quarta-feira, 31 de julho de 2019

Jogo a Três Mãos (Bull Durham) 1988

Em tempos incertos e remotos, mas não muito, uns miúdos que jogavam futebol no condado portucalense tiveram um presidente do clube e todos os seus assistentes que lhes atiravam tiradas não-transcendentais, ternamente e com verdade, que iriam ficar, para o bem e para o mal, nas teias das suas memórias, tais como: «o que importa é que ninguém se aleije», ou: «desportivismo acima de tudo», para fazerem a síntese perfeita: «se conseguirmos a taça fair play já é muito bom». Mediante encorajamentos destes, não consta que tenha saído da cepa nenhum Luís Figo. Mas tão menos éticas como de resultados análogos era a moral e os conselhos do treinador que acumulava a função recreativa de mestre do fogo-de-artificio da freguesia: «estudar para os testes? para quê? copia! eu quando andava na escola e tinha pontos metia as cábulas nos tomates. Se a professora visse eu dizia-lhe para ´mas tirar dos colhões! joga ´mas é à bola, pá! E caga para essas coisas»
Talvez tenham dito destas coisas ao personagem de Tim Robbins em Bull Durham – a próxima next big thing desmiolada – talvez tenham gritado tamanhas odes ao Crash Davis de Kevin Costner – o mítico jogador das segundas linhas que nelas detém todos e demais records e isso basta; fabuloso actor, distante aqui da aura celestial do Gary Cooper de The Pride of the Yankees, mas só porque os tempos já não admitem aqueles anjos públicos e Cooper nos anos 80 teria sido Costner - sendo essa a grande ambiguidade e complexidade do filme, do conto e da moral: quem vive feliz, realizado e consciente na sombra e quem tem de mergulhar nas mais extravagantes luzes para um objectivo de fundo: dominar as bolas na quadra de jogo e na cama.
O “montro” de Robbins que pode ser só isso com culpas ou sem culpas formativas, ou o analógico de Costner que grita para a sexy esfomeada de Susan Sarandon (não dá para traduzir): «Well, I believe in the soul, the cock, the pussy, the small of a woman's back, the hanging curve ball, high fiber, good scotch, that the novels of Susan Sontag are self-indulgent, overrated crap. I believe Lee Harvey Oswald acted alone. I believe there ought to be a constitutional amendment outlawing Astroturf and the designated hitter. I believe in the sweet spot, soft-core pornography, opening your presents Christmas morning rather than Christmas Eve and I believe in long, slow, deep, soft, wet kisses that last three days.» 
Ron Shelton, belíssimo realizador só realizador, de quem tenho de recomendar Jordan Rides the Bus, apanha tudo isto tão naturalmente como o movimento do ar nas árvores e tão avidamente como a pulsão de qualquer um dos três protagonistas, num secretíssimo esplendor Visconteano – atenção aos fundos sólidos, inteiros - aplicado ao dia-a-dia sem mais nada do que o café, a bola e a tal da pulsação que torna todos os antagonistas mais do que complementares, absolutamente semelhantes. E é muito. 
* texto de José Oliveira

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terça-feira, 30 de julho de 2019

Traço Vermelho 7000 (Red Line 7000) 1965

Pode ser que como escreveu João Bénard da Costa HH tenha aberto aqui a primeira das vias do post-modernismo. Ou, lembrando-me de um texto de resgate de Jesús Cortés no seu blog, se trate de uma das suas obras mais emocionantes, sem espartilhos pulsionais ou elipses atenuadoras. O artificialismo, o “sobrecarregamento”, as séries, a panóplia técnica de efeitos – mesmo sendo secos e directos – no primeiro caso; a paixão inalienável em fundo fatalista, o controlo e compartimento impossível entre o profissionalismo e o íntimo, o vício do risco contra o conforto prometido, argumentos já para o segundo caso. Isto para não falarmos de loosers, errantes, neuróticos e uma violência instintiva que na antepenúltima das suas obras se torna outra coisa ainda, mais abstrata e fugidia, comovente e perigosa. A estrutura é de facto inaudita para a linearidade habitual: três pilotos que se abrasam pela hora de carregarem no acelerador e domarem o volante, mulheres que lhes aparecem, desaparecem e se trocam; suspensão de uma das histórias que corre para apanharmos outra no começo ou nos meios; regressos nada maquinados mas sempre imprevistos e em perda; cruzamentos que não possuem o estilhaço ou afogueamento dos mosaicos do “contemporâneo” mas antes a espessura e peso das correntezas incessantes - aquilo que um especialista consciente poderia aproximar de Joyce e desaproximar de Homero não é tão simples. Teoria que vacilaria imediatamente pela verificação de uma montagem que nunca dispersa, nunca perde a memória e o coração, mas que investe de sentidos, dependências, irmandades e individualismo, ambiguidade complexa, rumo a um painel intrincado na sua despojada frontalidade. Continua-se a andar em frente mesmo no circulatório. E tudo o que cerca e carrega esta tragédia de proporções iguais às do início ou do final de “Red River” – o barulho das plateias e a ordenação do speaker, os números e numerações que abananam, o sortido das cores, a tal da sacrossanta e perfumada borracha queimada, fumaradas, óleos e brilhos que despistam e atormentam tanto quanto os inevitáveis acidentes. Tragédia a que Hawks se atira sem rede, sem cálculo prévio, segurança responsável, chegando-se a terminais terrenos do melodramático, e junto a ele e ultrapassando-o, toca no lirismo. Esse lirismo no seu grau final que combina a sacralidade dos ardores com o funesto incessante. O sorriso e a beleza das mulheres e todo o paraíso prometido / a ameaça a cada ronronar e tentação dos motores frios e quentes que com eles dialogam. 
 Noutro dos raros textos a esta obra que permanece incaracterizável e praticamente escondida, Joaquim Pinto aponta que estamos perante outro caso original - o que não é de somenos no percurso tão complexo e perdido pelas misérias humanas do realizador - ou seja, continua ele, nenhuma das relações encontra saídas definitivas no final. Pinto fala ainda no acaso, esse malvado que tudo parece orquestrar sem justificações ou justiças terrestres para lá do virtuosismo. A sentença capital e potencialmente capitular é mesmo capaz de ser a derradeira, quando uma das mulheres do trio tortuoso reconhece o inferno daquela maneira de ganhar a vida. Essa indiferença em que os tipos do asfalto são como a carne para queimar por culpa própria, e onde elas os aguardam sem certezas como nas guerras. Obviamente perto da incandescência e nudez de um “Today we Live” ou de um cineasta seu perfeitamente contrário, Douglas Sirk, onde o absoluto concorda com a consumição instantânea – é o momento fugaz e eterno daquela corrida ou cavalgada não oficial noite adentro pelas pistas da loucura entre James Cann e a sua companheira, instantes de rara urgência que se seguem ao canto anterior, melodia da entrega, e que perfazem dois dos grandes momentos do cinema. O homem em perigo e a vitalidade disso, sempre, custe o que custar, nem que seja necessário fazer-se capitão gancho ou Edward G. Robinson de “Tiger Shark” e desafiar os Deuses; e a necessária paga, a solidão no tão geral e a dor para além de nós mesmos espalhada. 
 Eles, tanto eles como elas, não disfarçam, não dissimulam, não se encolhem mesmo no medo que aninha, mas abrem-se, agem e falam sem rodriguinhos ou máscaras do sexo ou da confiança, numa verdadeira modernidade que nos chega da origem. Jamais construção feita conscientemente moderna, sim o “The Crowd Roars” em paisagem a caminho do degradamento desse mesmo falhanço modernista, post ou não. “Red Line 7000” pode ser assim como um novo poema ou tratado de outra cavalgada, aquela que nos agarra diariamente, momento a momento, bafo a bafo, para a morte; e a superação, a não desistência, transgressão se necessário, a aceitação, alma. Vai a todas as fatias do tempo e a toda a sua história num único movimento. O excesso latente abranda, trava, derrapa, cala-se perante os silêncios dos olhares e as temperaturas dos desejos. Advém a intimidade do gesto que Glauber Rocha procurou para as suas demenciais óperas. Esse espírito secreto… 
 Aqui, nenhuma novidade a não ser a presença de tantas das questões que nos géneros ampliou, pois HH tanto nos ofereceu documentos pendentes sobre as grandes aventuras, esses gigantismos da nossa musculatura, lembro-me da detalhada sequência madeireira de “Come and get It” que só tem par com a de “Sometimes a Great Notion” de Paul Newman muitos anos depois; como a velocidade irreal e assim sensível de “His Girl Friday”, ou seja, outras fatias de experiência essencial ao todo. A grande lição, tanto para o cinema como para o dia-a-dia, que esta cepa nunca fez distinções, é que o centro pode estar no fluxo e o fluxo no centro, basta olharmos e escutarmos bem. Fazer por inteiro. E qualquer dia a qualquer segundo tudo faz sentido e se sente. Citando JBC outra vez, agora a propósito de outro Running: “…Nessa delirante irracionalidade do amor, apanágio de tão raros.” 
 Combinar o estratosférico, a combustão e o delírio com a serenidade, o desassombro, a certeza. E ser parcial se necessário, comprometendo-se e ignorando. Nem mais nem menos, hoje em dia, Michael Mann. Não só por causa dos seus profissionais, obreiros intransigentes, obstinados, onde tudo o mais parece ficar nas margens da pulsão ontológica. Esses que só respiram com causa, pressionados, em modo tudo ou nada, progredindo no opaco - o fogacho de Robert de Niro em “Heat” com a bela magoada como ele que foi uma das mais intensas gestas de amor. Mas o mesmo: buscar uma verdade onde elas se expõe inteiras pela força e dimensão da circunstância. Toda a caminhada destes destemidos, tão invencíveis, tão frágeis.
* texto de José Oliveira

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segunda-feira, 29 de julho de 2019

O Ídolo do Público (The Pride of the Yankees) 1942


Sobre Lou Gehrig e a fascinação fora de tempo pelos heróis que nos formaram na primeira idade, John Fante, o poeta da bruteza do quotidiano e das rotinas mas também o mais terno irmão que nunca conhecemos, escreveu em 1933 was a Bad Year

«Quando cheguei, o Ken não estava lá. Vesti o fato de treino, calcei as sapatilhas e fiz os alongamentos num banco no balneário, enquanto esperava por ele. As janelas da cave ficavam ao nível da rua e conseguia ver a neve a cair no passeio e as pernas dos transeuntes a caminhar a custo pela recente borrasca. 
Era uma boa altura para mim, a melhor parte do Inverno, aquelas tardes passadas com o Ken Parrish. Ele era finalista na secundária de Roper, e o meu melhor amigo. O que nos fazia levantar de manhã era o basebol. O Ken tinha regressado a Roper após ter sido expulso de duas escolas preparatórias do Leste, não por tirar más notas, mas por fazer gazeta para ir assistir a partidas de basebol no Fenway Park, em Boston. 
O ídolo dele era o Lou Gehrig dos Yankees. Tinha três tacos partidos do Gehrig e um penso com o sangue coagulado e pêlos do seu polegar colados. O que aconteceu foi isto: certa tarde, estava o Kenny sentado atrás do banco de suplentes dos Yankees, quando viu o Lou Gehrig arrancar o adesivo do polegar e atirá-lo para junto da primeira base. O Ken desatou a correr pela bancada, saltou a barreira para o recinto de jogo, e apanhou o penso do relvado enquanto dois porteiros o agarraram pelo pescoço. Expulsaram-no do parque, mas o Ken ficou com a sua recordação e não se importou. 
No final do jogo, manteve-se por perto dos balneários dos Yankees até o Gehrig sair. O Ken pediu ao grande Lou para lhe autografar o penso e este fê-lo com a sua própria caneta de tinta permanente. Esse penso ensanguentado estava agora pendurado numa moldura na parede do quarto do Ken. Ele tinha a certeza de que um dia valeria imenso dinheiro, mas eu tinha as minhas dúvidas. Os velhos jogadores de basebol caem rapidamente no esquecimento.» 

O livro foi postumamente publicado em 1985, mas já nos anos 40 se tinha prestado uma bela homenagem a esse ídolo das massas que chegou a rivalizar com Babe Ruth, no The Pride of the Yankees de Sam Wood. Ídolo das massas e coração ternurento, visão luminosa em movimentos radiantes, portador de dádivas gloriosas que cativaram milhões, simples beleza e simples emoção que todos compreendiam, deixando de um momento para o outro de conseguir praticar a sua grande paixão, morrendo precocemente e deixando em lágrimas tantas famílias e tantos desamparados. 
Sobre corpos celestes assim terrenos e em fusão com o outro mais anónimo, encontro de almas sem tempo nem espaço, Walt Whitman, um dos cantores capitais do desporto americano por excelência e logo um dos seus inventores espirituais, escreveu: «Do I contradict myself? Very well, then I contradict myself, I am large, I contain multitudes.» 
O resto, o rasto estelar, indefinível, inexplicável, incontável, é a história de amor entre o Gehrig que só a Gary Cooper pode pertencer e essa Eleanor da frágil e blindada Teresa Wright, num percurso Borzageano que passa pelo presente imaculado e pelas sombras do destino com a mesma resolução; num imaginário de sonhos talvez pudesse ter-se chamado outro dos sonhos que Frank Borzage nunca filmou, em branco sobre branco sobre branco: Este Coração que te pertence (como alguém chegou a traduzir para português o titulo do livro póstumo de Hans Fallada, Dies Herz...)
*Texto de José Oliveira.

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domingo, 28 de julho de 2019

Above the Rim (Above the Rim) 1994

"AtR continua a ser mostrado nas aulas de Filosofia ou até mesmo nas de Educação e cidadania, como exemplo de superação, do hereditário, da possibilidade de concretização dos sonhos mesmo nos locais mais cinzentos, enfim, para dizer aos alunos perdidos que o crime não compensa; mas não é por aí que se chega a algo de especial. Se formos ao “cinema” e à “convenção crítica” também não vamos muito lá, pois Jeff Pollack, o realizador, foi um dos criadores do “The Fresh Prince of Bel Air” e de outras séries e filmes que não o vão meter nos anais nem proporcionar retrospectivas, nem na pequena história, porventura; por outro lado estamos a planetas da dramaturgia cósmica emplacada num court de Spike Lee; e há quem diga que foi só mais um veículo para Tupac Shakur e para mais uma banda-sonora de éxito e tal... produto ou mercadoria para amamentar mil e um top de qualquer Billboard...
Mas vamos a três momentos, sem desconto de tempo: no berço, o movimento de câmara (panorâmica, senhor professor?) que apanha Michael Jordan suspenso no espaço sideral, brilhante como a primeira estrela cadente na noite inaugural, passa pela desarrumação do jovem artista e encontra a estrela do momento pronta a render, acabando tudo enquadrado na catadura do samurai Pat Ewing (salvou-nos tanto como Barkley e Rodman nos libertaram), inclusive o Pump Pump de Snoop Dogg e Dre – todos os anos de 90, as fitas de celulóide a desenrolarem-se e a justificarem a sua razão de ser, e a rima para a posterior projecção e cantoria quimérica e realista de “Shaft”, carga sem metafísica.
Segundo andamento, no caminho, rasgando o ar do tempo e do espaço, contra o cronometro: quando a estrela do momento humilha o vagabundo que poderia ter sido alguém e este é “salvo” pelo que quis ser ninguém; no epicentro das ilusões perdidas, fica clara a questão da facilidade do presente em relação à memória, o despachar com um chuto-no-rabo ao invés de ganhar tempo com o legado, o que fazer com o grande momento que já passou e que não ficou nos livros, e como isso é igual aos erros que as grandes nações e chefes cometem ciclicamente, chegando os genocídios e as guerras; e, claro, fala dos grandes que só o foram fugazmente pois preferiram, e certos, pois são eles a decidir, o seu “vício” que para eles é a felicidade mais do que todo o ouro e compromisso da fama – um Belarmino Fragoso ou um José Egas dos Santos Branco (a.k.a Zequinha), jogador da bola que passou por clubes como Setúbal ou Porto, hoje trintão e finalizada a carreira, que arrancou um cartão vermelho das mãos de um árbitro, irradiado mil vezes. Cena em que se percebe a irremediabilidade do “agora” em gravidade inusitada, o milésimo de segundo a levantar a espada ameaçando o eterno, ainda mais porque não se chama a atenção para tal, é só uma luta de egos. 
Por último, já no cesto, passando o aro, contando: depois da vedeta cair na realidade não porque lhe aumentaram o número e a qualidade das garinas mas porque trataram abaixo de cão o seu amigo de infância; passado o confronto com os fantasmas de outrora e estendida a rampa da redenção a cada qual, depois de mais um bailado comum em que o fogo-de-artifício da maquineta e da montagem e dos filtros poderiam ter brilhado mas ficaram no banco, um “last minute rescue” à força toda, cosendo as pontas soltas, as esquadrias e simetrias, bem como o punch perfeito para a conclusão da aula benemérita. Mas... fundo mas... como num afundanço... o que acontece para cá do televisor (sequência final do palco do bairro à transmissão televisiva) foi a trajectória da bola que traçou o movimento do filme: a aprendizagem, ou crescimento, ou meter-se na linha certa, enfim, não cometer passos, é sempre fintar, sem o desprezar, esse prenúncio de morte; é enfrentá-lo, mesmo que seja um Tupac (ou um The Notorious B.I.G.) símbolo irónico de todas as misérias e pulsões do instante. 
Quase nada, domingo de tarde, e precioso. 

p.s: já que se anda por estas redondezas, “Straight Outta Compton” de 2015 é bem justo e muito bom; pelo fundo em causa ainda não deu para estrear em muitos países, como o nosso, nem nas cinematecas, muito menos para imprimir dossiers culturais, mas talvez seja só pela forma que é bom e justo, o resto vive inseparavelmente nisso, como tudo que importa; feito em plano-sequência (beats erguendo um enorme corpo orgânico que pode acarretar com tudo) com um grande Coppola, sem efeitos ou loops de transição fácil ou de reconciliação provocada só por truques e mercantilismos de plot, segue pessoas e situações como se pertencessem aos anos de Bathsheba ou numa Síria de agora, ao lado e nunca picando ou usando de superioridade cinematográfica; muito mais próximo de um Dj Kronic do que dos discípulos de um Vibe, de Zeca Afonso do que António Zambujo, é uma peça para um tempo e para uma profecia que ainda tem tudo para oferecer. E F. Gary Gray, desde o magnetismo com que apanhou o terreno convulso da face e as ondas carregadas da voz de Sam Jackson em “The Negotiator”, com certeza nunca quis enganar alguém."
* texto de José Oliveira

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quinta-feira, 25 de julho de 2019

Um Lance no Escuro (Night Moves) 1975

Antes de chegar a "Night Moves" Arthur Penn realizou os seus dois filmes mais inclassificáveis. E achar isto é não esquecer "The Miracle Worker" e os outros casos dessa época que realmente só parecem ter paralelo com um Ingmar Bergman desta vida. "Alice's Restaurant" parece agora um imenso adeus ou uma derrota não tomada como tal; "Little Big Man" um olhar para os secundários da grande História que tem mais de desilusão do que de revisionismo. Pelo meio voltou à televisão e a outras formas, com certeza com o mesmo empenho. Não sei dizer mais nada sobre este período. Mas desilusão, lentidão, olhar para dentro e pressentimento, olhar sempre à procura de alguma coisa que não vem é a história desse grandíssimo (e pequeníssimo, ao lado de) filme de 1975 que não se toma por tal. Gene Hackman é Harry Moseby, detective privado que plana por uma Los Angeles tão triste como os seus olhos e tão abatida como a pele do rosto. A mão do tempo já avançou muito e a Moseby já não é permitido ter o estilo ou a dureza de um Sam Spade ou de um Philip Marlowe. Sabe que a sua natureza inserida na paisagem contemplada é a sua tragédia, a sua ferida, o seu buraco, e vai acabar tão sem rumo no final como quando o encontramos. Meteu-se no negócio errado, mas, se atentarmos bem nas suas acções, reflexões, respostas e disponibilidades, divagações dilaceradas, perceberemos que qualquer modo de vida seria prejudicial a tal melindre. Não é dizer que ele sabe o quanto é bom, antes que está em contracorrente e deu por isso. A imagem ou o mecanismo do futebol é perfeita: - "Quem está a ganhar?" - "Ninguém. Um dos lados só está a perder mais devagar do que o outro." Uma consciência de que vogando limpo ou simplesmente acessível no centro de um cancro (corrupção ou falta de amor) a demanda está perdida à partida. E mesmo que se possa chegar à vitória superior de poder andar de cabeça levantada e olhar olhos nos olhos, o lamento pelo que poderia ter sido não passa e mata de maneira mais dolorosa do que o fulminante tiro a frio. 
Nesse universo onde tudo se pode comprar como tudo se pode comer, Moseby é obrigado a dizer a uma adolescente estilhaçada, essa Melanie Griffith que possivelmente traça o seu último caso, que ter dezasseis anos ou quarenta é igual ao litro. Não se fica melhor. Sobre a procura da obrigatória identidade para sempre. E diz-lhe isto sem gemer ou gritar, mas com uma gravidade fina e calada que tece a construção e progressão deste filme de consciência ferida. Ferido mas nunca fascinado por qualquer iconografia do looser, niilismo ou celebração, numa frontalidade que tem a ver com compreensão e amparo familiar. Pode-se ter visto e experimentado mais, ter partido a cabeça a alma e o coração, mas as certezas, ali ou aqui no século XXI dos eventos que substituíram a verdade e o comprometimento, é sempre mais chão escorregadio. Os movimentos nocturnos do título devem ter a ver com esses raros que só podem respirar bem pela calada, quando o grande embuste e a grande piada fica suspensa, pela noite dos cantos dos bichos e das músicas das crianças; junto dos que se afogam em bares ou nas sarjetas da falta de ambição que pode ser a mais justa ambição; essas casualidades que já não esperam grandes coisas, não acreditam em milagres ou no romanesco aconchegante, e então pode acontecer um vislumbre ou um encaixe como esse que Moseby teve junto a essa aparição feiticeira surgida das águas; momento, vamos sabê-lo posteriormente, também encenado, mas é preciso já estar completamente vazio para não se perceber da excepção ou da maravilhosa ilha que tão serenamente emergiu e explodiu aí, no momento mais belo e apaziguado. 
"Night Moves" é assim e por tudo aonde não se pode aceder, o mais sossegado e o mais exposto momento de Penn. Uma acalmia urdida num mal-estar e numa doença que é muito mais evoluída do que a dos eléctricos e furiosos filmes passados. O sexo, a nudez, o oferecimento ou a procura, tudo isso aparece sem o fulgor do desejo. Tudo tem valor de mera troca, de vingança, de mal mesquinho. Embaciamento e entropia onde se avança a custo, sempre de pé atrás, cada um por si. Como no desporto americano, corre quem estiver com a bola. Já não há trabalho de equipa, entreajuda, solidariedade. Sem se dar por isso, estamos perante um dos mais vertiginosos climas, temperamentos, ventos dos anos setenta. Essa Nova Hollywood que proporcionou visões tão cansadas, terminais, funéreas como esta. Para se perceber agora que as tiradas sobre os filmes de Eric Rohmer não eram maldosas, não se podiam era aplicar no contexto. Pois como Rohmer, Penn também sabia que é sempre questão de envolvência e não de acessório; questão ontológica primordial, nunca efeitos que se evaporam sem o apelo da matéria. Se Moseby acaba a navegar, ainda a navegar, com tanto cadáver em torno, é porque ainda restará algo. Nem que seja só navegar. Mas navegar ainda. Pertence a um tipo não muito gregário que inclui o George C. Scott de "The New Centurions ", os espantalhos de "Scarecrow", porventura o corredor louco de "Vanishing Point". Tipo que ignora o sábio conselho "se não os podes vencer, junta-te a eles". E paga por isso. "You bastard! Bastard! Bastard!" é o que esse detective vocifera para si mesmo e para quem já não o pode escutar. Depois a câmara sobe, sobe, e ele continua a navegar. Algo se esfuma. E não temos nova situação. Assim, seco. 
* Texto de José Oliveira

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Que Se Lixe a Taça (The Bad News Bears) 1976


Em “The Bad News Bears” pouco ou nada se aprende, isto é, se só tivermos em conta os preceitos dos sociólogos canónicos, dos ministérios de educação oficiais, dos grandes pedagogos de secretária, dos partidos conservadores da boa consciência familiar e patriótica... da lengalenga determinista... Na abertura o treinador e atleta falhado de Walter Matthau é enleado por uma luz espessa, brilhante mas perfurada por demasiada granulação da película para tudo se poder acreditar harmónico; no final, ele e a sua equipa de petizes vão acabar a beber cerveja no primeiro lugar dos últimos. A harmonia é apanhada em linhas convulsas. Pois esse treinador que contrata a sua talentosa «filha» para a quadra de basebol não com palavras belas ou pelo falar de almas entrelaçadas, mas sim por largar umas notas para o que ela realmente almeja, jamais trata a criançada de modo inferior, infantil ou apalhaçado mas sim com trejeitos tão severos como se fosse meter um Mickey Mantle na linha. 
É essa a inteligência que não o faz prescindir da sua personalidade nem das crenças que a vida vivida ensinou mas antes fazer perceber aos novos demais da pureza disso mesmo – mesmo nas contradições, mesmo nas falhas. Fidelidade, e complexidade, tanto no bailado cénico que conjuga Georges Bizet com a magia e os milagres dos tacos e do swing puramente americanos que Walt Whitman cantou, como nos pactos calados entre aquele balneário que é um mundo – raparigas, mexicanos, bêbados, bons corações – sempre em genuína evolução e irmandade: modernidade para lá dos rótulos e cadernos de encargos, um por todos e todos por um, mais vale quebrar do que torcer, incluindo no momento da falha técnica e humana no jogo ou para lá dele: sempre em recomposição e aprendizagem, a tentarem perceber, como as bolas curvas, do que trata a tal da existência plena. Michael Ritchie, considerado nos compêndios um realizador de terceira, atingiu nesta simplicidade de afectos e instintos quase todos os modos e géneros do cinema americano. Como quem não quer a coisa e não larga o osso. Brilhante e terno como a espantosa e perfurada luz iniciática das origens, lídima estripada.
* Texto de  José Oliveira

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terça-feira, 23 de julho de 2019

Rookie of the Year (Rookie of the Year) 1955

Em Rookie of the Year John Ford e John Wayne não estão a escrever histórias de Índios e Cowboys – como Wayne, o jornalista desportivo diz ao miúdo paquete da redacção – mas também estão, pois, como vemos diariamente em qualquer dos nossos três jornais desportivos (viva ao luxo! Nem a Alemanha…), tudo é um bacanal e vale tudo por uma notícia bombástica mesmo que não tenha pés nem cabeça, mesmo que seja passível de destruir o futuro de um jovem ou o legado de um gigante.
Rookie of the Year é uma contenda jornalística a la Sam Fuller onde o furacão ético de um acontecimento de contornos bíblicos que aglutina a épica de David e Golias e a longevidade de Matusalém é engolido a bílis ou para a arca de Noé das narrativas privadas e preciosas – como as amantes ou o euro milhões não ganho por estupidez - para ceder passo a uma criança que ama o taco de basebol.
Furacão ético assim resolvido por um Matusalém que dispensou a imortalidade fácil de uma narrativa que mais do que sensacionalista poderia resultar na Great American Novel, cessando o dilúvio das parangonas com o seu pequeno sonho de infância, que está nesse plano derradeiro absolutamente Fordiano – Wayne, o cowboy dos cowboys, com uma bola na mão, um sorriso de criança, o lançamento, o homerun e a traquinice; traquinice que no caso foi limpar um bocado da fossa da imprensa. Wayne, como um puto, brilho nos olhos igual ao de Patrick Wayne, o jogador do ano, na vida real seu filho e no filme filho da verticalidade de Ward Bonde – tudo entrelaçado, uno e lógico na humanidade do mais humanista dos cineastas. Pois com coisas sagradas, like ball stuff, boy oh boy, não se brinca.
* Texto de José Oliveira
Legendas em Espanhol, em anexo.

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Legenda em espanhol
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segunda-feira, 22 de julho de 2019

Quem Programa Sou Eu: Desporto, por José Oliveira

Estamos de volta com a rubrica "Quem Programa Sou Eu", que tem sido, e continuará a ser, regular, ao longo deste ano, e quem sabe dos próximos, onde os nossos seguidores/leitores são convidados a programar o seu próprio ciclo. Quem quiser participar em futuras edições é favor mandar mail para: myonethousandmovies@gmail.com. Neste momento já temos mais duas listas para os próximos tempos, mas, quem sabe, se a vossa vez será a seguinte.

O convidado desta semana, é um convidado muito especial. O José Oliveira, natural de Braga, mas que tem tido uma presença muito activa no mundo do cinema desde há muitos anos para cá. Ele é blogger, realizador, cineclubista, e muito mais, mas, sobretudo, é alguém com quem o My Two Thousand Movies se identifica muito. A sua presença aqui, é por isso uma honra e para o conhecerem um pouco melhor, e a sua cinefilia, nada melhor do que ler as entrevistas que deu para o site "À Pala de Walsh", aqui e aqui, a segunda em conjunto com o João Palhares, seu colega e co-fundador do Cineclube Lucky Star. "Desporto" foi o tema escolhido, e para dar o pontapé de saída nada como lermos as suas palavras:


"Volto a recuperar Thomas Pynchon e o seu livro mais desprezado porque ligeiro, ligeiro como uma partida de bola, esse elegíaco charro apelidado Inherent Vice: «O que seria « caminhar sobre as águas » senão a maneira bíblica de dizer surfar?»
Jorge Valdano, arcanjo de Diego Armando Maradona aquando da famosa “mão de Deus” e filósofo disponível do genuíno futebol da rua, escreveu que «todos queremos vencer, mas apenas o medíocre não aspira a beleza.» Steve Prefontaine, uma das casualidades mais “estranhas” e fascinantes que a história do desporto deu à luz efémera, outro lamentavelmente “irresponsável” que não soube administrar a vida, nunca quis começar as corridas de fundo no fundo da cauda para atacar no instante decisivo, pois para ele isso era como a cobardia e acreditar em alguma coisa, nem que seja em si mesmo, isso sim, é o milagre acabado.
A beleza… acreditar em alguma coisa… milagres… todo o desporto é equiparável à magia e ao milagre do cinema, à sua razão e à pergunta sempre capital do “porquê?”, e da transfiguração à transcendência, cabe toda a beleza. É por demais evidente que todas as gerações querem que no seu tempo aconteça o incomparável, o “melhor de sempre”, o mito. Por isso tentamos achar o novo Michael Jordan, o novo Maradona, o Joe DiMaggio em Brooklin… o Eusébio do Lumiar…por isso se usam as estatísticas, os recordes, se equipara e se faz a cisão entre as “eras modernas” e as “eras arcaicas”, a tecnologia a matar o primordial, os tecnocratas a fuzilarem a beleza. Jordan não foi só o melhor pelos seus títulos , pela iconografia, pela universalidade; nem também somente pelo seu percurso bigger than life, por ter sido um dos últimos hustlers na sombra e em escala interplanetária, mas porque tudo isso aconteceu inseparável da beleza de um corpo e da inteligência de uma mente em puro movimento concreto e translúcido.
Em puro movimento, ou seja, uma cadência celeste como terrena que nasceu para isso e somente para isso. Assim são os filmes verdadeiramente filmes. O essencial nem que seja num milésimo de segundo a salvar tudo. De John Ford ao Steven Soderbergh de Traffic (o mais belo dos filmes de desporto, explicarei mais à frente no ciclo). A beleza a tomar conta de tudo e escondida num piscar de olhos. Bons abismos."

José Oliveira, Julho de 2019


sábado, 20 de julho de 2019

A Canção da Terra (A Canção da Terra) 1938


Em Porto Santo, uma pequena ilha próxima à ilha da Madeira, a seca alastra-se, e Gonçalves, um agricultor local, tenta superar a catástrofe com a a ajuda de Bastiana, a quem ele ama muito. João Venâncio, é outro agricultor, que se recusa a partilhar a água do seu campo com os outros agricultores, e vai entrar na luta pelo coração de Bastiana.
João Bénard da Costa escreveu o seguinte sobre este filme: "À época Jorge Brum do Canto defendeu que "A Canção da Terra" é quase um filme de cowboys (...) tem acima de tudo o mais, aquele ritmo feroz, impressionante e ofegante dos westerns, ritmo que foi o pai de todo o cinema de hoje". A comparação não é despropositada, como o não é a adjectivação do ritmo do filme. Mas, o que mais surpreende, a uma visão actual, é a elevação à máxima sacralidade do décor e da paisagem de Porto Santo. (...) Hoje o que sobreleva é a carga mitológica da obra, o seu animismo crucial a sua sensualidade mórbida e, por vezes, assaz escatológica."
Palavras de Luís de Pina: "Visto à distância de quase cinquenta anos, "A Canção da Terra" não perdeu qualidades, sobretudo naquilo que sempre constituiu o seu forte: o ritmo visual, a sequência sempre dominada pela imagem, a beleza incomparável da terra e do mar, o tom lírico mantido com segurança e sem pieguice. (...) Jorge Brum do Canto soube traduzir essa imagem poética numa forma cinematográfica que muito deve ao seu operador Aquilino Mendes. Mais próximo de Flaherty ou de Epstein que dos russos, sobra-lhe uma sensibilidade e um conhecimento pessoal muito directo daquilo que mostra."

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quinta-feira, 18 de julho de 2019

O Príncipe com Orelhas de Burro (O Príncipe com Orelhas de Burro) 1980

No tempo do rei Leonardo, uma guerra e a peste que a acompanhou despovoaram a Traslândia. Ignorando esses trágicos acontecimentos, a rainha Isménia, a princesa Camila e a aia Narcisa, oriundas de um reino distante, chegam à Traslândia, quando a guerra se aproxima do final…
"Adaptação do romance homónimo de José Régio, O Príncipe com Orelhas de Burro (fotografia de Elso Roque, música de Carlos Zíngaro) corresponde a um projeto acalentado por António de Macedo desde 1957, concretizado numa aproximação subversiva ao material literário que adapta inspirando-se no estilo teatral de António José da Silva (O Judeu): o reino imaginário da Tralândia, um mundo de fantasia mais ou menos medieval, fica quase despovoado devido à guerra e à peste. Ignorando o que se passa, a princesa de um outro reino distante e a sua aia chegam à terra desolada, quase no fim da guerra. Uma sátira ao poder político."
"O Príncipe com Orelhas de Burro" contava com a colaboração de uma companhia teatral chamada "Os Cómicos". É deles o melhor desta obra.
Nota: esta é a versão televisiva do filme.

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quarta-feira, 17 de julho de 2019

Guerra Cívil (Guerra Cívil) 2010


""Guerra Civil", de Pedro Caldas, Melhor Longa Metragem Portuguesa do IndieLisboa 2010, é a primeira longa de um realizador com larga presença no cinema português (director de som nos anos 80 e 90 e autor de várias curtas recentes). "Gostava cada vez menos dos filmes em que trabalhava ou via. Escrevi argumentos, mas apenas agora recebi o apoio para realizar uma longa", diz-nos Caldas. 
A época do filme é a década de 1980, no Verão de um país desfasado entre as expectativas e as desilusões das suas diferentes gerações. Para o realizador, "muito do filme é feito contra o cinema português dessa época e a sua perda, mas também sobre o que se passa agora. Perdeu-se o punk, a liberdade estética e política: é o início do mundo de hoje, em que os valores económicos predominam". Mas o filme vive, sobretudo, pelo comovente retrato das suas personagens: um jovem e solitário rapaz fechado na escuridão da sua imaginação (Francisco Bélard, candidato a melhor Ian Curtis do cinema), o encontro com uma rapariga que reflecte a luz e o calor da estação (Maria Leite, encarnando o brilho da inocência de vida no cinema), e uma geração adulta frustrada no falhanço das suas relações. "Interessava-me fazer um filme sobre várias solidões", explica Caldas. "O Rui [Francisco Bélard] não vê nenhum futuro à sua frente, é um punk tardio. A única personagem que sente a alegria de um futuro é Joana [Maria Leite]. A mãe tem medo de envelhecer, mas quer provar a si própria que ainda é mulher [uma tocante Catarina Wall]."
A sensibilidade do filme passa por um olhar sobre a vida potenciado pelas possibilidades do cinema: uma inovadora montagem que garante um olhar, sem julgamentos, sobre os desejos e falhas de cada um. "Achei justo montar pontos de vista diferentes para nos aproximarmos mais das personagens, dando-lhes o tempo de uma personagem principal", refere Caldas. A solidão de cada um é vista por uma montagem paralela dos mesmos dias de cada personagem, oferecendo uma ponte emocional para a presente (e eterna) forma de vida do país. "Hoje, vemos desencanto nas relações e pouca vontade de viver. Os portugueses tornam-se mais fechados com os problemas, sentem uma falta de alegria de viver que me choca", diz-nos Caldas. Contudo, "Guerra Civil" brilha pelo mais tocante dos sentimentos em cinema: a alegria de filmar. "É um dos maiores prazeres da vida", diz-nos Caldas, "mas, para a maior parte das pessoas com quem trabalhei antes, era um sofrimento. Fiz este filme também contra isso".
"Guerra Civil" remete-nos para um luminoso e desaparecido cinema português - o de "Uma Rapariga no Verão" (1986), de Vítor Gonçalves, obra nunca estreada e na qual Caldas trabalhou. "Guerra Civil" depara-se também com dificuldades em estrear, pairando, assim, a reclusão do cinema dessa época sobre o filme. A sua banda sonora, forte elemento da narrativa (Orange Juice, Joy Division), é o entrave da sua estreia, fazendo desta exibição (hoje, 21h30) uma ocasião especial para ver o filme. 
"Só faz sentido fazer cinema para mostrar às pessoas. E, para o filme não morrer, é preciso exibi-lo", diz o realizador. João Figueiras, o seu produtor, refere que "o filme não pode passar nas salas, excepto nas condições especiais da Cinemateca, por uma questão burocrática: a versão original tem um impedimento nas autorizações de duas músicas. Não é uma questão financeira mas de não-autorização da Sociedade Portuguesa de Autores", diz-nos. "Estamos em contacto directo com o autor e aguardamos uma resposta a qualquer momento. Se se resolver, o filme vai para as salas, pois há interesse para que isso aconteça." O retrato emocional de um país, sedento de cinema, raramente terá encontrado tão sensível forma como em "Guerra Civil". A sua aguardada estreia será a nossa comoção.
* Texto de Francisco Valente para o jornal Público, quando de uma exibição na Cinemateca. 

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Especial Cinema Português

E assim termina o ciclo Festival Stop Motion. Foram perto de de 50 curtas que passaram por aqui nas últimas semanas, de todos os cantos do mundo, todas elas localizadas no tempo entre 2000 e 2009.
E agora, antes de arrancar o ciclo do nosso convidado especial, que será, em principio no Domingo, vamos ter aqui um pequeno especial relativo ao Cinema Português, com um punhado de filmes difíceis de se encontrarem no mercado. Um deles é o aguardado "Guerra Cívil", do Pedro Caldas, que já tinha sido prometido por aqui.
Até já.


Coraline e a Porta Secreta (Coraline) 2009

Uma jovem rapariga, Coraline atravessa uma porta secreta, na sua nova casa, e descobre uma versão alternativa da sua vida. À primeira vista, esta realidade paralela é estranhamente parecida com a vida real – mas muito melhor. Mas quando este maravilhoso conto se torna perigoso e a sua mãe contrafeita tenta ficar com ela para sempre, Coraline dependerá da sua firme determinação, coragem, a ajuda de vizinhos e de um gato que fala, para salvar os seus pais verdadeiros e algumas crianças fantasma, e assim voltar para casa.
Baseado num romance de Neil Gaiman de 2002, trazido para a tela com uma mistura de stop-motion e  CGI, "Coraline", de Henry Selick é um conto de fadas dos tempos modernos, firmemente enraizado numa das fantasias mais primitivas da infância: que existe um muito muito melhor onde nós realmente pertencemos, onde os pais são mais agradecidos e amorosos, a comida é mais saborosa e abundante, e os rituais diários da vida são sobre diversão e excitação, em vez de tédio e solidão. 
De uma perspectiva de narrativa, "Coraline" levanta e retrabalha elementos de centenas de anos de contos de fadas e outras morais de histórias que deveriam assustar as crianças para serem boas, aceitando o que lhes foi dado e não desejando mais. Em certo sentido, o mundo paralelo que Coraline descobre do outro lado da parede da sala é doce para a sua falta de comida, e não podemos culpá-la  de querer e comer mais, mesmo quando percebemos que algo não está certo. 

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terça-feira, 16 de julho de 2019

Mary and Max (Mary and Max) 2009

Uma história de amizade entre duas pessoas muito diferentes: Mary Dinkle, uma menina gordinha e solitária, de oito anos, que vive nos subúrbios de Melbourne, e Max Horovitz, um homem de 44 anos, obeso e judeu que vive com Síndrome de Asperger no caos de Nova York. Alcançando 20 anos e 2 continentes, a amizade de Mary e Max sobrevive muito além dos altos e baixos da vida.
""Mary e Max - Uma Amizade Diferente" traz, acima de tudo, uma percepção impressionante sobre um mundo que, embora tenha evoluído tecnologicamente, mantém em sua essência algumas características que parecem difíceis de serem rompidas, sentimentos que soam intrínsecos ao ser humano independente da concepção de grupo que se desenvolva. Em tempos de internet, mensagens virtuais e telefones celulares que nos permitem comunicação instantânea entre dois pontos distintos do mundo, é curioso – e doloroso – constatar que muitas vezes, mesmo tão inseridos, o que precisamos é do contato certo, e que nestes momentos ele pode estar muito distante, ainda inacessível.
É por esta experiência que passam Mary e Max, que em outra época protagonizam exatamente aquilo que muitos de nós, usuários da internet, mantemos hoje em dia: uma amizade exclusivamente dependente de meios de comunicação inumanos. No caso nosso, o meio virtual; no deles, as correspondências em papel. Mary, garota australiana solitária que sofre com a ausência do pai e os excessos da mãe alcoólatra, escolhe aleatoriamente um nome em uma lista telefônica pertencente a um país distante, os Estados Unidos, e por coincidência ou conspiração conhece, através da troca de cartas, Max, um senhor solitário, sem amigos ou namoradas, que sofre de retardo mental e possui um estilo de vida anti-social, assim como o dela. 
Essa amizade acaba se tornando uma grande jornada de compreensão, um do outro, de si mesmos, da vida e do mundo que os cerca, mesmo que distorcido por suas visões quase alienígenas das coisas. Jornada que é marcada por observações peculiares e que mostram em Elliot, que aqui assina roteiro, direção e criação visual, um autor ousado e dotado de um olhar ao mesmo tempo desolador e sarcástico sobre esta realidade que pinta, especialmente por conta dos exageros sempre conotativos da estética que constrói com sua habilidosa técnica de stop motion com argila. Das caricaturas físicas dos personagens e objetos às composições particulares de cada um dos países retratados – Austrália a terra do sépia; Estados Unidos, a do preto-e-branco – existem momentos de imensa criatividade e audácia." Texto de Daniel Dalpizzolo

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segunda-feira, 15 de julho de 2019

O Fantástico Senhor Raposo (Fantastic Mr. Fox) 2009


Sr. Raposo (Clooney) era um antigo ladrão de galinhas, mas quando se encontra numa situação de vida ou de morte, a sua mulher, Sra. Raposa (Streep), anuncia que está grávida, ele promete-lhe nunca mais roubar nada ou colocar a vida dos dois em perigo. Então, o filme avança alguns anos, e  vemos que Raposo conseguiu um trabalho num jornal, que o seu filho cresceu e agora é um adolescente que está sempre a tentar impressionar a família (apesar de nunca conseguir). E o principal, Raposo está tão decepcionado com a sua vida que está a pensar num grande roubo que lhe irá dar comida de primeira para o resto da vida.
Primeiro filme animado de Wes Anderson, o que não deixava de ser engraçado mdado que todos os seus filmes anteriores desde "The Royal Tenenbaums" (2001) eram praticamente filmes de desenhos animados com actores humanos. A ironia é que ao mover-se totalmente para o reino da animação com este "Fantastic Mr. Fox", Anderson faz o seu filme mais humano desde Tenenbaums.
A estética de Anderson sempre foi profundamente enraizada numa nostalgia de estilos, tecnologias e técnicas ultrapassadas, por isso é justo que ele tenha adotado o rigor demorado e imperfeito da animação em stop-motion, contra métodos mais modernos, como o CGI.
Um elenco glorioso a dar vozes às personagens, onde para além de Meryl Streep e George Clooney destacam-se ainda Jason Schwartzman, Bill Murray, Willem Dafoe, Owen Wilson, o próprio Anderson, ou ainda Jarvis Cocker. 

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sábado, 13 de julho de 2019

Uma pequena pausa no ciclo, voltamos segunda ou terça para os últimos filmes.
Espero que esteja a ser do vosso agrado.

quinta-feira, 11 de julho de 2019

Há Pânico na Aldeia (Panique au Village) 2009

Cowboy e Índio tentam surpreender o amigo Cavalo dando-lhe uma churrascada caseira como presente de aniversário. Mas o plano não dá certo, e eles precisam de descobrir o que fazer com os 50 milhões de tijolos que encomendaram por engano. Mas a tentativa de esconder os tijolos resulta na destruição de uma casa. Quando tentam reconstruí-la, o excêntrico trio combate uma série de obstáculos bizarros: uma viagem ao centro da Terra; uma bola de neve gigante que atira pinguins mecânicos; vacas de paraquedas; criaturas marinhas pontiagudas de um mundo paralelo subaquático; waffles gigantes e lições malucas de música para animais de quinta dadas pela formosa égua vermelha Madame Longray. Até o Pai Natal aparece.
Stéphane Aubier e Vincent Patar são dois escritores e realizadores de animação belga em stop-motion, conhecidos por utilizar várias técnicas de animação: desde o acetato tradicional até à plasticina, passando pelos recortes. Conheceram-se em 1986, quando estudavam no Instituto de Belas-Artes de Saint-Luc, em Liège, e ambos se licenciaram em 1991 na Escola Superior de Artes Visuais da Universidade de La Cambre, em Bruxelas – uma conceituada escola de arte europeia. As suas carreiras estão fortemente ligadas desde esse primeiro encontro: os dois partilham um universo desenvolvido ao longo de muitos anos de colaboração.
"Panique au Village" é o filme mais conhecido desta dupla, fez parte da selecção oficial da Câmara de Ouro, em Cannes, no festival de 2009.

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The Butterfly From Ural (Uralin Perhonen) 2008

O filme conta a história de um antigo presidente da Finlândia, Gustaf Mannerheim, apesar do seu nome nunca ser mencionado, numa viagem à Ásia Central, onde conhece um rapaz do Quirguistão. Mannerheim trá-lo de volta com ele para a Finlândia, e começa a chamá-lo de Butterfly. O rapaz torna-se servo e amante de Mannerheim, mas quando a guerra civil finlandesa começa Mannerheim abandona o amante no campo de batalha.
De acordo com a realizadora Katariina Lillqvist esta curta metragem é baseada num conto de folclore do distrito de Pispala, em Tampere. Na altura da sua estreia, em 2008, causou algum reboliço na comunicação social finlandesa, causando discussões sobre os limites de liberdade de expressão  e a orientação sexual de Mannerheim.
Falado em inglês, e sem legendas.

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quarta-feira, 10 de julho de 2019

My Two Thousand Movies - Próximos Meses

Esta será a ordem dos ciclos a apresentar nos próximos meses:

- Programação de um Convidado (já para a próxima semana)

- Kon Ichikawa - O Essencial

- Programação de um Convidado

- Fantasy Lo-Fi - O Ciclo

- Programação de um Convidado

- Straub and Huillet - O Cinema é uma Arma (com a colaboração do Jorge Saraiva)



Já sabem que o melhor cinema passa pelo My Two Thousand Movies

O Nó da Gravata (Le Noeud Cravate) 2008


“O Nó de Gravata” combina perfeitamente animação de fantoches e desenhos animados. O filme retrata quinze anos da vida de Valentin. Empregado dedicado à sua tarefa, atraído por chefes cheios de poder, Valentin luta com toda sua força contra o absurdo do quotidiano como empregado. 
Um pequeno conto semi-melancólico, contado com uma pitada de humor que nos chega do norte das américas, mais propiamente do Canadá, pelas mãos de Jean-François Lévesque, nascido no Québec, no seu único trabalho conhecido até hoje.
Esta curta metragem é uma mistura interessante de diversos estilos de animação, e reflecte uma experiência que a maioria das pessoas tem na sua vida: o pagamento, senão a erradicação, das alegrias e dos sonhos pela labuta sem sentido do mundo moderno do trabalho. Mas, como o filme aponta, não percamos a esperança, nunca é tarde demais para redescobrir o que nos fez, ou faz feliz.

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Prometheus' Garden (Prometheus' Garden) 2008

Inspirado no mito grego Prometheus, um Titã que criou os primeiros mortais de barro e roubou o fogo dos deuses, "Prometheus´Garden" mergulha os espectadores num universo cinematográfico diferente de qualquer outro. As  imagens obscuras e mágicas deste assombroso filme desdobram-se num fluxo onírico de consciência, revelando um improvável elenco de personagens de barro envolvidas em lutas violentas pela sobrevivência.
Curta-metragem com 28 minutos de Bruce Bickford,, um nome já interessante no panorama de animação norte-americano,  que aqui nos apresenta um trabalho que irá intrigar alguém que procure uma realidade alternativa, uma forma de ver o mundo que é visual e substancialmente diferente daquilo que as pessoas estão habituadas a ver. O "real" que se vê no filme está relacionado com ideias e sentimentos, e não com as pessoas.
"Prometheus´ Garden" não tem uma narrativa linear, mas está fundamentado com temas de violência e destruição, combinados com os da transformação e regeneração. 

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segunda-feira, 8 de julho de 2019

$ 9.99 ($ 9.99) 2008

A pergunta filosófica que se segue não é tanto sobre o sentido da vida, mas sobre o preço do sentido da vida. Dave Peck tem 28 anos, é deprimido, desempregado e ainda não deixou a casa dos pais. Quando se depara com um anúncio que marca 9,99 dólares como o preço da felicidade, tudo se perspectiva na sua vida. Agora, animado e com uma esperança renovada, vai querer dividir essa incrível descoberta com o resto do mundo…
Filme excêntrico em stop-motion, feito com marionetes e dirigido pela israelita Tatia Rosenthal, que já era conhecida pela curta "A Buck´s Worth". É baseado numa série de curtas histórias de Etgar Keret, que também colabora no argumento, sobre a vida dos moradores de uma cidade, em busca da sua felicidade, num mundo crivado de dívidas, dependência, suicídios, solidão, e constante mudança. O ponto mais importante é o seguinte: o sentido da vida é diferente de pessoa para pessoa.

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Wallace & Gromit: Dúzia de Pasteleiro (A Matter of Loaf and Death) 2008

Nesta quarta curta-metragem de uma série de sucesso iniciada em 1991 com "A Grand Day Out", mais uma vez, iremos acompanhar a dupla Wallace e Gromit numa embrulhada das antigas condimentada com uma pitada de mistério, desaparecimentos, investigações e, para dar consistência ao conjunto, muita massa de padeiro. Entretanto, iremos descobrir o novo amor de Wallace numa nova personagem, Piella Bakewell e, já era altura, uma cadelinha chamada Fluffles para aquecer o coração de Gromit? make loaf not war.
Nick Park regressa aos seus amados personagens Wallace e Gromit, mais uma vez no formato curta metragem num filme com meia hora de duração. É tão sofisticado como qualquer filme que Park tenha feito até então, mas não oferece nada de novo, é quase uma repetição de "A Close Shave". 
Tal como os outros filmes da série, também foi nomeado para o Óscar de Melhor curta de animação, mas isso já seria de esperar. Também seria o último filme da série, até agora.

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domingo, 7 de julho de 2019

Madame Tutli-Putli (Madame Tutli-Putli) 2007

Madame Tutli-Putli entra no comboio da noite carregada dos mais diferentes objectos, precisamente aqueles que dão um sentido ao seu dia a dia. Inicia uma viagem da luz para as sombras, não apenas com essa pesada parafernália de memórias mas, igualmente, com uma série de fantasmas do passado.
Um filme em stop-motion surpreendente e eficaz, com um grande impacto visual. O shot de abertura detalha uma verdadeira mistura de objectos aleatórios que foram agarrados de uma vida inteira. Eles pertencem a Madame Tutli-Putli, uma esbelta figura de pano, com um rosto tão real que poderia ter sido tirado de qualquer lugar do mundo real. É de tal forma expressiva que custa acreditar tratar-se de uma boneca, e ninguém consegue ficar indiferente ao seu olhar.
Curta-metragem, primeiro filme para dois realizadores canadianos, Chris Lavis e Maciek Szczerbowski, que com a sua obra de estreia conseguiram logo uma grande notoriedade, com o filme a conseguir uma nomeação para Melhor Curta de Animação, dois prémios no festival de Cannes, enre muitos outros. Imperdível.

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Uma Noite na Cidade (Jedné Noci v Jednom Meste) 2007

"Uma Noite na Cidade", cujo argumento combina uma multiplicidade de histórias numa atmosfera de grande intensidade dramática, pode enquadrar-se nas correntes do fantástico, do absurdo e do surrealismo presentes no património cultural da República Checa e em obras cinematográficas como as do mestre Jan Svankmajer.
De um ponto de vista mais prosaico, esta obra pertence ao mundo muito particular da animação de volumes, com utilização de marionetas.
Da sua estrutura narrativa, destacamos o percurso onírico e alucinante das diferentes personagens, quer no interior de um edifício quer nos exteriores de uma cidade, quase sempre concebido a partir da observação do que realmente podia acontecer na vida quotidiana se o bizarro e o grotesco invadissem o espaço urbano. 
Este filme recebeu um dos mais generosos subsídios do governo checo destinados ao cinema, decorria o ano de 1998. Desde essa altura, a equipa liderada pelo realizador mergulhou de cabeça nesta super-produção, estreada no seu país a 23 de Janeiro de 2007. 
O realizador é Jan Balej, um dos autores de "Filmfarum 2"
* Texto de RTP

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sábado, 6 de julho de 2019

Pedro e o Lobo (Peter and the Wolf) 2006

Pedro é um rapaz discreto, solitário, impedido de ir à floresta pelo seu avô protector, tendo como seu único amigo um pato. Quando um lobo ameaça o seu amigo pato – bem como o gato gordo do seu avô e um pássaro com a asa partida de que Pedro se tornou amigo – Pedro corajosamente tenta apanhar o lobo. O Avô, o povo da aldeia e os caçadores que têm antagonizado Pedro figuram todos no desenlace final.
Pedro e o Lobo é uma história infantil contada através da música. Foi composta por Sergei Prokofiev em 1936, com o objectivo pedagógico de mostrar às crianças as sonoridades dos diversos instrumentos. Cada personagem da história (o Pedro, o lobo, o avô, o passarinho, o pato [ou pata, em algumas versões], o gato e os caçadores) é representada por um instrumento diferente. 
Suzie Templeton, de quem já tínhamos visto "Dog" neste ciclo, realizou uma adaptação moderna do conto de Pedro e o Lobo, recorrendo a animação stop-motion. É incomum na sua falta de qualquer diálogo ou narração, sendo a história apresentada unicamente com imagens e som, interrompida por períodos de silêncio sustentado. A banda sonora é executada pela Philharmonia Orchestra de Londres e o filme teve a sua estreia com um acompanhamento ao vivo da orquestra no Royal Albert Hall em Londres. 
Ganhou o Óscar de Melhor Curta de Animação. 

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Fimfárum 2 (Fimfárum 2) 2006

A sequela do filme de sucesso, "Fimfarum", que já passou por aqui neste ciclo, com histórias da autoria de Jan Werich. Quatro novas histórias para crianças inteligentes e adultos espertos.  Bretislav Pojor apresenta-nos a história do Tom Thumb, cheia de reviravoltas e aventuras. Aurel Klimt traz à vida três irmãos, os Corcundas de Damascus, recriando a atmosfera do Médio Oriente, e a variedade da narrativa oriental. Vlasta Pospisilova conta-nos s a história "Três Irmãs e um Anel", um manual rural do Decameron, sobre como encantar os entes queridos com um mero anel, e, por fim, Jan Balej deixa os seus personagens Marek e Kouba reviverem um antigo conto de fadas sobre ganância, demónios e fenómenos naturais.
Mais uma pequena pérola que nos chega da República Checa. Neste segundo filme colaboraram quatro realizadores, com Balej e Klimt a representarem a nova geração do cinema checo, enquanto que Pojar e Pospisilova a representarem os veteranos. 
Legendas em inglês.

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quinta-feira, 4 de julho de 2019

The Book of the Dead (Shisha no Sho) 2005

Baseado num romance de Shinobu Orikuchi, conta a história de Lady Iratsume, uma jovem donzela bonita e altamente cobiçada que vive na Nara do Século VIII, a então capital do Japão. Protegida por altos muros de pedra dos seus muitos pretendentes, ela passa o tempo a copiar escrituras budistas. Fixa-se em uma em particular, o Amida Sutra, e define o objectivo de fazer 100 cópias dele. Dia após dia, ela senta-se no seu lugar, ela concentra-se nas palavras do Buddha, parando apenas para olhar ocasionalmente para o Monte Fukatami, que se ergue do lado de fora da sua janela. Um entardecer ela tem uma visão…
De Kihachiro Kawamoto já tínhamos visto uma obra anteriormente neste ciclo, "Days of Winter", e se há um assunto que é comum nos seus filmes é o seu profundo interesse na filosofia budista. "The Book of the Dead" junta todas as vertentes do conhecimento, tanto domesticamente como internacionalmente, que inspiraram o realizador na sua carreira, com destaque para o budismo.
"The Book of the Dead" era a segunda, e última longa metragem de Kawamoto, que tem ainda no seu currículo uma dezena de curtas. O realizador viria a falecer cinco anos depois.
Legendas em inglês.

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terça-feira, 2 de julho de 2019

The Torchbearer (Svetlonos) 2005

O dia e a noite alternam-se incansavelmente sobre uma cidade e o seu labirinto... Até que a maquinaria de repente pára, deixando tudo numa noite eterna. O nosso herói entra no labirinto, e vai passando em todos os testes que lhe são colocados pela frente…
Sendo este filme obra do filho de Jan Švankmajer, Václav Svankmajer, poderia ser de esperar uma imitação derivada do estilo do pioneiro da animação que era o seu pai. No entanto, "Svetlonos" ilumina-se como um trabalho importante e distinto, sem dúvida um dos filmes de animação sub-30 minutos mais importantes de 2005, um ano muito rico na animação. Visualmente, tem uma forma mais clássica do que qualquer filme de Jan. Tanto a estrutura como as imagens parecem convidar a possíveis leituras alegóricas: ciclos temporais, ascensão e queda de reis, a invasão marcial de um espaço matriarcal, etc...
Os modelos são realistas, e o som é usado para assombrar. "Svetlonos" assemelha-se aos filmes dos irmãos Quay, como o sombrio "Streets of Crocodiles", ele próprio inspirado pelo pai Svankmajer, embora se possa perceber que a tecnologia avançou muito desde o filme dos irmãos Quay até 2005. 
É um filme que deve ser visto não só pelos fãs do cinema de animação, mas também por todos que permaneçam cépticos sobre o poder da animação em criar ambientes genuinamente escuros e sombrios.

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A Noiva Cadáver (Corpse Bride) 2005

"A Noiva Cadáver", de Tim Burton carrega na tradição dark e romântica do mesmo realizador de "Eduardo Mãos de Tesoura" e "O Estranho Mundo de Jack". Passado numa vila europeia do século 19, esta longa-metragem de animação conta a história de Victor (dobrado por Johnny Depp), um jovem varrido para o submundo e casado com uma misteriosa Noiva Cadáver (dobrada por Helena Bonham Carter), enquanto que a sua verdadeira noiva, Victoria (dobrada por Emily Watson), aguarda por ele, sem esperanças, no mundo dos vivos. Entretanto, quando a vida na Terra dos Mortos revela ser um pouco mais colorida do que todos imaginavam, Victor aprende que não existe nada neste mundo - ou no próximo, que possa mantê-lo longe do seu único e verdadeiro amor. O filme é um conto de optimismo, romance e uma vida depois da morte bem...viva! E contada com o estilo clássico e inconfundível de Burton.
Foi nomeado para o Óscar de Melhor Filme de Animação, que perdeu para "Wallace & Gromit: a Maldição do Coelhomem", que já vimos neste ciclo. 
Legendado em português.

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