A Lorena é uma região do leste da França que fica junto à Alemanha, fazendo igualmente fronteira com a Bélgica e o Luxemburgo. Juntamente com a Alsácia foi tardiamente integrada em França e a sua cultura reflecte a proximidade com o seu vizinho germânico. As relações entre a França e a Alemanha foram sempre particularmente complicadas com os alemães a reivindicarem (nem sempre de forma pacífica) a posse daquela região. Em 1870 e 1940 os alemães passaram mesmo a vias de facto invadindo militarmente a região. No período de ocupação nazi (1940-1944) era proibido falar francês na região e só com o fim da II Guerra Mundial é que a região foi plena e decisivamente integrada em França.
Lothringen! É uma curta metragem com cerca de 22 minutos feita por uma encomenda da Canal Arte numa sessão especial dedicada à região da Lorena. Jean-Marie Straub é natural de Metz e, portanto, sabe do que está a falar. O que é curioso é que para esta sua evocação da Lorena se tenha socorrido da obra de Maurice Barrès, um reputado escritor alsaciano conhecido pelas suas posições nacionalistas de direita, antissemita e que no célebre caso Dreyfus se colocou do lado das forças conservadoras. Mas foi igualmente um grande apologista da presença francesa em terras da Alsácia e da Lorena e, por esse motivo, as suas obras foram proibidas durante a ocupação alemã. Curiosamente, Jean-Marie Straub afirmou que durante a sua juventude, Barrès tinha sido «um bocado anarquista». Straub terá igualmente afirmado que gostava particularmente dos alsacianos que eram os únicos habitantes da França que conseguiam ser tão irónicos como Corneille. O filme evoca o início da invasão da Lorena (e em particular de Metz) por parte dos alemães em 1870 a que se seguiu um longo período de ocupação que duraria até 1918. A opção de Straub e de Huillet foi por um misto de ficção e de documentário, seguindo as palavras de Barrès. Trata-se de um relato da resistência e do êxodo dos habitantes de Metz da sua cidade, ao mesmo tempo que apresenta de forma breve um caso particular de uma mulher que desfaz o noivado com um alemão. As imagens, porém, estabelecem um contraste com a narrativa. Tirando uma pequena passagem em que a mulher aparece vestida com roupas da época, as restantes imagens exalam uma profunda tranquilidade. São as de Metz, uma pacata cidade de província, não como ela existia no final do ´seculo XIX, mas da actualidade, de uma urbe dos anos 90 do século XX com a vida normal das pessoas, os monumentos, o trânsito automóvel e outros retratos do quotidiano. A estas imagens, acrescentam-se outras de paisagens rurais próximas da cidade, com longos planos fixos como é habitual na obra desta dupla de cineastas. A relação entre as palavras e as imagens continua a ser aparentemente aleatória: o texto é apresentado quase todo em voz off, mas apesar da curta duração do filme existem momentos largos em que somos exclusivamente entregues à contemplação das imagens.
Afinal, após 1944 Metz e toda a região da Alsácia e da Lorena são francesas e as aspirações alemãs a anexá-las desapareceram. Apesar de o título do filme ser alemão (e não Lorraine como se designa em francês a Lorena) o filme é uma apologia ao cariz gaulês da região e utiliza a língua francesa. A Lorena é francesa e as pessoas estão tranquilas e vivem as suas vidas. As coisas estão como devem estar. As ideias de anexação alemã estão devidamente sepultadas e a ocupação nazi é um pesadelo distante.
Legendas em inglês.
Texto de Jorge Saraiva
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Imdb
Não foi toda a região da Lorena que foi anexada pela Alemanha, seja em 1870-1918 ou em 1940-1944 mas apenas o atual departamento de Moselle, do qual Metz é a capital. Os outros três departamentos da região (Meurthe-et-Moselle, Meuse e Vosges) continuaram pertencendo à França durante esses períodos. No período de ocupação nazista na Segunda Guerra os alemães ocuparam a França inteira, porém apenas os departamentos de Moselle (Lorena), Bas-Rhin e Haut-Rhin (os dois departamentos da Alsácia)foram anexados ao Terceiro Reich.
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