terça-feira, 17 de dezembro de 2019

Mataram o Pai Natal (L'assassinat du Père Noël) 1941

Numa pequena localidade algures nos Alpes franceses o Natal está a chegar, e a pesada neve isolou-os do resto do país. Não é nada que não estejam habituados, e a população está entretida com a preparação dos festejos natalícios. A atmosfera muda subitamente quando alguém ataca o padre da aldeia, e depois rouba o valioso sino de São Nicolau da igreja local, ao mesmo tempo que um homem aparece morto vestido de Pai Natal. O presidente imediatamente entra em contacto com a esquadra mais próxima, mas é-lhe dito que devido à neve levará alguns dias até que os únicos policias disponíveis cheguem ao local. O presidente, e alguns locais mais influentes, concluem que se a polícia não consegue lá chegar, o ladrão também não consegue saír, o que significa que ainda está entre eles, e pode ser qualquer um.
Como uma pequena comunidade, com um ambiente claustrofóbico, pode ser tomada pelo medo, pela suspeição, e pelas denuncias maliciosas, "L'Assassinat du Pére Nõel" tem muito em comum com "Le Corbeau" de Henri-Georges Clouzot. O enredo pode ser diferente, mas os dois filmes evocam poderosamente o ambiente que se vivia na altura, transportando o sentimento de desconfiança e paranoia que se vivia na França ocupada pelos nazis. As similaridades são mais evidentes quando nos apercebemos que os dois filmes foram produzidos pela Continental, gerida por capitais alemães. Grande parte dos argumentistas e realizadores que trabalharam com a Continental não eram simpatizantes da ocupação, e salvavam a consciência introduzindo alguma alegoria escondida nos seus filmes, mas teria de ser algo que escapasse aos censores alemães e pudesse ser apanhado pelo público cinéfilo. 
"L'Assassinat du Pére Nõel" era um dos exemplos mais flagrantes destes acontecimentos, na representação da população de uma pequena localidade montanhesa que se torna instável por causa de uma série de eventos sinistros, e viria a ter uma ressonância imediata na maioria da população francesa, que se ajustava ao regime nazi. O assassinato do Pai Natal aparecia para simbolizar a perda de identidade, mas, como mais tarde seria implícito no filme, esta perda dos ideais seria muito mais difícil de ultrapassar do que previsto. Um público moderno veria toda esta situação mais como um desafio, e o Pai Natal, afinal de contas, não era apenas um homem, mas uma ideia, e as ideias não podem ser mortas.
O filme também tem um grande significado histórico, pois foi o primeiro a ser feito depois da capitalização do país pelos alemães. Foi o primeiro a ser feito pela Continental, o que colocava a fasquia bem alta aos futuros filmes da produtora. Apesar da ocupação ser considerada um dos períodos mais negros da história do país, um período em que a nação fora humilhada e a maioria das pessoas passaram por situações muito duras, também foi um período em que o cinema francês floresceu, graças ao investimento dos alemães na Continental, que procuravam sempre os mais talentosos técnicos. E é por isso que o cinema da altura é tido, hoje em dia, em tão alta estima.
Legendas em inglês.

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