quarta-feira, 8 de abril de 2020

40 dias 40 filmes – Cinema em Tempos de Cólera: "Passeio ao Campo", de Jean Renoir

O Jornal do Fundão, os Encontros Cinematográficos, o Lucky Star – Cineclube de Braga e o My Two Thousand Movies associaram-se nestes tempos surreais e conturbados convidando quarenta personalidades, entre cineastas, críticos, escritores, artistas ou cinéfilos para escolherem um filme inserido no ciclo “Cinema em Tempos de Cólera: 40 dias, 40 filmes”, partilhado em segurança nos ecrãs dos computadores de vossa casa através do blog My Two Thousand Movies. O oitavo convidado é a crítica de cinema Maria João Madeira, que escolheu Passeio ao Campo de Jean Renoir porque “tem de ser.”

Sinopse: UNE PARTIE DE CAMPAGNE, cuja rodagem foi interrompida no verão de 1936 e cuja montagem foi concluída dez anos mais tarde a partir do material então filmado (a sua génese alimenta uma das lendas da história do cinema), é uma das obras-primas de Renoir, no seu período mais fértil. Adaptando um conto de Maupassant, Renoir assina o mais impressionista dos seus filmes em acordo com o universo pictórico do seu pai Pierre Auguste, mas UNE PARTIE DE CAMPAGNE é um filme do movimento. O dos elementos na imagem (a água do rio, o vento nas árvores) e o da fluidez da câmara.

No monumental Dictionnaire du Cinéma de Jacques Lourcelles, diz-se que “quis o destino que este filme, por razões financeiras, psicológicas (desentendimento da equipa) e técnicas (mau tempo persistente), ficasse incompleto e fosse apresentado ao público dez anos depois da sua realização, numa versão de quarenta minutos. Mas na verdade, e sobre todos os planos por que o queiramos julgar, este Passeio ao Campo continua uma obra acabada e completa. É mesmo um concentrado límpido e perfeitamente florescente das temáticas e do estilo de Renoir. Deslumbramento quase sagrado perante a beleza da natureza (e capacidade da câmara em captar esse deslumbramento e essa beleza ao mesmo tempo). Caricatura e ternura na apreensão das personagens (sendo a caricatura geralmente mais reservada aos homens e a ternura às mulheres). Espontaneidade avassaladora, justeza quase milagrosa da interpretação e das entoações. Crueldade na pintura social, subjacente mas muito clara, em que se abre a tendência anarquista permanente do autor ; as famílias normais e a sociedade estão condenadas a trazer a miséria, a resignação e a insatisfação ; a felicidade, essa, só pode ser clandestina, momentânea e como que roubada à sociedade. Perfeitamente fiel a si mesmo, plasticamente, Renoir também é fiel ao seu pai e ao impressionismo e dramática, emocional e moralmente a Maupassant. O fascínio pela água, elemento cuja perenidade impera sobre toda a vida humana, cujo percurso sinuoso nega qualquer ideia de domesticação, é tão importante para o cineasta como para o escritor. O que aqui domina é uma melancolia irrepreensível perante a perfeição da natureza e que contrasta com a perfeição do homem enquanto animal social. Na sua brevidade, Passeio ao Campo dá a impressão de conter apenas o essencial do que era realmente importante para Renoir. Está também entre o que o autor – e o cinema francês – produziram de mais perfeito.” 

Amanhã, a escolha de Luís Miguel Oliveira.

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