sexta-feira, 7 de junho de 2019

Few of Us ( Few of Us) 1996

Entramos no mundo intrigante de Sharunas Bartas, no cinema estático dum cineasta que não se preocupa com diálogos, que os evita, que procura fazer transparecer emoções pela imagem, pelo som, pela linguagem corporal. Num cinema cru, rude, estático e introspectivo, Bartas filma uma árida zona fronteiriça da Sibéria onde Yekaterina Golubeva, actriz fetiche de Bartas, é largada por um helicóptero e colhida por um tanque. A partir daqui tudo se mistura, nada se distingue. Bartas faz um filme completamente enigmático, abstracto. “Few of Us” vive desse enigma, dessa forma peculiar de Bartas fazer cinema, da lucidez com que Yekaterina vagueia por uma região que aparenta viver num primitivismo extremo, isolada numa cultura que não é a sua, colmatada com um acto de violência que a faz fugir daquela região ou aldeia e continuar a vaguear. De facto, não há explicações no cinema de Bartas, na forma como conduz a obra. O lituano procura sobretudo exprimir as emoções do actor/personagem. Ele não se mostra interessado em fazer uma história linear, em contar uma história com princípio, meio e fim. Não, Bartas quer espremer sensações, pensamentos e emoções escondidos nos olhares, nas acções, no ambiente, nos ruídos, na natureza. Ele não se preocupa nem nos pretende explicar o porquê dela vaguear por ali, não há razão para tal, simplesmente vagueia. Somos confrontados com o seu percurso e é isso que nos interessa, a sua jornada naquela aldeia, naquela cultura primitiva e agressiva que a faz vaguear ainda mais. Não precisamos saber mais. E é isso que Sharunas Bartas nos mostra, esse percurso que retracta uma ambiguidade moral e uma desolação humana numa terra de ninguém sempre de forma estática, rude e peculiar que só ele alcança.
Texto do Álvaro Martins. Daqui 

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