sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Novo Cinema Português

Seguindo as novas vagas que ocurriam um pouco por toda a Europa, uma ruptura estética ocorreu em Portugal no início dos anos 60, dando origem ao que viria a ser conhecido como o Novo Cinema Português. Apesar do seu flagrante fracasso comercial, os críticos e realizadores que o defendiam, conseguiriam ocupar lugares estratégicos no cinema português, a partir dos quais se pretendia promover, produzir e dirigir, até aos dias actuais, um art cinema para o qual o cinema Português contemporâneo ainda está muito em dívida. Ao fazê-lo, eles queriam institucionalizar, independentemente das audiências nacionais, um cinema fortemente subsidiado pelo estado, chamado de Escola do Cinema Português - que ficaria conhecido pelo trabalho de realizadores como Manoel de Oliveira, Paulo Rocha, João César Monteiro entre muitos outros.
O novo cinema nasceu, em Portugal, quase a partir do nada. O cinema anterior, que tinha vivido o seu apogeu nos anos quarenta, assistira durante a década de cinquenta a uma irreversível decadência, em termos de ideias, de renovação estética, de público, e até, pura e simplesmente, de produção. Basta dizer que em 1955, geralmente referido como "o ano zero do cinema português'', não se produziu nenhuma longa-metragem portuguesa.

O problema não estava na falta de procura: nos anos quarenta, o número de salas quase duplicara, o mesmo acontecendo ao número de espectadores de cinema: sintoma, decerto, de alguma expansão económica (com aumento da taxa de industrialização), de uma redução da taxa de analfabetização para 40 por cento, bem como da popularidade atingida pelo cinema em geral, e pelo cinema português em particular, nos anos trinta e quarenta. Esse aumento da procura tornava mais gritante a decadência da produção nacional, iniciada ainda nos anos quarenta, a ponto de, em 1948, o Estado Novo se ter decidido pela primeira vez a promulgar uma "lei de protecção" que instituiu um "Fundo do Cinema Nacional'' onde os produtores passaram a poder ir pedir subsídios e empréstimos para as suas produções: ao mesmo tempo, estabeleciam-se quotas para a exibição de filmes portugueses.
Isso não chegou, no entanto, para travar a decadência de um cinema que os cineastas maiores abandonavam, de que o público desertava e que, salvo raras excepções, levava as empresas à falência, mesmo com os dinheiros públicos e com produções cada vez mais modestas. Nem o recurso a nomes famosos da revista, da canção, do toureio, do ciclismo ou do hóquei em patins, ensaiando variações das fórmulas cómicas, folclóricas e sentimentais, nem tão-pouco o recurso a algumas co-produções com o estrangeiro, travou a degradação, quantitativa e qualitativa, do cinema português, bem patente nesse número zero de longas-metragens registado em 1955.
A ascensão do novo cinema consegue mesmo ultrapassar algumas contrariedades, ligadas, sobretudo, à guerra entretanto surgida em África: "novas dificuldades vão levantar-se ao Cinema português, que, em obras de fundo, poucas relações tivera com o ultramar. A prioridade nacional dada ao conflito - e nessa prioridade está o domínio absoluto, a "mobilização" da RTP - atrasa naturalmente as soluções de fundo''. As eleições de 1958, a guerra, o "caso do Santa Maria'' expuseram e geraram mais revolta contra o regime e provocaram o aperto da censura, que levaria às prisões "de cineastas e críticos como Fonseca e Costa, Vasco Granja, Henrique Espírito Santo, e até Manoel de Oliveira, libertado por imediata intervenção de gente do cinema junto da Presidência do Conselho, no momento em que decorriam as homenagens à sua obra''. Mais tarde, foi preso o distribuidor José Manuel Castello Lopes.
É questão central para o cinema novo a preocupação em dar a ver homens e realidades de um país profundo. Procuram ainda, tal como a Nouvelle Vague, ilustrar casos da condição do Homem na sociedade moderna, numa perspectiva não classista, ao gosto do autor, cujo papel Jean-Luc Godard, autor por excelência, chega a pôr em causa numa entrevista de 1970. A procura da identidade humana – coisa que o movimento faz, com técnicas ligeiras, junto dos esquecidos – é démarche idêntica à da antropologia, ciência das ciências do Homem. Trás-os-Montes e Alto Douro tornam-se palcos privilegiados dessas experiências.

Este ciclo já tinha sido realizado em Abril de 2013, mas os links encontravam-se desativados. Irão agora ser repostos todos os filmes, e ainda serão adicionados muitos novos. Serão cerca de 30 filmes, a serem postados em apenas uma semana.

Para abrir o apetite, um livro. Aqui.

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