quarta-feira, 19 de abril de 2017

Viram a Minha Noiva? (Has Anybody Seen My Gal) 1952

Viram A Minha Noiva? (Has Anybody Seen My Gal) deve ser visto como um complemento de No Room For Groom. Ambos foram feitos no mesmo ano, são comédias e têm pontos comuns no argumento. No entanto, este segundo filme apresenta uma diferença fundamental: a cor. E quando Sirk começou a utilizar a cor, o cinema nunca mais foi o mesmo. 
Has Anybody Seen My Gal parte de um romance da escritora Eleanore Porter, adaptado ao cinema por Joseph Hoffman. A ideia central do filme é muito simples: um dos maiores milionários de Nova Iorque, sem descendentes, para além de parentes afastados, resolve doar a totalidade dos seus imensos bens à família de uma antiga paixão sua, entretanto falecida. Contra os conselhos médicos consegue saber onde é que essa família vive e resolve investigar se eles são merecedores de receberem essa opulenta herança. Sob nome falso e ocultando as suas intenções, consegue hospedar-se na respectiva casa e passa a viver o quotidiano de uma família comum com todos os seus problemas, ambições e frustrações. Retrata-se de novo a dicotomia entre dinheiro e felicidade que já aparecia no filme anterior, aqui numa leitura menos política, mas igualmente incisiva. Uma família que, embora vivendo problemas financeiros graves e abdicando de luxos a que ele sempre esteve habituado, mantém-se coesa e feliz. Tal como em No Room For Groom, Sirk opta por filmar histórias, onde os valores materiais são relegados para um plano secundário, para emergir um objectivo mais elevado, em que um modo de vida simples e com afectos partilhados, se sobrepõe ao dinheiro. Mais uma vez, estamos em presença da velha disputa entre o que se tem e o que se é. Quando o velho milionário pretende intervir ajudando disfarçadamente a família a resolver os seus problemas financeiros, destrói a sua unidade e felicidade. As pessoas tornam-se vis, vaidosas e mesquinhas. Ele que tinha experimentado inusitados prazeres na companhia daquela família e num modo de vida simples que incluiu o seu trabalho num bar, contribuía agora, ainda que de forma involuntária, para a sua desunião. Pode-se dizer que o argumento é simplista e que a metamorfose do velho milionário só acontece nos filmes. Pior, pode ficar a sensação de que o dinheiro é irrelevante e não se deve invejar quem o tem, porque é fonte de infelicidade e de problemas. Não me parece que seja essa a intenção de Sirk, atendendo à sua obra anterior e posterior. A utilização da cor ainda não cria o ambiente depuradamente artificial que tanto encantaria nos seus filmes posteriores, embora se note já um predomínio dos tons vivos. O elenco de actores é sóbrio e seguro, na linha do registo ligeiro que caracteriza a comédia americana, com destaque para o veterano Charles Coburn no papel do protagonista e para a presença de Rock Hudson que se tornaria um habitué de grande parte dos seus filmes posteriores. 
Pessoalmente, prefiro No Room For Groom a este Has Anybody Seen My Gal. Isto não significa que se trate de um filme desprovido de interesse. Não está, obviamente, entre os seus melhores, mas nenhum dos incondicionais do cineasta alemão o vai querer perder.
* Texto de Jorge Saraiva.

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