domingo, 29 de novembro de 2015

Fassbinder Integral - I Don't Just Want You to Love Me

"Rainer Werner Fassbinder (1945-1982) não integrou a primeira geração do Novo Cinema Alemão, corporizado no Manifesto de Oberhausen de Fevereiro de 1962 e que integrava novos cineastas como Edgar Reitz e Alexander Kluge, entre outros. Este movimento de rejeição do cinema alemão posterior à segunda guerra mundial, viria a integrar numa segunda fase, realizadores como Werner Herzog, Wim Wenders, Hans-Jürgen Syberberg. Volker Schlöndorff ou Margarethe Von Trotta. Fassbinder irá igualmente integrar a segunda fase deste movimento, embora com traços peculiares que o distinguiriam de rodos os restantes cineastas de alguma forma relacionados com este movimento.

A sua obra decorreu como a sua vida: intensa, controversa e fulgurante. Viveu apenas durante trinta e sete anos, fez cinema durante quinze e deixou-nos uma obra imensa de mais de quarenta filmes, numa actividade frenética e sem paralelo em toda a história da sétima arte. Se se acrescentar que para além dos filmes que realizou, trabalhou igualmente como actor em muitos dos seus filmes e de outros realizadores, foi argumentista de quase todos os seus filmes, foi produtor, escreveu e encenou peças de teatro presencial e radiofónico, compôs bandas sonoras foi editor, produtor, designer e operador de câmara, ficamos com uma ideia dos seus talentos multifacetados.

Não há um estilo definido na obra de Rainer Werner Fassbinder. Filmou freneticamente, várias obras no mesmo ano, sem um estilo definido e variando de tema com frequência. No entanto, para quem fazia um filme em cada cem dias, as suas obras demonstram um surpreendente grau de depuração estética e de aperfeiçoamento técnico para além de um notável trabalho de direcção de actores e de argumentos muito bem estruturados. Isto significa que falar do cinema de Fassbinder é quase como se estivéssemos a evocar um milagre criativo: trabalhando a um ritmo alucinante, era capaz de fazer em poucos meses o que noutros cineastas durava anos. Quando começava a filmar, Fassbinder já tinha tudo meticulosamente preparado, pelo que não havia espaço para indecisões nem para tempos mortos.

Embora a sua obra seja muito diversificada quer em termos temáticos, quer estéticos, é possível, definir de uma forma imperfeita, duas fases na sua carreira, com o seu maior sucesso comercial, O Casamento de Maria Braun (1979) a servir de fronteira. Numa primeira fase, predominam os filmes de baixo orçamento, muito ligados às premissas do novo cinema alemão, aquilo que se poderia chamar um cinema intimista, e muitas vezes de cariz experimental. Nesse grupo de filmes gostaria de destacar, As Lágrimas Amargas De Petra Von Kant (filmado como se de uma peça de teatro se tratasse), Cuidado Com Essa Puta Sagrada, O Medo Come a Alma, O Amor É mais Frio Do Que a Morte e a obra-prima absoluta, O Direito Do Mais Forte À Liberdade. A segunda parte revela, embora não em todos os filmes, um maior compromisso com o cinema comercial e aborda de forma descomplexada e aberta a história do século XX da Alemanha. Da ascensão e apogeu do nazismo em filmes como Berlin Alexanderpltaz (feito para televisão e com mais de quinze horas de duração) a Lili Marlene, passando pela trilogia BRD ( iniciais da República Federal Alemã) sobre a reconstrução da Alemanha nas décadas de 40 e 50, O casamento de Maria Braun, Lola e As Saudades de Veronika Foss e terminando com o desconcertante A Terceira Geração que abordava o universo da guerrilha alemã de extrema esquerda, muito activa nas décadas de 60 e 70. Curiosamente, aquela que viria a ser a sua obra de despedida, Querelle, com a presença de Brad Davis, Franco Nero e Jeanne Moreau, adaptando a obra homónima de Jean Genet, parecia ser um regresso ao seu universo mais intimista e pessoal.

 O ciclo sobre Rainer Werner Fassbinder abrange a totalidade da sua obra, incluindo curtas metragens e filmes feitos para televisão. Muitas delas são relativamente menores, embora Fassbinder nunca tivesse assinado maus filmes. Será uma oportunidade única de aprofundar, ou mesmo de travar conhecimento com um dos maiores realizadores da história do cinema. E também a possibilidade de vermos o desempenho de um notável leque de actores, com destaque para Hanna Schygulla, tão deslumbrante quanto competente, e que foi presença assídua em grande parte da sua obra."




Os meus agradecimentos aos Jorge Saraiva, pela fantástica introdução ao ciclo Fassbinder. Será um ciclo integral, que contará também com alguns documentários, um livro, e a colaboração de vários leitores. Irá decorrer a partir de agora, e durante todo o mês de Dezembro.
Vamos abrir as hostilidades com um livro, e, amanhã, um documentário, que servirão de guia para o resto do ciclo. A maioria dos filmes terão legendas em Português, mas em alguns casos apenas foi possível em inglês. Espero que seja um ciclo do vosso agrado.

A Companion to Rainer Werner Fassbinder

3 comentários:

julia disse...

que maravilha!!!!!

Anónimo disse...

Tio Chico do céu!

Só por esse texto inicial, esse poderá ser o melhor ciclo de toda a história do M-One/Two-TM.

Estou fascinando.

My One Thousand Movies disse...

Obrigado Rafael. Vai ser mesmo :)