quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014
Um Vinho Difícil (Le Beau Serge) 1958
François regressa à sua terra natal, no interior de França, depois de mais de uma década fora. Nota que a terra não mudou muito, mas as pessoas sim, especialmente o seu primo Serge, que se tornou um alcoólico. François vai tentar descobrir o que lhe aconteceu, e vai tentar ajudá-lo...
É muitas vezes esquecido que "Le Beau Serge", de Claude Chabrol, tecnicamente é o primeiro filme da Nouvelle Vague, ou pelo menos, a primeira longa-metragem a saír do grupo de críticos do Cahiers du Cinéma, que assim ajudaram a mudar os parâmetros do cinema francês, e do mundo.
Apesar de ser um filme relativamente discreto, e de ter uma narrativa bastante simples, já são visíveis algumas das principais características deste movimento, algumas das quais foram reconhecidas num artigo de François Truffaut para a Cahiers du Cinéma, que considerou logo um ponto de viragem para o cinema francês, apesar de na altura não lhe ter sido dada a devida atenção, ficou fora da competição oficial de Cannes, e demorou tempo até conseguir encontrar distribuidor. Um estudo de personalidades íntimo e pessoal, passado num cenário de Inverno da província rural francesa, Le Beau Serge foi filmado inteiramente em exteriores, em Sardent, uma pequena localidade onde tinha nascido a mãe de Chabrol, e onde o próprio realizador passou parte da sua infância, e inclusivé adolescência, durante a Segunda Guerra Mundial. A produção do filme, que incluía uma pequena equipa de filmagem, um elenco formado na sua maioria por actores desconhecidos e habitantes locais, tinha uma narrativa focada em personagens comuns em situações realistas, reflete em grande parte o Neo-Realismo, pelos quais os críticos do Cahiers eram admiradores. Chabrol tinha 27 anos na altura, e nunca tinha aprendido a fazer um filme, não se limitou apenas às influências do neo-realismo, mas também incorporou alguns aspectos do expressionismo, e uma obsessão com a natureza da culpa, que para Chabrol era um dos factores mais importantes da filmografia de Hitchcock, sobre quem o realizador tinha recentemente escrito um livro, em conjunto com Eric Rohmer.
Filmado pelo director de fotografia Henri Decaë, que tinha começado a trabalhar com Jean-Pierre Melville, e que de futuro trabalharia muito com os realizadores da Nouvelle Vague, é um filme muito negro, directo, que apresenta personagens profundamente complicadas, mas com um forte senso de compaixão e graça. Chabrol não suaviza o alcoolismo de Serge, ou o monstro que desperta dentro dele, e age abusivamente perante Yvonne, humilhando-a perante outras pessoas, e rejeitando as tentativas de François o querer ajudar, com um sentimento de desprezo que circunda o patológico. Chabrol deixa claro que Serge é uma alma sofredora, e os momentos finais dão-lhe o que poderia ser interpretado como uma chance de redenção, uma segunda hipótese de criar uma nova vida.
Em alguns momentos, evoca um sentimento sombrio e profundamente sentido da humanidade, a tentar fechar a lacuna criada entre François e Serge, e de certa forma curar os males na vida de Serge. É tentador ver as acções de François impulsionadas em primeiro lugar por um sentimento de culpa, e depois por um sentimento primordial de amor, que o obriga a continuar a tentar. Jean-Claude Brialy interpreta da melhor forma François, enquanto Gérard Blain é Serge.
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