segunda-feira, 30 de junho de 2014

A Voz do Desejo (Baby Doll) 1956



A viver em Tiger Tail County, Mississippi, Archie Lee Meighan um homem de meia idade, e a jovem de 19 anos "Baby Doll" Meighan, estão casados há quase dois anos. O casamento não é baseado no amor, mas em obter o que precisam um do outro. Segundo o acordo que fizeram têm de consumar o acto do casamento quando ela fizer 20 anos, o que vai acontecer em três dias, o acto para o qual Baby Doll não está preparada, pois não está minimamente atraída por Archie. A sensualidade de Baby Doll provoca os outros homens, e eis que surge na vida deste casal Silva Vacarro (interpretado por Eli Wallach).
Esta adaptação do romance "Baby Doll", de Tennessee Williams, é possivelmente o filme mais sujo, e mais sexual, sem conter um único momento de nudez, ou mesmo uma única linha no diálogo de cariz sexual. A heroína do mesmo nome, é uma jovem virginal e infantil, de 19 anos de idade, interpretada pela sensual Carroll Baker, casada com um falhado dono de uma plantação (Karl Malden)
A implementação da tensão sexual no filme é magistral, empurrando para os limites na tela, na altura. No centro do filme está aquilo que podemos chamar de uma cena de sexo, alcançada inteiramente através de uma conversa entre Vacarro e Baby Doll. A câmera de Kazan aproxima-se progressivamente, à medida que o diálogo se altera, para motivações mais pertinentes, e a urgente sexualidade desta cena é expressa inteiramente na face angelical de Baker, e no sorriso maroto de Wallach. O valor gerado por estes dois é palpável, e a cena funciona gradualmente como um longo caminho para um orgasmo.
Tennessee Williams e Elia Kazan tinham trabalhado juntos cinco antes, em Um Eléctrico Chamado desejo, e as expectativas eram altas. Enquanto foi um fracasso financeiro derivado da controvérsia, também recebeu bastantes criticas favoráveis. Foi nomeado para 4 Óscares, incluindo uma para Carroll Baker, então com 21 anos, e para o próprio Tennessee Williams na autoria do argumento.

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domingo, 29 de junho de 2014

Recordar Eli Wallach

Um actor magistral, famoso pela sua versatilidade, durante mais de 60 anos experimentou um pouco de tudo no campo das interpretações, desde o teatro surrealista, a papéis de mafioso italiano, ou vilão. Foi como vilão que ficou mais conhecido, por dois papéis de mexicano que fez em dois westerns - "O Bom, o Mau e o Vilão", e "Os Sete Magníficos".
Um favorito de Tennessee Williams, Wallach tinha uma carreira distinta no teatro antes do seu talento passar para o cinema, a sua pronuncia de Brooklyn levou-o a ser escolhido para inúmeros papéis de vilão. Um dos primeiros produtos do pós-guerra da escola do "Método", os seus personagens eram nervosos, intensos, introspectivos e pensativos. Baixo, escuro, de sobrancelhas carregadas, ele podia sugerir grandes reservas de poder infundidas nas suas interpretações com uma força escondida.
Nunca foi nomeado para um Óscar, mas a Academia reconheceu a sua carreira no final de 2010, entregando-lhe o Óscar honorário pela “desenvoltura inata com que interpretou uma variedade de personagens, ao mesmo tempo que deixou uma marca inimitável em cada papel”. Chamou-lhe então “um camaleão por excelência”.
Eli Wallach morreu na semana passada, com a idade de 98 anos. Uma carreira inigualável no cinema e no teatro, que iremos homenagear esta semana. Escolhi cinco dos seus filmes mais marcantes. Já tinhamos por cá dois filmes seus, aqui. Vou actualizar o link do "Os Inadaptados" esta semana.



 A programação desta semana:

Segunda: Baby Doll (1956), de Elia Kazan

Terça: The Lineup (1958), de Don Siegel

Quarta: Os Sete Magníficos (1960), de John Sturges

Quinta: Lord Jim (1965), de Richard Brooks

Sexta: O Bom, o Mau, e o Vilão (1966), de Sérgio Leone

sábado, 28 de junho de 2014

Final Episode (Jingi Naki Tatakai: Kanketsu-hen) 1974

Kinji Fukasaku começou a saga The Yakuza Papers com a história de um jovem gangster a tentar sobreviver no pós-guerra de Hiroshima. Mas com "Final Episode", o último capítulo, ele faz um olhar solene para trás para um império criminoso lentamente em colapso, sob o peso do seu próprio veneno. Embora não fiquemos com uma sensação de encerramento, como seria de esperar, Fukasaku encerra "Final Episode" com muita experiência adquirida, garantindo que a conclusão do seu conto épico seja tão convincente como o início.
Enquanto "Battles Without Honor & Humanity" começara no rescaldo da bomba atómica, "Final Episode" começa no aniversário de ocasião tão fatídica. Os anos setenta chegaram, e os gangs da Yakuza que antes governavam em Hiroshima e outras cidades ao longo do país, foram forçados a tomar uma atitude menos ofensiva. Graças às revoltas do povo contra as suas atitudes violentas, as familias mafiosas assumiram estruturas mais corporativas, reorganizando-se em grupos políticos, como a coligação Tensei. Mas, assim como muitos Yakuzas estavam ansiosos por abandonar as suas vidas de gangsters do passado e começar de novo, o fascinio do poder, e os ressentimentos do passado, eram demais para se arrependerem. A coligação Tensei depressa se tornou uma casa dividida, mas a acção continua a circular à volta de Shozo Hirono (Bunta Sugawara). Depois de passar algum tempo na cadeia a escrever as suas memórias, Shozo vai ser libertado em breve...
Ao longo da série muito protagonismo foi dado a Shozo. Tanto que grande parte da história é contada da sua perspectiva, mas os filmes tornavam-se muito mais interessantes quando ele não estava por perto. Com "Final Episode" acontece exactamente isso. Apanhando a acção onde "Police Tactics" tinha terminado, Shozo passa a maior parte do tempo a cumprir pena na prisão. Os eventos que ele previu, dos seus antigos companheiros guerreando entre eles, estão perto de passar, numa história que não requer grande input do seu protagonista. Fukasaku mostra-se mais preocupado com o grande filme que tem em mãos, trazendo à superfície temas que vinha a preparar desde o início. "Final Episode" é uma obra menos pessoal, um mosaico mostrando como as implicações trágicas que uma vida do crime trás, faz efeito em todos os envolvidos, desde o maior dos patrões ao mais dispensável dos bandidos.
"The Yakuza Papers" tem sido comparado ao Padrinho de Coppola, ambos contam histórias da inocência perdida, de pessoas normais, cujas vidas foram mudadas para sempre. Este foi um final em beleza. Acabava aqui a saga.
Legendas em inglês.

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quinta-feira, 26 de junho de 2014

Police Tactics (Jingi Naki Tatakai: Chojo Sakusen) 1974

Enquanto os três primeiros filmes retratavam a vida criminosa no Japão, numa luta violenta pelo poder, este posicionava-se numa direcção diferente. A ilusão de honra que estes guerreiros levaram anos a manter, começava a dissipar-se, deixando o cadáver de muitos gangsters no seu rasto. O castelo de cartas começava a entrar em colapso com toda a fúria que se tinha tornado a marca deste franchise, e "Police Tactics" está lá para capturar cada segundo trágico.
Seguindo os eventos de "Proxy War", o veterano da Yakuza Shozo Hirono (Bunta Sugawara) desembarcou em águas quentes, entre os seus irmãos criminosos. Com a familia Muraoka a continuar a expandir o seu império sob a liderança de Yoshio Yamamori (Nobuo Kaneko), Shozo continuar a guardar um rancor de década contra o seu antigo líder. Infelizmente, esta raiva resultou numa guerra prolongada entre os chefes de várias familias, que estão ansiosos por lhe pôr um fim. Mas, como se vinganças de longa data não bastassem, estes clãs estão sob pressão de outra fonte: a lei. Com o povo a revoltar-se contra as actividades violentas da Yakuza, a policia começou a reprimir as actividades no submundo do crime, usando a imprensa para angariar ainda mais apoio. Os mais velhos da Yakuza esperam um fim pacífico para tal tumulto, mas os mais violentos esperam dar-lhe um fim tão brutal como começou...
"Police Tactics" desde o início que deixa claro que esta saga está a chegar ao final. A mudança está definitivamente no ar, e o exemplo disso é o destaque que a polícia tem neste episódio. Nos capítulos anteriores o foco era quase todo em Shozo e no seu gang, mas aqui, os polícias decidem que realmente basta de guerras. Eles são mostrados como uma ameaça onipresente, uma força sem rosto, que trabalha contra e a favor da história. É interessante o modo como é adicionado o perigo constante aos homens da Yakuza, mas também seria mais interessante se a polícia tivesse uma figura única que a representasse. Mas, Fukasaku transmite bem o seu ponto de vista, e de forma consistente, lembrando os personagens que o momento para pagar os seus pecados está próximo.
Tal como em "Deadly Fight in Hiroshima", a história de Shozo Hirono passa a ser mais secundária, mas o filme acaba por ser bem mais interessante que o anterior.
Legendas em inglês.

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quarta-feira, 25 de junho de 2014

Proxy War (Jingi naki tatakai: Dairi sensô) 1973

Depois de dois filmes consecutivos, Kinji Fukasaku trouxe ao mundo uma visão um pouco esgotada sobre o mundo da Yakuza, como sequência de  "Battles Without Honor & Humanity" e "Deadly Fight in Hiroshima", os dois primeiros capítulos da saga The Yakuza Papers. Os dois primeiros filmes funcionaram bem porque eram filmes baseados no caos, que se focavam em determinadas figuras com interessantes histórias para contar. "Proxy War", por outro lado, não tem o coração que os seus antecessores tiveram. Existe como mais uma entrada na série, um pouco estagnada, que diminui um pouco a velocidade da saga.
A terceira entrada dos Yakuza Papers, traz a acção e a carnificina para os anos sessenta. Shozo Hirono (Bunta Sugawara) é uma vez mais a figura central, agora já um veterano da Yakuza, e com a sua própria familia dentro da máfia. A sua situação torna-se ainda mais dolorosa quando por força da situação se vê mais uma vez obrigado a aliar-se a Yamamori (Nobuo Kaneko), o criminoso que pensava que finalmente tinha deixado para trás. Hirono concorda em adoptar um punk loser no seu clã, e fazer dele um homem. Os problemas surgem quando o seu gang se junta a outro clã, o que faz com que alguns membros se sintam menosprezados, e começam uma guerra entre o próprio gang.
Tal como nos filmes anteriores da série, existem muitos chefes, sub-chefes, e todo o tipo de vilões que nem sequer interessam para a história. Este tipo de personagens basicamente existem como carne para canhão. No entanto, há alguns momentos a ter em atenção, onde a violência de Fukasaku está patenteada, e merecem uma olhada. Numa certa cena, a um membro do gang é dito para cortar o dedo, para atenuar os seus erros. Ele sente-se tão culpado, que acaba por cortar a mão inteira. É uma sequência forte, que não chega para salvar o filme, mas pelo menos, serve para manter as coisas interessantes.
Ainda assim, o fantástico primeiro acto, e a personagem de Sugawara são dois factores muito interessantes do filme, e que mantêm os espectadores interessados em seguir o resto da história, nos próximos filmes.
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terça-feira, 24 de junho de 2014

Deadly Fight in Hiroshima (Hiroshima Shitô Hen) 1973



A última vez que vimos  Shozo Hirono (Bunta Sugawara), ele tinha se despedido da familia do crime que lhe tinha causado tanta dor e angustia. Em "Deadly Fight in Hiroshima" vamos apanhá-lo na prisão, a fazer amizade com Yamanaka (Seizo Fukumoto), um gangster violento. Não muito tempo depois Yamanaka é libertado, e vai embrulhar-se mo mundo do crime, a Yakuza, cruzando no caminho do brutal Katsutoshi Otomo (Shinichi “Sonny” Chiba). Depois de ser derrotado por Otomo e os seus homens, Yamanaka começa a criar um gang rival, para cumprir vingança, e ganha o respeito pelo boss do crime Muraoka (Hiroshi Nawa).À medida que a rivalidade entre Muraoka e Otomo aumenta, Shozo tenta, em vão, tirar os seus homens do meio do caminho, mas ele já está numa guerra que ameaça dividir Hiroshima.
O primeiro filme dos Yakuza Papers, "Battles Without Honor & Humanity" era uma grande peça de cinema, mas não perfeita. O seu maior problema era dar demasiada ênfase a  Shozo como protagonista. Com um elenco bastante extenso, "Battles" perdia algum fulgor quando Shozo não estava por perto, talvez porque as restantes personagens não eram tão importantes. "Deadly Fight in Hiroshima" rectifica este problema, fornecendo não um, mas três personagens centrais. Shozo está de volta, continua a ser uma personagem importante na história, mas o tempo que passa no ecran é muito mais reduzido. Por outro lado, temos Yamanaka, à volta de quem gira muita acção, e que é interpretado com grande intensidade por Fukomoko. Com a história de Shozo em segundo plano, Fukasaku traz-nos a história de mais um recém chegado à Yakuza, que aprende que a vida de gangster não é fácil em Hiroshima. A jornada de Yamanaka vem com um toque de tragédia com as suas esperanças de um futuro com a sobrinha de Muraoka ( (Meiko Kaji, de Lady Snowblood) a desaparecerem à medida que ele mergulha no submundo do crime.
Mas a grande estrela do filme é o mafioso de Sonny Chiba. A interpretação de Chiba é a própria definição da desinibidade, saltando pelo ecrã com uma enorme sede de sangue, e uma alegria maníaca.  Katsutoshi é o máximo de frenético que poderia ser, um homem raramente visto sem os seus óculos escuros, ou o seu chapéu de "badass", além de passar a maior parte do tempo a esfaquear, ou a disparar contra as pessoas. 
 "Deadly Fight in Hiroshima" é uma das raras sequelas que realmente avança com a história, ao invés de usar a mesma premissa. Sozinho, é um filme intenso e animado, mas para a série a que pertence, deixa-nos ansiosos para ver o que vem a seguir.
Legendas em inglês.

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segunda-feira, 23 de junho de 2014

Battles Without Honor & Humanity (Jingi Naki Tatakai) 1973



A acção começa nas ruas de Hiroshima, um ano depois do Japão se ter rendido às forças aliadas, na Segunda Guerra Mundial. O caos superior reina, com as pessoas a tentarem viver numa sociedade sem regras. É neste ambiente que vamos encontrar Shozo Hirono (Bunta Sugawara), um homem que apenas quer chegar vivo ao dia seguinte. Depois de uma briga na prisão Shozo faz amizade com um bandido preso ((Tatsuo Umemiya), que o promete ajudar em troca deste o ajudar a saír da prisão. Shozo consegue ajudá-lo, e assim começa a sua ascenção na hierarquia da Yakuza, colhendo as recompensas monetárias e carnais de trabalhar ao serviço de um chefe próspero ( (Nobuo Kaneko). Mas Shozo também vai descobrir que a vida de gangster não é segura, com a sua vida constantemente ameaçada por causa de uma competição dura.
É interessante observar como a vida de gangster evoluiu desde os primórdios do cinema. No passado longínquo essas figuras eram retratadas com grande glamorização,  dando a idéia de que era o tipo de vida que muitas pessoas dariam um braço para ter. Mas nos anos 70, alguns realizadores começaram a explorar o lado trágico do mundo do crime, com o japonês Kinji Fukasaku a liderar, primeiramente com este grande "Battles Without Honor & Humanity". Não há nada de romântico no modo com que Fukasaku aborda o assunto, contando uma história muito frenética na qual os personagens lutam por alguma dignidade, num mundo onde não há nada a ser encontrado.
A primeira coisa que vamos reparar, é no seu estilo extremamente frenético. Mal o filme começa, somos atirados para o meio da loucura, os primeiros dez minutos contam com uma tentativa de violação, espancamentos brutais, e também dois braços cortados. Kinji Fukasaku nunca permite que fiquemos muito confortáveis com o ambiente, batalhas têm lugar numa paisagem volátil, onde não há espaço para descansar. Através de uma fotografia vertiginosa, muitas personagens e explosões de violência regulares, ficamos a conhecer o que é a vida de um yakuza, e com toda a certeza não é uma vida fácil.
Tal como Akira Kurosawa revolucionou o filme de samurais, Fukasaku desenvolveu o género Yakuza, em grande parte por causa deste "Battles Without Honor & Humanity". Não tem aquele estilo limpo de "Scarface" ou "Goodfellas", mas a sua ferocidade e realismo são muito evoluídas, e poucos filmes sobre a Yakuza chegaram perto daqui.
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domingo, 22 de junho de 2014

The Yakuza Papers

Antes dos filmes de gangsters de Kinji Fukasaku os filmes sobre a Yakuza tinham tendência a ser versões modernas de épicos históricos de samurais, com os mafiosos japoneses a agirem sem princípios de lealdade. Fukasaku contrariou esta tendência criando o "jitsuroko": histórias de gangsters japoneses inspiradas por "O Padrinho", de Coppola, e também pela violência nas ruas de "Os Incorruptíveis Contra a Droga", de William Friedkin.
Entre 1973 e 74 Fukasaku fez uma série de cinco filmes, conhecidos alternadamente como "The Yakuza Papers" ou "Battles Without Honor & Humanity" (o título do primeiro filme da série), traçando as complicadas redes do crime na cidade de Hiroshima, desde 1946 a 1970. No mundo de Fukasaku, a Yakuza adere aos códigos de honra quando é do seu interesse, mas quando é preciso também mata indiscriminadamente.
Fukasaku começa esta série de filmes com um still da explosão atómica, estabelecendo estes filmes como uma crítica à geração que nasceu dos escombros da Segunda Guerra Mundial. Ao longo da série, os personagens referem a guerra várias vezes, como no segundo filme "Deadly Fight In Hiroshima", onde o herói deseja ter sido um piloto kamikaze. A série começa num campo de refugiados em 1946, onde um grupo de jovens se envolve no mercado negro, e se aliam às "famílias" do crime, na região.Bunta Sugawara é o mais duro de todos, e vê o idealismo dos seus amigos ser engolido pela necessidade de trabalho. Nas horas seguintes a história pouco muda. Durante 25 anos as famílias trocam lealdades e matam-se, enquanto Sugawara, no papel da personagem que vamos seguir,  tenta fazer o melhor para se manter fora das lutas.
No Japão, estes filmes bateram recordes de bilheteira. A sequência que vamos ver é a seguinte:

Segunda: Battles Without Honor and Humanity (1973)

Terça: Deadly Fight in Hiroshima (1973)

Quarta: Proxy War (1973)

Quinta: Police Tactics (1974)

Sexta: Final Episode (1974)

Para abrir o ciclo, tenho aqui uns presentes para vocês:

1.Filme americano "The Yakuza", de Sydney Pollack. Uma visão americana sobre o mundo da Yakuza. Aqui.
2. Documentário japonês: Jitsuroku - Reinventing a Genre. Aqui
3. Fukasaku and the Art of Violence. Aqui


sábado, 21 de junho de 2014

O Homem Que Veio de Longe (The Man From Laramie) 1955



O misterioso Will Lockhart (James Stewart) entrega mantimentos à lojista Barbara Waggoman, no Coronado, uma cidade isolada no território Apache. Em pouco tempo ele envolve-se numa disputa com Dave Waggoman, filho do rancheiro autocrata Alec, e primo de Barbara. Mas ele permanece na cidade, a sua presença é um catalisador para a mudança da vida nas pessoas, procurando alguém que não sabe quem é, e que anda a vender armas aos Apaches.
Lockhart tem a vingança na sua mente, e a primeira parte do objectivo é descobrir quem vendeu as armas aos Apaches. O seu irmão mais novo fazia parte de um grupo que foi embuscado pelos Apaches, e morto. Lockhart também é um militar respeitável, mas de forma inteligente cria uma dupla identidade a fim de cobrir as suas origens. Este tema de duplas identidades já se repetia na série de filmes que temos vindo a acompanhar, entre Mann e Stewart. Stewart encarna o paradoxo de ser etica e moralmente correcto e ao mesmo tempo um assassino treinado, com uma enorme desenvoltura. Lockhart é imparável porque tem a sua vingança justificada, e nunca perde de vista o seu objectivo apesar de um enorme número de obstáculos que vão aparecendo pelo caminho. O primeiro é a bela Barbara Waggoman (Cathy O'Donnell),  o segundo é Dave Waggoman (Alex Nicol), o sádico filho do barão do gado Alec Waggoman (Donald Crisp).
De um ponto de vista estrutural, este, e os outros filmes entre Mann e Stewart eram westerns clássicos. Não tinham nada de excepcional em termos das suas narrativas a não ser a rica caracterização das personagens, os estados psicológicos, as motivações, e os argumentos que eram raramente vistos em westerns. Eram filmes obscuros com um interesse permanente no que se passava nos corações dos homens e das mulheres. "The Man from Laramie" foi a última colaboração entre os dois, em termos destes westerns psicológicos, e continua como um dos grandes westerns dos anos 50, e merece ser relembrado.

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quinta-feira, 19 de junho de 2014

Terra Distante (The Far Country) 1954



Em 1896 Jeff Webster (James Stewart) vê o inicio da corrida ao ouro de Klondike, como uma boa oportunidade para fazer uma fortuna em carne...e ai de alguém que se meta no seu caminho. Ele dirige um rebanho de gado de Wyoming para Seattle, por navio para Skagway, e (depois de um atraso causado pelo boss da cidade Gannon) através das montanhas para Dawson. Aí, ele e o parceiro Ben Tatum (Walter Brennan) entram eles próprios na corrida ao ouro. Duas mulheres encantadores apaixonam-se por Jeff, mas eles acredita na velha máxima, cada homem por si próprio...
Tal como Bend of the River ou Winchester 73 a narrativa segue por vários caminhos inesperados até ao duelo final, mas é o que menos interessa num filme onde brilham diversas personagens e o tema da civilização a ultrapassar a fronteira. Mesmo numa pequena e isolada comunidade mineira os seus moradores sonham fazer dela uma "verdadeira cidade", com uma escola, uma igreja, e um xerife. Os locais não gostam de Ronda porque ela atrai o tipo errado de pessoas. Ironicamente pretendem que Jeff venha a fazer parte da comunidade, mas este rejeita. Talvez porque ele resista à ideia de a civilização conquistar o Oeste. Tal como Ben aponta, Jeff anda sempre de lado para lado, prometendo um dia assentar, mas nunca o faz. Só quando sofre uma perda muito pessoal decide tomar medidas contra Gannon, e fazer parte da comunidade. John McIntire destaca-se de entre um excelente elenco, trazendo bastante charme para o vilão de serviço, naquele que é provavelmente o seu melhor papel em anos (incluindo o de xerife em Psycho).
O realizador Anthony Mann está no topo da sua forma, mais uma vez, com uma bela fotografia de William H. Daniels, contrastando as montanhas cobertas de neve, com as ruas enlameadas das cidades feias. Mas são os pequenos detalhes, como o sino na sela de Jeff que tornam "The Far Country" memorável. Temos de esperar até aos minutos finais para Mann revelar a importância deste pequeno sino (representará a comunidade?).
Seria a última colaboração entre Mann e o argumentista Borden Chase, que já tinha escrito o argumento para Winchester 73.

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quarta-feira, 18 de junho de 2014

Esporas de Aço (The Naked Spur) 1953



Um rancheiro (James Stewart) regressa a casa depois da Guerra Civil, para descobrir que a sua noiva vendeu a quinta e fugiu com o dinheiro. Desolado ele tenta ganhar a recompensa para um assassino astuto e manipulador (Robert Ryan), para assim poder recuperar a sua quinta, e vai ver-se no meio de uma trama com um prospector (Millard Mitchell), um ex-soldado (Ralph Meeker), e a namorada confusa do seu alvo (Janet Leigh).
Os westerns de Anthony Mann são duros moralmente e estilisticamente emocionantes, e "The Naked Spur" é um dos seus melhores, menos directo do que o tradicional "bom vs mau" de "Bend of the River" e "The Far Country", e um pouco menos pretensioso do que os seus filmes shakesperianos, como "The Man From Laramie". É um filme todo passado na vida selvagem, longe das cidades, onde os personagens são despidos pelos acontecimentos violentos, para revelarem a sua verdadeira natureza.
Além do argumento perfeito, Mann conta com um sentido visual magistral, elevando a câmera até ás rochas, e mostrando a violência na nossa cara. A câmera em Technicolor de William Mellor absorve o belo, mas perigoso cenário, dando ao filme uma paisagem psicótica. Os protagonistas deste filme de Anthony Mann, mais uma vez deixam que o seu desejo por vingança consuma as suas qualidades inerentes de honra e decência. A jornada torna-se um processo quase religioso de revelação, que finalmente permite a um deles amargamente alcançar o estado de graça.
Conseguiu uma nomeação para o Óscar de Melhor Argumento, para Sam Rolfe, e Harold Jack Bloom.

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terça-feira, 17 de junho de 2014

Jornada de Heróis (Bend of the River) 1952



Dois homens com um passado questionável, Glyn McLyntock (James Stewart) e o amigo Emerson Cole (Arthur Kennedy), conduzem um grupo de colonos do território do Missouri para o Oregon. Fazem um acordo às portas de Portland já que com o Inverno a chegar. É necessário que McLyntock e Cole resgatem e entreguem comida e suprimentos detidos por oficiais corruptos.
Em Bend of the River é-nos imediatamente mostrado que James Stewart é um homem com um passado a esconder, alguém que já foi quase enforcado, e sobreviveu. Numa cena chocante, Stewart está quase a esfaquear um homem, quando é impedido por um grito de Julia Adams. Mais tarde, depois dos seus homens tomarem conta dos vagões de suprimentos e estarem prestes a deixá-lo para trás, ouvimos a seguinte quote: "You'll be seein' me. Every time you bed down for the night, you'll look back in the darkness and wonder if I'm there. And some night I will be. You'll be seein' me." O público estava habituado a vê-lo na personagem de "It's a Wonderful Life", e que Hitchcock iria levar ao extremo alguns anos depois, especialmente em "Vertigo", mas este Stewart era uma figura completamente diferente.
Com "Bend of the River" Mann transportava a violência intensa dos seus noirs dos anos 40 (como "Raw Deal" e "Border Incident"), para um novo género, que proporcionava um estilo mais limpo. A simplicidade e a clareza destes cinco westerns tornariam Stewart primordial, com personagens complexas, chocantes e fascinantes. E como era habitual nos filmes de Mann, há muitas sequências sem palavras, de narrativa puramente visual.
"Bend of the River" era baseado no livro "Bend of the Snake", de Bill Gulick, primeiramente publicada em 1952. Gulick escreveu uma série de livros, dois deles originaram westerns. Este seria o primeiro, o outro “The Hallelujah Trail” originou um filme do mesmo nome, realizado em 1965 por John Sturges. Um bom elenco secundário, que além de Arthur Kenendy contava com Julie Adams, Rock Hudson, Jay C. Flippen e Harry Morgan.

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Winchester 73 (Winchester '73) 1950



Num concurso de tiro ao alvo, Lin McAdam (James Stewart) ganha uma espingarda premiada, que é imediatamente roubada pelo segundo classificado Dutch Henry Brown (Stephen McNally). Este filme segue a história dessa espingarda, uma Winchester de 1873, e segue a busca de McAdam para a obter de volta, com ela a percorrer o filme mundando de mão em mão até um duelo final, num percepício das montanhas rochosas.
Este foi o primeiro na série de cinco westerns de sucesso consecutivos, da dupla Anthony Mann e James Stewart, que apareceu na altura certa para o actor. Stewart estava preocupado com o desenvolvimento da sua carreira, depois de uma série de flops consecutivos no pós guerra. Eram westerns muito menores do que os da dupla Ford/Wayne, filmes excitantes, cheios de acção, muito pessoais, e largamente focados nas personagens.
"Winchester '73" é muitas vezes considerado o melhor filme desta dupla, rodado a preto e branco e quase sem falhas. Foi um filme que mudou muito a personalidade Stewart enquanto actor, pois fê-lo passar de personagens mais amistosas e românticas, para personagens mais maduras e astutas. Anthony Mann também viu a sua carreira a mudar completamente o rumo, e para melhor. Mais habituado a filmes negros de série B, passava a fazer filmes com um balanceamento completamente diferente. A transição de Mann do noir para o western foi muito bem conseguida, conseguindo levar algumas características do Noir para o território do western que não eram muito habituais, dando um toque perverso ao mais americano dos géneros.
O filme contava com um belo elenco de secundários: Shelley Winters, Dan Duryea, Stephen McNally, Will Geer (como Wyatt Earp), e uns novatos Rock Hudson e Tony Curtis, mas é a personagem vingativa de Stewart que leva o filme.

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domingo, 15 de junho de 2014

Os Westerns Psicológicos de Anthony Mann e James Stewart



Enquanto lendária figura do cinema mundial, James Stewart é provavelmente mais conhecido pelos três filmes que fez com Frank Capra, ou pelos quatro que fez com Alfred Hitchcock. Mas além disso ele teve uma colaboração igualmente frutífera com um realizador então pouco conhecido: Anthony Mann. Mann e Stewart trabalharam juntos em oito filmes, mas foi o quinteto de westerns que eles fizeram na primeira metade da década de 50, que ajudou a redefinir a imagem de Stewart perante as audiências, e a de Mann perante os críticos, primeiro na Europa, e depois nos Estados Unidos. Tendo sido êxitos de bilheteira, estes westerns ficaram conhecidos por várias razões: a bela fotografia graças a exelentes exteriores, grandes sequências de acção, uma vontade de explorar temas adultos e complexidades psicológicas, já que neste quinteto de filmes Stewart encara sempre personagens neuróticas, obcecadas pela vingança. A fúria do herói, na comunidade e na família.
Esta aliança entre Mann e Stewart, tal como a parceria entre Ford e Wayne, é uma das colaborações mais importantes entre realizador e estrela, não apenas no western, mas em toda a história do cinema.
Esta semana vamos ver os cinco westerns desta dupla:

Segunda: Winchester '73 (1950)

Terça: Bend of the River (1952)

Quarta: The Naked Spur (1953)

Quinta: The Far Country (1954)

Sexta: The Man From Laramie (1955)

sexta-feira, 13 de junho de 2014

A Cerimónia (Gishiki) 1971



Os flashbacks de Masuo no tempo presente, permite-nos visualizar a fortuna da familia Sakurada, onde Masuo pertence, e por sua vez, isso reflecte a história do pós-guerra do Japão: tal é a intenção ambiciosa de "Gishiki". É um filme complicado no seu conteúdo, quase underground. Começa com Masuo (Kenzô Kawarasaki) e o primo Ritsuko (Atsuko Kaku) a fazerem planos urgentes para viajar para uma ilha ao largo da costa de Kyushu para descobrirem se alguém chamado Terumichi cometeu suicídio. Oshima não nos dá qualquer indicação de quem é este Terumichi excepto Masuo afirmando na sua narração em voiceover que se Terumichi não tivesse entrado nas suas vidas, eles agora seriam umas pessoas diferentes. A partir daqui, Oshima conta-nos a história em flashbacks para preencher as lacunas.

O filme acompanha o destino e os infortúnios da família Sakadura desde 1946 até à década de realização do filme, através das diversas cerimónias que vão tendo lugar: funerais, casamentos e reuniões. Através do uso magistral dos flashbacks, Oshima revela o passado negro dos Sakadura - expondo os seus antecedentes comunistas e militaristas, os criminosos de guerra e os empresários arrivistas, os atletas ilustres e os patriarcas suicidas – e a sua contribuição para a ascensão económica, bem como para o escalar de um sentimento de embaraço social que grassou no Japão do pós-guerra.
A lógica narrativa fragmentada, apoiando o interrogatório social e representações sublimadas da sexualidade pervertida, "Gishiki" é uma sátira provocadora sobre a natureza amorfa da moderna identidade japonesa que só poderia ter sido forjada na esteira da crescente desilusão de Nagisa Oshima, com a impotência do movimento de esquerda. Este sentimento de destino frustrado e sentido ambivalente dão lugar em uma rápida alteração da paisagem social. 
 Legendado em inglês.

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quinta-feira, 12 de junho de 2014

O Menino (Shônen) 1969



O rapaz (Tetsuo Abe) tem 10 anos de idade. Ele viaja por todo o país com o pai (Fumio Watanabe), a madrasta (Akiko Koyama) e um jovem irmão (Tsuyoshi Kinoshita). O pai reclama que os ferimentos da guerra, e os diabetes, o impedem de trabalhar, então encontra uma maneira de gerar dinheiro. A madrasta atira-se para a frente de carros que vão a passar e finge-se magoada, para o pai intimidar o motorista para lhe dar um valor em dinheiro. Até que um dia a madrasta fica mesmo lesionada, e descobrem que o rapaz é uma vítima mais rentável...

A trémula bandeira japonesa flutua num silêncio impotente contra um fundo em Technicolor, as paisagens urbanas, lançando um olhar triste no declínio da inocência e a perda de identidade no Japão do pós-guerra. A assustadora ocidentalização destruiu uma geração de pessoas, enquanto eles se afundam num mal estar e desilusão. Estas não são imagens e temas que não sejam familiares à obra de Oshima, ele próprio à deriva, tentando descobrir um sentido, ou propósito maior para o estado alienado das pessoas no seu país. O povo japonês dos anos sessenta era um povo derrotado, sem algum senso de identidade. Oshima mais uma vez foi buscar inspiração a uma história verdadeira, e canalizou nela o sofrimento da sua geração. Os pais são levados para a exploração dos seus próprios filhos para satisfazer as suas necessidades materiais.
"Shonen" não é necessariamente uma chamada para as reformas do bem estar social, como as atrocidades realizadas por causa do materialismo não são um indicativo para as necessidades de sobrevivência. É uma lamentação das prioridades causadas pela ocidentalização. No fundo estas pessoas estão desesperadamente à procura de refúgio, mas os seus esforços são dificultados pelo impacto do mal estar, e o abrigo que procuram ainda não existe. 
Legendado em inglês. 

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quarta-feira, 11 de junho de 2014

O Enforcamento (Kôshikei) 1968



De acordo com uma sondagem feita em 1967 no Japão, pelo ministro da justiça, 71% das pessoas eram contra a abolição da pena de morte, 16% a favor, e 13% não sabiam. Mas aqueles que se opunham à abolição, alguma vez viram uma câmara da morte? Já assistiram a uma execução ao vivo?
Nagisa Oshima não perde tempo em comunicar a sua opinião sobre a pena de morte, e, de seguida, narra-nos em estilo de documentário uma viagem por uma câmara de execução, enquanto um condenado à morte é guiado ao local para ser enforcado.

O filme é inspirado no caso de Ri Chin’u, um pobre mas imensamente talentoso coreano, que matou duas jovens no que é curiosamente conhecido como incidente Komatsugawa High School, em 1958. O filme começa com a tentativa de execução de um jovem de 22 anos de idade, não muito diferente de Ri Chin’u, que vamos conhecer apenas como  R (Yun-Do Yun), e que foi considerado culpado de violação e assassinato de duas jovens quatro anos antes. R é, de facto, enforcado, mas permanece vivo no final do acto, com o pescoço muito intacto. E assim seguimos, de modo muito satírico, os esforços do comité de execução decidirem o que fazer a seguir. R sobreviveu, e perdeu a memória de quem realmente é, e o grupo não é capaz de decidir se é capaz de enforcar uma pessoa que não está ciente das suas capacidades mentais.
O filme foi lançado em 1968. Quase uma década depois dos acontecimentos de Ri Chin’u, e apenas duas décadas depois do Japão ter retirado as suas tropas da Coreia. Oshima, corajosamente, levanta a sua voz contra a pena de morte, e contra o racismo praticado pelas autoridades, o preconceito contra os coreanos, que era igual ao da sociedade japonesa. Mais de 40 anos passados, o Japão mantém a prática da execução institucional (tal como os Estados Unidos), mas as relações com a Coreia melhoraram bastante (e até a pena de morte pode chegar a um ponto de inflexão nos próximos anos).
Este não é tanto um filme de género, e mais um filme de "auteur" . Não tenta lidar com as questões que confrontam a vida na prisão, e parece, à primeira vista, ser uma sátira à pena de morte, e a todos que se opõem à sua abolição. Mas no curso dos acontecimentos, o filme vai passar do documentáro à fantasia surrealista, em gradações cada vez maiores, e passará a tratar de questões da política sexual, raça, religião e identidade. Apesar do incremento da paródia, cada vez mais absurda, Oshima insiste na realidade. Ele nunca nos conduz directamente para a comédia/tragédia, e por isso a mensagem do filme mantém-se forte.
Legendas em inglês.

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terça-feira, 10 de junho de 2014

Contos Cruéis da Juventude (Seishun Zankoku Monogatari) 1960



Kiyoshi é um jovem mal-humorado que trata as mulheres como objectos. Makoto é uma jovem que está a passar pelo seu despertar sexual. Ela e as amigas aceitam boleias de homens mais velhos, embora afirmem que não seja mais do que diversão, e não pretendam ter algo sério com eles. Kiyoshi e Makoto conhecem-se quando ele a salva de um desses homens de meia idade, quando este tenta abusar dela. Apesar de se tratarem de forma abusiva, começam uma relação que os lava até aquilo que eles chamam de amor, mas que parece mais como uma dependência emocional, e uma vontade de se rebelarem contra a sociedade tradicional.
Um filme que ilustra a disconexão entre a juventude rebelde e as influências inconscientes que ajudaram a moldar a cultura japonesa nos anos 60. Era uma altura de reconstrução do pós-guerra e uma geração de jovens que estava preparada para definir os padrões do seu próprio mundo. Pela sua exuberância juvenil, os personagens de "Contos Cruéis da Juventude" são incapazes de escapar à influência Ocidental, para preencher o vazio cultural deixado por uma rejeição reacionária, de todas as coisas pré-modernas. Eles, essencialmente, selam o seu próprio destino, adoptando estereótipos da cultura pop, dos filmes americanos, e da música americana, para tentar criar uma identidade própria. Há uma ironia profundamente enraizada na rebelião dos jovens, que neste filme não podem ver as consequências fatalistas de noções românticas da cultura ocidental com a natureza delicada e impressionável de uma sociedade em fase de reconstrução. 
Oshima compreendia o mundo onde estes jovens viviam. Tinha apenas 28 anos, e o seu idealismo era temperado pela natureza pensativa que podia encontrar as contradições em ambos os lados da barricada, e possui duas filosofias aparentemente opostas, simultaneamente, e sentia a alienação entre as gerações mais velhas e o movimento estudantil. Por isso este filme é geralmente considerado o "à Bout de Souffle" do cinema japonês.
Legendas em inglês.

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segunda-feira, 9 de junho de 2014

Uma Cidade de Amor e Esperança (Ai to Kibô no Machi) 1959


Masao parece ter o mundo inteiro contra ele. O pai morreu, a mãe está doente, e a sua pequena irmão tem uma deficiência mental, e passa a maior parte do tempo a brincar ou desenhar figuras de animais mortos. Masao é um jovem brilhante, mas vê-se na obrigação de arranjar um trabalho para sustentar a família. Ele quer trabalhar, mas a mãe acha que ele deve continuar a estudar para arranjar um trabalho melhor no futuro. Masao faz tudo para trazer algum dinheiro para casa, inclusive vender os pombos de estimação da irmã. No entanto, a venda dos pombos é uma farsa, já que depois de vendidos os pombos regressam a casa, o que faz do negócio ilegal...
Na sua estreia como realizador, Nagisa Oshima apresenta uma análise escaldante e provocante, das pessoas socialmente habilitadas, das interelações entre a pobreza e o crime. Embora fosse um estreante, Oshima já tinha trabalhado com um realizador experiente, como Keisute Kinoshita. Os filmes de Kinoshita na década de 50 eram filmes feministas, eram mitos sobre a bondade humana, o amor romântico e a justiça paternal. Oshima viria a subverter os elementos familiares do melodrama, inaugurando uma direcção artística que incentivava a criatividade não tradicional, e o experimentalismo que viria a definir a futura "new Wave". É interessante notar que a obsessão mórbida da irmã de Masao por animais mortos dá uma impressão do que se tornaria um elemento recorrente nos filmes de Oshima: a repressão, a aberração psicológica profundamente enraizada que se manifestava no incompreensível, e no comportamento muitas vezes destrutivo. O filme é também um documento realista, duro e sentimental, sobre a disparidade da classe social e a inevitabilidade da pobreza.
Legendas em inglês.

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domingo, 8 de junho de 2014

Nagisa Oshima

Nagisa Oshima, mais conhecido como realizador de "O Império da Paixão", "O Império dos Sentidos" e "Feliz Natal, Mr. Lawrence", estava na vanguarda dos realizadores da nova vaga do cinema japonês que emergiram nos anos 60, e que ficaram conhecidos por abordar temas como a pena de morte, racismo e homossexualidade. Inicialmente trabalhou para os estúdios Shochiku Co., mas desistiu depois do distribuidor ter retirado de circulação o seu filme "Noite e Nevoeiro no Japão", com a acusação de desunião com o movimento de esquerda do país, apenas três dias depois do seu lançamento.
 Oshima é o mais importante representante da sua geração, da qual fazem parte nomes como Shohei Imamura, Seijun Suzuki e Hiroshi Teshigahara. Ao contrário dos seus conterrâneos franceses, a maioria destes realizadores veio do Studio System, como aprendizes tradicionais de realizadores importantes (como Ozu e Mizoguchi), até se rebeliarem contra os estilos de filmagem mais contido dos seus mestres.
Ninguém empurrou tanto esta nova vaga como Oshima, que na sua rejeição pelo cinema clássico japonês, retratou uma nova geração amoral de punks, gangsters e bandos juvenis. As imagens gentis do pós-guerra dos filmes a preto e banco de Ozu, dão lugar às explosões de cor dos filmes de Oshima, penteados orientais e roupas elegantes, mostrando o quanto havia mudado o Japão nos anos 50.
Outros realizadores foram comparados com Jean-Luc Godard, mas neste caso, a comparação é apropriada. Não só nos primeiros filmes de Oshima, e nas suas preocupações, mas os dois vieram para a relização do mesmo modo, começando ambos como críticos. Como Godard, Oshima também escrevia os seus próprios argumentos e era um mestre nos diálogos de improviso.
Neste ciclo, vamos deixar de lado os filmes mais conhecidos do realizador, e vamos abordar a primeira fase da sua carreira, a fase de rebelde. Vamos deixá-lo no início da década de 70, depois de ter realizado mais de 30 obras na década de 60, para o cinema e para a televisão. A nossa escolha para esta semana vai ser a seguinte:

Segunda: Street of Love and Hope (1959) - primeiro filme do realizador

Terça: Cruel Story of Youth (1960)

Quarta: O Enforcamento (1968)

Quinta: Shonen - The Boy (1969)

Sexta: A Cerimónia (1971)

Todos os filmes são bastante raros, por isso serão apresentados com legendas em inglês.

sábado, 7 de junho de 2014

Objectivo Burma (Objective, Burma!) 1945



Um grupo de para-quedistas em território ocupado pelos japoneses, com uma perigosa missão: localizar e destruir um radar. Conseguem cumprir a missão, e quando se deslocam para o local onde serão recolhidos para a base, são surpreendidos por uma espera japonesa, e são obrigados a fazer uma longa e difícil caminhada, através da selva ocupada pelo inimigo.
Um daqueles filmes que não tem grande argumento, mas o que está lá, deve-se em parte ás grandes interpretações. Errol Flynn tem uma das suas mais profundas interpretações como um capitão da Força Aérea que enfrenta grandes sacrifícios para salvar as vidas dos seus homens. Muitas vidas são perdidas ao longo do caminho, cada uma delas uma facada no coração do capitão. Claro que alguns deles vão conseguir saír dalí, mas a luta não irá ser fácil, dando um profundo respeito aos homens que lutam pela sua liberdade. Com o inevitável desespero, há muita acção para manter o ritmo do filme. A maior parte dos homens desta esquadra, são figuras que nos são muito familiares e as suas mortes afectam-nos como se fossem membros da nossa família. Eles cumprem o seu trabalho com coragem, humor, e um profundo sentimento de camaradagem. Não existe aqui um significado escondido, eles são personagens normais, que fazem apenas o melhor que podem para permanecerem vivos.
Tal como a maioria dos filmes sobre a Segunda Guerra Mundial, filmados durante a Segunda Guerra, os eventos são nos apresentados com um sentimentalismo pró-aliados, que é dificil de entender 50 anos mais tarde. Os americanos abatem os japoneses na estação do radar sem aviso prévio, e é considerado um acto heróico, os japoneses abatem americanos armados e é considerado um acto heróico. Como se isso já não os fizesse suficientemente maus aos olhos da audiência, os japoneses ainda torturam americanos para seu belo prazer (e extrair informação). 
 Realizado por Raoul Walsh, com a sua habitual economia,"Objectivo Burma" parece ter menos do que os seus reais 142 minutos. Foi recebido com indignação em Inglaterra, onde grupos de veteranos opuseram-se à campanha na Birmânia como sendo uma guerra apenas americana. A polémica foi tão grande que o filme foi retirado do circuito comercial britânico durante 7 anos.

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sexta-feira, 6 de junho de 2014

O Dia Mais Longo (The Longest Day) 1962



Junho de 1944. As forças Aliadas, combinando militares dos Estados Unidos, Inglaterra, Canadá e França, preparam uma invasão em massa da França. Os alemães preparam a defesa do ataque, sem saber exactamente de onde ele virá, e a resistência francesa na Normandia, descobre alguns problemas atrás das linhas inimigas.
Com um elenco cheio de estrelas com nomes bastante familiares, quer sejamos fãs do cinema mainstream de Hollywood, ou do cinema trash europeu. Tal como a maioria dos épicos do período, o filme foca-se nos generais e presta pouca atenção aos soldados em campo. Durante a noite de 5 de Junho, a resistência francesa (liderada pela bela Irina Demick e Maurice Poli) faz explodir comboios, e corta as comunicações dos alemães. O elenco varia de veteranos como Henry Fonda, Richard Burton, Rod Steiger, Robert Ryan, e John Wayne, a novatos, como era na altura Sean Connery. Se olharmos atentamente podemos descobrir George Segal a subir um penhasco. Até mesmo a futura estrela de "Family Feud", Richard Dawson tem um pequeno papel.
O filme é um trabalho para a Fox, do produtor tornado independente Darryl F. Zanuck, e é  baseado no livro de Cornelius Ryan, do mesmo nome, e contava a invasão da Normandia em grande detalhe, graças a muitas histórias contadas por homens que estiveram lá. O filme de Zanuck mantém esse espírito, fazendo uma releitura desse dia famoso, não apenas tão detalhadamente para satisfazer qualquer pessoa que queira saber sobre história, mas também criando um grande envolvimento na trama. Ficamos a saber todos os factos e números, nomes e horários, mas também ficamos com uma visão mais pessoal.
Para ajudar a construir este filme episódico, Zanuck contratou três diferentes realizadores. Ken Annakin dirigiu os episódios Britânicos, Andrew Marton cobriu os americanos, enquanto Bernhard Wicki filmou as sequências alemãs, não só dando-lhe uma elevada dose de realismo, (os nazis aqui falam alemão, e não em inglês como em dezenas de outros filmes da Segunda Guerra Mundial), mas também dando uma visão audaciosa dos inimigos, que são vistos como pessoas reais. Este é um rico e detalhado retrato do Dia D, que se recusa a ver apenas um dos lados da história em termos genéricos.
Apesar de um elenco de tantas estrelas, e a colaboração de três realizadores, este é inquestionavelmente um filme de Zanuck. É o tipo de épico que é produzido, e não dirigido. A coordenação deste tipo de produção, rivaliza com a do próprio Dia D, e foi a visão singular de Zanuck que levou o filme a bom porto. O próprio Zanuck orgulha-se em dizer que dirigiu algumas cenas no filme, então quando ele é referido como “Darryl F. Zanuck’s The Longest Day,” não é uma questão de ego, são créditos merecidos pois é o coroamento de uma carreira lendária no cinema.

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Kapò (Kapò) 1960



Antes de deixar a sua marca para sempre no cinema, com o lendário "A Batalha de Argel", Gillo Pontecorvo realizou este audacioso drama sobre a Segunda Guerra Mundial sobre uma jovem judia (Susan Strasberg) num campo de concetração Nazi, salvando-se da morte depois de assumir a identidade de outra mulher, para depois se tornar numa "kapò" implacável. Foi um dos primeiros filmes a retratar os horrores do Holocausto, e fê-lo com uma brutalidade, e uma complexidade muito ousada para o seu tempo.
Pontecorvo recria o campo de concentração em vívido detalhe, e preenche o fundo com uma desgastante actividade que parece designada a manter os prisioneiros cansados demais para sequer tentarem escapar. Existe uma enorme quantidade de personagens que passam pelo filme, como o prisioneiro político (Emmanuelle Riva), tentando manter a resistência viva num lugar onde manter o corpo vivo é bastante difícil.
Filme muito pouco visto ao longo da história do cinema, esteve anos indisponível, mas ficou famoso pelas piores razões, não só o tema mas também por causa de um determinado travelling. Serge Daney, famoso crítico nos "Cahiers du Cinema", escreveu o seguinte sobre Kapò:
"Entre os filmes que nunca vi, não estão apenas Outubro, Le Jour se Léve ou Bambi, há também esse obscuro Kapo. Filme sobre os campos de concentracão, rodado em 1960 pelo italiano de esquerda Gillo Pontecorvo, Kapo não deixou marcas na história do cinema. Serei eu o único a nunca o ter esquecido, apesar de nunca o ter visto? É que eu nunca vi Kapo mas, ao mesmo tempo, vi-o. Vi-o porque alguém — através das palavras — mo mostrou. Este filme, cujo título, como uma senha, acompanhou toda a minha vida de cinema, só o conheço através de um curto texto: a crítica que fez Jacques Rivette em Junho de 1961 nos Cahiers du Cinéma. Era o número 120, o artigo chamava-se «Da abjecção», Rivette tinha trinta anos e eu dezassete. Acho que até aí nunca tinha sequer pronunciado a palavra «abjecção» em toda a minha vida. No seu artigo, Rivette não contava o filme; contentava-se, numa frase, em descrever um plano. Essa frase gravou-se-me na memória e dizia o seguinte: «Vejam em Kapo, o plano em que Riva se suicida, atirando-se sobre o arame farpado electrificado: o homem que decide fazer, nesse momento, um travelling para reenquadrar o cadáver em contra-picado, tendo o cuidado de colocar a mão erguida num ângulo preciso do seu enquadramento final, este homem só tem direito ao mais profundo dos desprezos». Assim um simples movimento de câmara podia também ser o movimento que não se devia fazer. Aquele que deveria — de modo evidente — ser abjecto fazer. Mal tinha lido estas linhas, soube que o seu autor tinha absolutamente razão. Abrupto e luminoso, o texto de Rivette permitia-me descrever esse rosto da abjecção. A minha revolta tinha encontrado por fim palavras para se dizer. Mas havia mais. É que essa revolta era acompanhada por um sentimento menos claro e, sem dúvida, menos puro: O reconhecimento aliviado de ser esta a minha primeira certeza de futuro crítico. Ao longo dos anos, com efeito, «o travelling de Kapo» seria o meu dogma portátil, o axioma que nunca se discutia, o ponto final de qualquer debate. Com alguém que não sentisse imediatamente a abjecção do «travelling de Kapo», eu não teria, definitivamente, nada a ver, nada a partilhar. Este género de recusa estava, aliás, no espírito do tempo. À vista do estilo irritado e excessivo do artigo de Rivette, sentia que ele provinha de antigos e furiosos debates e parecia-me lógico que o cinema fosse a caixa de ressonância privilegiada de todas essas polémicas. A guerra da Argélia tinha acabado com a crença de quem — por não ter sido filmada — estivesse à partida desconfiado em relação a qualquer representação da História. Qualquer pessoa podia agora perceber que existissem — mesmo, e sobretudo, no cinema — tabus, facilidades criminosas e montagens interditas. A formula célebre de Godard, que via nos travellings «uma questão de moral», era, para mim, um desses truísmos sobre os quais não se podia ceder. Eu não, em qualquer caso."
Em 1961 conseguiu uma nomeação para o Óscar de Melhor Filme em Língua Estrangeira. 

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quinta-feira, 5 de junho de 2014

Queimada (Queimada) 1969



Sir William Walker (Marlon Brando) é um mercenário profissional que instiga uma revolta de escravos na ilha de Queimada, a fim de ajudar a melhorar o comércio de açúcar com os britânicos. Alguns anos mais tarde ele é enviado de novo para a ilha para lidar com os mesmos rebeldes, só que desta vez com objectivos diferentes, porque eles aproveitaram-se do poder, e ameaçam o comércio do açúcar com Inglaterra.
Um filme que retrata o conceito de liberdade no contexto colonial da América Latina. A certa altura Dolores diz a um soldado negro que o capturou: "A Liberdade é algo que tu deves tomar. Se o Homem te dá Liberdade, isso não é Liberdade". Esta declaração questiona as medidas para os quais os Latino Americanos estavam livres da exploração do imperialismo, e retrata a manipulação contínua das colónias pelos seus ex-colonizadores, à custa da população trabalhadora. Também retrata a incrível violência e destruição do meio ambiente, e da população das colónias, em nome dos recursos valiosos que os europeus tanto necessitavam. A última cena foca-se na dor e na raiva presente nos rostos da população negra que atravessou anos de devastação e perda em nome de uma liberdade nunca alcançada, e que, aparentemente, nunca será.
Gillo Pontecorvo vinha do sucesso de "A Batalha de Argel", e dá a "Queimada" uma inconfundível sensibilidade "larger than-life" de proporções épicas - completada por um grande número de personagens secundárias - e não há como negar no sucesso do filme a nível do puro espectáculo. Pontecorvo está perfeitamente consciente dos paralelismos políticos dos tempos modernos com a sua história, especialmente com a do Vietname. Tudo se sente próximo e imediato, Brando consegue arrancar uma interpretação memorável, e a banda sonora de Morricone é assombrosa. 

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