segunda-feira, 22 de julho de 2019

Quem Programa Sou Eu: Desporto, por José Oliveira

Estamos de volta com a rubrica "Quem Programa Sou Eu", que tem sido, e continuará a ser, regular, ao longo deste ano, e quem sabe dos próximos, onde os nossos seguidores/leitores são convidados a programar o seu próprio ciclo. Quem quiser participar em futuras edições é favor mandar mail para: myonethousandmovies@gmail.com. Neste momento já temos mais duas listas para os próximos tempos, mas, quem sabe, se a vossa vez será a seguinte.

O convidado desta semana, é um convidado muito especial. O José Oliveira, natural de Braga, mas que tem tido uma presença muito activa no mundo do cinema desde há muitos anos para cá. Ele é blogger, realizador, cineclubista, e muito mais, mas, sobretudo, é alguém com quem o My Two Thousand Movies se identifica muito. A sua presença aqui, é por isso uma honra e para o conhecerem um pouco melhor, e a sua cinefilia, nada melhor do que ler as entrevistas que deu para o site "À Pala de Walsh", aqui e aqui, a segunda em conjunto com o João Palhares, seu colega e co-fundador do Cineclube Lucky Star. "Desporto" foi o tema escolhido, e para dar o pontapé de saída nada como lermos as suas palavras:


"Volto a recuperar Thomas Pynchon e o seu livro mais desprezado porque ligeiro, ligeiro como uma partida de bola, esse elegíaco charro apelidado Inherent Vice: «O que seria « caminhar sobre as águas » senão a maneira bíblica de dizer surfar?»
Jorge Valdano, arcanjo de Diego Armando Maradona aquando da famosa “mão de Deus” e filósofo disponível do genuíno futebol da rua, escreveu que «todos queremos vencer, mas apenas o medíocre não aspira a beleza.» Steve Prefontaine, uma das casualidades mais “estranhas” e fascinantes que a história do desporto deu à luz efémera, outro lamentavelmente “irresponsável” que não soube administrar a vida, nunca quis começar as corridas de fundo no fundo da cauda para atacar no instante decisivo, pois para ele isso era como a cobardia e acreditar em alguma coisa, nem que seja em si mesmo, isso sim, é o milagre acabado.
A beleza… acreditar em alguma coisa… milagres… todo o desporto é equiparável à magia e ao milagre do cinema, à sua razão e à pergunta sempre capital do “porquê?”, e da transfiguração à transcendência, cabe toda a beleza. É por demais evidente que todas as gerações querem que no seu tempo aconteça o incomparável, o “melhor de sempre”, o mito. Por isso tentamos achar o novo Michael Jordan, o novo Maradona, o Joe DiMaggio em Brooklin… o Eusébio do Lumiar…por isso se usam as estatísticas, os recordes, se equipara e se faz a cisão entre as “eras modernas” e as “eras arcaicas”, a tecnologia a matar o primordial, os tecnocratas a fuzilarem a beleza. Jordan não foi só o melhor pelos seus títulos , pela iconografia, pela universalidade; nem também somente pelo seu percurso bigger than life, por ter sido um dos últimos hustlers na sombra e em escala interplanetária, mas porque tudo isso aconteceu inseparável da beleza de um corpo e da inteligência de uma mente em puro movimento concreto e translúcido.
Em puro movimento, ou seja, uma cadência celeste como terrena que nasceu para isso e somente para isso. Assim são os filmes verdadeiramente filmes. O essencial nem que seja num milésimo de segundo a salvar tudo. De John Ford ao Steven Soderbergh de Traffic (o mais belo dos filmes de desporto, explicarei mais à frente no ciclo). A beleza a tomar conta de tudo e escondida num piscar de olhos. Bons abismos."

José Oliveira, Julho de 2019


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