Os irmãos Quay estão entre os artistas de animação mais bem sucedidos dos últimos anos. Os fantásticos cenários e os seus fantoches kafkianos e os ocasionais closeups combinam numa alquimia engenhosa de visão inconsciente e metafórica. Ver qualquer filme de animação desta dupla significa entrar num mundo de sonhos de metáfora e poesia visual. Nas suas próprias palavras: "Os filmes de marionetes pela sua própria natureza são construções extremamente artificiais, ainda mais dependentes de que nível de "encantamento" se deseja para eles em relação ao tema, e, acima de tudo, a mise-en-scène conceptual aplicada". O "encantamento" dos seus filmes fê-los conquistar audiências pelo mundo fora, e as suas inovações introduziram uma nova qualidade de poesia para o filme animado.
Hoje trago-vos aqui uma série de curtas desta dupla, e uma longa.
Nocturna Artificialia (1979)
Uma história enigmática contada em sete capítulos, cada um introduzido por uma frase elíptica num título. Um homem no seu apartamento. Ele sai para a rua onde um eléctrico vermelho passa ao lado de uma catedral. Curta de estreia dos realizadores. Com valores de produção bastante baixos, é quase o filme mais negro dos Quay, além de ser o mais sombrio. Um jogo de sombras bastante apurado que faz com que nunca tenhamos a certeza do que estamos a ver. Os realizadores não gostam muito de misturá-lo com os seus filmes posteriores.
The Cabinet of Jan Svankmajer (1984)
Em Praga, um marioneta professora, com pinças metálicas nos lugares das mãos e um livro aberto como chapéu, toma um jovem rapaz como pupilo. Primeiro a professora esvazia a cabeça do rapaz de todos os brinquedos, deixando-o sem o topo a maioria do filme. Depois ensina o rapaz sobre ilusões e perspectivas, a busca de um objecto através da exploração de um banco de gavetas, adivinhando um objecto e a migração das formas. A animação em stop Motion dos Quay é obviamente influenciada por Jan Svankmajer, e este é o seu tributo ao realizador Checo.
Street of Crocodiles (1986)
Um acompanhamento musical electrónico orquestrado por Karlheinz Stockhausen acompanha adequadamente o filme. É talvez o trabalho dos Quay mais bem sucedido dos realizadores, inteiramente animado por marionetes e o fantástico microcosmos do seu universo. Foi um filme altamente premiado. Não ganhou em Cannes, mas ganhou prémios nos festivais de Sitgés e Fantasporto.
Rehearsal for Extinct Anatomies (1988)
Na frágil imobilidade de uma sala, um casal espera. Enquanto o crepúsculo avança, alternadamente inconsciente e ansioso por pressentimentos de destruição brutal. Livremente inspirado numa gravura do pintor francês Jean Honoré Fragonard. O ponto de partida era uma música que Leszek Jankowski escreveu para um projecto com temas de Kafka. Assim é criado um plano coreográfico envolvendo certos movimentos de câmara precisamente calibrados, criando um cenário com isto em mente.
The Comb (1991)
O filme abre no quarto sombrio de uma bela adormecida, e parece entrar na sua mente e mergulhar nos seus sonhos. Com base num fragmento de um texto do escritor austríaco Robert Walser, "The Comb" é uma exploração do subconsciente, visualizada como uma casa de teatro labiríntica assombrada por um explorador de bonecas. Uma mistura impressionante de live action com animação, "The Comb" é semelhante a uma nota sensual de violinos, guitarras e gritos e sussurros vindos de um sótão, todos banhados num magnífico brilho dourado.
Instituto Benjamenta (1995)
Jakob Von Gunten acaba de entrar para o estranho Instituto Benjamenta, especializado em preparar e educar criados. Pouco a pouco vai conhecendo os seus inusitados colegas e apredendo técnicas de serventia a cargo dos irmãos Johannes e Lisa Benjamenta, responsáveis pelo Instituto. Estranho é a norma para esta primeira longa metragem em live action dos imãos gémeos Quay, que por esta altura já tinham atingido o estatuto de culto pelas suas curtas metragens. Aqui, as influências são o expressionismo alemão de "O Gabinete do Dr. Caligari", e é marcado por um tom de pesadelo. É vagamente baseado na novela "Jakob Von Gunten", do autor suiço Robert Walser. Filme premiado em festivais como Fantasporto, Sitgés e Locarno.
Tem legendas em português.