quinta-feira, 4 de maio de 2017

Imitação da Vida (Imitation of Life) 1959

Imitação de Vida é o derradeiro filme realizado em Hollywood, antes de regressar à Alemanha, agora que os motivos que o tinham feito emigrar (o nazismo) se tinham totalmente dissipado. Como em quase todos os filmes de Sirk, as reacções entre a crítica e o público divergiram. Se, por um lado, foi um sucesso de bilheteira, situando-se entre os mais vistos desse ano, a crítica torceu o nariz. Imitação de Vida era um remake de um filme de John Stahl de 1934 baseado na novela de Fanny Hurst Leave Her To Heaven, escrita no ano anterior. Posteriormente, o que também é comum nas suas obras, particularmente da década de 50, o filme foi reavaliado e há quem o considere como a sua obra prima. 
Imitação de Vida apresenta algumas alterações ao padrão geral dos seus filmes anteriores. Embora se trate de um melodrama, as relações amorosas não desempenham aqui um papel central, substituídas pelas relações entre mães e filhas e pela amizade entre duas mulheres, aparentemente destinadas a não serem amigas, dado as diferenças sociais e culturais entre ambas. Por outro lado a habitual profusão de cor e os cenários quase irreais, são aqui substituídos por uma direcção muito mais sóbria. Parece que Sirk quis fazer um filme centrado sobretudo na força do argumento e dos diálogos. E este é provavelmente um dos melhores melodramas da história do cinema. A complexidade das personagens e respectivas interacções e a densidade da estrutura narrativa, contribuem decisivamente para o afastar dos melodramas comuns com enredos simplistas e disputas e desencontros amorosos banais. Mais impressionante ainda, é a forma como Sirk aborda o problema do racismo de uma forma razoavelmente explícita, numa altura em que o tema era tabu em largas faixas da sociedade americana e no próprio poder político. É certo que os tema sociais já tinham surgidos em filmes anteriores (a deficiência física, ou as diferenças sociais, por exemplo) que contribuíram para a sua reputação de realizador de esquerda, o que deve ser relativizado, face ao contexto da produção de Hollywood. Mas Imitação de Vida parece mandar um recado a todos os Estados Unidos e à sua moral preconceituosa e conservadora do final dos anos 50: todas as pessoas têm sentimentos e aspirações, amam e sofrem, independentemente da cor de pele. Se isto hoje é para muita gente um puro lugar comum, na época e contexto em que o filme foi realizado, seguramente era impressionantemente arrojado. 
Imitação de Vida termina de forma majestosa. Uma velha mulher (Juanita Moore que foi nomeada para o Óscar de melhor actriz, embora não tivesse ganho) que passou a vida a servir os outros, guardou o pouco dinheiro que foi amealhando, para ter um funeral requintado e solene. Soa como uma despedida que poderemos associar à do próprio cineasta, que não voltaria a filmar. Se em 1937, Sirk tinha abandonado a Alemanha, receando o que poderia acontecer à sua mulher judia, agora estava na hora de voltar e deixar para trás uma carreira brilhante. 
*Texto de Jorge Saraiva

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