quinta-feira, 13 de junho de 2013

As Amigas (Le Amiche) 1955



A banda Joy Division uma vez gravou uma canção chamada "Love Will Tear Us Apart". Podiam muito bem estar a falar de "Le Amiche", uma das mais fascinantes visões da doce devastação do amor que o cinema já viu. O filme passa-se na Turim burguesa, dura, de olhares infinitos, e coloca as pessoas a pedirem umas às outras para se conectarem, mas incapazes de fazê-lo elas mesmo. A distância física torna-se distância emocional. Um homem fala com uma mulher ocupada a olhar para um espelho, ambos de costas para nós, o reflexo do seu rosto aparente, mas o próprio rosto invisível.
Elas são as amigas (ou as namoradas) deste filme indescritível, que talvez seja melhor compreendido através de uma série de frames. O filme é baseado num romance de Cesare Pavese, "Tra donne sole", com o qual compartilha superficialmente uma história: Uma jovem mulher tenta e não consegue suicidar-se e, na procura de perceber os motivos, os seus amigos confrontam-na com a sua própria infelicidade. O filme muda muito o enredo do livro (retira um romance de lésbicas), mas a sua maior mudança é a perspectiva. A narradora na primeira pessoa do livro, Clelia, observa o mundo sombrio. O filme, por contraste, conta histórias de cinco mulheres, preferindo sequências filmadas ao longe do que o ponto vista de qualquer personagem. A psicologia emerge da paisagem, em vez de partir de uma perspectiva individual.
As pessoas são tão personagens como as ondas, as roupas, as pinturas, o apito do comboio, os saltos altos estalando contra a pedra do passeio, são todos valores numa paisagem em movimento. Isto é usual no trabalho do realizador Michelangelo Antonioni, que em 1962 faria "O Eclipse", um filme com sete minutos de sequências com candeeiros, faixas para pedestres, e poucos minutos com as estrelas Alain Delon e Monica Vitti. Já em 1969, por altura de Zabriskie Point, os blocos de madeira chamados de actores eram irrelevantes face ao Vale da Morte. Antonioni era fascinado pelas tentativas das pessoas para caberem num mundo moderno mecanizado, e em segui-los revelando que o mundo era composto por peças animadas e dinâmicas, as pessoas incluídas. E se os objetos têm vidas secretas, então as pessoas devem ter também. Um dos amantes masculinos de "Le Amiche" é arquiteto, outro pintor. Assim como qualquer obra de arte é composta de peças de materiais diferentes, também as consciências humanas ficam isoladas, mesmo dentro dos mais profundos laços emocionais.
Antonioni estava longe de seu materialismo mais radical quando fez Le Amiche. Na altura ele estava a afastar-se de um outro movimento materialista: o neo-realismo. A quantidade de filmes itallianos que cresceram após  a Segunda Guerra Mundial, em muitos dos quais Antonioni serviu como assistente, usava actores amadores, filmagens no exterior e momentos improvisados ​​que visavam uma realidade emocional mais autêntica. Ao mesmo tempo, Le Amiche é um documentário, no sentido de que o filme é uma gravação literal de pessoas que interagem com o mundo. Antonioni afirmou que a sua primeira experiência no cinema foi uma tentativa de registrar pacientes num asilo de loucos, durante o qual as suas reacções instintivas provaram ser bastante intrigantes para ele.

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