terça-feira, 31 de março de 2015

Amantes em Veneza (Blume in Love) 1973



Stephen Blume (George Segal), é um advogado, de meia idade, especialista em divórcios. Vive numa situação paradoxal quando, depois de ver o seu casamento terminado, ainda está apaixonado pela sua mulher (Susan Anspach).
"Blume in Love" é uma meditação, essencialmente benigna sobre os relacionamentos confusos, num tempo em que muitas pessoas viviam com a sensação de "vale tudo". Paul Mazursky é um realizador com um "toque" muito próprio, que permite que o seu grupo de actores se aproximem do comportamento humano naturalista, mas ainda assim mantém o suficiente para seguir uma narrativa em movimento. Se há alguma sátira aqui, é filtrada atavés de uma sensibilidade que respeita os personagens, e coloca os seus sentimentos em primeiro lugar.
"Blume in Love" é também um conto sobre um homem com um coração destroçado que se torna um náufrago apaixonado e encontra o perdão. Todos aqueles que viveram por uma crise pessoal semelhante reconhecerão o final romântico de Mazursky. O filme é notável pelo que alcança na área de redefinir o que significa o casamento. Alimenta uma discussão interessante sobre como duas pessoas gerem as suas expectaticas da relação, e como essas percepções podem levar uma ruptura entre marido e mulher.
O elenco de secundários inclui alguns nomes interessantes: Kris Kristofferson, Marsha Mason, Shelley Winters, e o próprio realizador.

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segunda-feira, 30 de março de 2015

Bob, Carol, Ted e Alice (Bob & Carol & Ted & Alice) 1969



Bob e Carol são um sofisticado casal californiano que, depois de assistir a uma sessão terapêutica matrimonial, decidem expandir os limites do casamento tendo casos extraconjugais. Ted e Alice são um casal mais tradicional que sempre gostou de ouvir as provocativas aventuras dos seus melhores amigos, até chegar o dia em que são convidados a juntarem-se a eles…
Paul Mazursky a fazer uma excelente estreia na realização. No final dos anos setenta a maioria dos realizadores fazia filmes que tentassem refletir os tempos, com montagens rápidas argumentos e elementos fora de normal, mas Mazursky seguia num caminho diferente, tentando manter o humor a um nível subtil, e fazendo grande uso do silêncio. Alguns filmes desta época debruçaram-se sobre temas bastante picantes, mas ainda era necessário manter uma certa moral. A um tema que poderia ser polémico, Mazursky mostra respeito pelo seu público adulto, mantendo um nível sofisticado e descomprometido.
Foi tanto, famoso como infame, ao combater a revolução sexual, e é muitas vezes visto apenas como um filme de "troca de casais". Na verdade, a troca de casais vem apenas depois do "climax" do filme, e apenas tem alguns minutos de duração, para além de ser apresentada de um modo sério. Embora seja uma comédia, deita um olhar sério para as relações durante este final da década de sessenta e como elas foram afectadas pelas rápidas mudanças sociais. Mazursky está muito mais preocupado com as suas personagens do que como a sociedade os afecta. Ao pintar um retrato incisivo e inteligente de um grupo de pessoas reais, identificáveis com a realidade do dia a dia, "Bob and Carol..." mantém-se um filme efectivo, apesar de algumas reviravoltas com frases e expressões de ideias que possam parecer um pouco naives para os dias que correm.
Não podia ter sido uma melhor estreia para Mazursky. O filme foi nomeado para 4 Óscares: argumeto (Mazursky e Larry Tucker), fotografia, e actor e actriz secundários (Elliott Gould e Dyan Cannon). Robert Culp e Natalie Wood, como protagonistas ficaram de fora.

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domingo, 29 de março de 2015

Paul Mazursky

Paul Mazursky raramente foi ligado aos realizadores da "Nova Hollywood", como Martin Scorsese, Francis Coppola, William Friedkin, Steven Spielberg, que surgiram em finais dos anos 60, e início dos anos anos 70. Mas Mazursky era um dos realizadores/argumentistas mais inteligentes deste período, e soube tirar vantagem do mundo do "show business", sobretudo durante este período dos "movie brats", como se chamavam os realizadores desta geração, estabelecendo o seu próprio nicho de comédias dramáticas sobre a vida moderna. Por vezes os filmes de Mazursky eram populares o suficiente para se tornar referências culturais, como foi  o caso da comédia sobre os casamentos abertos "Bob & Carol & Ted & Alice", ou a vida da mulher solteira em "An Unmarried Woman", mas Mazursky também fez alguns filmes mais suaves e malancólicos, como o semi-autobiográfico "Next Stop, Greenwich Village".
Os seus filmes são principalmente focados em culturas em fase de transição, mostrando como pessoas normais tentam manter-se num mundo onde os costumes e os valores evoluem. São filmes frequentemente engraçados, mas o mais importante, documentam o seu tempo, fazendo piadas do progresso e da pretensão ao mesmo tempo, mostrando a compaixão pelo seres humanos, tentando fazer o melhor para se adaptarem sem se perderem. Mazursky nunca se tornou numa estrela, mas deixou para trás uma carreira bastante interessante.
Esta semana vamos ver 5 dos seus filmes mais importantes, todos da fase incial da sua carreira. Espero que gostem.

Segunda: "Bob, Carol, Ted and Alice" (1969)

Terça:  "Blume in Love" (1973)

Quarta: "Harry and Tonto" (1974)

Quinta: "Next Stop, Greenwich Village" (1976)

Sexta: "An Unmarried Woman" (1978)


sábado, 28 de março de 2015

Maciste no Inferno (Maciste all'inferno) 1962



Na Escócia do século 17 uma bruxa é queimada na fogueira, mas antes ainda consegue lançar uma maldição sobre toda a população. Um século depois, as mulheres estão misteriosamente a ser levadas ao suicídio, por ela. Não há problema - Maciste, o clone italiano de Hércules para para resolver o problema. Há uma pergunta que não vale a pena fazerem, porque não vão obter resposta, mas também não tem interesse relevante: o que faz Maciste na Escócia do século 17?
Um dos melhores filmes da série Maciste (nas versões dobradas costuma ter outros nomes, como Hércules, Samsão, Golias, Colossus, mas aqui tem o mesmo nome, apesar da versão postada ser a italiana), e é mais um filme que se passa no submudo do terror, apesar de não ter Mário Bava, e de ficar longe da qualidade de "Hercules in the Haunted World", mas o sobrenatural tem uma presença muito forte durante o filme, com os cenários do submundo a serem impressionantes.
Riccardo Freda, italiano nascido em Alexandria, filho de pais italianos, dirige. Primeiro foi escultor, depois crítico de arte, mudando para a realização nos anos 40, carreira que durou cerca de quatro décadas. Freda era outro especialista no terror gótico, já tínhamos visto por aqui que foi ele que iniciou o movimento do terror gótico italiano, com "I Vampiri". Machiste era interpretado pelo italiano Adriano Bellini, que adoptou o nome de Kirk Morris. Era comum nesta época actores italianos adotarem nomes ingleses, para conseguirem chegar mais facilmente a audiências internacionais. Morris, dado a sua fisionomia, praticamente só interpretou peplums, aparecendo na pele de Machiste por 6 vezes.

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sexta-feira, 27 de março de 2015

Hércules contra o Vampiro (Ercole al centro della Terra) 1961



Depois de regressar da batalha do filme anterior, Hércules descobre que a sua amada, Daianara, perdeu os sentidos. De acordo com oráculo Medeia a única esperança de Daianara é a Pedra do Esquecimento, que se encontra nas profundezas do reino de Hades. Hércules parte com dois companheiros, Theseus e Telemachus, em busca da pedra, sem saber que o responsável pela sua situação é o Rei Lico, que pretende ficar com a namorada de Hércules para ele, depois de a reanimar.
Embora "Black Sunday" tivesse elevado o terror a preto e branco a novos níveis nunca vistos, Mário Bava desviou-se para um novo território no ano seguinte, com este "Hércules in the Hunted World", uma mistura incrivelmente colorida de terror gótico com peplum, que se destaca como uma das melhores entradas, senão mesmo a melhor, neste género que estamos a explorar. Uma mistura elegante de paisagens luminosas, monstros macabros, e reviravoltas excêntricas, onde não falta um grande Christopher Lee no papel de vilão, e o britânico Reg Park no papel principal. Este filme era a sequela directa para "Hércules, o Conquistador", que vimos na passada quarta-feira.
Graças a uma extensa experiência como director de fotografia Bava traz uma enorme sensibilidade para este filme, o seu primeiro colorido, e estabelece as bases para clássicos como "Planet of the Vampires", também realizado por si. Com um orçamento mínimo, e cenários limitados, Bava transforma os seus estúdios em miniatura em redemoinhos de côr e textura, colocando os seus actores contra uma série aparentemente interminável de obstáculos imaginativos. Alguns efeitos expandem a profundidade física e o alcance de muitos shots. Bava não desperdiça uma pequena parte do Widescreen.
Bava dirigiu outro filme histórico no mesmo ano, "Gli Invasori/A Fúria dos Vikings", interpretado por Cameron Mitchell. E o protagonista iria repetir o papel de Hércules mais duas vezes.

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quinta-feira, 26 de março de 2015

O Colosso de Rodes (Il Colosso di Rodi) 1961



Um herói militar grego chamado Darios visita o seu tio em Rhodes, no ano 280 AC. Rhodes acabou de construir um enorme colosso de Apollo, para guardar o seu porto, e está a preparar uma aliança com Phoenicia, que poderá ser hóstil para a Grécia. Darios envolve-se com a bela Diala, filha do idealizador da estátua, e conhece um grupo de rebeldes liderados por Peliocles. Estes rebeldes tentam derrotar o tirânico rei Serse, e o seu comandante que dá pelo nome de Thar.
Depois do enorme sucesso de Dino de Laurentis da versão dobrada em inglês de Hércules (1959), outros grandes estúdios americanos começaram a importar peplums semelhantes, para rivalizar com este grande sucesso internacional. Nenhum chegou sequer perto de destronar esse filme nas bilheteiras, e a maioria tinham pouca qualidade, e destinava-se a plateias pouco exigentes, como estudantes pré adolescentes numa matinée de sábado. Uma das poucas excepções foi este filme, dirigido por um futuro "auteur" do western spaghetti", que se estreava aqui: Sergio Leone. O filme distinguia-se por ser uma produção de valores elevados, filmado no porto espanhol de Laredo, e no golfo da Biscaia, e uma realização muito sólida que combinava humor com momentos de sadismo, acabando por ser um filme muito interessante com um herói pouco convencional, e uma heroína. Ele é apresentado como um playboy machista, ela é uma beleza enigmática que gosta de provocar e enganar os seus admiradores. Ambos revelam a sua verdadeira natureza antes do cataclismo do acto final.
De acordo com relatos históricos existia mesmo um colosso de Rhodes. Era uma das "sete maravilhas do mundo", uma estátua gigantesca de Apollo que marcava a entrada do porto de Rodes entre 280 e 224 AC,  que acabaria por ser destruída por um terramoto. Leone escreveu a história em conjunto com seis outros argumentistas, e contava com o actor americano Rory Calhoun e a italiana Lea Massari nos principais papéis.
Apesar de ser a estreia de Sérgio Leone na realização, este tinha já uma vasta experiência no campo dos épicos de fantasia, já que tinha sido assistente de realização de Mervyn LeRoy em "Quo Vadis" (1951), de Robert Wise em "Helena de Tróia (1956), de William Wyler em "Ben Hur" (1959), e no remake de "Os Últimos dias de Pompeia (1959), com Steve Reeves. Leone contrataria vários elementos da equipa deste último filme, para a sua primeira realização, como o director de fotografia Antonio Ballesteros, o compositor Angelo Francesco Lavagnino, entre outros. Gostou particularmente de apresentar o Colossus como uma versão mais malévola da Estátua da Liberdade, que em vez de dar as boas vindas aos visitantes da sua costa, é bem capaz de lhes atirar um caldeirão de óleo a ferver.
Quando o filme estreou em Itália foi um enorme sucesso de bilheteira, mas não ultrapassou "Hércules" em popularidade. Ainda assim convenceu a MGM a distribuir o filme nos Estados Unidos onde recebeu críticas medianas, tal como os outros peplums da altura. O filme seria redescoberto mais tarde, depois de Sérgio Leone se tornar num realizador de sucesso, com os seus westerns spaghetti.
Existem várias versões do filme, esta tem 123 minutos, e só a consegui arranjar com legendas em inglês.

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quarta-feira, 25 de março de 2015

Hércules, o Conquistador (Ercole Alla Conquista di Atlantide) 1961



Hércules e o seu amigo Androcles partem num navio para salvar a Grécia de uma misteriosa força invasora. Depois de naufragarem Hércules vai parar a uma pequena ilha onde uma bela jovem está a ser mantida prisioneira pelo malvado Proteus, que é salva por Hércules. Acontece que a jovem é filha da raínha de Atlantis, e é para lá que Hércules segue. Mas, acontece que a raínha não fica muito satisfeita por ter a sua filha de volta, e, na verdade, esconde alguns segredos sombrios.
Depois de dois filmes de sucesso com Steve Reeves no papel de Hércules não tardaria muito para que outros o imitassem. Chegamos assim a Reg Park, sem dúvida o segundo actor mais popular a interpretar esta personagem, fazendo a sua estreia neste filme, conhecido também como "Hércules and the Captive Women". Antes de mais, há duas coisas a ter em atenção: apesar do título internacional, existe apenas uma mulher captiva, e não várias, como indica o título. Apesar de muitos considerarem este filme como uma sequela aos de Steve Reeves, na verdade não é. É apenas mais um filme a utilizar a personagem de Hércules, o que voltaria a acontecer muito nos anos seguintes.
Dentro do território do Peplum é um filme bastante acima da média, para o qual contribuíram uns valores de produção consideráveis. Vittorio Cottafavi já tinha realizado cinco entradas neste género, mas seriam precisos muitos anos até ver reconhecido o seu valor. Durante a década de sessenta ainda viu alguns dos seus filmes serem falados, especialmente através de alguns críticos do "Cahiers do Cinema", como Truffaut. Aqui ele contava com a ajuda preciosa de Duccio Tessari, no argumento. Tessari colaboraria no argumento de bastantes "peplums, mas seria, mais tarde, no spaghetti que se destacaria, tanto como realizador como argumentista. O elenco contava com um Gian Maria Volonté, ainda em início de carreira, no papel de rei de Sparta.

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terça-feira, 24 de março de 2015

Hércules (Le Fatiche di Ercole) 1958



Uma jovem mulher fica presa numa carroça quando os cavalos desatam a fugir, mas ela é salva mesmo a tempo pelo imortal Hércules (Steve Reeves), que atira uma árvore para a frente dos cavalos, parando-os. A mulher é Iole, a filha do rei Pélias, que convidou Hércules para visitar a sua cidade, e treinar o seu filho para ser um homem. Mas parece que Iole está preocupada com os acontecimentos que ocorreram anos antes, quando o seu tio, que era o rei na altura, foi brutalmente assassinado, e o seu primo Jason fugiu com o Velo de Ouro. Hércules chega à cidade e começa a treinar o filho de Pélias, mas quando um homem que diz ser Jason chega à cidade, Hércules é enviado com ele numa expedição para encontrar o Velo, e provar quem é realmente Jason.
Muito antes dos géneros de culto do cinema italiano, como o Spaghetti, o Giallo ou o Macaroni Combat, havia o Peplum. O peplum foi revigorado pelos épicos históricos americanos, como "Spartacus", "Os Dez Mandamentos", "Ben Hur", muitos deles filmados em Itália. Sérgio Leone, antes de se estrear na realização, fez parte da equipa de produção de alguns destes filmes. O primeiro filme deste primeiro "género" italiano até foi uma obra modesta, e de baixo orçamento: "Hércules". E esta foi a obra que estabeleceu o género, influenciando cerca de uma centena de filmes. Enquanto que a maioria dos peplum adaptava livremente figuras da história nas suas aventuras, sem referência às suas próprias lendas, "Hércules" é baseado, muito de perto (embora esteja mais perto da versão Romana da lenda) nos contos históricos deste herói. A segunda parte do filme é uma adaptação do conto dos "Argonautas", com Hércules a passar a ter um papel secundário na história. Algumas sequências não funcionam tão bem como deviam (Hércules a lutar com um leão, e depois com um touro), enquanto que o personagem de Jason nunca é suficientemente trabalhado para parecer um herói. O filme desenvolve-se bastante lentamente mas na segunda parte tem algumas sequências interessantes, e um climax adequadamente dramático.
Realizado por um pouco conhecido Pietro Francisci, que também dirigiu a sequela, mas provavelmente o tom e o ambiente do filme são mais facilmente creditados ao director de fotografia Mario Bava, que ficaria mais conhecido no terreno do terror gótico, embora também tenha dado uma perninha neste popular género. As pinturas e a iluminação são claras evidências da influência de Bava.

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segunda-feira, 23 de março de 2015

Peplum

O termo Peplum, por vezes também chamado de Sword and Sandal, é um expressão que vem do latim, e era também o robe utilizado pela personagem de Hércules usava por cima do ombro. É um termo também aplicado a uma série de filmes que surgiram nos anos 50, com homens musculosos, depois do sucesso de Hercules, de 1958. No entanto, tal como a maioria das expressões de culto europeias, tornou-se confuso, e demasiado usado ao longo dos anos.
Vamos classificar como Peplum uma variante do Sword and Sandal, mais especificamente os filmes rodados na Europa, na sua grande maioria em Itália. O "peplum" era um cruzamento dos filmes de homens musculados com os épicos históricos de aventuras, passados em cenários clássicos, que vinham desde o antigo Egipto até perto do ano 700 AC. O Peplum não deve ser confundido com o posterior sub-género "sword and sorcery", do qual faz parte o famoso "Conan, the Barbarian" (1982).
Já desde os primeiros tempos que o cinema italiano se dedicava a fantásticos épicos de aventuras, basta lembrar os clássicos mudos Quo Vadis (1912), The Last Days of Pompeii (1913), ou Cabiria (1914). Este último ficou famoso por introduzir a personagem de Maciste, um herói nos molde de Hércules, interpretado pelo actor Batolomeu Pagano, que nos anos seguintes, em plena era do cinema mudo, interpretaria a mesma personagem mais 25 vezes. Este género acabaria por desaparecer no rescaldo da Primeira Guerra Mundial. A segunda guerra mundial ainda fez mais danos à indústria italiana, mas o género lentamente começava a ressurgir. Em 1950 surgia uma nova versão de "The Last Days of Pompeii, seguido, em 1953, por "Sins of Rome", realizado por Riccardo Freda.
Mas o mais influente filme deste género, acabaria por ser uma obra feita com um orçamento muito pequeno: Fatiche de Ercole (1958). Uma nova versão do conto clássico dos Argonautas, realizado cinco anos antes da famosa versão americana, com o culturista americano Steve Reeves a interpretar a personagem do mesmo nome. Rapidamente se seguiu uma sequela, "Ercole e la regina di Lidia", com Reeves a voltar ao papel anterior. Estes dois filmes foram um sucesso em Itália, e, mais importante, foram um sucesso na América, onde os direitos tinham sido comprados por Joseph E. Levine, que anteriormente já tinha comprado os direitos de Godzilla (1954). Graças a uma promoção agressiva, o filme colocou-se ao lado dos maiores sucessos do ano americanos, e foi implementou o boom do falado cinema de género italiano, que começou aqui.
Nos seis anos seguintes a indústria italiana produziu quase 100 peplums, de todas as formas e feitios, até o género começar a desaparecer, em meados da década de 60, em parte por causa da repetição dos filmes, que já começam a ser cada vez mais idiotas, da diminuição dos orçamentos, e também por causa do aparecimento do spaghetti western, que começava a conquistar as audiências do Peplum. O spaghetti foi mesmo a sentença de morte para o peplum, já que a maioria dos seus mais famosos realizadores mudavam-se de um género para o outro, levando atrás de si toda uma indústria de sucesso. Entre os muitos realizadores italianos que passaram pelo Peplum contam-se Sérgio Leone, Sérgio Corbucci, Mario Bava, Riccardo Freda, entre muitos outros.
Este ciclo não pretende fazer um best of dos peplums, mas sim mostrar uma pequena amostra do que estes filmes eram. Esperemos que gostem do ciclo.

Terça: Le Fatiche di Ercole (1958), de Pietro Francisci

Quarta: Ercole Alla Conquista di Atlantide (1961), Vittorio Cottafavi

Quinta: Colossus of Rhodes (1961), Sérgio Leone

Sexta: Ercole al Centro della Terra (1961), Mário Bava

Sábado: Maciste All'inferno (1962), de Riccardo Freda

Esperemos que gostem do ciclo. Até amanhã.

quinta-feira, 19 de março de 2015

O Destino (Al Massir) 1997



A história passa-se no século 12, na província árabe-espanhola de Andaluzia, onde o famoso filósofo Averroes é nomeado juiz pelo califa e as suas decisões liberais na corte não são aprovadas por todos. Rivais políticos do califa, centrados em torno do líder de uma seita fanática islâmica, forçam o califa a enviar Averroes para o exílio, mas as suas idéias continuam a viver graças aos seus alunos.
Chahine determinou que Averroes faria um magnífico protagonista para um filme épico, filme que faria lembrar a Europa e a América que o mundo islâmico tinha preservado e protegido o conhecimento da civilização grega clássica. Ele também esperava que este filme, "O Destino", também servisse para acordar o povo do Egipto e de outros países, que o Médio Oriente estava a caír como presa à ideologia fundamentalista islâmica, e estavam em perigo de entrar na sua própria Idade das Trevas.
No filme de Chahine muitas forças lutam pelo poder em Córdoba, a capital da Andaluzia. Mansur, o Califa e poder supremo do império, é arrogante e parece ser intocável. Sheik Riad é um homem rico, e poderoso, que pode influenciar o povo com as suas orações. Tem sido amigo do califa, mas agora procura mais poder para si próprio. Os clérigos islâmicos também vinham a ser amigos destes dois, mas uma enorme onda de fundamentalismo intolerante está a percorrer o país. O misterioso Emir construiu um exército de seguidores inquestionáveis, que proferem versos do Alcorão em resposta a todas as questões ou desafios.
Averroes tem o seu próprio núcleo de seguidores, não de crentes mas de alunos que leem os seus livros sobre Aristóteles e questões filosóficas. Um é um jovem cristão, cujo pai foi queimado na fogueira em Languedoc por ler e discutir os ensinamentos de Averroes. O filho Joseph (Youssef) viaja para Córdoba para continuar a tradição de estudar com o filósofo árabe.
Chahine sentiu uma enorme necessidade em fazer este filme, para garantir que fosse visto por jovens egípcios, pelo menos. Ele sabia que o ambiente no país estava a escurecer. Naguib Mahfouz, um amigo seu que tinha ganho o prémio Nobel da Literatura em 1988, tinha sido esfaqueado no pescoço por um fanático em 1994. Nesse mesmo ano Chahine teve de defender em tribunal o seu filme, "O Emigrante", vagamente baseado em histórias do profeta Joseph. Um grupo extremista islâmico convenceu os tribunais de que o filme era blasfémia, por representar um profeta através de um actor. Apesar de ter defendido o filme, ele acabou por ser proibido no Egipto e em outros países do Médio Oriente. Com ataques destes, tanto físicos como legais, Chahine sentiu que o Egipto onde ele tinha crescido estava em vias de se tornar uma terra perigosa para mentes mais criativas. E certamente que Chahine foi a pessoa certa para fazer soar este aviso.
"O Destino" foi até Cannes, e além de ter sido nomeado para a Palma de Ouro, o realizador ganhou um Lifetime Achievement Award. Talvez por causa deste prémio, ou também por causa deste prémio, Chahine começou a ser atacado por grupos islâmicos. A indústria cinematográfica egípcia ficou com medo, e começou a produzir menos filmes. No entanto Chahine continuou a atacar a ganância das pessoas poderosas da indústria, o globalismo e o terrorismo islâmico, em mais alguns filmes. Chahine faleceu em 2008, com 82 anos. A sua arte humanista finalmente se tornou mais conhecida, e os ocidentais ficaram a conhecer o homem que não tinha medo de transformar as suas crenças em filmes poderosos.

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quarta-feira, 18 de março de 2015

Alexandria... Why? (Iskanderija... lih?) 1979

Yehia é um jovem egípcio cristão, em fase de crescimento para a maturidade durante a Segunda Guerra Mundial, ele vive deslumbrado por filmes americanos e estrelas de cinema, e até por Leo, o leão cujo rugido anuncia cada filme da MGM. Sonha um dia ir para Hollywood, e tornar-se um realizador, argumentista ou actor famoso. Porque, pergunta a si mesmo, nasceu ele em Alexandria? Mas, depois de se apaixonar e descobrir as mentiras da ocupação europeia, Yehia reavalia profundamente a sua identidade e lealdade ao ocidente.
Youssef Chahine já tinha 25 anos de carreira quando este filme foi lançado. Habilmente estruturado, com a introdução de várias personagens e tramas paralelas, sem perder o controle de qualquer uma delas. Em primeiro lugar é um filme sobre pessoas, mas também incorpora patriotas e políticos na sua história. Apesar da invasão Nazi pendente que domina politicamente, é um filme fundamentalmente optimista e alegre - qualquer pessoa com uma tendência criativa irá logo identificar-se com os sonhos e o desespero de Yehia.
Feito no Egipto, presumivelmente com um orçamento limitado, refletido nas limitações técnicas comuns a muitos outros filmes daquele país. Os cenários típicos daquele período não estão muito visíveis, provavelmente por causa das limitações do orçamento, mas filmagens dos musicais da MGM, e bobines da Segunda Guerra Mundial, com referências à cultura pop da altura, rapidamente nos situa no tempo. Chahine também emprega algumas técnicas inovadoras, embora a tecnologia seja datada (a câmara em movimento é por vezes instável). Mas o forte elenco e a equipa técnica de Chahine superam estes problemas com distinção, por vezes por pura força de vontade.
O filme inclui um caso de amor entre um árabe e uma judia, o que parecia muito avant-garde para a população da cidade do Cairo da altura, o que obrigava à menina judia a dissociar-se de Israel e do Zionismo. Num jeito de tentar explicar os problemas que Israel trazia para o mundo, alguém diz: "Todo o Judeu agora pertence a um país diferente do de seu nascimento". Mesmo os refugiados dos campos de concentração. 
Seria o primeiro filme de uma trilogia de Chahine, chamada "Trilogia do Cairo". Nunca estreou em Portugal nem no Brasil.
Legendado em inglês.
  
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terça-feira, 17 de março de 2015

The Sparrow (Al-Asfour) 1972

Junho, 1967, véspera da guerra dos seis dias. "The Sparrow" segue um jovem polícia, estacionado numa pequena localidade do Alto Egipto, cujos habitantes sofrem o assédio de um empresário corrupto. O jovem polícia cruza caminho com um jornalista que está a investigar o que parece ser um escândalo envolvendo o roubo de armas e equipamentos bélicos por altos funcionários.
Um dos seus filmes mais controversos, "The Sparrow" foi escrito por Youssef Chahine em colaboração com o vanguardista Lofti el-Kholi. Passada durante a guerra dos seis dias, entre Israel e a Répública Árabe Unida, esta história de divisões nacionais tornou-se um dos filmes mais populares de Chahine, em festivais e retrospectivas. Primeiro foi banido, em Maio de 1973, em Dezembro do mesmo ano recebeu a mais alta condecoração do país. No entanto, o mais importante, foi a partida do cinema mais convencional e mainstream do seu tempo, desenvolvendo o seu próprio estilo individual, tornando-se um pioneiro nesta matéria. Em vez de usar em argumento linear começou a desenvolver um gosto por formas fragmentadas, narrativas descontínuas, e colagens de materiais tão díspares como flashbacks, eventos reais, e sequências documentais. O resultado final destas mudanças, foi o inicio de uma nova fase nos seus filmes, dedicado à experimentação e inovação. 
Legendas em inglês.

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segunda-feira, 16 de março de 2015

The Land (Al Ard) 1969

Numa aldeia egípcia dos anos 30 os camponeses são informados pelo governo que podem irrigar as suas plantações por apenas 5 dias, em vez dos 10 habituais. Tentam apelar ao primeiro ministro mas o homem que escolhem como seu representante é um fantoche nas mãos do poderoso Mahmoud Bey. Este tem o líder da aldeia no bolso, e a mudança na programação da irrigação faz apenas parte de um esquema para roubar as terras dos camponeses e construir uma estrada para o palácio. Os camponeses lutam para satisfazer as suas necessidades mais básicas, contra o governo corrupto, contra a selvajaria da polícia, e lutam entre si...
Chahine adapta um famoso romance de Sharqawi intitulado "The Land", num filme que nos trás uma sensação épica, apesar de ter pouco mais de duas horas de duração. Repleto de personagens importantes, é um pouco dificil seguir apenas uma, porque há um monte de gente a acompanhar. Abu Swelem (Mahmoud El-Meliguy) é quem se adiante como líder. A sua bela filha Wasifa (Nagwa Ibrahim) quer partir para a grande cidade do Cairo, para lutar ao lado dos homens. Um dos seus principais pretendentes é Abd El-Hadi (Ezzat El Alaili), um homem feroz com princípios guerreiros. Outro pretendente é Mohammad Effendi (Hamdy Ahmed), um homem educado mas fraco. Há pelo menos mais meia dúzia de personagens importantes, que têm participação activa nos eventos que se desdobram, incluindo um jovem que começa por parecer uma figura chave no filme, mas que lentamente vai desaparecendo da tela. Para aumentar a confusão há dois Sheiks diferentes, um que parece ser pacífico mas numa última análise corruptível, e outro que é um bastardo desde o início.
O espírito de revolução contra as forças corruptoras recorda outros filmes fulcrais da década de sessenta, como "Salvatore Giuliano" ou "O Exército das Sombras", ou ainda qualquer clássico de propaganda soviética. Quem faz o trabalho sujo com as suas próprias mãos na terra, são mostrados como sendo os mais puros de espírito. Mas, embora haja um pouco de didática no filme, as caracterizações das personagens não são inteiramente preto e branco, e o poder do povo nem sempre é suficiente.
A fotografia também é muito forte, com grande parte dos movimentos de câmera usados em "Cairo Station". Não tem o tom "noir" desse filme, mas em vez disso utiliza cores garridas para criar imagens impressionantes. Concorreu para a Palma de Ouro de 1970.

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domingo, 15 de março de 2015

Cairo Station (Bab el Hadid) 1958



"Cairo Station" passa-se numa estação de comboios, no curso de um único dia. A câmera apresenta-nos os três personagens principais: Qinawi (Youssef Chahine), que é o pobre e pervertido vendedor de jornais, Hanuma (Hind Rostom), a bela mulher constantemente perseguida pela segurança por vender bebidas de forma ilegal, e Abu Serib (Faris Shawqi) que pretende casar-se com Hanuma. Qinawi passa os dias a fantasiar sobre as mulheres. Pin ups de modelos compõem as paredes do seu pequeno quarto sujo, onde ele passa o tempo olhando para as fotos com os seus penetrantes olhos negros. Enquanto no trabalho não se aplica muito, lá vai continuando o seu hábito em relação ás mulheres. Como um predador sexual, mulheres e sexo é tudo o que lhe interessa. É um indivíduo doente e perturbado que raramente pronuncia uma palavra. Toda a gente conhece Qinawi, mas ninguém sabe da sua doença, a não ser a plateia. Não demora para que Hanuma comece a chamar a atenção de Qinawi, que começa a ficar obcecado por ela, mas ela já é comprometida...
O personagem principal é um pervertido, com tanto de desagradável como de perturbador. E depressa o argumento nos leva outros lugares, como um crime, violência e caos. O desempenho assombroso de Chahine no papel de Qinawi é tão poderoso como a sua realização tem de inovadora. É ele quem está no controle total do filme atrás e à frente das câmeras, levando-nos à mente de um homem sexualmente reprimido caminhando para a insanidade. Os sujos e feios exteriores contribuem para o realismo obscuro do filme.
O neo-realismo italiano influenciou o grande realizador egípcio que se atreveu a forçar o público a lidar com a realidade. Antes de "Cairo Station" os filmes egípcios tinham todos muito bom aspecto, simplesmente para entreter. O cinema era um escape para o dia a dia do homem comum, até que o público ficou chocado com este filme. Aparecia um jovem realizador a julgar uma cultura inteira com uma obra que quebrava todas as regras do cinema egípcio. A censura proibiu o filme a pedido do público. Os críticos elogiaram-no como uma obra-prima, mas o público desprezava-o.
Conta-se que depois do filme ter sido exibido, um homem aproximou-se de Chahine, cuspindo-lhe na cara, e disse: "Tu deste ao Egito uma imagem desoladora." Depois de 20 anos sob uma estrita proibição, os egípcios redescobriram-no. Foi exibido em festivais de cinema por todo o mundo e, desde o renascimento como "Cairo Station", em 1978, os egípcios reconheceram-no como o trabalho de um mestre. A reputação do filme foi crescendo e agora é considerado o "Citizen Kane" do cinema egípcio.
 Legendado em inglês.

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sábado, 14 de março de 2015

Youssef Chahine

Génio sem rival no cinema egípcio, Youssef Chahine trabalhou em quase todos os géneros conhecidos: noir, melodrama, screwball, filme de época, thriller polémico, entre muitos outros, por vezes abraçando vários géneros num só filme. Escrevendo sobre "O Destino", conto alegórico de Chahine sobre um filósofo cujo trabalho vai ser alvo de fundamentalistas religiosos, Jonathan Rosenbaum elogiou "o impulso generoso que faz o filme circular em partes diferentes entre o musical, a comédia, o western, o biopic, o épico bíblico, a lenda medieval e o filme de aventuras". Sempre muito bem compostos,  como uma explosão de energia e por vezes estruturados à volta de um triângulo amoroso, os filmes de Chahine podem acomodar mudanças radicais de tom. As suas influências são vastas, e são bem exploradas nas suas películas: as extravagancias de Bollywood, Dreyer, Sirk, DeMille, Citizen Kane.
Talvez o neo-realismo italiano tenho deixado marcas mais profundas no realizador, especialmente num dos seus filmes mais adorados, Cairo Station (1958), onde o próprio realizador interpreta um vendedor de jornais levado a extremos violentos. O estilo mosaico que Chahine avançou para este filme providenciou um excelente meio de expressão para a consciência social do realizador presente em "People of the Nile", um filme construído com fundos soviéticos.
Os filmes de Chahine também são influenciados pela cidade do Cairo, onde são produzidos grande parte dos filmes egípcios, uma indústria dominada por filmes árabes, com os seus toques populistas de música e melodrama. Além de tratar das complexidades da vida social e política do Egipto, os filmes de Chahine mantinham o apelo e a energia de um filme mainstream. Esta combinação de cultura popular e sofisticação artística deu-lhe uma certa ambiguidade, assim como uma rara exuberância e ecletismo.
Chahine faleceu em 2008, depois de uma carreira de mais de 60 anos, e cerca de 37 longas metragens. Esta semana iremos ver aqui alguns dos seus filmes mais importantes.

Domingo: Cairo Station (Bab el Hadid) 1958

Segunda: The Land (Al Ard) 1969

Terça: The Sparrow (Al Asfour) 1972

Quarta: Alexandria...Why? (Iskanderija... lih?) 1979

Quinta: O Destino ( Al Massir) 1997

Espero que seja do vosso agrado. Até amanhã.

quinta-feira, 12 de março de 2015

Bang Bang (Bang Bang) 1971



Um actor de um filme vive sem qualquer distinção da sua própria realidade pessoal e a realidade da personagem que está a interpretar. Procura por um sentido e por uma saída, enquanto é perseguido por bandidos, um mágico, uma fantasia romântica, um bêbado, e a sua própria imagem. O humor, a razão da perseguição, as situações, os personagens, os cenários, a banda sonora, levam-nos a símbolos, metáforas, e à recusa de uma possível narrativa lógica, de forma a permitir ao espectador passar por uma situação igual à do personagem principal.
"Bang Bang" é uma comédia surreal slapstick, formada por episódios em vez de uma narrativa vulgar. O seu conteúdo simbólico extremamente enigmático, rico em material étnico brasileiro, é influenciado pelo movimento do "cinema novo brasileiro", que apareceu no Brasil dos anos sessenta. Ao contrário dos filmes deste período, este não tinha nenhum conteúdo político em particular, e era projectado apenas com o entretimento em mente.
O "cinema novo" varreu o Brasil durante a década de 60, até 1972, largamente influenciado pelo neorealismo italiano, pela Novelle Vague, e pelos primeiros cineastas soviéticos. Eram filmes obscuros e destrutivos da vida brasileira, onde as contradições sociais e económicas se tornavam mais evidentes. Depois de um golpe de estado que engoliu o governo brasileiro, o cinema começou a evoluir para uma espécie de paródia do seu próprio passado, adaptando um tom deliberadamente kitsch, e uma estética que tentava desesperadamente ficar politicamente e culturalmente relevante.
Do cinema novo surgia um novo movimento, o cinema marginal, a estética do lixo, ou o "Údigrudi". Era o cinema underground brasileiro. Os realizadores do cinema marginal rejeitavam as fórmulas tradicionais do cinema popular, e encontravam a sua força no cinema experimental. Andrea Tonacci, nascido em Roma, mas criado no Brasil, foi um dos nomes mais importantes do cinema marginal. A sua longa metragem de estreia, "Bang Bang", é considerada um dos principais marcos do cinema underground brasileiro, e teve honras de exibição na Semana dos Realizadores do festival de Cannes de 1971. Este filme serve, por um lado para abrir o apetite para o ciclo do cinema marginal que aí vem, por outro para anunciar a vinda de Andrea Tonacci aos Encontros Cinematográficos do Fundão, que irão ter lugar nesta cidade, entre 20 e 22 de Março deste ano. Se tiverem tempo, e possam passar por lá, vale a pena, como podem ver pelo cartaz em baixo.

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segunda-feira, 9 de março de 2015

Próximos ciclos

Uma pequena pausa para recuperar forças, e regressamos dentro de momentos. Aqui fica a previsão dos próximos ciclos:

15 Março: Youssef Chahine
22 Março: Peplum
29 Março: Paul Mazursky
5 Abril: Mikio Naruse
12 Abril: Sharon Tate
19 Abril: Ciclo Surpresa (2 semanas)
3 Maio: Jacques Tati
10 Maio: Cinema Marginal Brasileiro (2 semanas)
24 Maio: Raoul Walsh - Parte 1
31 Maio: A Idade de Ouro dos Filmes de Samurais (2 semanas)


"O Bandido da Luz Vermelha” (1968), de Rogério Sganzerla


Até já. 

P.S. Podem seguir mais sobre a programação do blog no grupo do Facebook, aqui.

sexta-feira, 6 de março de 2015

Filha da Mãe (Filha da Mãe) 1990



Comédia sentimental, intriga policial e tragédia conjugal, este filme conta a história de Maria (Rita Blanco), uma “filha da mãe” cómica, agressiva, cínica e sentimental. Tem um namorado, Adriano (João Cabral), que se dedica a pequenos tráficos e roubos. A sua mãe é Júlia (Lídia Franco), actriz insegura e mazinha que tem por amante ocasional Gigi (Miguel Guilherme), actor e toxicodependente, sempre sem dinheiro e com o coração dividido entre Júlia e Dalila, sua colega de palco. O seu pai é Álvaro (José Wilker), um pintor que depois de ter estado desaparecida durante vinte anos no Brasil quer voltar para Júlia como se nada tivesse acontecido e dá de caras com uma filha que não sabe se é sua e que, quase sem se dar conta, lhe cai nos braços.
"O segundo filme de um jovem realizador português confirma alguns traços pessoais, perde-se em pequenas cenas e torna-se perturbante quando finalmente se encontram duas fortes personagens. A mais evidente afinidade entre "Filha da Mãe" e "Três Menos Eu", o primeiro filme de João Canijo, é o triângulo sentimental. No outro filme um rapaz circulava entre duas raparigas, neste um homem circula entre duas mulheres. Mas em "Filha da Mãe" a relação triangular tem uma maior intensidade (questão física que se deve entender no sentido perturbante da relação entre três corpos) e é também mais generalizada.
Recordar-se-à que no filme anterior de Canijo a introdução de um dos elementos do trio, o rapaz, ocorria pelo roubo de uma cassete numa loja de discos, e que "O Roubo" foi o título inicial deste segundo filme. Independentemente da alteração do título, o roubo é uma forma de transacção marcante em "Filha da Mãe", sublinhada pela presença de mais duas personagens, dois cúmplices de Adriano, Lázaro (Diogo Dória) e Victor (Adriano Luz)."  Augusto M. Seabra, Público, 4/05/90

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quinta-feira, 5 de março de 2015

A Idade Maior (A Idade Maior) 1991



A acção do filme passa-se no início dos anos 70 durante o fim da guerra do ultramar. Alex, um rapaz que nunca conheceu o pai, que combate na guerra em África, é o narrador desta história. A mãe de Alex descobre um dia que o pai deste já regressou da guerra e não contactou a família, decide ir à sua procura. Nesse mesmo momento, ele regressa a casa e só encontra o filho Alex. Dá-se, então o primeiro encontro entre pai e filho.
"A Idade Maior" foi o primeiro filme de Teresa Villaverde, realizadora que faz parte da geração nascida em final dos anos 80, inicio dos anos 90, da qual faziam parte nomes como Pedro Costa, Joaquim Leitão, Manuel Mozos, Ana Luisa Guimarães, Vitor Gonçalves, João Canijo, entre outros, e que se preparava para renovar o panorama do cinema português. Nada parecia ligar estes nomes, a não ser uma idade que os colocava a fazer filmes ao mesmo tempo, mas esta geração acabou por trazer um outro olhar para o cinema português, e um conceito de "cinema de autor", que estava apenas presente nas obras de poucos autores, até então. "A Idade Maior" era destes primeiros filmes desta geração, e procurava apresentar um ponto de vista bastante realista, algo que também era visto nos filmes do cinema novo português. A história era narrada no passado, por um adulto que revisita a sua infância.
Foi exibido no festival de Berlim de 1991, na secção Forum Jovem Cinema. Do elenco fazem parte nomes como Joaquim de Almeida, Maria de Medeiros e Vincent Gallo

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quarta-feira, 4 de março de 2015

O Movimento das Coisas (O Movimento das Coisas) 1985



A filmes como O Movimento das Coisas costuma aplicar-se a designação documentário. É despropositado, nesta “folha”, retomar a discussão acerca de tal designação e do que separa ou não separa, enquanto objecto fílmico, o documentário da ficção. Mas também não adianta iludir a questão classificativa e acrescentar lugares comuns do género dos que afirmam que toda a ficção é documento e todo o documento ficção. Porque O Movimento das Coisas se situa na região indefinida onde essas questões podem e devem ser postas sem as reduzir a chavões.
Para exemplificar apenas com filmes portugueses recentes, pode ser grande a tentação de aproximar O Movimento das Coisas das obras de António Reis e Margarida Cordeiro, particularmente Trás-os-Montes e Ana. A meu ver, não há maior contra-senso. Não apenas por uma questão qualitativa (se muitos são os méritos de Manuela Serra, há uma enorme distância entre tais méritos e a grandeza atingida por António Reis e Margarida Cordeiro) mas sobretudo porque a raiz do filme que vamos ver, o seu imaginário e o seu fantástico, são de ordem completamente diferentes.
 Se comecei por uma comparação ingrata a Manuela Serra, não foi para apoucar (mesmo relativamente) o seu filme, mas porque essa comparação tem sido exercida noutros textos sobre esta obra prejudicando a sua compreensão e o seu alcance. Atrás usei (e sublinhei) o adjectivo indefinida. Não foi por acaso. Ao rigor que preside aos regressos originais e originados de António Reis e Margarida Cordeiro, opõe-se em O Movimento das Coisas uma indefinição que lhe dá grande parte do seu interesse e o singulariza não só em relação à via única - e inimitável - desses cineastas, como a singulariza em relação a outras obras que podem, à primeira vista, ser aproximada desta, como são os casos dos belos filmes de António Campos ou de Philippe Constantini.
O Movimento das Coisas não é nem pretende ser uma gesta mítica, como não é nem pretende ser um documentário etnográfico ou antológico. Reparar-se-á que a aldeia onde o filme se passa nunca é situada. Lanheses é um nome que só aparece no genérico final, nos agradecimentos da autora. Qualquer português identificará a aldeia, situando-a no norte de Portugal, mas a imprecisão geográfica, ou a indefinição, para usar um termo mais apropriado, existe desde o inicio do filme. Não sabemos bem aonde estamos e nunca saberemos porque razão a realizadora nos levou até ali. Aparentemente, é uma aldeia igual a tantas outras, onde coexistem ritmos ancestrais com influências da emigração, aldeia onde predominam as mulheres, mas onde o trabalho destas não é exclusivo e as marcas de incipiente industria se começam a fazer sentir. Mas, desde a belíssima abertura, com o rio, as névoas, os juncos e a câmara, muito lentamente, a descobrir-nos a povoação, sentimos que há uma relação física entre o olhar da câmara e o que esta nos dá a ver, como se aquele espaço, aparentemente indefinido, fosse também o único espaço possível para a corporização do imaginário contemplativo de Manuela Serra.
Essa mesma indefinição entre os diversos materiais é uma constante que atravessa o que o filme nos vai dando a ver, com grande demora e certeira beleza. O filme não nos conta uma história (a família que o atravessa jamais é portadora de qualquer ficção ou qualquer verdade); o filme não ilustra o quotidiano de uma aldeia (as imagens do quotidiano mais ofuscam a narração do que a esclarecem); o filme não está ao serviço de qualquer causa (em vão procuraremos ver nele leituras politicas, sociais ou etnográficas); o filme não segue o ritmo exterior temporal (género, um dia na vida de uma aldeia, ou o ciclo de estações). Podia continuar as enumerações, respondendo sempre pela negativa. E, no entanto, tudo isso lá está (historia, quotidiano, causa, tempo, espaço) mas lá está no mesmo modo indefinido com que penetramos na comunidade. Numa língua literária, diríamos que a realizadora nunca utiliza artigos definidos, mas opta sempre pelos artigos indefinidos. Como estes “artigos” se articulam a uma matéria correcta (aparentemente despida de qualquer metafísica) a conjugação é estranhíssima e impõe, desde o inicio, um singular perturbação.
O exemplo flagrante do que estou a dizer é o uso da montagem. Aparentemente, a inserção de sequências alheias ao que parece centrar a atenção da realizadora (pense-se nomeadamente, na sequência do jantar da família ou na sequencia da igreja) não tem qualquer nexo, parecendo arbitrárias e retirando a duração necessária aos planos.
Mas, com maior atenção, vamos descobrir que o uso de montagem da cineasta é precisamente uma interrogação à montagem, como se Manuela Serra, a cada momento, pusesse em causa essa própria noção, substituindo-a pela noção de colagem e reunindo um todo os diferentes materiais que vai dando a ver.
 Essa utilização específica é particularmente impressionante naquele que é, para mim, o mais belo momento do filme. Refiro-me a sequência da igreja. O plano começa por nos mostrar a imagem de Cristo no altar-mor e, depois, vai lentamente descobrindo o padre, o altar e a assistência. Contra-plano e, do ponto de vista do altar, vemos a assistência e a porta da igreja aberta contra um céu nocturno e azulíssimo. Tudo nos leva a supor que estamos numa missa nocturna, até que, lentamente e após novas inserções das imagens "leit-motif" do campo, do rio e das névoas, voltamos à igreja, com uma luz diferente, como se muito tempo se tivesse passado e os personagens permanecessem fixos naquele ritual, tal arrancados a qualquer tempo Preciso como a imagem de Cristo que a câmara nos dá em pormenor. Quando as pessoas saem da igreja é dia (crepúsculo? alvorada?) ficando apenas acesas as luzes da Igreja, como se a noite se projectasse de interior desta para o exterior, num sinal contrário ao da iluminação inicial.
 Exemplos deste género multiplicam-se no filme, sempre por fragmentos, como se no houvesse outro movimento senão aquele do que o título da Obra nos fala. E esses fragmentos, e esses movimentos, são tanto visuais como sonoros. Ouvimos bocados de diálogos que, em si mesmos, parecem sempre esparsos e in-significantes. Mas o som com que ficamos é o da flauta da bela música de José Mário Branco, tão obsessivo e tão embalador como o plano visual do rio que passa junto a aldeia.
Tudo flui e tudo flui indefinidamente nesta obra que voga vagamente. Mas tudo flui em torno desses pontos de sustentação que são, paradoxalmente, os pontos de referência mais imateriais deste filme: a paisagem ritual e o som da flauta, que guiam do princípio ao fim no nosso olhar.
O Movimento das Coisas é, simultaneamente, um filme extremamente materialista e extremamente abstracto. Os dois termos não são inconciliáveis. Só que para o não serem é preciso uma determinável visão e é essa visão que dá coerência a este filme disperso e o transforma numa obra una, com surpreendente lógica e surpreendentes rimas.

Texto de João Bénard da Costa
In Folhas da Cinemateca

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segunda-feira, 2 de março de 2015

Ao Fim da Noite (Ao Fim da Noite) 1991



Jorge é disc-jockey numa discoteca do Bairro Alto, em Lisboa. Mas o dono da discoteca, Queirós, também está envolvido noutro negócio menos lícito mas mais rendoso: o tráfico de diamantes. Queirós é um homem frio e sofisticado cuja única fraqueza é uma paixão obsessiva por uma mulher que já o traiu. O seu nome é Cláudia. E quando ela um dia volta inesperadamente a Portugal e surge na discoteca, Jorge percebe a razão da obsessão de Queirós. E também ele tomba na armadilha. Por causa dela, Jorge acaba também por se envolver no tráfico e lentamente vai sendo arrastado para um mundo de paixão, violência e traição, cujas regras desconhece e do qual vai ser a primeira vítima.
Depois de uma estreia auspiciosa com "Duma Vez Por Todas", Joaquim Leitão regressa, quatro anos depois, com este "Ao Fim da Noite", um filme que tal como o nome indica, se passa na noite, e se mantém no território do noir, ou, se preferirem, do "neo noir". Vale-se, uma vez mais da brilhante fotografia de Daniel Del Negro, que já tinha colaborado com Leitão em "Duma Vez Por Todas". O filme faz-se mais valer do "look" dos anos 80, e fica a perder no argumento, e na caracterização dos actores, mas ainda há alguns vislumbres de bom cinema, que fazem dele uma obra interessante dentro do cinema português. Pena que o caminho que ele tenha tomado tenha sido o do cinema para as massas, pois pode se ter perdido um grande talento.

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Vidas (Vidas) 1984



"Um casal de jovens que habita a noite, a heroína e os favores, personagens de meia-idade que deambulam pela escrita, pelo tráfico de droga, pelo jornalismo, vidas que se cruzam em leitos vários e uma mesma angústia.
Aposta comercial assaz óbvia (temas "fortes", imagens "proibidas") "Vidas" tem uma estrutura dramática pouco consistente mas uma respiração que faz emergir uma realidade sociológica em carne viva e, até, bastante sincera.
É um filme contraditório, nunca desinteressante, onde o mau gosto alterna com momentos de uma grande intensidade, um pouco à maneira de "Meus Amigos", só que com outra argúcia.
Assinale-se o regresso de Maria Cabral ao cinema português, perdida a exuberância e ganho o desgosto (esplêndido o plano final onde chora sobre a madrugada de lisboa), a curiosidade de ver gentes de outros ofícios do cinema a representar (Eduardo Geada, Hélder Costa, Paulo Branco), e a descoberta de uma presença feminina: Julia Correia." JLR.

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domingo, 1 de março de 2015

João Bénard da Costa - No Tempo do Cinema



Um documentário de 58 minutos sobre a vida de João Bénard da Costa.
Para além do seu testemunho na primeira pessoa e com os depoimentos oriundos de vários quadrantes da sociedade – com Alberto Vaz da Silva, Vasco Pulido Valente, Alberto Seixas Santos, João Mário Grilo, Jorge Silva Melo, Miguel Lobo Antunes, Fernando Lopes, Maria João Seixas, Agustina Bessa-Luís, Manoel de Oliveira, Manuel S. Fonseca, Rita Azevedo Gomes, José Manuel Costa, Paulo Filipe Monteiro, Guilherme d’ Oliveira Martins, Lucília Alvoeiro, Maria Alice Castro, e os quatro filhos, João Pedro, Mónica, Sofia e Ana -, este documentário conta com uma linha narrativa que parte do presente para o passado. Podemos subdividi-lo em cinco actos, assim considerados teoricamente pois o pano desce sobre uma fase da vida, para se levantar e dar início a uma outra, num flashback sobre a vida e de uma forma essencial o trabalho de Bénard da Costa. Entre os grandes momentos da sua vida e obra, dá-se a deambulação poética de uma mulher através de uma geografia dos lugares de Lisboa habitados por João Bénard da Costa e pelos cúmplices de geração. Os suspeitos do costume são amantes de ópera, tanto quanto de cinema, são amantes da liberdade e da palavra. Por isso, este documentário usa-a para além das margens da entrevista e a jovem actriz Joana Barrios recita Alexandre O’Neill, Ruy Belo e M. S.Lourenço, segundo momentos que evocam personagens do cinema ou tão simplesmente impressões poéticas, uma forma encontrada para transmitir uma outra impressão digital de João Bénard da Costa.

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