir de pedaços de cartão e fio, animados à mão, influenciaram gerações de cineastas e artistas. Foi ela a autora da chamada primeira longa metragem de filmes de animação, "The Adventures of Prince Achmed" (1926). Os seus filmes, e os seus encantos são fenomenais, mas há contradições na história de Reiniger. Enquanto pensamos em Reiniger como uma artesã, o seu trabalho foi principalmente inspirado por tradições antiquadas de perfomances e histórias tradicionais. A sua história também é cautelosa, já que ela trabalhou em torno do que é ser uma mulher na indústria cinematográfica, o que não era muito fácil no tempo em que viveu.
O cinema era a paixão de Reiniger: quando criança ficou encantada com os filmes de Georges Méliès, e mais tarde com os filmes expressionistas de  Paul Wegener. Era também uma entusiasta pela arte chinesa de marionetas das sombras, criando os seus próprios espectros de silhuetas para um público caseiro. O seu primeiro passo propriamente dito no campo da animação foi com "The Pied Piper of Hamelin" (1918). Wegener descobriu-a, e como não conseguia controlar ratazanas (mesmo cobaias) num cenário, contratou-a para animar roedores de madeira, estilo stop-motion. O resultado foi triunfante, e daqui para a frente já podia assegurar a sua própria assinatura.
Juntou-se a um estúdio experimental de animação, o Berliner Institut für Kulturforschung, onde conheceu vários vanguardistas, como Bertolt Brecht e o seu futuro marido, Carl Koch. Foi aqui que foi dando asas à sua imaginação, e trabalhando como realizadora, e sobretudo, artistas. Hoje iremos conhecer vários dos seus filmes.

As Aventuras do Príncipe Achmed (Die Abenteuer des Prinzen Achme) 1926
Com base em histórias das "Mil e Uma Noites". Um feiticeiro malvado engana o príncipe Achmed para montar um cavalo mágico, mas heroicamente ele consegue subjugar o cavalo mágico que usa para voar para muitas aventuras. Enquanto viaja apaixona-se pela bela princesa Peri Banu, e deve derrotar um exército de demónios para conquistar o seu coração. O filme inteiro é animado usando a técnica da silhueta, que emprega papelão móvel e recortes de metal colocados na frente de folhas de vidro iluminadas. Reiniger tinha apenas 27 anos quando completou este filme, que é considerado a primeira longa metragem de animação da história do cinema.

Papageno (Papageno) 1935
"Papageno" é uma curta metragem de 10 minutos, e mais um belo exemplo da extraordinária arte de Lotte Reiniger, baseado na "Flauta Mágica" de Wolfgang Amadeus Mozart. Conta a história de uma das personagens dessa obra, Papageno, um ser metade homem, metade pássaro. Nesta curta ele tem o objectivo de encontrar o seu par, o que não será fácil. Uma
fantástica mistura de beleza e humor, por vezes humor negro, e não esquecer a música de Mozart, e da "Flauta Mágica".
  

Die goldene Gans (Die goldene Gans) 1944
Baseado no conto de fadas dos irmãos Grimm, Dummling vai para a floresta cortar madeira para a família. Onde os seus dois irmãos falharam uma verdadeira aventura está a começar para Dummling. Por ter sido feito durante a Segunda Guerra Mundial este filme nunca foi terminado, ainda assim conta uma história completa. Por esta altura Reiniger já tinha mais de 30 obras realizadas, entre curtas e longas metragens, mas por causa da guerra a sua carreira seria interrompida, para retomar 5 anos depois.
  

Aladino e a Lâmpada Mágica (Aladdin and the Magic Lam) 1954
Um dos primeiros filmes que Lotte Reiniger fez para Louis Hagen e a sua produtora baseada em Londres, a Primrose Productions, foi feito com a intenção de ser exibido na televisão americana, daí o sotaque americano do narrador. Tal como The Magic Horse (1954), também da mesma produtora, desenvolve temas, e recicla algumas cenas de As Aventuras do Príncipe Achmed, onde a trama de Aladino formava uma sub-trama menor. A técnica das silhuetas é muito bem adaptada a este mundo das Mil e Uma Noites, tornando esta curta de 14 minutos uma das obras mais interessantes da realizadora.

sábado, 1 de julho de 2017

Oh, Moon! (A Ay) 1989

Yekta, uma jovem de 11 anos, nasceu e vive numa casa misteriosa, uma espécie de castelo, numa margem do Bósforo, com a sua gaivota, uma tia solteira, Nukhet Seza, e o avô Sirri, paralisado e acamado depois da morte do seu filho e da sua noiva. O quarto da sua mãe é onde Yekta procura abrigo, sonha acordada e esconde os seus segredos.  Tudo o que ela sabe sobre a sua mãe é que ela partiu um dia num pequeno barco no Bósforo e nunca mais regressara. Uma noite, Yetka vê a sua mãe passar num pequeno barco, mas ninguém acredita nela. A tia mais nova, uma professora de língua inglesa que vive na ilha de Burgaz quer que ela se inscreva na sua escola, para assim afastá-la do anseio pela sua mãe a afastá-la daquela casa estranha e assombrada. Mas ela não está disposta a partir...
Reha Erdem, realizador, argumentista, montador, um dos representantes mais originais do cinema turco que conseguiu os maiores elogios neste novo milénio, estreou-se aqui, com este "A Ay", aos 28 anos, e construiu o seu trabalho num diálogo contínuo entre a realidade e a imaginação, pedindo directamente ao público que procura uma nova perspectiva para a vida. O tema e o género variam consideravelmente nos seus filmes, mas a dificuldade de preservar a humanidade de alguém num mundo em rápida mudança e a impossibilidade de comunicação onde o amor deixou de existir são os principais motivos da sua obra. Personagens condenados a estados intermediários e espaços mínimos sofrem, e as crianças no limiar da idade adulta sofrem ainda mais. "A Ay" era o primeiro filme de Erdem, e marcaria o tom para toda a sua obra.

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Motherland Hotel (Anayurt Oteli) 1987

O solitário proprietário de um pequeno hotel numa cidade turca da província desenvolve uma paixão por uma hóspede, e a sua rotina do dia a dia começa a desmoronar-se. 
Um dos grandes clássicos do cinema turco dos anos oitenta, é, em primeiro lugar, um "character study". Baseado no livro homónimo de Yusuf Atılgan, escrito em 1973, no rescaldo do golpe de estado de 12 de Março de 1971 (embora a acção no livro se passe em 1963), tem como primeiro plano a narrativa de um gerente de hotel numa pequena cidade da província, cuja obsessão por uma mulher misteriosa o leva por caminhos sinuosos. O ambiente da sociedade desmoralizada pós-traumática dos anos 80, o período em que feito o filme, é referenciado através de uma cidade provinciana sonolenta onde tudo chega com atraso: as notícias, a música, a moda, a política, e até mesmo o comboio da capital, que trás esta misteriosa passageira. São prevalecentes as desigualdades, a exploração, opressão social e política, a desconfiança e o fanatismo. 
O filme é uma das melhores adaptações literárias do cinema turco, no entanto, ao contrário do livro, que se debruçava sobre a interpretação explícita dos desejos sexuais, o filme de Omer Kavur concentra-se nas emoções. O passado, descrito no livro, é referenciado por apenas duas vezes no filme: através de Zebercet como narrador, e através da conversa no parque com um homem idoso. 
A alienação do indivíduo numa sociedade moderna e a passagem do tempo, seriam temas que Kavur desenvolveria mais profundamente em filmes posteriores, e estão no centro desta narrativa. Combinando com o seu fascínio por sonhos, símbolos e o significado oculto dos objectos, "Motherland Hotel" é uma das obras primas do cinema turco. 
Concorreu no festival de Veneza de 1987, onde ganhou o prémio Fipresci. 

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