quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Outono Escaldante (La Prima Notte di Quiete) 1972

Em Itália, o jogador e professor de poesia Daniele Dominici chega à cidade costeira de Rimini onde é contratado para dar aulas no liceu durante quatro meses, substituindo outro professor. A sua relação com a namorada Mónica está em crise, e ele passa a maior parte do tempo com os seus novos amigos, os também jogadores Giorgio Mosca, Marcello e Gerardo Pavani. Na sala de aula ele conhece a bela e misteriosa estudante, Vanina Abati, de dezanove anos, que também é namorada de Gerardo, e sente uma grande atração por ela. Começam a encontrar-se fora das aulas, e apaixonam-se.
"La Prima Notte di Quiete" é uma história cruel e trágica, fria e melancólica, magnificamente interpretada por Alain Delon, a desenvolver perfeitamente o papel de um homem ateu, numa desesperante crise existencialista. A fotografia e a banda sonora são muito frias, tal como o ambiente de Rimini. Valerio Zurlini usa alguns elementos melodramáticos para mergulhar profundamente no desespero existencialista do personagem de Delon, enquanto ele caminha pelas discotecas de uma Itália do inicio dos anos setenta, pós-revolução sexual, pressionado pelas
pessoas vazias em seu redor, tentando desesperadamente distrair-se de qualquer forma. Este tema já era habitual na filmografia de Antonioni, e viria a ser melhor explorado no seguinte e último filme de Zurlini, "O Deserto dos Tártaros", uma obra que, apesar do tema, não podia ser mais diferente de "La Prima Notte di Quiete".
A fotografia é de Dario di Palma, sobrinho de Carlo di Palma, na sua única colaboração com Zurlini. Seria um dos primeiros filmes de Sonia Petrovna, uma jovem revelação do cinema francês que passou ao lado de uma grande carreira. 

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terça-feira, 30 de agosto de 2016

Sentado à Sua Direita (Seduto Alla Sua Destra) 1968

Um líder rebelde do Congo é capturado e preso com dois criminosos brancos. Maurice Lalubi (Woody Stroode) é atirado para a cadeia com um soldado e um ladrão italiano. Este trio é torturado às mãos dos captores, enquanto um regime militar recém formado decide o destino do insurgente. Todo o horror do confronto é visto através dos seus olhos, ao longo do interrogatório e tortura de Lalubi. Só que a sua morte eminente poderia transformá-lo num mártir e trazer problemas para o novo governador.
O mais próximo que Woody Stroode tinha estado de um papel de protagonista num filme americano, tinha sido em "Sargento Negro" (1960), de John Ford, onde ele interpretava o personagem do título, e mesmo assim só aparecia em quarto lugar no cartaz, atrás de Jeffrey Hunter, Constance Tower e Billie Burke. Num irónico twist, Stroode teve de viajar até Itália para finalmente ser reconhecido, e apesar de ser dos seus filmes menos conhecidos, acabou por ser uma das suas maiores prestações.
Baseado na captura, tortura e execução de Patrice Lumumba, o primeiro legalmente eleito primeiro ministro da Républica do Congo, coloca a personagem principal no centro de um drama angustiante, apresentado como uma ficção, mas que realmente é a reconstituição dissimulada de eventos reais, que foram manipulados para obter vantagem política de países como Estados Unidos e Bélgica. Stroode interpreta um lider rebelde depois de uma ditadura militar tomar o controle do país. Os paralelos entre os últimos dias de Cristo e este filme são bastante óbvios, com Valerio Zurlini a dirigir de mão pesada a representação dos ideais elevados de um homem que se recusa a comprometer as suas crenças, mesmo quando isso significa a morte certa.
É dos filmes menos populares de Zurlini, o que não surpreende, dada a temática complicada. Nunca estreou em Portugal e na América chamou-se "Black Jesus".

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segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Le Soldatesse (Le Soldatesse) 1965

Baseado num livro de  Ugo Pirro, "Le Soldatesse", é um dos melhores filmes sobre a Guerra desde "Paisá"(1945), de Roberto Rossellini, quase vinte anos depois. 
No centro da história está o transporte de uma frota de mulheres, prostitutas, a fim de atenderem soldados italianos em bordéis, durante a Segunda Guerra Mundial. A acção começa em Atenas, e prossegue para norte. A viagem de camião é por terrenos montanhosos traiçoeiros, e todo este calvário evolui como uma metáfora sobre a guerra. Enquanto isso, o transporte em si vê-se envolvido em fogo de artilharia de guerra, matando algumas das mulheres, e partindo a alma aos sobreviventes. 
Portanto, embora num certo nível o filme seja metafórico e simbólico, noutro é naturalista e realista. Pode-se até dizer que estilisticamente seja neorrealista. Mas é mais provável que o filme de Zurlini tenha sido mais inspirado por "General della Rovere" (1959) de Rossellini ou "Le Quattro Giornate di Napoli" (1962), de Nanni Loy, do que por "Roma, Cidade Aberta", ou "Paisá". Era filmado a preto e branco pelo fotógrafo Tonino delli Colli, que tinha fotografado "O Evangelho Segundo São Mateus" (1964), o filme de Pier Paolo Pasolini que mais o liga ao neorealismo italiano. 
O filme de Zurlini também é sobre a interação de três soldados encarregados do transporte, e entre eles e as prostitutas. Há, com efeito, duas personagens principais, uma de cada grupo. O tenente Gaetano Martino (Tomas Millian) é um protagonista, enquanto a personagem feminina é Eftichia (Marie Laforêt), a mais calada e miserável das prostitutas.As interpretações são mesmo a melhor parte do filme. Laforêt tem o melhor papel da sua carreira, como uma prostituta sofredora que carrega as marcas da guerra. Tomas Milian, nascido em Cuba, mas desde cedo a filmar em Itália, era talvez o único actor do cinema italiano que tinha realmente estudado para actor, com formação em Nova Iorque dada por Lee Strasberg. O seu Martino é um óptimo exemplo de uma alma esgotada pela guerra. Mas o filme conta ainda com outras estrelas, como Anna Karina (dos filmes de Godard), Lea Massari e Mario Adorf, todos com grandes prestações.
Nota: em dois momentos do filmes ficamos 2 a 3 minutos sem legendas. Mas isso não nos impede de compreender o desenrolar da história.

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sábado, 27 de agosto de 2016

Dois Irmãos, Dois Destinos (Cronaca Familiare) 1962

Dois Irmãos reencontram-se quando adultos, depois de terem sido criados separados. A relação de ambos é dificil. O mais velho, doente, tornou-se marxista radical. Já o mais novo, que teve uma educação aristocrática, precisa de cuidar dele.
"Se há coisa que Cronaca Familiare tem, e digo-o com toda a certeza, é a “veia” Viscontiana que carrega consigo, os planos e enquadramentos majestosos e imponentes quer dos símbolos da velha aristocracia quer do espaço rural e urbano da época, a família como coisa sagrada (ainda que amputada desde a tragédia inicial), a secura e a palidez da imagem, a música...
Em Cronaca Familiare existe uma total e contida submersão de mágoa e de nostalgia dilacerante que nasce da tragédia (ou das tragédias) para alcançar a sua plenitude na intensidade dramática que se torna erosiva na implacabilidade e na intensidade dessa dramaturgia. Se é verdade que Cronaca Familiare é um filme trágico que nasce e morre na tragédia, ainda mais verdade é que, acima de todo esse tragicismo épico, Zurlini faz um filme de reencontros e de lutas interiores com a solidão e os laços fraternais. Da ausência surge esse vazio familiar interior que teima em se dissipar mesmo no reencontro e após dele. É a tragédia ou a aproximação dela que vem colmatar esse vazio e fortalecer o amor fraternal que tanto tempo esteve adormecido. Aí tudo é libertador da mágoa contida por anos, tudo é implacável e brutal na aceitação da força do mesmo sangue que corre nas veias e une aqueles dois irmãos. O amor, adormecido pelo tempo e pela ausência, emerge lentamente para explodir sob a ameaça da tragédia. 
É por isso, e sobretudo em Enrico (um assombroso Mastroianni), um caminho tortuoso e negro (alegoricamente pois o filme é repleto de luz no seu radioso technicolor) de dúvidas e de ambiguidades quer existencialistas quer espirituais na procura da redenção e do amor fraternal. Ainda que Cronaca Familiare transporte consigo todo o realismo (ou o neo-realismo) italiano do pós-guerra é o lirismo dessa visão da vida (e dos destinos daquelas duas vidas) que mais nos atrai, é a brutalidade do tempo que tudo fez para os castigar pela ausência. É aí que Cronaca Familiare irrompe toda a sua implacabilidade, todo o sentimento e todo o dramatismo que irá verter todas as lágrimas da tragédia, é aí que as trevas da mágoa, da solidão e do conflito interior irrompem para libertar o homem. Implacável, brutal, grandioso, Zurlini." 
Texto de Álvaro Martins, daqui.

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sexta-feira, 26 de agosto de 2016

A Rapariga da Mala (La Ragazza con la Valigia) 1961

Aida é uma jovem mulher pobre, atraente, cantora, que é enganada por um rapaz que lhe prometeu um bom contrato mas depois a abandonou. Aida descobre-o em Parma, bate à porta de casa dele e ele manda o irmão, Lorenzo, adolescente de 16 anos, atender a porta e dizer que ele não mora ali, que é engano. Mas Lorenzo apieda-se dela e tenta ajudá-la. Começa aqui uma relação de profunda amizade da parte de Aida e de amor da parte de Lorenzo. Esta relação vai ajudar Lorenzo a crescer e Aida a buscar um rumo para a sua vida. 
Sendo ele de uma família abastada, mas com inclinações de esquerda e querendo-se encaixar na comunidade artística mais boémica dos cineasta italianos, Zurlini conhecia bem as diferenças entre os dois mundos transcritos no filme, o de Aida e o de Lorenzo, e seriam as precisões destas diferenças que fariam deste filme tão grande. Aida tem pouco mais do que as roupas no corpo, lutando para ganhar a vida da única forma como ela pode, como uma "showgirl", vivendo dos favores dos homens e lidando dos contratempos que vai enfrentando ao longo do caminho. Lorenzo vem de uma família rica e privilegiada, mas não está orgulhoso da forma como eles se comportam com os outros menos afortunados, e a sua consciência começa a pesar pelos maus tratos que Aida recebe do seu irmão.
Mais uma vez, como acontece com "Verão Violento", Zurlini mistura uma história de amor e um cenário socialmente consciente, cada um deles com uma quantidade razoável de sentimento pelo outro, mas muito mais subtilmente do que o flash bombástico do filme anterior. Em "A Rapariga da Mala" a caracterização é muito mais contida, mas não menos magistral. A desconfiança de Aida em relação aos homens é mostrada apenas em pequenos detalhes, como a forma como ela tranca a porta e como obriga constantemente Lorenzo a jurar por tudo o que diz. 
Concorrendo para a Palma de Ouro em Cannes, seria o primeiro grande sucesso de Claudia Cardinale, como protagonista, apesar de na altura ela já ter trabalhado com realizadores como Luchino Visconti, Pietro Germi, Luigi Zampa ou Mario Monicelli. 

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quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Verão Violento (Estate Violenta) 1959

Depois da sua primeira longa metragem, Zurlini passou três anos desempregado devido à reputação dele ser um homem difícil com quem se trabalhar. Durante este tempo absorveu a cultura do seu país, uma cultura com quem antes se tinha sentido distanciado. "Verão Violento" foi o produto desta aprendizagem, uma história de amor rica em observações sociais e profundas vicissitudes históricas.
Passado no Verão de 1943, quando o império de Mussolini estava a desmoronar, e a Itália estava prestes a mergulhar numa guerra civil. Um grupo de italianos de famílias abastadas está festa familiar. Carlo (Jean-Louis Trintignant) é um jovem bonito e charmoso na casa dos vinte anos, bem vestido e cheio de palavras que as mulheres gostam de ouvir. Anda envolvido com Rosanna (Jacqueline Sassard), uma linda e sensual morena. Uma mulher mais velha, na casa dos trinta chama-lhe a atenção, Roberta, (Eleonora Rossi Drago), uma recente viuva de um heróico tenente naval, que tenta sobreviver ao seu novo modo de vida. Presa entre o compromisso vazio com um falecido marido com o qual ela não tinha muita ligação, e os avanços do jovem Carlo, com o qual a mãe não simpatiza de modo nenhum.
Passado em volta da cidade costeira de Riccione, na costa adriática, o caso de amor começa lentamente com a rejeição da mais bela e jovem, pela outra mais velha e experiente. Ficamos a saber que Carlo é um trapaceiro, filho de um influente fascista, que em breve irá ser forçado a saír da sua enorme casa da praia, para o exército. Isto adicionado ao comportamento furtivo de Roberta em relação à mãe, por causa da desaprovação da relação dos dois, torna o filme num crescendo emocionante, até às cenas finais.
"Verão Violento" não é um romance épico em tempo de guerra. É um filme menor do que isso, mais silencioso, reflectindo nos motivos das pessoas, nas acções e nas verdades. O "background" e a valorização da estética visual são óbvios. Gente bonita a passear na praia, uma partitura musical assombrosa, que envolve as pessoas na história e na situação sócio-política do país, são prova suficiente da declaração do próprio Zurlini: "Eu sempre acreditei que as coisas feitas com grande sinceridade, com a simplicidade de meios, e uma profunda honestidade, são aquelas que permenacerão".

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quarta-feira, 24 de agosto de 2016

As Raparigas de San Frediano (Le Ragazze di San Frediano) 1955

As escapadelas amorosas de um bonito mecânico chamado Andrea Sernesi aka "Bob". O primeiro nome no caderno negro de Bob é a tempestuosa Tosca. Em pouco tempo o nosso heroi passa dos braços de Tosca para os de Mafalda, uma dançarina, depois Silvana, uma professora, depois Bice, uma costureira. Entretanto, Gina, uma jovem que vive no mesmo bloco de apartamentos do que Bob, secretamente desenvolve uma paixão pelo mecânico.
A estreia de Zurlini nas longas metragens seria o seu único filme mais ligeiro, embora também seja tingido com alguma angústia. Vagamente baseado num conto de Vasco Pratolini (o autor de "Cronaca Familiare"), fala dos interlúdios amorosos de um jovem florentino, cuja alcunha é Bob, em homenagem a Robert Taylor.
Palavras do Catalogo Bolaffi del cinema italiano: "The jovial representation of the characters and its taking place in a timely and particular historical moment-lively and bustling Florence-already highlight the qualities of this new director. He is a sensitive scholar of psychologies, especially those of women, and an attentive painter of natural settings and countrysides. The narrative freshness, the freedom of his style, and the wonderful types of irony give him a fresh and new film".

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terça-feira, 23 de agosto de 2016

8 ANOS DE THOUSAND MOVIES

Muitos de vós provavelmente nunca o conheceram, ou já não se lembram dele, mas se fosse vivo o My One Thousand Movies faria hoje oito anos. Isto quer dizer que a comunidade "thousand movies" está hoje de parabéns. Obrigado a todos que ainda andam aí por esse lado.



A Estação (La Stazione) 1952

Uma das obras iniciais de Valerio Zurlini, uma curta-metragem documental sobre a Estação Termini de Roma, no estilo de cinema verité.
Um filme sem palavras, cinema avant-garde, incluindo os sons e os apitos dos comboios, e um olhar sobre os passageiros à espera de um comboio, capturando peões que parecem atrasados, revelando uma complacência, uma aceitação involuntária sobre uma ordem vigente estabelecida. Um retrato do dia a dia de uma estação ferroviária, onde a grande massa da humanidade espera por um comboio, ou atravessa a estação para chegar a uma reunião, ou caminha para mais um dia sem sentido.
Zurlini começou a sua carreira a dirigir uma série de curtas-metragens de não-ficção que lhe permitiram adquirir confiança e desenvolver o seu próprio estilo. Mais tarde confessou que estes documentários não foram feitos para ele ser notado, comentário que denunciava uma exagerada modéstia, pois alguns deles foram premiados e mostravam claramente algumas características de um talento emergente. "La Stazione" é o único destes filmes disponíveis, e vai ser com ele que iniciamos este ciclo.
Legendas em Inglês.

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sábado, 20 de agosto de 2016

Valerio Zurlini

De todos os realizadores italianos dignos de nota que se estrearam nos anos 50 - Ermanno Olmi, Francesco Rosi, Dino Risi, e Marco Ferreri - o menos conhecido é Valerio Zurlini. Um dos mais literados e sensíveis realizadores europeus do seu tempo, realizou apenas 8 longas-metragens até à sua morte prematura em 1982. Sendo ele um pós-realista, Zurlini era um mestre nos dramas intimistas, que estava muito em voga antes do radical Novo Cinema Italiano dos anos sessenta, de que fariam parte os realizadores mencionados em cima. Ele ficou como o único resistente de uma geração perdida, e talvez por isso nunca é mencionado nos livros sobre a história do cinema. 
Nascido em Bolonha, em 1926, foi marcado para a vida pela guerra e pela arte. Em 1943 alistou-se no corpo italiano de libertação e passou dois anos a lutar contra os Nazis no movimento da Resistência. A guerra viria a ser o cenário central de dois dos seus mais importantes filmes: "Verão Violento" e "La Soldatesse". Como muitos dos seus contemporâneos aderiu ao Partido Comunista, mantendo-se como um católico praticante. Um devoto apaixonado pela pintura e estudante da história da arte, tornou-se um amigo próximo de dois artistas notáveis, o grande pintor Giorgio Morandi e Ottone Rosai, cujo ponto de vista da cidade de Florença iria influenciar outra obra de Zurlini, "Cronaca Familiare". Entrou para o cinema com uma série de curtas e documentários, estreando-se nas longas metragens com "Le Ragazze di San Frediano", uma comédia agradável, e o seu único trabalho mais leve, apesar de ser tingido com melancolia.
"Verão Violento" (1959), foi um dos raros filmes a abordar um tabu de longa data no cinema italiano: a representação do dramático ano de 1943, que viu a queda de Mussolini, e o início da guerra entre fascistas e anti-fascistas.
As próximas duas semanas serão dedicadas a este realizador italiano. Um ciclo que já planeava a algum tempo, mas só recentemente consegui as suas oito longas metragens (além de uma curta). 
Vão ser duas semanas de descoberta. Espero que gostem. Até segunda-feira.

 

sexta-feira, 19 de agosto de 2016

The Glass Menagerie (The Glass Menagerie) 1973

Amanda Wingfield (Katharine Hepburn) é uma mãe dominadora presa às histórias do seu passado e possui planos irrealistas para o futuro dos filhos. Os seus projetos para a vida das crianças ameaçam até mesmo sufocar a tímida Laura Wingfield (Joanna Miles) e o aspirante a escritor Tom Wingfield (Sam Waterson).
Terceira adaptação desta peça de Tennessee Williams, desta vez para televisão. Três anos depois de  trabalharem juntos em "The Lion in the Winter", Katharine Hepburn e Anthony Harvey voltaram a trabalhar juntos, e num telefilme com um elenco recheado de estrelas. Aqui contava-se ainda Sam Waterston, Joanna Miles e Michael Moriarty. 
Por esta altura, em 1973, já Katharine Hepburn tinha conquistado grande parte dos media, e da indústria de entretimento - excepto a televisão. Já tinha ganho três Óscares (embora nunca tivesse aceitado nenhum), interpretou inúmeros clássicos, triunfou em dramas da Broadway, em comédias, e até mesmo num musical, mas nunca tinha representado para a televisão. . A sua lógica era misteriosa, será que ela propositadamente evitava a pequena tela por considerá-la insignificante, ou será que evitava tornar-se numa estrela ainda maior? Quando o produtor David Susskind lhe sugeriu aparecer numa adaptação para televisão de Tennessee Williams, Hepburn ergueu as suas barreiras habituais. Mas depois do produtor insistir e de lhe garantir todas as suas exigências criativas, Hepburn acabou por aceitar. Ela assinou perante um grande mediatismo, apesar da sua estreia na televisão não ter gerado as audiências que a ABC antecipava. Ainda assim o seu desempenho foi muito interessante. 
Apesar do diálogo poético e do desfecho assombroso, "The Glass Menagerie" foi uma peça que não envelheceu tão bem como outras obras de Williams. Diz-se que Williams se baseou na sua própria família para escrever a peça, o que explica a sua tão rica caracterização. 

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quarta-feira, 17 de agosto de 2016

Choque (Boom!) 1968

A incrivelmente rica escritora Sissy Goforth (Elizabeth Taylor) vive sozinha com as suas criadas e enfermeiras numa ilha do Mediterrâneo, onde cria as suas próprias regras. Os seus dias consistem em ditar a sua biografia e implorar por injeções.É então que chega à ilha Chris Flanders (Richard Burton), conhecido como “o anjo da morte”, um homem com bastante charme, que tem o hábito de “visitar” mulheres infelizes pouco antes das suas mortes. E também lhe aparece o seu vizinho, conhecido como “A Bruxa de Capri” (Noel Coward), e juntos eles partilharão um jantar que mudará as suas vidas…
"Boom!", de Joseph Losey, é um dos filmes mais mal amados e criticados do final dos anos sessenta. O orçamento previsto de 3,9 milhões de dólares foi largamente ultrapassado, tendo ultrapassado os 10 milhões, em parte para pagar o salário do casal maravilha, Elizabeth Taylor e Richard Burton, e vestir Taylor com os seus maravilhosos fatos Tiziani (muitos desenhados de propósito por Karl Lagerfeld) e jóias Bulgari, além da construção de um cenário fabuloso. Os críticos não gostaram de todas estas extravaganzas, e desprezaram o filme. Muitos espectadores saíram dos cinemas antes do filme terminar, completamente perplexos com o que tinham acabado de ver. 
Na verdade o filme deve ser visto como realmente é: um "Camp Classic" da mais elevada ordem (portanto, menor). Alegadamente, consta-se que toda a gente estava bêbada enquanto decorriam as filmagens. Noel Coward sorri de forma pouco adequada várias vezes durante o filme, e Burton parece estar intrigado com o absurdo de falar as suas linhas ridículas. Baseado na peça de Tennessee Williams chamada "The Milk Train Doesn’t Stop Here Anymore", que também foi o autor do argumento, acabaria por custar caro ao escritor, pois até à sua morte em 1983 nunca mais viu uma história sua ser adaptada a um filme de série A em Hollywood. Mesmo assim, aqui fica ele para ser visto.

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terça-feira, 16 de agosto de 2016

Flor à Beira do Pântano (This Property Is Condemned) 1966

A cidade de Dodson, no Mississippi, na era da Depressão, fica particularmente devastada com a chegada de Owen Legate (Robert Redford), um oficial com o bolso cheio de avisos de demissão para os ferroviários. Alva Starr, interpretada por Natalie Wood, é a namoradeira da cidade, com muitos planos, mas sem ter para onde ir ... até que Legate aparece na sua porta. O inevitável romance enfurece a mãe de Alva (Kate Reid), e causa a furia de toda a cidade.
Robert Redford apareceu em vários papéis no cinema e na televisão no inicio dos anos sessenta, mas foi apenas com o seu primeiro grande sucesso na Broadway, "Barefoot in the Park" (1963), que Hollywood começou a reparar nele. A sua interpretação de bissexual contracenando com Natalie Wood em "Inside Daisy Clover" (1965) deu-lhe um Globo de Ouro como "Best New Star" e a admiração e a amizade de Natalie Wood. No ano seguinte os dois voltariam a contracenar, neste "This Property Is Condemned", baseado numa peça de um só acto de Tennessee Williams.
Elizabeth Taylor era apontada para protagonista, com John Huston a realizar, mas ela queria o marido Richard Burton atrás das câmaras. Huston e Taylor saíram da produção (Taylor era demasiado velha para o papel), que iria parar a Natalie Wood, ela própria uma fã de Tennessee Williams. Natalie Wood acabaria por escolher Robert Redford para contracenar com ela, com o actor a recomendar o seu amigo Sydney Pollack, que tinha apenas realizado o seu filme de estreia, para dirigir.  Redford disse mais tarde ao seu biógrafo que "This Property Is Condemned" teve um desenvolvimento infernal. Segundo ele o argumento foi passando de mão em mão, desde Huston a Francis F. Coppola, incluindo James Bridges, Charles Eastman, e John Houseman, sem que nenhum se apercebesse que isto tinha de ser uma peça de um só acto. Finalmente Pollack fechou-se num quarto de motel com os vários rascunhos do argumento, e, literalmente, cortou-os e colou-os, para depois passar a um novo argumentista, David Rayfiel, para passar a limpo. Reza a lenda que Tennessee Williams ficou tão insatisfeito que pediu para ser removido dos créditos finais, apenas conseguindo que nos créditos finais aparecesse "suggested by a play by Tennessee Williams," em vez do habitual "based on a play by."   
A rodagem também foi muito problemática. Natalie Wood estava a passar por um periodo muito dificil na sua vida, e o argumento mudava de dia para dia. Era uma casa de loucos. Havia muita tensão na produção, e Redford chegou a escrever no seu diário que esperava que Natalie fosse embora da produção do filme. Depois das filmagens terem terminado, por causa de todo o stress da vida familiar e profissional, Wood tomou uma overdose de comprimidos para dormir. 

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domingo, 14 de agosto de 2016

A Noite de Iguana (The Night of the Iguana) 1964

Numa cidade isolada da costa mexicana, um padre com a fé abalada esforça-se para juntar os cacos da sua vida despedaçada. E três mulheres - uma viúva proprietária de um hotel, uma artista etérea e uma adolescente ninfomaníaca - podem ajudar a salvá-lo. Ou destruí-lo! 
Baseado numa peça da Broadway de Tennessee Williams sobre um padre sem hábito que se tornou guia turístico no México, a versão cinematográfica de John Huston foi nomeada para 4 Óscares: Melhor Actriz Secundária ( Grayson Hall), Melhor Fotografia a Preto e Branco, Direcção de Arte e Guarda Roupa. O único Óscar ganho seria pelo Guarda Roupa da autoria de Dorothy Jeakins.
"Night of the Iguana" é essencialmente um estudo de personagem, sobre a crise existencial de um homem (Richard Burton) cujo legado familiar tanto sobre liderança espiritual como irresistíveis "apetites" continuam a assombrá-lo. O restante elenco é pura dinamite, com uma Ava Gardner muito tensa como a infeliz proprietária de um hotel, Deborah Kerr como a visitante sexualmente inexperiente, Sue Lyon num papel bem próximo do que ela havia tido dois anos antes, em "Lolita", e Grayson Hall como a solteirona com um segredo. Burton certamente que tem o seu próprio segredo, e com o avançar da noite mais interessantes as conversas ficam. 
Burton vivia na altura um romance com a actriz Elizabeth Taylor, com quem casaria pela primeira vez pouco depois de terminadas as filmagens. Corriam rumores que a actriz o visitava durante o set, o que colocava a produção do filme constantemente nos jornais. O filme era rodado no México, num local que não aparecia nos mapas, chamado Puerto Vallarta, uma localidade que nem sequer tinha voos comerciais. Depois ficou um local muito conhecido, e hoje em dia tem resorts de luxo que recebe milhares de visitantes todos os anos.

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sexta-feira, 12 de agosto de 2016

Corações na Penumbra (Sweet Bird of Youth) 1962

Paul Newman é Chance Wayne, um ex-"gigolo" que volta à sua terra natal acompanhado por Alexandra Del Lago (Geraldine Page), uma actriz em decadência. A intenção de Wayne é impressionar Tom Finley (Ed Begley), o cacique local, um político corrupto que o expulsou da cidade. Mas a figura patética de Del Lago, que se afoga em álcool, drogas e sexo com a sua incapacidade de aceitar a passagem dos anos, não é a mais adequada para melhorar a imagem de Wayne. 
Uma das peças mais corrosivas e perturbadoras de Tennessee Williams, "Sweet Bird of Youth" foi um grande sucesso nas mãos de Elia Kazan pelos palcos da Broadway, mas teve uma produção algo problemática a passar para a tela. Por um lado, A MGM sabia que ía ter problemas com o Código de Produção, por causa da sua história: um ex-gigolo com aspirações a se tornar um actor de Hollywood tem uma relação com uma actriz outrora famosa, com um fraco por álcool e haxixe. Quando o casal visita a terra natal dele alguns segredos são expostos. O terrível final da peça original tinha Chance a ser castrado por vários durões. A versão cinematográfica não podia ser tão explicita, e Richard Brooks teve de reescrever completamente o final para algo muito mais optimista.
Por sorte, quatro dos principais membros do elenco da peça da Broadway concordaram entrar no filme: Paul Newman, Geraldine Page, Rip Torn, e Madeleine Sherwood, todos concordaram recriar os seus papéis na Broadway. Newman estava a tornar-se numa estrela de Hollywood muito rapidamente, contando já com duas nomeações para o Óscar de melhor actor (uma por "Cat on a Hot Tin Roof"(1958) e outra por "The Hustler"(1961)). Embora o seu desempenho em "Sweet Bird of Youth" seja louvável, é Geraldine Page quem rouba o filme, no papel de Alexandra del Lago, uma personagem originalmente inspirada em Tallaluh Bankhead, uma amiga próxima de Tennessee Williams.
 Foram três os actores nomeados para Óscares neste filme: Ed Begley, Geraldine Page e Shirley Knight, mas apenas o primeiro conseguiu levar uma estatueta para casa.

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quinta-feira, 11 de agosto de 2016

A primavera em Roma de Mrs. Stone (The Roman Spring of Mrs. Stone) 1961

Karen Stone (Vivien Leigh) é uma atriz de meia-idade decadente que perde o marido ao sofrer um enfarte durante uma viagem de férias a Roma. Sentindo-se solitária, Karen envolve-se com Pablo di Leo (Warren Beatty), um jovem gigolo italiano. 
Baseado em mais um romance de Tennessee Williams, "The Roman Spring of Mrs. Stone" contava com Vivien Leigh no principal papel, também ela uma actriz decadente de meia idade, que regressava ao cinema depois de uma ausência de seis anos, no seu penúltimo papel de protagonista, contracenando com Warren Beatty, um jovem jovem 24 anos mais novo e que se estreava no grande ecrã neste ano. O seu outro filme deste ano era "Splendor in the Grass", de Elia Kazan. A realização estava a cargo de José Quintero, a única obra para cinema de um homem virado para o teatro. 
É dito que a novela original de Tennessee Williams se passa no período logo após a grande guerra, e o seu subtexto poético permanece o mesmo na adaptação para o cinema, feita por Gavin Lambert ("Bigger than Life" e "Bitter Victory"). Dez anos separam a peça original e esta versão cinematográfica, e infelizmente esses dez anos fazem muita diferença. Nem a peça original, nem o filme são tão brilhantes como outras obras do dramaturgo, mas com um elenco e uma equipa destas era impossível o filme passar despercebido.
Vivien Leigh já tinha ganho uma Óscar a interpretar personagens de Williams, mas atravessava um dos períodos mais negros da sua vida. A passar por um processo de divórcio no preciso momento da rodagem do filme, soube durante um jantar que o seu marido pretendia casar-se com outra actriz, Joan Plowright. Leigh estava desolada quando terminou a rodagem do filme, e o seu olhar de desolação e de tristeza que seguimos durante o filme era verdadeiro. A sua interpretação, mesmo assim, ficou fora das nomeações para os Óscares, mas outra actriz foi nomeada como secundária, Lotte Lenya, como condessa Magda Terribili-Gonzales.

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quarta-feira, 10 de agosto de 2016

Bruscamente no Verão Passado (Suddenly, Last Summer) 1959

Uma jovem é internada num hospital psiquiátrico, depois de testemunhar a morte do primo. A tia, que a internara, quer uma intervenção cirúrgica para acabar o que parecem ser alucinações, mas o neurocirurgião que a trata percebe que se tratam de alucinações reais. A história gira à volta de uma personagem misteriosa, (Sebastian Venable, o primo), cuja figura só conseguimos ver em breves flashbacks, o que dá maior poder à narrativa, porque tentamos compreender exactamente o que causou a sua morte horrível, e porque a sua mãe está tão determinada a esconder a verdade sobre o seu enigmático filho.
Adaptação de uma peça de Tennessee Williams de 1957, de um único acto,dirigida de uma forma tensa por Joseph L. Mankiewicz (Dragonwyck/Cleopatra). Este chocante melodrama lida com temas bastante pertinentes, como a loucura, prostituição homossexual, incesto e canibalismo. Levamos muito tempo até chegar à revelação final, mas, quando esta chega, é bastante eficaz. Gore Vidal escreve o argumento, e consegue mantê-lo menos contundente do que a peça, cheio de insinuações ocultas, que vamos descobrindo à medida que o tempo vai passando. Com um slogan bastante efectivo: "...suddenly last summer Cathy knew she was being used for something evil!", o filme acabaria por fazer bastante sucesso nas bilheteiras, como já era habitual nas obras adaptadas das peças de Williams. 
Desde os anos 30 que a MPAA, o organismo de auto-censura da indústria cinematográfica, tinha sido criado para impor o seu código de produção, regulando o que podia e não podia ser visto. No final dos anos 50 os padrões tinham ficado mais frágeis, e as fronteiras estavam a ser empurradas, com os filmes a abordarem cada vez mais temas que outrora eram tabu, como o sexo e as drogas. "Suddenly, Last Summer" (1959) foi uma das produções mais ousadas deste periodo, e servia como prenuncio ao que viria na década de sessenta.
Como já era habitual, os filmes de Williams eram excelentes veículos para as suas actrizes. Mais uma vez valeu nomeações ao Óscar, aqui ex-aqueo para as suas duas actrizes principais Katherine Hepburn e Elizabeth Taylor. Taylor ainda não tinha 30 anos e já conseguia a sua terceira nomeação, segunda consecutiva graças a obras de Tennessee Williams. Neste ano a concorrência era muito forte, e a estatueta foi para alemã Simone Signoret.

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terça-feira, 9 de agosto de 2016

Gata em Telhado de Zinco Quente (Cat on a Hot Tin Roof) 1958

Harvey Pollitt (Burl Ives) é um rico proprietário de terras, além de possuir uma fortuna de US$ 10 milhões. Harvey festeja o aniversário e é visitado pelos dois filhos, mas ignora que tem um cancro inoperável, pois o médico tinha lhe dito que estava recuperado. Gooper (Jack Carson), um dos filhos, e a sua esposa (Madeleine Sherwood) tiveram algumas crianças e cobiçam poder herdar os milhões do "Velho". Por outro lado Brick (Paul Newman), o seu filho preferido, é um alcoólatra e ex-estrela de futebol americano, que vive um casamento infeliz. Esta situação deixa Maggie (Elizabeth Taylor), a sua esposa, muito frustrada, porque ama o marido apesar de ser desprezada por ele. 
A peça "Cat on a hot Tin Roof" foi um êxito da Broadway na primavera de 1955, e não demorou muito para que a MGM comprasse os direitos para a sua adaptação ao cinema, com James Dean e Grace Kelly apontados para os papéis principais, de Brick e Maggie. A peça de Tennessee Williams vencedora de um prémio Pulitzer, revelou-se ser mais complicada do que parecia, e foram precisos três anos para que a MGM conseguisse uma adaptação do do argumento que conseguisse satisfazer os standards do Código Hays, e quando o argumento ficou pronto já Dean tinha morrido e Kelly era uma princesa na vida real. O argumento ficou sem qualquer referências à homossexualidade do protagonista, e foi-lhe retirado bastante narrativa para tornar o filme fluído para um público mainstream. Tennessee Williams não ficou muito satisfeito com todas estas alterações, e chegou a desencorajar as pessoas a verem o filme, mas apesar disso foi um dos grandes sucessos de bilheteira do ano, para além de ter conseguido seis nomeações para o Óscar (incluindo Filme, Realizador, Actor, Actriz e Argumento), acabando por perder tudo. 
Apesar de toda a inépcia da MGM em lidar com críticas a valores da sociedade americana (homofobia, mentira, avareza, são apenas três dos pontos que o autor aponta o dedo nesta peça), o filme é compensado pela electrificante presença de Paul Newman e Elizabeth Taylor. É incrível pensar que poucas semanas depois de iniciar a rodagem deste filme, Taylor tinha perdido o marido num acidente de avião. Poucas foram as vezes que a actriz tinha conseguido uma prestação tão arrepiante. Taylor e Newman representavam duas escolas de interpretação muito diferentes, ela era muito instintiva, ele era muito devoto ao "método", com o confronto entre os dois a ser brilhante.
O filme era originalmente para ter sido dirigido por George Cuckor, mas este acabou por ser substituído por um muito menos experiente Richard Brooks quando se apercebeu nos problemas que seriam levantados pelos censores. Brooks já era um dos autores do argumento, e a sua decisão de ensaiar o filme como se fosse uma peça de teatro assegurou-lhe a intensidade claustrofóbica da fonte original, e ainda amplificava o poder das interpretações, como não havia mise-en-scéne ou trabalho de câmera para nos distrair. 

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terça-feira, 2 de agosto de 2016

A Rosa Tatuada (The Rose Tattoo) 1955

Uma viúva obcecada com a morte do marido (Anna Magnani) enclausura-se e afasta qualquer possibilidade de retomar a sua própria vida, levando a filha consigo no seu martírio. Quando menos espera, um camionista italiano desperta novamente a sua paixão adormecida, enquanto a filha descobre a sexualidade à própria maneira. 
Ana Magnani foi a musa do dramaturgo Tennessee Williams durante muitos anos, sendo eles amigos de longa data com Williams a escrever pelo menos três peças para ela. "The Rose Tattoo" foi escrito expressamente para Magnani, e apesar dela não ter entrado na versão teatral da Broadway, entrou no filme, tendo ganho com ele o seu único Óscar. Era o segundo Óscar que Williams proporcionava ás suas actrizes, depois de Vivien Leigh ter vencido em "Um Eléctrico Chamado Desejo".
Algures entre os trabalhos que colocaram Williams no mapa, "A Streetcar Named Desire" (1951) e "The Glass Menagerie" (1950), e as versões para cinema de "Cat on a Hot Tin Roof" (1958) e "Suddenly Last Summer" (1959), este filme oferecem-nos variações dos seus temas habituais como a opressão familiar, o amor proibido, o luto, o alcoolismo e a loucura.
Tal como outras personagens de luto na obra de Williams, Serafina está obcecada com a beleza do seu sofrimento, com o seu amante morto a ser idolatrado de todas as perspectivas. Este amante morto, aparece muitas vezes na obra do dramaturgo, como o Fred de "Night of the Iguana", o Sebastian de "Suddenly Last Summer" ou até mesmo em "Cat on a Hot Tin Roof". Serafina está condenada a lamentar o seu homem perdido na forma do marido. Na sua mente ele foi congelado em algum ponto da juventude viril.
Daniel Mann era o homem atrás das câmaras.

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segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Um Eléctrico Chamado Desejo (A Streetcar Named Desire) 1951

Depois de perder o trabalho e a sua casa no Mississippi, Blanche Dubois desloca-se para New Orleans, para visitar a irmã, Stella. Blanche mal consegue acreditar no nível em que Stella caiu. Vive num apartamento apertado num bairro decadente da cidade, casada com um brutamontes chamado Stanley, que parece saído directamente da idade da pedra. Não demora muito até que o seu ar de senhora e o seu criticismo exagerado a tornem numa visita pouco desejada, e Stanley começa a acreditar que ela esconde alguma coisa...
Adaptação de Tennessee Williams de uma peça sua vencedora de um Pulitzer em 1947, estava rodeada de controvérsia desde o primeiro minuto, mas tornou-se num filme marcante no modo como mudava o retrato do sexo no cinema americano. Apesar de algumas alterações à peça original de Williams, e alguns cortes de última hora para cumprir com os Códigos de Produção de Hollywood, o filme foi devastado com uma enorme onda de criticismo, para não falarmos em total condenação, pelas suas conotações eróticas e evidentes referências sexuais. Mesmo assim foi um grande sucesso, tendo conseguido 12 nomeações ao Óscar, tendo apenas ganho quatro (incluindo Melhor Actriz e Melhor Actor/Actriz Secundários).
Foi realizado pelo cineasta independente Elia Kazan, que já tinha dirigido a primeira adaptação teatral da peça. O elenco era constituído na sua maioria por actores que tinham colaborado na adaptação teatral de Kazan, principalmente Marlon Brando, que aqui participava na sua segunda obra cinematográfica. A principal mudança era a inclusão da actriz Vivien Leigh, como Blanche, repetindo o papel que tinha interpretado na primeira adaptação inglesa da mesma peça, dirigida na altura pelo então marido Laurence Olivier. Era o seu papel mais icónico desde a sua participação em "Gone With the Wind", como Scarlett O´Hara. Doze anos passaram entre estes dois filmes, que valeram dois Óscares a Vivien Leigh.
O que é tão impressionante neste filme, mesmo hoje em dia, é a intensidade sensual e o realismo, em vez da prosa altamente estilizada da peça, e, como é óbvio, os cenários teatrais. O cenário claustrofóbico (que quase faz lembrar uma cela num asilo), e a fotografia quase noir criam um sentimento sufocante de opressão, que reflecte e acentua a crescente tensão sexual na casa dos Kowalski, e a descida à degradação mental de Blanche. Até a música é profundamente evocativa, sugestionando a atmosfera de um bordel barato de Paris.

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