Ozu, o cineasta do quotidiano, da beleza da simplicidade, dos pequenos gestos e das suas compreensões, dos erros e da aprendizagem da vida. Ozu, o cineasta da sinceridade, porque o seu cinema é o mais sincero de todos, o mais leal à vida, à semântica da vida (o que quer que seja que isso signifique), coisa mundana, coisa que irrompe da realidade e das pequenas (grandes) questões da vida.
Ozu, o cineasta da serenidade, nada no cinema se compara a esta serenidade, ainda que toda ela se veja envolta pela azáfama da vida, pelos problemas da realidade, do dia-a-dia, ainda que em todos eles (os seus filmes) brote ou a tragédia ou a traição ou a velhice ou o desemprego ou qualquer outra coisa que advém do realismo e das suas contrariedades. Ozu, o cineasta do optimismo, da transcendência da vida e do seu valor, do humano, da dádiva que é uma vida. Ozu, o mestre japonês.
Sôshun, filme do recomeço, dos erros e do perdão. Monumental. O filme em que Ozu faz dois movimentos de câmara, naquele corredor da empresa, sempre com destino à porta do escritório de Shoji, o filme em que mais do que nunca Ozu faz uma crítica social, em que o modo de vida do pós-guerra é posto em causa, o filme em que mais do que nunca Ozu se preocupa com as relações conjugais, aqui as dos funcionários, em como tudo isso traz o tédio, a insatisfação e a alienação dessas relações. Sôshun é o filme em que Ozu tira os jovens de casa, dá-lhes emprego e uma vida familiar autónoma, longe dos pais, o começo da sua família, é o filme em que a melancolia da separação dá lugar à melancolia social e laboral que afecta a conjugal/familiar, os erros daqueles jovens inexperientes que restaram da guerra, o recomeço e a remissão. A vida, nada mais que a vida.
Texto de Álvaro Martins. Daqui.
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