quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Bom Dia (Ohayo) 1957



Uma casa na vizinhança, pertencente a um jovem casal, possui um aparelho de TV. Todas as crianças do bairro se reúnem lá diariamente para assistir ao wrestling. O jovem casal veste o pijama todo o dia, ouve música jazz, tem cartazes de filmes de Hollywood (The Defiant Ones), nas suas paredes. Vivemos no Japão dos anos 50, e escusado será dizer que eles são os excluídos da sociedade.
Durante muitos anos os filmes de Yasujiro Ozu raramente eram vistos fora do Japão. A narrativa mínima, e o estilo idiossincrático assemelhavam-se a poucos filmes, e os distribuidores temiam que eles fossem "demasiado japoneses" para um público internacional. Durante os anos 50 e 60, o seu trabalho era centrado em volta do mesmo motivo: a tentativa de um pai envelhecido de casar a filha obediente, para que ela pudesse viver a sua própria vida. Alguém caracterizou este ponto de vista como "uma tristeza simpática". 
Mas com "Bom Dia", Ozu visitava os subúrbios e regressava uma pessoa mais alegre. Ele leva-nos para um lugar diferente, um novo Japão, mais brilhante, onde a cultura popular americana se infiltra na vida quotidiana do povo local. A história gira à volta dos altos e baixos da vida suburbana da classe média, num pequeno bairro onde as casas estão rodeadas por cercas brancas, e cheias de mobilia colorida e eletrodomésticos. Donas de casa saltando de casa em casa, trocando comida, bebida, bisbilhotices, por vezes cruéis. As crianças entram e saem da casa dos vizinhos, principalmente para verem TV. O senhor Hayashi não quer comprar uma televisão, porque segundo ele, esta já produziu "100 milhões de idiotas. Desesperadamente querendo uma, os seus filhos primeiro praticam uma resistência passiva, mas acabam por fazer uma greve de silêncio. 
Apesar de ser considerado um remake do filme mudo de Ozu, "Nasci, mas...", "Bom Dia" é muito parecido com as Sitcoms americanas do mesmo período. Está cheio de personagens de acção, Mr. Hayashi, o velho e distraído pai (interpretado por Chishu Ryu, quem é dito ser o alter ego de Ozu, presente na maioria dos seus filmes), vizinhos bisbilhoteiros, que causam grande dor para a senhora Hayashi, uma avó corajosa, que não se deixa intimidar nem por parentes nem por vendedores porta a porta. Mas o melhor de tudo são os vizinhos da Boémia.
A critica mais aguda de Ozu, vai directamente para a cultura japonesa. Embora a maior parte dos seus filmes sejam feitos em volta do diálogo banal e comum da vida diária, aqui ele critica a propensão do povo japonês pela vida sem sentido, pelas conversas para preencher o vazio. É o vazio das conversas dos adultos que revolta os jovens que todos dias assistem TV em casa dos vizinhos, e que os transforma em críticos sociais. Não querem crescer num mundo de rituais sem sentido, um mundo onde a conversa de dois jovens apaixonados não pode ir para além do estado do tempo. 
Os filmes de Ozu são meditativos e relaxantes. Revelam-se lentamente e obliquamente, através dos diálogos, de um trabalho de câmera mínimo. A câmera coloca-nos em contacto com os seus personagens, e quando começamos a entender as suas vidas somos convidados a tomar a nossa própria opinião.
Filme escolhido pelo Rui Alves de Sousa.

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