Homens Maduros é o infeliz título dado em Portugal a The Age of Consent, o penúltimo filme realizado por Michael Powell. Peeping Tom, hoje considerado um clássico, arruinou a carreira britânica de Michael Powell. A década de 60 foi penosa para o cineasta, ostracizado pela crítica mainstream do seu país e com escassas possibilidades de filmar. Não admira, portanto, que este The Age of Consent tenha sido rodado na Austrália, produzido a meias por Powell e James Mason que desempenha o papel principal. Para todos os efeitos, o cineasta tornou-se, pelo menos temporariamente, num exilado.
O filme parte de um roteiro de Peter Yeldham baseado num romance de 1935 de Norman Lindsay. Em abono da verdade o filme que fecha o ciclo não é propriamente um encerramento com chave de ouro. Não foi o desastre que a crítica não australiana proclamou, mas foi um filme pouco condizente com os pergaminhos anteriores de um dos cineastas mais importantes de sempre. Curiosamente, parece-me que o argumento até poderia ter potencialidades para dar, não um grande filme, mas uma obra interessante. Um pintor de sucesso resolve regressar à Austrália natal, cansado dos meandros do negócio das artes. Mesmo em Brisbane, sente a necessidade de se isolar e recolhe a uma ilha que pensa ser deserta. Não se percebe se o seu objectivo é redefinir a sua carreira, ou apenas descansar. O que poderia ser explorado de forma mais eficaz é a forma de relacionamento entre o pintor e uma bela adolescente que vive na ilha (Helen Mirren no seu primeiro papel no cinema). A presença da adolescente faz repensar o rumo criativo do pintor. Teríamos então um filme que poderia ser excelente se centrasse na relação entre pintor e adolescente que lhe serve de modelo. Claro que como a relação estabelecida não vai ser puramente artística, poderíamos antever uma espécie de Lolita (de Kubrick a partir do célebre livro homónimo de Nabokov), salvo as devidas distâncias que se prendem sobretudo de não estarmos em presença de uma adolescente de 12 anos, antes de uma de 17 e com um corpo de adulto. Por vontade própria, ou por condições alheias, Powell altera o foco para elementos laterais, tornando o filme numa espécie de comédia ligeira., criando personagens secundárias (a avó, o amigo, a velha solteirona, o barqueiro) que lhe aligeiram o tom, tornando-o excessivamente leviano e superficial. Daqui resulta um objecto em que nenhuma das personagens tem suficiente espessura e densidade para fazer delas algo de interessante. Para quem nos deixou algumas das mais inolvidáveis personagens da história do cinema, custa bastante ver Powell nesta situação. E nem o belo corpo de Helen Mirren aqui filmado no limite (ou se calhar um pouco para lá do limite) das convenções dos anos 60, nem as imagens subaquáticas dos corais, salvam The Age of Consent de um certo desconchavo. E afinal, quando o que de forma mais ou menos sugerida se concretiza na cena derradeira do filme, fico a pensar se ele não poderia ser muito melhor se se tivesse centrado na relação artística e pessoal entre o pintor de meia idade e o seu modelo adolescente.
Não sei se se pode falar de declínio criativo. Afinal Powell tinha apenas 64 anos quando realizou The Age of Consent. Houve cineastas como Bergman, Resnais ou Oliveira que fizeram obras primas com idade muito mais avançada. Mas provavelmente nenhum deles teve que arrostar com um filme que hoje é uma obra prima e na altura foi demolido. É à luz de Peeping Tom que podemos ver The Age of Consent. E talvez essa relação explique mais coisas do que o próprio filme.
* texto de Jorge Saraiva
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Adorei o filme! O olhar de artista ainda sobrepõe o olhar do homem. Quando o James Mason diz que é semelhante ao camelo, logo no começo do filme, na cama com uma bela mulher, ele quer se isolar. O seu olhar sobre Cora é uma busca de artista, por isso, o filme parece frívolo, mas não é.
ResponderEliminarO amor dele está entre possuir a forma da beleza na arte, ou o corpo dela?
E ele prefere a forma e só aceita o corpo quando ela se lança sobre ele no mar.
Lindo!
No Brasil saiu como A Idade da Reflexão...
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