O Jornal do Fundão, os Encontros Cinematográficos, o Lucky Star – Cineclube de Braga e o My One Thousand Movies associaram-se nestes tempos surreais e conturbados convidando quarenta personalidades, entre cineastas, críticos, escritores, artistas ou cinéfilos para escolherem um filme inserido no ciclo “Cinema em Tempos de Cólera: 40 dias, 40 filmes”, partilhado em segurança nos ecrãs dos computadores de vossa casa através do blog My Two Thousand Movies. O terceiro convidado é o realizador Pedro Costa, que disse simplesmente, “Stars in My Crown, como é óbvio.”
Sinopse: "Stars in My Crown" é, talvez, o mais perfeito e belo exemplo daquilo a que se chama a "americana" (evocação nostálgica do passado dos EUA) no cinema. É também o mais pessoal dos filmes do realizador, Jacques Tourneur, que para o dirigir aceitou um salário simbólico. Praticamente sem história, "Stars in My Crown" é uma colecção de vinhetas da vida numa pequena cidade no interior dos EUA, que retratam sentimentos e emoções, e tem como ponto de partida a vida de uma criança com o seu pai, pregador, na vila que os adoptou, onde o tranquilo deslizar do tempo é por vezes quebrado pelo drama (e o discurso de Joel McCrea na tentativa falhada de linchamento pelo Klu Klux Klan é um dos mais extraordinários momentos políticos de todo o cinema americano).
Stars in My Crown é do realizador francês Jacques Tourneur, que trabalhou sobretudo na América e contou em 1964 que “nessa altura (1949) estava livre, e não tinha contrato com qualquer firma. Tinha ganho bastante dinheiro com os filmes Berlin Express (1948) e Easy Living (1949). Tinha um grande amigo na MGM, William Wright, que preparava um filmezinho. Pedi-lhe para ler o argumento e ele emprestou-mo. Entusiasmei-me logo. Telefonei a Wright e disse-lhe que queria, custasse o que custasse, filmar esse argumento. Respondeu-me: 'Mas Jacques, é um filme sem importância, com um orçamento reduzidíssimo, que tem que ser feito em doze dias, e a nossa ideia é contratar um realizador pago à semana' Continuei a insistir e ele disse-me 'Jacques, percebe-me, não te podemos pagar'. Respondi-lhe: 'Ouve, não há problemas, faço o filme de graça'. Esta resposta estarreceu-o e, no dia seguinte, mandou-me dizer que me pagaria o que estavam dispostos a pagar ao realizador contratado à semana. O que, de resto, acabou por se virar contra mim, porque, quando acabei o filme, e me propuseram outros, todos os estúdios iam logo perguntar à MGM quanto é que me tinham pago e foi assim que o meu ordenado foi reduzido em dois terços. Foi o preço que paguei pela minha vontade de rodar este filme. O autor do romance, Joe David Brown, escreveu-me uma carta que guardei, em que me dizia que tinha ficado comovidíssimo ao ver o filme, que o achava bem melhor que o romance. E ainda hoje quando o encontro, Joel McCrea diz-me sempre 'Jacques, a maior alegria de toda a minha carreira foi ter trabalhado em Stars in My Crown'.”
Em conversa com o crítico Chris Fujiwara, precisamente sobre Tourneur, em 2010, Pedro Costa confessou que “eu tenho um carinho pelo Stars in My Crown porque foi mesmo o primeiro que vi de forma consciente, e foi num grande ecrã, e é uma coisa rural, de mundo pequeno, tenho um carinho por coisas dessas. Provavelmente tem algo que ver com o realismo ou assim; realismo não, mas qualquer coisa ali que-- Bom, é a América, uma vila pequena; os outros filmes todos do Tourneur, não estão ancorados em lado nenhum, mesmo, ou é sempre uma espécie de-- podia ser um sítio imaginário, as ilhas, as ruínas, acho que todos eles. Não sei (...) Mesmo Londres [em Night of the Demon]. É demasiado poético, demasiado vago, não, vago não, demasiado brumoso. O Stars in My Crown provavelmente é uma coisa sentimental, e uma coisa visual; talvez se tivesse importado mais um bocadinho com o detalhe, ou tenha tido mais tempo. Consegue-se sentir isso. A sequência com o feno e os rapazes, por exemplo, acho que não se consegue pensar naquilo em casa. Talvez, mas… não sei como é que ele trabalhava, se tinham um storyboard, ou… (…) Não sei, ele provavelmente teve dois ou três dias para fazer aquilo; pôde tentar umas coisas, pôr os rapazes a mexer-se um bocadinho… Mesmo a coisa da câmara, é difícil, tecnicamente é pouco comum, há tipo sete ou oito planos… Não parece uma coisa pré-concebida de storyboard.”
Amanhã, a escolha de Miguel Marías.
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Grande escolha!!! Filme incrível!!!
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