domingo, 24 de outubro de 2021

A Raposa (The Fox) 1967

"The Fox", a adaptação de uma história curta do mesmo nome, escrita por D. H. Lawrence, contém apenas quatro personagens principais. A história gira à volta de duas mulheres, Jill Banford e Ellen March, que se conheceram na universidade, e que vivem juntas numa quinta isolada no Canadá. Jill assume o papel da mulher tradicional, a tomar conta da casa e a cozinhar, enquanto Ellen assume os tradicionais deveres masculinos, de fazer os trabalhos na quinta e servir como protectora de Jill. Cada uma veste-se para acomodar os seus deveres, tornando Jill a mais feminina das duas. O filme pega na criação de Lawrence sobre uma inconsciente atracção lésbica, e torna-o numa relação lésbica intensa e obsessiva, o público vê as duas mulheres na cama a beijarem-se e a abraçarem-se apaixonadamente.
Esta harmonia é ameaçada por uma raposa que ameaça o galinheiro. Ellen tenta matar o animal várias vezes sem sucesso, mas o animal é na realidade uma metáfora para o que está a chegar. Irá chegar um homem que irá atrapalhar as suas vidas, o neto do falecido proprietário da quinta onde as duas jovens vivem, e que decide visitar o lugar de onde tem muitas memórias de infância.
O filme não foi selecionado para passar em muitos cinemas, por causa do selo "Mature Audiences Only", que foi dado pela MPAA. Em 1968, em Jackson, Mississippi, dois polícias acompanhados por um advogado, compraram bilhetes para ver uma das sessões do filme. Imediatamente após a exibição, sem qualquer mandato, apreenderam o filme e prenderam os operadores do cinema, acusando-os de ter violado uma leita estatal do Mississippi, que fazia da exibição do filme um espectáculo "obsceno", sujeito a punição. Os operadores do teatro foram logo julgados e condenados sem poderem apresentar contestação, os seus advogados foram acusados das mesmas violações, e não foi um caso fácil de resolver. Segundo um juiz, o filme era sórdido e bizarro, e continha cenas repulsivas e ofensivas, e que excedia todos os limites de propriedade e decência. A decisão não viria a ser revertida, revelando a profundidade do medo que tópicos lesbianos motivaram na década de 60.


terça-feira, 19 de outubro de 2021

Viva Maria! (Viva Maria!) 1965

"Viva Maria!" é um western cómico que relata as aventuras de um circo itinerante e uma troupe de música no fictício país de San Miguel. O filme apresenta inúmeras sequências cómicas, incluindo granadas de mão lançadas por um pombo, Brigitte Bardot a balançar por entre as árvores com uma corda, um presidente corrupto, revolucionários ineptos cujos comportamentos põem em causa a sua capacidade de se conduzirem. O filme caricatura a infância revolucionária de Maria O´Malley, desde 1891 na Irlanda até 1907, na América Central, quando a jovem Maria explode uma ponte que o soldados coloniais britânicos estão a cruzar enquanto tentam alcançar o seu pai, um anarquista irlandês. Ela foge dos soldados e junta-se a um grupo itinerante em San Miguel. Durante uma perfomance, acidentalmente faz um número de striptease, que a torna muito famosa na região.
"Viva Maria" não se levou muito a sério, mas os censores do Texas, sim. O distribuidor submeteu o filme para a MPCB, em Dallas, para solicitar licença de exibição. Oito membros do MPCB votaram no filme como impróprio para menores, enquanto um nono membro se absteve. Uma portaria local permitia que o MPCB pudesse fazer esta classificação se acreditasse no seu julgamento que um filme "descrevesse ou retratasse brutalidade, violência criminal ou depravação de forma a incitar os jovens ao crime, delinquência ou promiscuidade sexual". A lei previa também que se um exibidor não aceitasse as regras, a MPCB devia entrar com um processo judicial para impedir a exibição do filme. O exibidor, neste caso, não aceitou a avaliação do filme, e fez uma exposição por escrito alegando que o filme tinha sido mal avaliado. 
O juiz da primeira instância alegou que o filme tinha duas ou três cenas que poderiam influenciar negativamente os jovens, mas o exibidor voltou a apelar até o caso ser julgado na Suprema Corte dos Estados Unidos, que deu razão ao filme realizado por Louis Malle, num caso que levaria a indústria de Hollywood a abandonar o Production Code. 


sábado, 16 de outubro de 2021

Desafiando o Perigo (The Bedford Incident) 1965

 "The Bedford Incident" retrata o choque de vontades nacionalistas durante a guerra fria, e os resultados de um confronto entre as forças dos Estados Unidos e da Rússia. O capitão Eric Finlander, um capitão naval experiente, ganhou uma reputação de capitão confiante, que pode ser duro com as suas tropas de vez em quando. É especialmente exigente com o desempenho de Ensign Ralston, um jovem oficial novo no contratorpedeiro, que Finlander acredita ter potencial se for treinado da maneira correcta - a  sua maneira. A nova missão de Finlander é a atribuição do comando do USS Bedford, um recém lançado destruidor naval, cuja missão é erradicar submarinos hostis do Atlântico Norte.
Devido ao aumento de atenção dos média sobre a guerra fria, o governo deu autorização a um jornal para entrevistar o capitão e documentar as actividades do navio. Ben Munceford é o civil selecionado para acompanhar o navio na sua patrulha de rotina. É um jornalista veterano queparece pouco hesitante sobre o poder, e o capitão deixa claro desde o inicio que vê o jornalista como uma distração desnecessária. Finlander também está chateado com outra decisão do alto comando, a quem ele sente terem prestado um péssimo serviço, enviando um médico substituto.
"The Bedford Incident" é o outro filme selecionado pela Columbia, em conjunto com "Bunny Lake is Missing", para testas as leis da censura inconstitucionais do Kansas.  Apesar de uma condenação informal do filme por exibir uma visão demasiado liberal ao retratar o confronto de um destruidor da marinha com um siubmarino russo como uma situação sem saída, o filme não foi banido nem censurado em mais nenhuma cidade do país. Em Novembro de 1965 a Columbia tentou exibir o filme no Kansas sem pedir selo de aprovação, decisão que foi vedada pelo tribunal. O caso seguiu para julgamento em conjunto com "Bunny Lake is Missing", o filme que vimos no post anterior, tendo a distribuidora levado a melhor.

segunda-feira, 11 de outubro de 2021

Desapareceu Bunny Lake (Bunny Lake is Missing) 1965

 Filmado a partir de um argumento adaptado do livro de Marryam Modell, escrito como Evelyn Piper, "Bunny Lake is Missing" é um filme assustador que sugere que o personagem principal vive num mundo de fantasia. Ann Lake, uma jovem mãe solteira, recentemente restabeleceu-se em Londres com a sua filha Bunny, e o irmão Stephen. Quase depois de chegar, Ann matricula a sua filha num colégio, e quando vai buscá-la depois do primeiro dia de aulas, não há qualquer registo da menina, nem ninguém se lembra de a ver. As suspeitas caem sobre o irmão de Ann, que parece mentalmente perturbado. 
"Bunny Lake is Missing" é um de dois filmes selecionados pela Columbia Pictures para servir como teste para provar que as leis da censura no Kansas eram inconstitucionais. Apesar da condenação informal do filme pelo retrato de uma mãe solteira, e pela sugestão de uma relação incestuosa entre dois irmãos, o filme não foi censurado nem banido pelo conteúdo em todo o país. Em Novembro de 1965, sete meses depois do Supremo Tribunal dos Estados Unidos acabar com a lei da censura no estado de Maryland, a Columbia resolveu testar estes dois filmes no Kansas, distribuindo-os sem buscar aprovação prévia, e informando a Kansas Board of Reviews que não submeteriam futuros filmes que decidissem exibir no estado.
O Procurador-Geral do estado moveu logo uma acção contra a Columbia para impedir o distribuidor de distribuir filmes sem primeiro obter autorização. O ex-governador do Kansas, John Anderson Jr, viria a defender a Columbia em tribunal, num caso que acabou por ser decidido em tribunal, e que levou finalmente a distribuidora a conseguir obter a razão nas suspeitas em que tanto este filme, como "The Bedford Incident" seriam censurados.

quinta-feira, 7 de outubro de 2021

491 (491) 1964

"491", um filme chocante para o seu tempo, mas que provavelmente parece mais comovente do que pertubador para os espectadores contemporâneos. Adaptado do livro do mesmo nome escrito por Lars Gorling (que acabou por cometer suicídio), a história fala-nos de seis rapazes problemáticos que são selecionados para passar por uma experiência social, na casa de uma assistente social sob diretrizes comportamentais específicas. Supostamente estão por sua própria vontade, mas na verdade não têm escolha, porque a alternativa é a prisão. O filme contém algumas sequências chocantes para o público da década de 60, incluindo a alusão à sodomia entre dois dos jovens e o inspector a quem eles devem reportar as suas actividades, e uma cena (retratada fora do campo de visão) de violação de uma jovem por um cachorro. 
O realizador Vilgot Sjoman é mais conhecido nos Estados Unidos por "I Am Curious: Yellow", mas o seu filme anterior, "491", também criou polémica, quando os agentes alfandegários dos Estados Unidos se recusaram a permitir a entrada deste filme no país. Sjoman queria retratar uma actriz adolescente nua no filme, mas as limitações da censura nos Estados Unidos obrigaram o realizador a cobri-la. O realizado" concordou mas resmungou sobre os "clichés" de Hollywood, que teve de satisfazer. Mesmo assim, o filme não passou na alfândega, foi declarado "obsceno" e confiscado. 
Mais um longo caso se iniciou em tribunal, entre o Governo dos Estados Unidos e o filme "491", uma dura batalha que acabou por ter como vencedor o filme. Na sua decisão os juízes escreveram que o filme "lidava com problemas sociais que não estavam apenas à nossa porta, mas muito além do limiar", e consideraram o filme como "constitucionalmente protegido e não obsceno".
* Legendas em inglês

segunda-feira, 4 de outubro de 2021

Flaming Creatures (Flaming Creatures) 1963

"Flaming Creatures" emprega um elenco de travestis para brincar com as convenções do filme clássico e explorar as implicações da mudança de género. Os primeiros três minutos e meio consistem nos créditos acompanhados de sequências do filme "Ali Babá e os 40 Ladrões", imterpretado por Maria Montez, completo com uma banda sonora composta por gongos e tambores. A abertura é fornecida em contraste com um dos personagens de "Flaming Creatures",  uma jovem espanhola, interpretada por um homem que se auto denominou Mario Montez. Depois dos créditos a tela entra em erupção no caos com fotos em close up de bocas enrugadas, linguas balançando e um pénis ocasional, pontuado pelo aparecimento aleatória de uma espécie de "criaturas". 
"Flaming Creatures" é um filme de avant-guarde que faz parte do movimento livre, cinema experimental da década de 60, que testou tabus sexuais e gozava com as visões rígidas que a sociedade mainstream dominante considerava sagradas. Quando "Flaming Creatures" estreou no Gramercy Arts Theater em Nova Iorque, em Outubro de 1963, o proprietário Jonas Mekas não cobrou entrada, o que seria ilegal porque o filme não foi submetido aos censores do estado de Nova Iorque, para obter licença. Para obter compensação Mekas solicitou contribuições pela Love and Kisses to Censors Film Society, um grupo formado por espectadores determinados a desafiar os censores, e cujos membros mudavam a cada exibição. Em Dezembro Mekas planeava apresentar o realizador Jack Smith com o Independent Filmmaker Award, mas pouco tempo antes da cerimónia o gerente do cinema onde esta iria ser realizada foi pressionado para cancelar a sessão, acabando esta por ser realizada na rua. Jonas Mekas viria, ele próprio, a ser um dos nomes mais importantes do cinema avant-guarde.
Em Março de 1964 Mekas estava a mostrar o filme no New Bovery Theater, quando dois detectives foram enviados para impedir a sessão e apreender a película. Os detectives também prenderam Mekas e o projecionista que foram a julgamento no tribunal de Nova Iorque, onde três juizes os condenaram por violarem a secção 1141 da Lei Penal de Nova Iorque, que condena quem "vende, empresta, dá, distribui, mostra ou transmuta" qualquer conteúdo "obsceno, lascivo, imundo, indecente, sádico, ou masoquista", numa pena que podia dar prisão de 10 dias a um ano. Numa longa batalha judicial em que académicos testemunharam a favor do filme, o juiz não concordou e sentenciou Mekas a 60 dias de prisão. A pena ficou suspensa, mas só muito tempo depois a situação seria revertida a favor de Mekas.
Sem legendas.