Xavier entra na idade adulta. Em criança tinha sido entregue pela mãe
num orfanato onde passou a infância aos cuidados da freira Irmã Maria da
Luz e com a amizade de Hipólito. Na adolescência foi adotado pelos
Alves, um casal burguês, com uma filha, Luísa, um pouco mais nova que
Xavier. Os Alves impediram-lhe qualquer contacto com a mãe, mas
proporcionaram-lhe uma vida condigna. Até que a rebeldia própria da
idade e um grave percalço fizeram com que Xavier se afastasse, indo
cumprir o serviço militar algures, num local distante de Lisboa. Agora a
tropa terminou e regressa à capital. Vamos seguir-lhe os passos. Os
seus gestos, os seus movimentos, os seus olhares, os seus tremores, os
seus temores, os seus sentimentos. Através dele e daqueles com que a sua
vida se cruza.
Na altura que saíu o filme, João Mário Grilo escreveu o seguinte sobre Xavier:
"Eu sei que talvez devesse aproveitar este espaço para falar, esta
semana, dos muitos filmes de que toda a gente fala e que vão passando
(mais ou menos meteoricamente) pelas salas portuguesas: são os últimos
dos irmãos Warchowski (Matrix Revolutions), de von Trier (Dogville), de Tarantino (Kill Bill), de Gus van Sant (Elephant) ou, mesmo, a obra-prima sui generis e admirável que é India Song,
de Marguerite Duras, que a Atalanta Filmes repôs em cópia nova, abrindo
um ciclo dedicado à obra notável desta não menos notável e
singularíssima cineasta. Em vez disso, porem, vou aqui despedir-me de um
filme que não sei quando tornarei (quando tornaremos) a ver: Xavier,
o primeiro filme de Manuel Mozos, que estreou, vai para um mês, e que
ainda está em exibição, por enquanto, numa única sala de Lisboa e num
único horário.
Xavier não merecia tal destino, embora,
em boa verdade, se possa (e deva) dizer que é o país – que cada vez mais
se estupidifica – que não merece tal filme. E Xavier até
esteve para nunca ser. Durante doze anos, Manuel Mozos lutou para
conseguir que o seu filme sobrevivesse à falência do co-produtor
francês. Entretanto, chegou mesmo a estrear o seu segundo filme (Quando Troveja,
em 1998), e não é o menor dos sortilégios que, num país de raros filmes
e raros cineastas, uma primeira-obra estreie depois da segunda. Isso
marca bem uma diferença – o filme quase parece de "época" –, mas as
diferenças de Xavier não são realmente essas. Já antes de mim houve quem escrevesse que se Xavier tivesse estreado na altura em que foi feito, muita coisa podia ter mudado no cinema português. Porque Xavier –
história de um rapaz (Pedro Hestnes) em rota de colisão com uma cidade
(Lisboa) – esconde, realmente, a promessa de um novo cinema novo
português, o cinema de uma nova gerarão que é, talvez, doze anos depois,
o que mais falta nos faz.
E nada disto é só (sem o deixar de
ser, completamente) por o filme tanto nos fazer lembrar a alma, o
sangue, o nervo e o músculo de Verdes Anos, filme realizado por
Paulo Rocha, há quarenta anos, e que iniciou, então, uma revolução
radical no status quo apodrecido da cinematografia portuguesa da altura.
Xavier é um filme com um idioma próprio, sonhado e feito,
totalmente, nas margens das imagens dominantes (mesmo as do cinema, para
já não falar das da televisão), e que parte, solitariamente, à
descoberta de uma nova poética portuguesa, que não é só cinematográfica.
Do filme, guardo muita coisa: por exemplo, o risco elíptico e brutal,
que fende o filme em ligações surpreendentes, o "casal" Hestnes/Isabel
Ruth (Laura, a mãe), a relação fraterna entre Xavier e Hipólito, o fundo
palpitante da cidade (soberbo o plano em que Xavier conserta uma antena
num telhado de Alcântara). De tudo isso, no entanto, o que mais me
fascina é essa vontade de tecer todo um filme à volta de um único
protagonista, um grande, paciente e magnífico gesto de humildade,
absolutamente incomum no cinema português, e que faz com que Xavier,
apesar do atraso com que nos chega, mantenha, para sempre – sabemo-lo
hoje – a força genuína de uma mudança, que o filme nunca deixará de ser,
realmente. Foram doze anos; mas parece, apesar de tudo, que ainda há tempo."
Tirado daqui. Podem ler mais sobre o filme aqui, e aqui. E penso que está tudo dito.
TV Rip.
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Imdb
Por favor, atualize este link. Obrigada
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