"Ambientada em Manhattan, a história tem a ver com um polícia de coração mole, não muito inteligente (Spencer Tracy), que namora a empregada de mesa de uma casa de sopas e, por mero acaso, apanha um famoso gangster que, convenientemente, escolheu o sótão da irmã dele para se esconder. Pelos vistos, Raoul Walsh e os seus argumentistas usaram esta premissa como deixa para fazer o que bem entendiam. O resultado é um filme delicioso, despretencioso, muitas vezes louco.
O populismo de "Me and My Gal" parece sincero, embora o retrato dos americanos de origem irlandesa na Nova Iorque durante a depressão, seja sem dúvida idealizado, o optimismo, a ternura, o calor humano e a intensidade da experiência comum por detrás da idealização são verdadeiros. Neste filme feito antes da revogação da Lei Seca, não apenas há um motivo cómico recorrente envolvendo um bêbado belicoso (o excêntrico Will Stanton), mas há também uma cena de casamento que é uma homenagem aos copos, com o pai da noiva a entrar em grande plano e a lançar um convite para dentro das lentes da câmara: "Quem quer um copo?"
Com toda a comicidade de "Me and My Gal", não é nem surpreendente nem lamentável que o lado sério da intriga saia a perder. O à vontade com que Walsh lida com o espaço, o seu fraco pelos durões e pelos bondosos, bem como o domínio de cada nuance do seu material, são evidentes do principio ao fim do filme que, por milagre, nunca desliza para o meramente convencional." 1001 Filmes Para Ver Antes de Morrer
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terça-feira, 30 de junho de 2015
A Pista dos Gigantes (The Big Trail) 1930
Breck (John Wayne) conduz uma caravana de pioneiros através de ataques indios, tempestades, desertos, rios caudalosos, descendo penhascos, enquanto procura o assassino de um caçador, e se apaixona por Ruth (Marguerite Churchill).
Western épico, o primeiro da era do cinema sonoro, foi filmado simultaneamente nos 35mm habituais, e em 70 milímetros widescreen, um processo recém introduzido mas de curta duração chamado Fox Grandeur (similar ao posterior Todd-AO). Nos anos 90 foi restaurado, ao seu esplendoroso widescreen original. O filme faz um trabalho impressionante ao mostrar as suas impressionantes vastas paisagens, as caravanas a atravessarem os rios, cruzando planícies ásperas e escalando penhascos íngremes em todos os tipos de clima, e a coragem dos pioneiros para fazerem uma viagem tão perigosa, tudo isto é mais importante do que um argumento pouco criativo e sem imaginação, para além de díalogos pouco naturais, e uma tentativa de fazer humor ligeiro. Mas tudo isto acaba por não ser tão importante.
Consta que o filme custou 2 milhões de dólares para ser feito, muito para a altura em questão, e surpreendentemente falhou nas bilheteiras. Foi filmado na mesma tradição que outros grandes westerns da década anterior, como "The Covered Wagon" (1923) ou "The Iron Horse" (1924). Raoul Walsh pretendia ser o protagonista, mas teve de procurar um substituto depois de perder um olho. John Ford recomendou-lhe o seu amigo Marion Morrison para o papel, e este para o seu papel de protagonista acabou por adoptar o nome de John Wayne, com o qual ficaria no resto carreira. Mas depois do filme ter fracassado monetariamente acabou por obrigar Wayne a andar por inúmeros filmes de série B durante a década de 30. Wayne só recuperaria a reputação quase 10 anos mais tarde, num outro western épico realizado por John Ford: "Stagecoach".
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Western épico, o primeiro da era do cinema sonoro, foi filmado simultaneamente nos 35mm habituais, e em 70 milímetros widescreen, um processo recém introduzido mas de curta duração chamado Fox Grandeur (similar ao posterior Todd-AO). Nos anos 90 foi restaurado, ao seu esplendoroso widescreen original. O filme faz um trabalho impressionante ao mostrar as suas impressionantes vastas paisagens, as caravanas a atravessarem os rios, cruzando planícies ásperas e escalando penhascos íngremes em todos os tipos de clima, e a coragem dos pioneiros para fazerem uma viagem tão perigosa, tudo isto é mais importante do que um argumento pouco criativo e sem imaginação, para além de díalogos pouco naturais, e uma tentativa de fazer humor ligeiro. Mas tudo isto acaba por não ser tão importante.
Consta que o filme custou 2 milhões de dólares para ser feito, muito para a altura em questão, e surpreendentemente falhou nas bilheteiras. Foi filmado na mesma tradição que outros grandes westerns da década anterior, como "The Covered Wagon" (1923) ou "The Iron Horse" (1924). Raoul Walsh pretendia ser o protagonista, mas teve de procurar um substituto depois de perder um olho. John Ford recomendou-lhe o seu amigo Marion Morrison para o papel, e este para o seu papel de protagonista acabou por adoptar o nome de John Wayne, com o qual ficaria no resto carreira. Mas depois do filme ter fracassado monetariamente acabou por obrigar Wayne a andar por inúmeros filmes de série B durante a década de 30. Wayne só recuperaria a reputação quase 10 anos mais tarde, num outro western épico realizado por John Ford: "Stagecoach".
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domingo, 28 de junho de 2015
Raoul Walsh - Parte 1
Quando os críticos dos Cahiers du Cinema conferiam o status de "auteur" aos cinestas de Hollywood, a tendência era favorecer os realizadores mais "machos" cuja vida era tão áspera como os filmes que faziam. Raoul Walsh era o epítome da bravura, um dos chamados "mavericks" que demonstrava um vigoroso senso de aventura, dentro e fora da tela.
Ainda em adolescente, interrompeu os estudos para viajar com o seu tio de barco, acabando por se tornar cowboy no México. No Texas juntou-se a uma companhia de teatro itenerante, e finalmente chegou a Hollywood como cowboy cantor, trabalhando para D. W. Griffith em vários filmes, tanto atrás como à frente das câmeras, como por exemplo, no papel de John Wilkes Booth em "The Birth of a Nation" (1915).
Como realizador, Walsh foi um pioneiro. Ajudou a formular o protótipo do filme de gangsters com "Regeneration" (1915), além de realizar uma série de outros filmes mudos notáveis, como "The Thief of Bagdad" (1924), "What Price Glory" (1926), e "Sadie Thompson" (1928). Também deu a John Wayne uma das suas primeiras oportunidades, em "The Big Trail" (1930). Mas, os anos trinta não foram muito favoráveis a Walsh, e foi apenas quando ele se mudou para a Warner Bros., no final da década, que começaram a aparecer sinais de um estilo pessoal.
O seu forte eram os filmes de acção, preenchidos com uma energia abrasiva e uma decência brusca onde os seus heróis definiam o seu próprio código moral, num universo indiferente. Com um trio de filmes de gangsters levou o género a novos patamares: "The Roaring Twenties" (1939), "High Sierra" (1941) e "White Heat" (1949). Walsh demonstrava uma afinidade natural com actores duros como James Cagney ("Manpower" 1941), Humphrey Bogart ("They Drive by Night" 1940), e, principalmente, Errol Flynn (quem dirigiu em vários filmes). As experiências pessoais de Walsh incutiam autenticidade em westerns como "Pursued" (1947) ou "Colorado Territory" (1949).
Permaneceu um realizador activo até meados da década de 60, mas a sua carreira entrou em declínio desde que saíu da Warner, a meio da década de 50. Ao todo realizou mais de 100 filmes, numa carreira que se prolongou por 52 anos, tendo sido forçado a retirar-se em 1964, por perder a visão no já único olho que tinha.
Neste ciclo dedicado a Raoul Walsh, vamos ver cerca de 3 dezenas dos seus filmes mais importantes, com especial ênfase ao período da Warner. Como irá ser um curso extenso vou dividi-lo em três partes, por ordem cronológica. A segunda parte irá para o ar em Setembro, depois do ciclo "Anos Setenta, Esses Esquecidos...", e a terceira durante o mês de Outubro.
Aqui ficam os filmes que poderão ver de seguida:
- The Big Trail (1930)
- Me and My Gal (1932)
- The Roaring Twenties (1939)
- They Drive By Night (1940)
- They Died With Their Boots On (1941)
- High Sierra (1941)
- Gentleman Jim (1942)
- Desperate Journey (1942)
- Action in the North Atlantic (1943)
- Background to Danger (1943)
- Northern Pursuit (1943)
Ainda em adolescente, interrompeu os estudos para viajar com o seu tio de barco, acabando por se tornar cowboy no México. No Texas juntou-se a uma companhia de teatro itenerante, e finalmente chegou a Hollywood como cowboy cantor, trabalhando para D. W. Griffith em vários filmes, tanto atrás como à frente das câmeras, como por exemplo, no papel de John Wilkes Booth em "The Birth of a Nation" (1915).
Como realizador, Walsh foi um pioneiro. Ajudou a formular o protótipo do filme de gangsters com "Regeneration" (1915), além de realizar uma série de outros filmes mudos notáveis, como "The Thief of Bagdad" (1924), "What Price Glory" (1926), e "Sadie Thompson" (1928). Também deu a John Wayne uma das suas primeiras oportunidades, em "The Big Trail" (1930). Mas, os anos trinta não foram muito favoráveis a Walsh, e foi apenas quando ele se mudou para a Warner Bros., no final da década, que começaram a aparecer sinais de um estilo pessoal.
O seu forte eram os filmes de acção, preenchidos com uma energia abrasiva e uma decência brusca onde os seus heróis definiam o seu próprio código moral, num universo indiferente. Com um trio de filmes de gangsters levou o género a novos patamares: "The Roaring Twenties" (1939), "High Sierra" (1941) e "White Heat" (1949). Walsh demonstrava uma afinidade natural com actores duros como James Cagney ("Manpower" 1941), Humphrey Bogart ("They Drive by Night" 1940), e, principalmente, Errol Flynn (quem dirigiu em vários filmes). As experiências pessoais de Walsh incutiam autenticidade em westerns como "Pursued" (1947) ou "Colorado Territory" (1949).
Permaneceu um realizador activo até meados da década de 60, mas a sua carreira entrou em declínio desde que saíu da Warner, a meio da década de 50. Ao todo realizou mais de 100 filmes, numa carreira que se prolongou por 52 anos, tendo sido forçado a retirar-se em 1964, por perder a visão no já único olho que tinha.
Neste ciclo dedicado a Raoul Walsh, vamos ver cerca de 3 dezenas dos seus filmes mais importantes, com especial ênfase ao período da Warner. Como irá ser um curso extenso vou dividi-lo em três partes, por ordem cronológica. A segunda parte irá para o ar em Setembro, depois do ciclo "Anos Setenta, Esses Esquecidos...", e a terceira durante o mês de Outubro.
Aqui ficam os filmes que poderão ver de seguida:
- The Big Trail (1930)
- Me and My Gal (1932)
- The Roaring Twenties (1939)
- They Drive By Night (1940)
- They Died With Their Boots On (1941)
- High Sierra (1941)
- Gentleman Jim (1942)
- Desperate Journey (1942)
- Action in the North Atlantic (1943)
- Background to Danger (1943)
- Northern Pursuit (1943)
sábado, 27 de junho de 2015
Emboscada Fatal (Comanche Station) 1960
Loner Cody (Randolph Scott) é contratado por um rico fazendeiro para recuperar a sua esposa raptada, Mrs. Lowe (Nancy Gates), e ao conseguí-lo, terá de cumprir um longo caminho de regresso. No trajecto de volta, um fora-da-lei e seus homens juntam-se a ele apenas por interesse à grande quantia em dinheiro oferecida como prémio. Com os índios em pé-de-guerra e os bandidos como antigos inimigos, tudo se encaminha para um final explosivo...
O derradeiro filme deste aclamado ciclo, também chamado por Ranown, é mais uma obra bastante sólida, de aventuras non-stop, que recicla e embaralha os temas do filme anterior, "Ride Lonesome". Em ambos os filmes Scott interpreta um homem que é inicialmente confundido com um caçador de recompensas, cavalgando o território do Oeste tentando enriquecer negociando pessoas, mas, que na verdade, tem uma missão pessoal a cumprir.
A maior parte de "Comanche Station" foi rodado na região norte da California, em Lone Pine, perto do sopé do Monte Whitney. As acumulações montanhosas de pedregulhos, conhecidas como Alabama Hills, são figuras proeminentes no filme, servindo como pano de fundo para a abertura e para as cenas finais, bem como proporcionam o árido e desolador campo de batalha onde a guerra entre Cody e Lane é resolvida. Dos sete filmes desta dupla, três foram filmados aqui.
Atrás destas colaborações entre Scott e Boetticher estavam dois outros homens. Harry Joe Brown produziu cinco dos sete filmes desta dupla, e Burt Kennedy, que escreveu o argumento também de cinco. Foram um exemplo da habilidade de Brown que conseguiu convencer a Columbia a produzir todos estes filmes, numa altura em que o western estava a passar para a televisão, o que marcaria o declínio do género.
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O derradeiro filme deste aclamado ciclo, também chamado por Ranown, é mais uma obra bastante sólida, de aventuras non-stop, que recicla e embaralha os temas do filme anterior, "Ride Lonesome". Em ambos os filmes Scott interpreta um homem que é inicialmente confundido com um caçador de recompensas, cavalgando o território do Oeste tentando enriquecer negociando pessoas, mas, que na verdade, tem uma missão pessoal a cumprir.
A maior parte de "Comanche Station" foi rodado na região norte da California, em Lone Pine, perto do sopé do Monte Whitney. As acumulações montanhosas de pedregulhos, conhecidas como Alabama Hills, são figuras proeminentes no filme, servindo como pano de fundo para a abertura e para as cenas finais, bem como proporcionam o árido e desolador campo de batalha onde a guerra entre Cody e Lane é resolvida. Dos sete filmes desta dupla, três foram filmados aqui.
Atrás destas colaborações entre Scott e Boetticher estavam dois outros homens. Harry Joe Brown produziu cinco dos sete filmes desta dupla, e Burt Kennedy, que escreveu o argumento também de cinco. Foram um exemplo da habilidade de Brown que conseguiu convencer a Columbia a produzir todos estes filmes, numa altura em que o western estava a passar para a televisão, o que marcaria o declínio do género.
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O Homem que Luta Só (Ride Lonesome) 1959
O assassino Billy John (James Best), é capturado por Ben Brigade (Randolph Scott), um caçador de recompensas, que pretende levá-lo até Santa Cruz para ser enforcado. Brigade pára numa estalagem onde salva a esposa do gerente de um ataque de índios e pede ajuda a dois foras-da-lei para o acompanharem na sua jornada com mais segurança. Contudo, o ataque dos índios continua, e os foras-da-lei têm outros planos...
O penúltimo filme na série "Boetticher/Scott é considerado por muitos como o melhor, e também dos melhores da carreira do realizador. Tal como o título do filme indica, Ben Brigade, o personagem de Scott, é um herói solitário, um caçador de recompensas que guia o seu prisioneiro para ser julgado, mas na realidade, na maior parte do filme, Brigade não cavalga sozinho.
O argumento é basicamente um compêndio de todos os padrões do western: o ataque dos índios, os vilões a perseguirem os heróis para um confronto final, e a mulher da fronteira que precisa de ser protegida (Karen Steel, que era uma habitual nos filmes de Boetticher). Tal como James Stewart em "The Naked Spur", Brigade é um caçador de recompensas pouco relutante, não o tipo de pessoa que esperaríamos perseguir alguém por dinheiro. É óbvio que nem tudo é o que parece, e Brigade tem motivos ocultos para aquilo que está a fazer.
Como é habitual, Boetticher é extremamente imparcial ao lidar com os seus personagens principais, com personalidades bem desenvolvidas, nunca permitindo que Boone e Whit se tornem os vilões do filme, apesar de conspirarem contra Brigade. Isto porque o vilão principal, Frank, o irmão de Billy (Lee Van Cleef), pouco está presente no no filme, e era preciso algum antagonismo contra a personagem principal.
Era a estreia absoluta de James Coburn nas longas metragens, no papel de Whit.
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O penúltimo filme na série "Boetticher/Scott é considerado por muitos como o melhor, e também dos melhores da carreira do realizador. Tal como o título do filme indica, Ben Brigade, o personagem de Scott, é um herói solitário, um caçador de recompensas que guia o seu prisioneiro para ser julgado, mas na realidade, na maior parte do filme, Brigade não cavalga sozinho.
O argumento é basicamente um compêndio de todos os padrões do western: o ataque dos índios, os vilões a perseguirem os heróis para um confronto final, e a mulher da fronteira que precisa de ser protegida (Karen Steel, que era uma habitual nos filmes de Boetticher). Tal como James Stewart em "The Naked Spur", Brigade é um caçador de recompensas pouco relutante, não o tipo de pessoa que esperaríamos perseguir alguém por dinheiro. É óbvio que nem tudo é o que parece, e Brigade tem motivos ocultos para aquilo que está a fazer.
Como é habitual, Boetticher é extremamente imparcial ao lidar com os seus personagens principais, com personalidades bem desenvolvidas, nunca permitindo que Boone e Whit se tornem os vilões do filme, apesar de conspirarem contra Brigade. Isto porque o vilão principal, Frank, o irmão de Billy (Lee Van Cleef), pouco está presente no no filme, e era preciso algum antagonismo contra a personagem principal.
Era a estreia absoluta de James Coburn nas longas metragens, no papel de Whit.
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quinta-feira, 25 de junho de 2015
Têmpera de Herói (Buchanan Rides Alone) 1958
No caminho de regresso para casa, Tom Buchanan (Randolph Scott), passa pela cidade de Agry, na fronteira entre a California e o México, e acaba por se envolver num conflito entre o mexicano Abe Garbo, e a familia que domina a região, do mesmo apelido que o nome da cidade.
"Buchanan Rides Alone" continua o famoso ciclo de westerns realizados por Bud Boetticher e interpretados por Randolph Scott, embora seja talvez o mais "leve" da série, e também o mais fácil. Até aqui os filmes eram conhecidos por dar ao herói do western normalmente sisudo um sentido de humor e um sorriso pronto, mas este filme em particular é dominado por um sentido cómico e um sentimento de slapstick. O herói é largamente incompetente, tropeçando no meio dos problemas, ficando de fora apenas como forma anárquica, e, de seguida, tropeçando de volta para o meio das coisas. Scott interpreta um Buchanan solitário, que acaba de passar algum tempo como mercenário no México, ganhando dinheiro suficiente para cumprir o sonho mais comum de qualquer cowboy: comprar um pedaço de terra só para si.
No seu conjunto, "Buchanan Rides Alone" é mais um western interessante da equipa Boetticher / Scott, um estudo de contrastes, em que a um drama sério e por vezes sangrento é substituido pelo factor cómico, neutralizando a sensação de perigo real, neste história. Em vez disso, é um western engraçado, bastante acessível, cujo tom irreverente é melhor representando pelo momento em que Scott, depois de um disputa no saloon com um adversário, lhe pisca um olho. Tentem imaginar um actor como Gary Cooper a fazer isso, e então saberão o quanto esta série de filmes é diferente dos mais comuns westerns.
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"Buchanan Rides Alone" continua o famoso ciclo de westerns realizados por Bud Boetticher e interpretados por Randolph Scott, embora seja talvez o mais "leve" da série, e também o mais fácil. Até aqui os filmes eram conhecidos por dar ao herói do western normalmente sisudo um sentido de humor e um sorriso pronto, mas este filme em particular é dominado por um sentido cómico e um sentimento de slapstick. O herói é largamente incompetente, tropeçando no meio dos problemas, ficando de fora apenas como forma anárquica, e, de seguida, tropeçando de volta para o meio das coisas. Scott interpreta um Buchanan solitário, que acaba de passar algum tempo como mercenário no México, ganhando dinheiro suficiente para cumprir o sonho mais comum de qualquer cowboy: comprar um pedaço de terra só para si.
No seu conjunto, "Buchanan Rides Alone" é mais um western interessante da equipa Boetticher / Scott, um estudo de contrastes, em que a um drama sério e por vezes sangrento é substituido pelo factor cómico, neutralizando a sensação de perigo real, neste história. Em vez disso, é um western engraçado, bastante acessível, cujo tom irreverente é melhor representando pelo momento em que Scott, depois de um disputa no saloon com um adversário, lhe pisca um olho. Tentem imaginar um actor como Gary Cooper a fazer isso, e então saberão o quanto esta série de filmes é diferente dos mais comuns westerns.
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quarta-feira, 24 de junho de 2015
Entardecer Sangrento (Decision at Sundown) 1957
Bart Allison (Scott) chega a Sundown pretendendo matar Tate Kimbrough, com o seu amigo Sam. Ele acredita que Kimbrough fora resposável pela morte da sua esposa, três anos antes, e agora pretende vingança.
"Decision at Sundown" é um western invulgar da dupla formada por Scott e Boetticher, onde a personagem principal costuma ser impulsionada por um acto heróico, mas aqui vamos deparar com um twist, ao encontrar o personagem interpretado por Randolph Scott a ser movido por um acto de vingança, completamente consumido pelo ódio. Boetticher consegue manter a tensão alta, neste "chamber western" onde as correntes emocionais e filosóficas são desenvolvidas lentamente e pacientemente.
Com as simpatias do filme a manterem-se longe de Bart, mesmo com este a fazer o papel de herói, a narrativa centra-se mais na cidade, como um todo. A história não é realmente a do homem bom em busca de vingança contra o homem mau, para corrigir um erro cometido muito tempo antes, mas é um tipo muito diferente de western, basicamente "High Noon" em sentido inverso, com o despertar dos habitantes da cidade contra a podridão no seu meio, em torno de um homem que não quer nem aprecia a sua ajuda. Se o filme não é realmente sobre o herói, que termina o filme consumido pelo sentimento do ódio, raiva e perda, é sobre a forma como as pessoas da cidade reaprendem colectivamente sobre o valor do auto-respeito. Kimbrough pode não ter sido totalmente responsável pela morte da esposa de Bart, mas ele é, sem dúvida, um influência malévola em Sundown, mantendo o povo dócil, com os seus homens a controlarem a lei na cidade. Liderados pelo médico local, o povo de Sumdowm vai acabar por redimir-se.
Ao longo de todo o filme, até a personagem de Kimbrough é humanizada, com as simpatias a tornarem-se cada vez mais difusas, mais difíceis de rastrear. Não está claro desde o início, o que Kimbrough fez pelo povo da cidade concretamente, à excepção de comprar o xerife, e eleger alguns bandidos para deputados da cidade. No final é visto como um homem normal, como qualquer outro, com medo de enfrentar Bart, mas disposto a fazê-lo de qualquer modo, para manter o seu orgulho.
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"Decision at Sundown" é um western invulgar da dupla formada por Scott e Boetticher, onde a personagem principal costuma ser impulsionada por um acto heróico, mas aqui vamos deparar com um twist, ao encontrar o personagem interpretado por Randolph Scott a ser movido por um acto de vingança, completamente consumido pelo ódio. Boetticher consegue manter a tensão alta, neste "chamber western" onde as correntes emocionais e filosóficas são desenvolvidas lentamente e pacientemente.
Com as simpatias do filme a manterem-se longe de Bart, mesmo com este a fazer o papel de herói, a narrativa centra-se mais na cidade, como um todo. A história não é realmente a do homem bom em busca de vingança contra o homem mau, para corrigir um erro cometido muito tempo antes, mas é um tipo muito diferente de western, basicamente "High Noon" em sentido inverso, com o despertar dos habitantes da cidade contra a podridão no seu meio, em torno de um homem que não quer nem aprecia a sua ajuda. Se o filme não é realmente sobre o herói, que termina o filme consumido pelo sentimento do ódio, raiva e perda, é sobre a forma como as pessoas da cidade reaprendem colectivamente sobre o valor do auto-respeito. Kimbrough pode não ter sido totalmente responsável pela morte da esposa de Bart, mas ele é, sem dúvida, um influência malévola em Sundown, mantendo o povo dócil, com os seus homens a controlarem a lei na cidade. Liderados pelo médico local, o povo de Sumdowm vai acabar por redimir-se.
Ao longo de todo o filme, até a personagem de Kimbrough é humanizada, com as simpatias a tornarem-se cada vez mais difusas, mais difíceis de rastrear. Não está claro desde o início, o que Kimbrough fez pelo povo da cidade concretamente, à excepção de comprar o xerife, e eleger alguns bandidos para deputados da cidade. No final é visto como um homem normal, como qualquer outro, com medo de enfrentar Bart, mas disposto a fazê-lo de qualquer modo, para manter o seu orgulho.
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terça-feira, 23 de junho de 2015
A Marca do Terror (The Tall T.) 1957
Depois de perder o seu cavalo numa aposta, Pat Brennan (Randolph Scott) apanha boleia de uma diligência, com dois recém casados Willard e Doretta Mims (John Hubbard e Maureen O´Sullivan). Na paragem seguinte o condutor e os passageiros caem nas mãos de um trio de foras-da-lei, cujo líder é um homem chamado Frank Usher (Richard Boone). Quando Usher descobre que Doretta é filha de um proprietário de uma mina de cobre, resolve pedir um resgate. A tensão irá aumentar nas 24 horas seguintes, com Usher a aguardar resposta às suas demandas, e uma ligação romântica a crescer entre Brennan e Doretta.
Filmado em apenas 12 dias, "The Tall T." é mais um western notável, numa década que sem dúvida pertenceu a este género. Burt Kennedy escreve um argumento tenso, a partir de um conto de Elmore Leonard.
"The Tall T." é, acima de tudo, um filme de actores. A primeira surpresa reside no desempenho de Maureen O'Sullivan, no papel da choramingona Doretta Mims, um desempenho que quase pode ser visto como uma antítese do seu excelente papel de mulher independente em "Tarzan and His Mate". Aqui ela é a recém-casada, e tímida esposa do antipático Willard Mims. Depois há o papel de Scott, entre os mais bem desenvolvidos dentro do cânone de Boetticher.
"The Tall T." tem também algumas das melhores sequências da dupla Boetticher/Scott, incluíndo o uso magistral do terreno rochoso, a caverna escura em que Doretta e Brennan são mantidos, e as sequências da diligência. E não esquecer as sequências de Brennan protege um pacote de hortelã-pimenta doce.
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Filmado em apenas 12 dias, "The Tall T." é mais um western notável, numa década que sem dúvida pertenceu a este género. Burt Kennedy escreve um argumento tenso, a partir de um conto de Elmore Leonard.
"The Tall T." é, acima de tudo, um filme de actores. A primeira surpresa reside no desempenho de Maureen O'Sullivan, no papel da choramingona Doretta Mims, um desempenho que quase pode ser visto como uma antítese do seu excelente papel de mulher independente em "Tarzan and His Mate". Aqui ela é a recém-casada, e tímida esposa do antipático Willard Mims. Depois há o papel de Scott, entre os mais bem desenvolvidos dentro do cânone de Boetticher.
"The Tall T." tem também algumas das melhores sequências da dupla Boetticher/Scott, incluíndo o uso magistral do terreno rochoso, a caverna escura em que Doretta e Brennan são mantidos, e as sequências da diligência. E não esquecer as sequências de Brennan protege um pacote de hortelã-pimenta doce.
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domingo, 21 de junho de 2015
7 Homens Para Matar (Seven Men From Now) 1956
Ben Stride (um ex-xerife) persegue sete homens que fizeram um assalto em Wells Fargo, e assassinaram a sua esposa. Stride vive atormentado pelo facto de que o seu próprio fracasso para manter o seu emprego foi a esposa trabalhar no sitio que foi assaltado, e por isso ele sente-se responsável pela sua morte.
Durante a década de 50, Bud Boetticher realizou dois famosos filmes sobre touradas: "The Bullfighter and the Lady" e "The Magnificent Matador". John Wayne produziu o primeiro, e foi por essa razão que convidou Boetticher para este pequeno western. Seria a primeira das sete colaborações do realizador com o actor Randolph Scott, colaborações essas que impulsionaram este ciclo, e também a primeira colaboração com Burt Kennedy, que na década seguinte se tornaria um dos realizadores mais importantes de série B americana. Houve quem os classificasse de "chamber westerns", e considerasse como uma das descobertas mais gratificantes do cinema dos anos 50. Eram obras psicologicamente complexas, equivalentes para os westerns americanos como Val Lewton estava para os filmes de terror dos anos 40, de quem já vimos alguns filmes neste blog.
Este filme de estreia era muito moderno esteticamente, muito tenso, e com personagens tão ou mais desenvolvidas do que famosas obras posteriores de realizadores como Sergio Leone ou Sam Peckinpah. Duas outras duplas podem colocar-se ao mesmo nível destas colaborações: Delmer Daves/Glenn Ford e Anthony Mann/James Stewart.
"Seven Men From Now" separa-se dos vulgares westerns na abordagem que faz conceito do bem e do mal. Os chamados "vilões" neste filme não se vestem de preto e com cara de maus, e o herói não executa apenas tarefas altruístas. Todos os tipos de personagens convivem entre eles, e tal como Jean Renoir disse em "A Guerra do Jogo": "toda a gente tem as suas razões". Poucos filmes demonstram tão bem este tipo de sentimento, como este.Um destaque muito especial para o papel de vilão de Lee Marvin.
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Durante a década de 50, Bud Boetticher realizou dois famosos filmes sobre touradas: "The Bullfighter and the Lady" e "The Magnificent Matador". John Wayne produziu o primeiro, e foi por essa razão que convidou Boetticher para este pequeno western. Seria a primeira das sete colaborações do realizador com o actor Randolph Scott, colaborações essas que impulsionaram este ciclo, e também a primeira colaboração com Burt Kennedy, que na década seguinte se tornaria um dos realizadores mais importantes de série B americana. Houve quem os classificasse de "chamber westerns", e considerasse como uma das descobertas mais gratificantes do cinema dos anos 50. Eram obras psicologicamente complexas, equivalentes para os westerns americanos como Val Lewton estava para os filmes de terror dos anos 40, de quem já vimos alguns filmes neste blog.
Este filme de estreia era muito moderno esteticamente, muito tenso, e com personagens tão ou mais desenvolvidas do que famosas obras posteriores de realizadores como Sergio Leone ou Sam Peckinpah. Duas outras duplas podem colocar-se ao mesmo nível destas colaborações: Delmer Daves/Glenn Ford e Anthony Mann/James Stewart.
"Seven Men From Now" separa-se dos vulgares westerns na abordagem que faz conceito do bem e do mal. Os chamados "vilões" neste filme não se vestem de preto e com cara de maus, e o herói não executa apenas tarefas altruístas. Todos os tipos de personagens convivem entre eles, e tal como Jean Renoir disse em "A Guerra do Jogo": "toda a gente tem as suas razões". Poucos filmes demonstram tão bem este tipo de sentimento, como este.Um destaque muito especial para o papel de vilão de Lee Marvin.
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sábado, 20 de junho de 2015
Os Westerns de Budd Boetticher e Randolph Scott
Ao longo da história do cinema foram muitas as estrelas que, de alguma forma, ficaram ligadas a realizadores. Por vezes, esses realizadores sentiam-se inspirados pelos actores, ou actrizes, chegando a construir filmes ou personagens à volta deles.
No Western, estas duplas - realizador/actor - eram muito comuns. Basta lembrar que John Wayne ficou para sempre ligado a John Ford, e juntos fizeram alguns dos melhores filmes do género. Nos anos cinquenta, Anthony Mann e James Stewart fizeram uma série de westerns psicológicos que hoje em dia colocam-se entre os mais importantes. Já Sérgio Leone realizou a trilogia dos Dólares à volta de personagens de Clint Eastwood.
Nos anos 50, Budd Boetticher era um realizador desconhecido, um autor, dedicado a filmes de série B, quer fossem comédias, westerns, ou filmes noir. Amado por cinéfilos invertebrados, mas também por todos aqueles que partilhavam uma visão da América que incluísse honra, dever, cavalos e a paisagem física do western americano, os seus westerns geralmente tinham um herói solitário, quase sempre silencioso, por vezes alienado do mundo, numa paisagem que lhe era hostil. As suas intenções chegavam mesmo a confundir-se com a dos vilões. Os seus melhores filmes eram existencialistas e emocionalmente ambíguos, mas continuava a haver um tom moral, que de certa forma girava em volta da sua própria integridade.
Boetticher encontrou um rosto, e um actor, para as suas personagens: Randolph Scott, que apenas começou a trabalhar com ele quando tinha 57 anos. A figura de Scott era perfeita para estas personagens, de rosto taciturno e solitário. Scott já era uma grande estrela nesta altura, mas nunca esteve tão bem como nestes westerns minimalistas de Boetticher. Interpretava sempre homens de poucas palavras, muitas vezes com uma história trágica que impulsionava as suas acções arriscadas e altruístas. A colaboração entre os dois apenas durou cinco anos (entre 1956 e 1960), mas espalhou-se por 7 filmes:
Embora não haja nenhuma teoria específica sobre o assunto, quer de críticos ou de estudantes de cinema, Boetticher é muito estimado por este grupo de filmes que fez com Scott. Todos eles fruto de produções de baixo orçamento, todavia com uma enorme precisão, como poderão evidenciar. Resumindo, estamos perante um pequeno pedaço da história do cinema americano, a não perder.
Aqui ficam os 6 filmes que farão parte deste ciclo:
- "Seven Men From Now" (1956)
- "The Tall T" (1957)
- " Decision at Sundown" (1957)
- "Buchanan Rides Alone" (1958)
- "Ride Lonesome" (1959)
- "Comanche Station" (1960)
* Texto originalmente publicado aqui.
No Western, estas duplas - realizador/actor - eram muito comuns. Basta lembrar que John Wayne ficou para sempre ligado a John Ford, e juntos fizeram alguns dos melhores filmes do género. Nos anos cinquenta, Anthony Mann e James Stewart fizeram uma série de westerns psicológicos que hoje em dia colocam-se entre os mais importantes. Já Sérgio Leone realizou a trilogia dos Dólares à volta de personagens de Clint Eastwood.
Nos anos 50, Budd Boetticher era um realizador desconhecido, um autor, dedicado a filmes de série B, quer fossem comédias, westerns, ou filmes noir. Amado por cinéfilos invertebrados, mas também por todos aqueles que partilhavam uma visão da América que incluísse honra, dever, cavalos e a paisagem física do western americano, os seus westerns geralmente tinham um herói solitário, quase sempre silencioso, por vezes alienado do mundo, numa paisagem que lhe era hostil. As suas intenções chegavam mesmo a confundir-se com a dos vilões. Os seus melhores filmes eram existencialistas e emocionalmente ambíguos, mas continuava a haver um tom moral, que de certa forma girava em volta da sua própria integridade.
Boetticher encontrou um rosto, e um actor, para as suas personagens: Randolph Scott, que apenas começou a trabalhar com ele quando tinha 57 anos. A figura de Scott era perfeita para estas personagens, de rosto taciturno e solitário. Scott já era uma grande estrela nesta altura, mas nunca esteve tão bem como nestes westerns minimalistas de Boetticher. Interpretava sempre homens de poucas palavras, muitas vezes com uma história trágica que impulsionava as suas acções arriscadas e altruístas. A colaboração entre os dois apenas durou cinco anos (entre 1956 e 1960), mas espalhou-se por 7 filmes:
Embora não haja nenhuma teoria específica sobre o assunto, quer de críticos ou de estudantes de cinema, Boetticher é muito estimado por este grupo de filmes que fez com Scott. Todos eles fruto de produções de baixo orçamento, todavia com uma enorme precisão, como poderão evidenciar. Resumindo, estamos perante um pequeno pedaço da história do cinema americano, a não perder.
Aqui ficam os 6 filmes que farão parte deste ciclo:
- "Seven Men From Now" (1956)
- "The Tall T" (1957)
- " Decision at Sundown" (1957)
- "Buchanan Rides Alone" (1958)
- "Ride Lonesome" (1959)
- "Comanche Station" (1960)
* Texto originalmente publicado aqui.
sexta-feira, 19 de junho de 2015
Histórias de Caçadeiras (Shotgun Stories) 2007
Son Hayes nunca fala das cicatrizes que tem nas costas: os chumbos de caçadeira desenham debaixo da pele um padrão de pontos negros e azuis. Os homens com quem trabalha fazem apostas sobre como as ganhou. Son é irmão de Boy e Kid - o pai que os abandonara nunca se importou em dar aos filhos nomes como deve ser. E os três crescem com a mãe amarga. Nos campos de algodão e nas pequenas estradas do Sudeste de Arkansas, estes irmãos descobrem o que estão dispostos a percorrer para proteger a família.
Enquanto o argumento foi desenhado numa trajectória ascendente de violência, o visual do filme de estreia de Jeff Nichols mantém a precisão das suas imagens de abertura. Co-produzido por David Gordon Green e fotografado por Adam Stone, o filme é ao mesmo tempo intensamente regional e expansivo e as imagens oferecem detalhes desolados dos irmãos, as suas frustrações e desejos. A inevitável violência aponta para outro sistema em vigor, baseado na forma como os homens agem e são esperados agir, a sua aparente falta de opções.
Todo o elenco é excelente, com interpretações que sugerem influências óbvias do Western, sem parecer arcaico. Michael Shannon erradia uma tenacidade refletida na sua cicatriz física, e tem uma química tão grande com Linon e Jacobs, temos uma sensação de que eles já se conhecem tão bem e não precisam de falar sobre os seus sentimentos.
Como filme indie, percorreu vários festivais pelo mundo fora, tendo ganho variados prémios.
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Enquanto o argumento foi desenhado numa trajectória ascendente de violência, o visual do filme de estreia de Jeff Nichols mantém a precisão das suas imagens de abertura. Co-produzido por David Gordon Green e fotografado por Adam Stone, o filme é ao mesmo tempo intensamente regional e expansivo e as imagens oferecem detalhes desolados dos irmãos, as suas frustrações e desejos. A inevitável violência aponta para outro sistema em vigor, baseado na forma como os homens agem e são esperados agir, a sua aparente falta de opções.
Todo o elenco é excelente, com interpretações que sugerem influências óbvias do Western, sem parecer arcaico. Michael Shannon erradia uma tenacidade refletida na sua cicatriz física, e tem uma química tão grande com Linon e Jacobs, temos uma sensação de que eles já se conhecem tão bem e não precisam de falar sobre os seus sentimentos.
Como filme indie, percorreu vários festivais pelo mundo fora, tendo ganho variados prémios.
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quinta-feira, 18 de junho de 2015
Sling Blade - O Arremeso (Sling Blade) 1996
Um homem parcialmente deficiente chamado Karl é libertado de um hospital mental, cerca de 20 anos depois de ter assassinado a sua mãe e outra pessoa. É frequentemente questionado se vai matar de novo, mas encolhe os ombros e diz que não há razão para isso. Agora fora da instituição mental instala-se na sua velha cidade natal, trabalhando como mecânico. Conhece um rapaz chamado Frank, de quem se torna amigo, e é convidado para ficar na casa deste pela mãe, que o vê como uma pessoa estranha mas amável. Já o namorado desta vê as coisas de outra forma...
O filme que fez de Billy Bob Thornton uma estrela, e um veículo improvável para ser um dos melhores filmes do ano. "Sling Blade" também recebeu o Óscar de Melhor Argumento para Thorton, que além de interpretar o papel principal também realizava. Não é um filme sobre o bem e o mal, com um protagonista ou antogonista claro, mas antes um filme sobre o certo e o errado. É uma distinção complicada, mas isso torna a história ainda mais atraente.
"Sling Blade" era uma extensão de uma curta metragem a preto e branco que Thornton escreveu e interpretou em 1994, chamada "Some Folks Call it a Sling Blade". Ao expandir o filme para fora dos quatro muros da prisão estadual, Thornton é capaz de expandir plenamente o seu sentido de tempo e lugar, e dá-lhe uma atenção ao detalhe normalmente reservada para obras literárias, que permitem aos seus personagens crescerem e se desenvolverem. O facto de que Thornton teve vários anos para trabalhar o personagem de Karl é bastante evidente, e nota-se na forma como ele habita o papel, desde a sua postura até à forma de caminhar.
No seu coração, "Sling Blade" é um conto de Southern Gothic, de amor e redenção. Tem o tipo de personagem que William Faulkner teria ficado orgulhoso de escrever sobre, e cria e sustenta um clima sugestivo que carrega traços do grotesco mas que permanece resolutamente humano. Para um realizador estreante em longas metragens Thornton é extremamente tranquilo, mesmo quando cede ao sentimentalismo perto do final.
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O filme que fez de Billy Bob Thornton uma estrela, e um veículo improvável para ser um dos melhores filmes do ano. "Sling Blade" também recebeu o Óscar de Melhor Argumento para Thorton, que além de interpretar o papel principal também realizava. Não é um filme sobre o bem e o mal, com um protagonista ou antogonista claro, mas antes um filme sobre o certo e o errado. É uma distinção complicada, mas isso torna a história ainda mais atraente.
"Sling Blade" era uma extensão de uma curta metragem a preto e branco que Thornton escreveu e interpretou em 1994, chamada "Some Folks Call it a Sling Blade". Ao expandir o filme para fora dos quatro muros da prisão estadual, Thornton é capaz de expandir plenamente o seu sentido de tempo e lugar, e dá-lhe uma atenção ao detalhe normalmente reservada para obras literárias, que permitem aos seus personagens crescerem e se desenvolverem. O facto de que Thornton teve vários anos para trabalhar o personagem de Karl é bastante evidente, e nota-se na forma como ele habita o papel, desde a sua postura até à forma de caminhar.
No seu coração, "Sling Blade" é um conto de Southern Gothic, de amor e redenção. Tem o tipo de personagem que William Faulkner teria ficado orgulhoso de escrever sobre, e cria e sustenta um clima sugestivo que carrega traços do grotesco mas que permanece resolutamente humano. Para um realizador estreante em longas metragens Thornton é extremamente tranquilo, mesmo quando cede ao sentimentalismo perto do final.
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quarta-feira, 17 de junho de 2015
Sangue Selvagem (Wise Blood) 1979
Um norte-americano do sul - jovem, pobre, ambicioso e pouco educado - está determinado a ser alguém no mundo. Ele decide que a melhor maneira de o fazer é tornar-se pregador e funda a sua própria igreja.
Em finais da década de setenta, John Huston foi abordado por um jovem produtor chamado Michael Fitzgerald. Ele era um dos seis filhos de Sally e Robert Fitzgerald. O seu pai era um famoso tradutor do grego, era o editor literário de Flannery O´Connor, e a sua mãe editava as cartas deste escritor nascido na Georgia, que passou largos períodos de tempo em casa dos Fitzgerald, antes de uma morte precoce por doença.
Foi ideia de Michael Fitzgerald fazer um filme de "Wise Blood", que tinha sido publicado em 1952, deslumbrante primeiro romance de O´Connor. A história de um jovem georgiano cuja obsessão por Deus o leva a fugir o mais rapidamente dele, para bater de frente na parede de Jesus e da religião.
Huston já tinha capturado da melhor forma a tensão erótica de Carson McCullers em "Reflections in a Golden Eye" e a inocência e o terror do clássico da guerra civil "Red Badge of Courage", escrito por Stephen Crane. Ambos os livros eram dramas sulistas, e por isso Huston poderia ser o realizador ideal para passar "Wise Blood" para filme.
O orçamento para o filme era muito baixo, e toda a gente, incluido Huston, trabalhou com um salário mínimo, quase simbólico. A esposa de Michael co-produziu o filme, e o seu irmão, Benedict, escreveu o argumento. Foi filmado em exteriores em Macon, na Georgia, sem grandes estrelas no elenco, mas com actores talentosos. Brad Dourif, era o protagonista, um jovem que aguardava um filme à sua altura, depois de ter sido nomeado para o Óscar de Melhor Actor Secubdário em "Voando Sobre um Ninho de Cucos".
Enquanto o romance de O´Connor era passado no início da década de 50, um tempo particularmente crucial para o conflito de identidades que se debatia no Sul dos Estados Unidos, o filme de Huston teve de ser passado num tempo contemporãneo, por causa de questões orçamentais, o que significa que todos os carros eram da década de 70, e não havia grande esforço em esconder os edifícios mais modernos do centro de Macon. Ao mesmo tempo, o conteúdo não é actualizado, e as atitudes (principalmente as questões raciais), permanecem firmemente enraizadas no início do década de 50. Os críticos que elogiaram o filme, viram isso como uma mistura eficaz de períodos de tempo, para criar uma espécie de atemporalidade.
Pelas questões orçamentais já citadas, pode dizer-se que é um filme "menor", de John Huston. Mas no que diz respeito à qualidade, não é um filme tão menor assim.
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Em finais da década de setenta, John Huston foi abordado por um jovem produtor chamado Michael Fitzgerald. Ele era um dos seis filhos de Sally e Robert Fitzgerald. O seu pai era um famoso tradutor do grego, era o editor literário de Flannery O´Connor, e a sua mãe editava as cartas deste escritor nascido na Georgia, que passou largos períodos de tempo em casa dos Fitzgerald, antes de uma morte precoce por doença.
Foi ideia de Michael Fitzgerald fazer um filme de "Wise Blood", que tinha sido publicado em 1952, deslumbrante primeiro romance de O´Connor. A história de um jovem georgiano cuja obsessão por Deus o leva a fugir o mais rapidamente dele, para bater de frente na parede de Jesus e da religião.
Huston já tinha capturado da melhor forma a tensão erótica de Carson McCullers em "Reflections in a Golden Eye" e a inocência e o terror do clássico da guerra civil "Red Badge of Courage", escrito por Stephen Crane. Ambos os livros eram dramas sulistas, e por isso Huston poderia ser o realizador ideal para passar "Wise Blood" para filme.
O orçamento para o filme era muito baixo, e toda a gente, incluido Huston, trabalhou com um salário mínimo, quase simbólico. A esposa de Michael co-produziu o filme, e o seu irmão, Benedict, escreveu o argumento. Foi filmado em exteriores em Macon, na Georgia, sem grandes estrelas no elenco, mas com actores talentosos. Brad Dourif, era o protagonista, um jovem que aguardava um filme à sua altura, depois de ter sido nomeado para o Óscar de Melhor Actor Secubdário em "Voando Sobre um Ninho de Cucos".
Enquanto o romance de O´Connor era passado no início da década de 50, um tempo particularmente crucial para o conflito de identidades que se debatia no Sul dos Estados Unidos, o filme de Huston teve de ser passado num tempo contemporãneo, por causa de questões orçamentais, o que significa que todos os carros eram da década de 70, e não havia grande esforço em esconder os edifícios mais modernos do centro de Macon. Ao mesmo tempo, o conteúdo não é actualizado, e as atitudes (principalmente as questões raciais), permanecem firmemente enraizadas no início do década de 50. Os críticos que elogiaram o filme, viram isso como uma mistura eficaz de períodos de tempo, para criar uma espécie de atemporalidade.
Pelas questões orçamentais já citadas, pode dizer-se que é um filme "menor", de John Huston. Mas no que diz respeito à qualidade, não é um filme tão menor assim.
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segunda-feira, 15 de junho de 2015
Ritual de Guerra (The Beguiled) 1971
Durante a guerra civil, um soldado yankee ferido John McBurney (Clint Eastwood) é resgatado à beira da morte por uma adolescente de uma escola do sul. Ela consegue levá-lo para a escola, e ao principio todas as jovens alunas que a frequentam estão com medo. Há medida que ele recupera, ele vai lançando o seu charme para cima delas, e a atmosfera escolar fica coberta de ciúmes e traição.
Em 1971 Don Siegel fez dois filmes muito diferentes com Clint Eastwood: "Dirty Harry" e "The Beguiled". "Dirty Harry" era um filme mais habitual na carreira de ambos, como tal, na sua zona de conforto. Já "The Beguiled" é talvez o veículo mais estranho que esta dupla fez juntos. Siegel parece querer que "The Beguiled" seja um conto moral feminista. Não há dúvida de que McBurney é um predador sexual, aquele que consegue o que quer de jovens inexperientes com promessas de amor. Mas, ao mesmo tempo que está disposto a pintar McBurney como vilão, apesar dele ser o protagonista, Siegel transforma as mulheres que nós supostamente vamos simpatizar em estereótipos dimensionais. Martha (Geraldine Page) é a mulher mais velha, e sexualmente frustrada. Edwina (Elizabeth Hartman) é a mais inexperiente e que se apaixona facilmente. Carol (Jo Ann Harris) é uma ninfomaníaca. Estas mulheres nunca crescem para lá desta função, mas ao fazer de McBurney uma personagem mais fluída e dando-lhe mais momentos simpáticos para questionar os seus motivos aparentemente lascivos, Siegel turva qualquer ponto feminista que estivesse tentado a fazer.
Ao mesmo tempo Siegel oferece-nos um guia sobre os males da guerra. Através de flashbacks ele mostra-nos assassinatos de McBurney a sangue frio no campo de batalha, como parte da marcha da União através do Sul. Por várias vezes é mancionado que todos os pais das raparigas são considerados mortos nos campos de batalha. Os encontros com as tropas confederadas consideradas amigáveis são momentos carregas de tensão para Martha, já que ela nunca sabe quando é que um grupo de homens irá invadir a escola e tomar as suas meninas pela força. Apesar do tratamento superficial que é dado a estes momentos, eles ainda são bastante efectivos.
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Em 1971 Don Siegel fez dois filmes muito diferentes com Clint Eastwood: "Dirty Harry" e "The Beguiled". "Dirty Harry" era um filme mais habitual na carreira de ambos, como tal, na sua zona de conforto. Já "The Beguiled" é talvez o veículo mais estranho que esta dupla fez juntos. Siegel parece querer que "The Beguiled" seja um conto moral feminista. Não há dúvida de que McBurney é um predador sexual, aquele que consegue o que quer de jovens inexperientes com promessas de amor. Mas, ao mesmo tempo que está disposto a pintar McBurney como vilão, apesar dele ser o protagonista, Siegel transforma as mulheres que nós supostamente vamos simpatizar em estereótipos dimensionais. Martha (Geraldine Page) é a mulher mais velha, e sexualmente frustrada. Edwina (Elizabeth Hartman) é a mais inexperiente e que se apaixona facilmente. Carol (Jo Ann Harris) é uma ninfomaníaca. Estas mulheres nunca crescem para lá desta função, mas ao fazer de McBurney uma personagem mais fluída e dando-lhe mais momentos simpáticos para questionar os seus motivos aparentemente lascivos, Siegel turva qualquer ponto feminista que estivesse tentado a fazer.
Ao mesmo tempo Siegel oferece-nos um guia sobre os males da guerra. Através de flashbacks ele mostra-nos assassinatos de McBurney a sangue frio no campo de batalha, como parte da marcha da União através do Sul. Por várias vezes é mancionado que todos os pais das raparigas são considerados mortos nos campos de batalha. Os encontros com as tropas confederadas consideradas amigáveis são momentos carregas de tensão para Martha, já que ela nunca sabe quando é que um grupo de homens irá invadir a escola e tomar as suas meninas pela força. Apesar do tratamento superficial que é dado a estes momentos, eles ainda são bastante efectivos.
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domingo, 14 de junho de 2015
Reflexos num Olho Dourado (Reflections in a Golden Eye) 1967
1948, num posto do exército dos Estados Unidos, um major impotente, homossexual latente, é casado com uma mulher que nunca perde uma oportunidade para ridicularizar as suas falhas masculinas. Ele descola a sua hostilidade brutalizando o seu cavalo, e ela retalia humilhando-o perante uma casa cheia de convidados, repetidamente, cortando-o no rosto com o seu chicote. Ela anda a cometer adultério com um oficial, cuja esposa cortou os mamilos com tesouras de jardim depois de ter perdido o bébé. Ela procura consolo no empregado de casa, efeminado.
Opiniões críticas parecem divididas em relação a este filme invulgar de John Huston, baseado num livro de 1941 de Carson McCullers sobre a repressão sexual numa base da Carolina do Norte. Enquanto algumas pessoas o viam simplesmente como um filme gótico sulista, em que a perversidade das personagens converge para um foco de tensões irrealisticamente melodramático, outros reconhecem-no como uma perspectiva exclusivamente compassiva sobre os caprichos da repressão sexual, como vistos pelas visões colectivas de Huston e McCullers.A verdade talvez seja a meio dos dois extremos.
Subjacente a todo o filme estão as suas duas forças principais: a primeira é a sua aparência única, como especificamente previsto por John Huston, que trabalhando com o director de fotografia Aldo Tonti, tinha a cor estrategicamente dessaturada, numa tentativa de emular a perspectiva do titular da história. Embora o filme só tenha sido autorizado a circular nos cinemas por uma semana com este esquema de cores, a versão restaurada é um verdadeiro prazer visual. Em segundo lugar, a magnifica interpretação de Marlon Brando, um desempenho verdadeiramente comovente no papel de um oficial do exército tragicamente reprimido. Cada expressão de Brando revela a profundidade da confusão da sua personagem, a raiva o desejo.
Um grande elenco, que inclui Brando, Elizabeth Taylor, Brian Keith, Julie Harris, Robert Foster, e um estreante chamado Harvey Keitel, então com 18 anos.
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Opiniões críticas parecem divididas em relação a este filme invulgar de John Huston, baseado num livro de 1941 de Carson McCullers sobre a repressão sexual numa base da Carolina do Norte. Enquanto algumas pessoas o viam simplesmente como um filme gótico sulista, em que a perversidade das personagens converge para um foco de tensões irrealisticamente melodramático, outros reconhecem-no como uma perspectiva exclusivamente compassiva sobre os caprichos da repressão sexual, como vistos pelas visões colectivas de Huston e McCullers.A verdade talvez seja a meio dos dois extremos.
Subjacente a todo o filme estão as suas duas forças principais: a primeira é a sua aparência única, como especificamente previsto por John Huston, que trabalhando com o director de fotografia Aldo Tonti, tinha a cor estrategicamente dessaturada, numa tentativa de emular a perspectiva do titular da história. Embora o filme só tenha sido autorizado a circular nos cinemas por uma semana com este esquema de cores, a versão restaurada é um verdadeiro prazer visual. Em segundo lugar, a magnifica interpretação de Marlon Brando, um desempenho verdadeiramente comovente no papel de um oficial do exército tragicamente reprimido. Cada expressão de Brando revela a profundidade da confusão da sua personagem, a raiva o desejo.
Um grande elenco, que inclui Brando, Elizabeth Taylor, Brian Keith, Julie Harris, Robert Foster, e um estreante chamado Harvey Keitel, então com 18 anos.
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sexta-feira, 12 de junho de 2015
Com a Maldade na Alma ( Hush...Hush, Sweet Charlotte) 1964
Bette Davis é Charlotte Hollis, uma solteirona reclusa ainda obcecada pelo brutal assassinato do seu amante, ocorrido há mais de 37 anos. Quando a sua propriedade está para ser desapropriada para a construção de uma nova estrada, Charlotte pede a ajuda à sua prima Miriam (Olivia De Havilland), ao velho amigo Drew (Joseph Cotten) e à empregada Velma Cruther (Agnes Moorehead). É então que os rumores que rondaram o crime acontecido décadas antes começam a se tornar realidade...
Já existia muita tensão sobre este filme, mesmo antes das câmeras começarem a filmar. Em primeiro lugar, era para ser uma sequela ao filme de 1962 "Whatever Happened to Baby Jane?", e era intenção voltar a juntar Bette Davis à sua co-star do primeiro filme, Joan Crawford. Mas a rivalidade de longa data entre as duas actrizes entrou em erupção, enviado Crawford para o hospital com uma suposta doença, e obrigando os produtores a encontrar uma substituta. A escolhida acabaria por ser Olivia de Havilland, que já tinha contracenado com Davis em três filmes, todos da Warner Bros.
A escolha foi perfeita. A personagem de Havilland era o contraponto perfeito para a de Davis, e era impossível imaginar Crawford no papel de Miriam. Manipula as nossas expectativas, dando um desempenho por camadas que tem o enorme poder de surpreender. A princípio o seu papel é de falas mansas e agradáveis, uma reminiscência do seu papel mais famoso, como uma senhora sulista: a gentil Melanie de "Gone With the Wind". No entanto, a personagem de Miriam tem muito mais a mostrar, como vamos vendo ao longo do filme. As interacções entre as duas mulheres são cruciais ao longo do filme, e o realizador Robert Aldrich brinca com a nossa simpatia, obrigando-nos a inclinar para uma personagem, e depois para outra. Sem o desempenho de Havilland o filme não teria este equilíbrio.
"Hush…Hush, Sweet Charlotte" é muitas vezes citado como exemplo do Grand Guignol, um estilo de terror dado a um teatro francês especialista em entretenimento sangrento. O prólogo sangrento mostra desde logo que o filme vai caminhar perto da fronteira do terror. Nos filmes mainstream da altura estávamos habituados a que as sequências fossem cortadas antes dos desmembramentos, não colocando as partes cortadas em exposição. A fotografia a preto e branco silencia o gore, e as partes dos corpos embora não sejam demais para os padrões modernos, ainda é um choque vê-las. Aldrich e o seu director de fotografia habitual, Joseph Biroc, também fazem um brilhante uso das sombras, ângulos de câmera extremos e composições forçadas para enaltecer a sensação do mal-estar e do grotesco. A qualidade da paisagem barroca também contribui para toda esta diversão.
Foi nomeado para sete Óscares, mas não venceu nenhum.
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Já existia muita tensão sobre este filme, mesmo antes das câmeras começarem a filmar. Em primeiro lugar, era para ser uma sequela ao filme de 1962 "Whatever Happened to Baby Jane?", e era intenção voltar a juntar Bette Davis à sua co-star do primeiro filme, Joan Crawford. Mas a rivalidade de longa data entre as duas actrizes entrou em erupção, enviado Crawford para o hospital com uma suposta doença, e obrigando os produtores a encontrar uma substituta. A escolhida acabaria por ser Olivia de Havilland, que já tinha contracenado com Davis em três filmes, todos da Warner Bros.
A escolha foi perfeita. A personagem de Havilland era o contraponto perfeito para a de Davis, e era impossível imaginar Crawford no papel de Miriam. Manipula as nossas expectativas, dando um desempenho por camadas que tem o enorme poder de surpreender. A princípio o seu papel é de falas mansas e agradáveis, uma reminiscência do seu papel mais famoso, como uma senhora sulista: a gentil Melanie de "Gone With the Wind". No entanto, a personagem de Miriam tem muito mais a mostrar, como vamos vendo ao longo do filme. As interacções entre as duas mulheres são cruciais ao longo do filme, e o realizador Robert Aldrich brinca com a nossa simpatia, obrigando-nos a inclinar para uma personagem, e depois para outra. Sem o desempenho de Havilland o filme não teria este equilíbrio.
"Hush…Hush, Sweet Charlotte" é muitas vezes citado como exemplo do Grand Guignol, um estilo de terror dado a um teatro francês especialista em entretenimento sangrento. O prólogo sangrento mostra desde logo que o filme vai caminhar perto da fronteira do terror. Nos filmes mainstream da altura estávamos habituados a que as sequências fossem cortadas antes dos desmembramentos, não colocando as partes cortadas em exposição. A fotografia a preto e branco silencia o gore, e as partes dos corpos embora não sejam demais para os padrões modernos, ainda é um choque vê-las. Aldrich e o seu director de fotografia habitual, Joseph Biroc, também fazem um brilhante uso das sombras, ângulos de câmera extremos e composições forçadas para enaltecer a sensação do mal-estar e do grotesco. A qualidade da paisagem barroca também contribui para toda esta diversão.
Foi nomeado para sete Óscares, mas não venceu nenhum.
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Na Sombra e no Silêncio (To Kill a Mockingbird) 1962
Atticus Finch (Gregory Peck) é um advogado na cidade de Alabama dos anos 30, uma cidade racialmente dividida. Ele concorda em defender um jovem negro acusado de violar uma mulher branca. Muitas das pessoas da cidade tentam fazê-lo desistir, mas ele decide continuar. Será o jovem culpado da violação? Se ele for inocente será que vai alterar a tensão que se vive na cidade?
Baseado no romance vencedor do Pullitzer de Harper Lee, com o mesmo nome. A forma como o filme é rodado, e a sua velocidade, mantém um espírito muito fiel ao livro original, o que ajuda bastante a entender a sua trama episódica.
"To Kill a Mockingbird" é uma excelente produção de estúdio, do produtor Alan J. Pakula, e realizada por Robert Mulligan. Um filme de grande entretimento, que passou pelo tempo e continua a inspirar muitos homens e mulheres. O filme é contado pelos olhos da jovem escuteira de 6 anos, filha do advogado Finch. A jovem é interpretada pela actriz Mary Badham, na sua estreia cinematográfica, que lhe valeria uma nomeação para o Óscar, que acabaria por ser vencido por outra actriz prodígio: Patty Duke em "The Miracle Worker". Na altura, Badham era a mais jovem actriz nomeada para Melhor Actriz Secundária.
Quando o julgamento começa é suposto ser um caso rápido. A mulher em questão, Mayella Ewell, ainda tem sinais de espancamento à vista. O seu pai é um dos homens mais racistas da cidade, e quer sangue. Atticus, inteligentemente estabelece que Tom Robinson nunca pôde ter batido na mulher. Tudo o que ele pode ser acusado, é de ter estado no sitio errado, no momento errado, e que provavelmente foi outra pessoa que o espancou.
O julgamento é uma coisa grande na cidade, e toda a gente está lá para ver. Isto inclui os negros da cidade, que estão segregados a uma varanda no primeiro andar, com vista para o piso principal onde os brancos se podem sentar. Muitos anos depois, no filme "Pleasantville", há uma homenagem a esta situação.
"To Kill a Mockingbird" recebeu oito nomeações para os Óscares, tendo vencido três. Foi o único da carreira de Gregory Peck, naquele que é considerado por muitos como o melhor papel da sua carreira.
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Baseado no romance vencedor do Pullitzer de Harper Lee, com o mesmo nome. A forma como o filme é rodado, e a sua velocidade, mantém um espírito muito fiel ao livro original, o que ajuda bastante a entender a sua trama episódica.
"To Kill a Mockingbird" é uma excelente produção de estúdio, do produtor Alan J. Pakula, e realizada por Robert Mulligan. Um filme de grande entretimento, que passou pelo tempo e continua a inspirar muitos homens e mulheres. O filme é contado pelos olhos da jovem escuteira de 6 anos, filha do advogado Finch. A jovem é interpretada pela actriz Mary Badham, na sua estreia cinematográfica, que lhe valeria uma nomeação para o Óscar, que acabaria por ser vencido por outra actriz prodígio: Patty Duke em "The Miracle Worker". Na altura, Badham era a mais jovem actriz nomeada para Melhor Actriz Secundária.
Quando o julgamento começa é suposto ser um caso rápido. A mulher em questão, Mayella Ewell, ainda tem sinais de espancamento à vista. O seu pai é um dos homens mais racistas da cidade, e quer sangue. Atticus, inteligentemente estabelece que Tom Robinson nunca pôde ter batido na mulher. Tudo o que ele pode ser acusado, é de ter estado no sitio errado, no momento errado, e que provavelmente foi outra pessoa que o espancou.
O julgamento é uma coisa grande na cidade, e toda a gente está lá para ver. Isto inclui os negros da cidade, que estão segregados a uma varanda no primeiro andar, com vista para o piso principal onde os brancos se podem sentar. Muitos anos depois, no filme "Pleasantville", há uma homenagem a esta situação.
"To Kill a Mockingbird" recebeu oito nomeações para os Óscares, tendo vencido três. Foi o único da carreira de Gregory Peck, naquele que é considerado por muitos como o melhor papel da sua carreira.
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quarta-feira, 10 de junho de 2015
O Homem na Pele da Serpente (The Fugitive Kind) 1960
Val Xavier (Marlon Brando), um andarilho de origens obscuras, chega a uma pequena cidade do sul e consegue um emprego numa loja governada por Lady Torrence (Anna Magnani), uma mulher carente de sexo, cujo marido está a morrer de cancro.Val é perseguido por Carol Cutere (Joanne Woodward), uma espécie de vagabunda de boas famílias, que tanto cobiça do casado de cobra de Val, como o tenta seduzir. Val fica mais atraído pela senhora mais madura, que engravida...
Muito da visão sórdida de Tennessee Williams pode ser aqui observada, a partir da sua peça "Orpheus Descending," aqui chamada de "The Fugitive Kind". Hollywood estava faminta para a mistura individual de melodrama sexy e a escrita poética que este autor oferecia. A expansão da sua obra tinha chegado através de pesos-pesados, como Elia Kazan (A Streetcar Named Desire, 1951), Richard Brooks (Cat on a Hot Tin Roof, 1958 e Sweet Bird of Youth, 1962), John Huston (Night of the Iguana, 1964), Daniel Mann (The Rose Tattoo, 1955), e Joseph L. Mankiewicz (Suddenly, Last Summer, 1959) e este "The Fugitve Kind", o quarto filme do novato Sidney Lumet, sendo talvez o filme menos conhecido desta série.
Lumet captura e explica algo vital dentro da escrita de Williams que outros não conseguiram. A sua visão gótica do Sul pisa uma linha ténue entre o expressionismo exótico e o realismo. Para isso muito contribuíram a fotografia brilhante de Boris Kaufman e a maravilhosa banda sonora de Kenyon Hopkins. Como é costume nas obras de Williams, há uma sensação de que as fronteira entre passado e presente, o real e o fantástico podem ser ultrapassadas.
Os críticos na altura não foram muito generosos, não só porque o filme chegou na mesma altura que tantos outros filmes de Williams, mas também porque era adaptado de uma das suas obras menos conhecidas, que já por si tinha sido uma adaptação da sua primeira obra, chamada "Battle of Angels", e que também tinha sido um fracasso comercial.
The Fugitive Kind" humaniza o crime, da mesma forma que "Dog Day Afternoon", outro filme de Lumet, o faria anos depois. O monólogo de abertura, quando Brando murmura sobre um crime que ele claramente cometeué um mecanismo de enfrentamento permanente, um modo de julgar as pessoas que nunca vão entender o seu comportamento.
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Muito da visão sórdida de Tennessee Williams pode ser aqui observada, a partir da sua peça "Orpheus Descending," aqui chamada de "The Fugitive Kind". Hollywood estava faminta para a mistura individual de melodrama sexy e a escrita poética que este autor oferecia. A expansão da sua obra tinha chegado através de pesos-pesados, como Elia Kazan (A Streetcar Named Desire, 1951), Richard Brooks (Cat on a Hot Tin Roof, 1958 e Sweet Bird of Youth, 1962), John Huston (Night of the Iguana, 1964), Daniel Mann (The Rose Tattoo, 1955), e Joseph L. Mankiewicz (Suddenly, Last Summer, 1959) e este "The Fugitve Kind", o quarto filme do novato Sidney Lumet, sendo talvez o filme menos conhecido desta série.
Lumet captura e explica algo vital dentro da escrita de Williams que outros não conseguiram. A sua visão gótica do Sul pisa uma linha ténue entre o expressionismo exótico e o realismo. Para isso muito contribuíram a fotografia brilhante de Boris Kaufman e a maravilhosa banda sonora de Kenyon Hopkins. Como é costume nas obras de Williams, há uma sensação de que as fronteira entre passado e presente, o real e o fantástico podem ser ultrapassadas.
Os críticos na altura não foram muito generosos, não só porque o filme chegou na mesma altura que tantos outros filmes de Williams, mas também porque era adaptado de uma das suas obras menos conhecidas, que já por si tinha sido uma adaptação da sua primeira obra, chamada "Battle of Angels", e que também tinha sido um fracasso comercial.
The Fugitive Kind" humaniza o crime, da mesma forma que "Dog Day Afternoon", outro filme de Lumet, o faria anos depois. O monólogo de abertura, quando Brando murmura sobre um crime que ele claramente cometeué um mecanismo de enfrentamento permanente, um modo de julgar as pessoas que nunca vão entender o seu comportamento.
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sexta-feira, 5 de junho de 2015
The Young One (La Joven) 1960
Um guarda-caça e a sua filha de 13 anos vivem numa ilha onde chega, fugido à polícia, um negro acusado de violação. Os confrontos entre os dois homens dão lugar a uma certa cumplicidade até à chegada de outro homem para prender o negro. A jovem, cuja sexualidade desperta durante o confronto, vai ajudar o negro a fugir.
Um dos dois únicos filmes rodados por Buñuel em inglês, é uma obra provocativa, uma fascinante história de poder, engano e manipulação. É muitas vezes entendido como sendo um filme falhado, que foi assim considerado por ser uma produção atípica de Buñuel não contendo nenhuma das suas características conhecidas do cinema surreal. Como acréscimo, algumas outras características que não eram habituais no realizador: racismo, pedofilia, falsas acusações de violação, tudo isto passado numa pequena ilha da Carolina do Sul, onde ele nem precisava de apresentar uma visão tão exagerada ou inquietante.
A parte maravilhosa deste pequeno filme, e na, verdade, o filme é muito melhor do que aquilo que foi visto na altura pelos críticos e pelo público, é que apresenta estas questões no contexto dos Estados Unidos de uma maneira que muito poucos filmes no seu tempo podiam sugerir. Na altura da rodagem deste filme, um outro com preocupações semelhantes, "The Defiant Ones", foi feito. Mas o trabalho de Stanley Kramer, embora notável pela dupla (literalmente algemada), com um racista (Tony Curtis) e um homem negro (Sidney Poitier), estava muito mais ligada ao mundo de Hollywood, não declarando totalmente os seus sentimentos liberais. Esta obra de Buñuel é muito mais subtil, e preocupada pelas mesmas razões. O realizador e o filme, embora tenham claramente um ponto de vista, apresentam os seus vários personagens com grande detalhe, recusando-se a julgá-los de imediato, seja ele qual for.
O filme foi escrito e rodado por muitos antigos artistas de Hollywood, anteriormente colocados na lista negra do Macartismo, o que tornava as questões do filme ainda mais pungentes. O filme, denunciado pelo crítico do New York Times Bosley Crowther, só aponta o facto de que o filme de Buñuel só poderia ser feito fora dos Estados Unidos, neste caso México, e reitera o sentimento de que no início dos anos 60, foram ainda mais conservadores do que em vários anos da década anterior.
Ganhou uma Menção Especial no festival de Cannes de 1960.
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Um dos dois únicos filmes rodados por Buñuel em inglês, é uma obra provocativa, uma fascinante história de poder, engano e manipulação. É muitas vezes entendido como sendo um filme falhado, que foi assim considerado por ser uma produção atípica de Buñuel não contendo nenhuma das suas características conhecidas do cinema surreal. Como acréscimo, algumas outras características que não eram habituais no realizador: racismo, pedofilia, falsas acusações de violação, tudo isto passado numa pequena ilha da Carolina do Sul, onde ele nem precisava de apresentar uma visão tão exagerada ou inquietante.
A parte maravilhosa deste pequeno filme, e na, verdade, o filme é muito melhor do que aquilo que foi visto na altura pelos críticos e pelo público, é que apresenta estas questões no contexto dos Estados Unidos de uma maneira que muito poucos filmes no seu tempo podiam sugerir. Na altura da rodagem deste filme, um outro com preocupações semelhantes, "The Defiant Ones", foi feito. Mas o trabalho de Stanley Kramer, embora notável pela dupla (literalmente algemada), com um racista (Tony Curtis) e um homem negro (Sidney Poitier), estava muito mais ligada ao mundo de Hollywood, não declarando totalmente os seus sentimentos liberais. Esta obra de Buñuel é muito mais subtil, e preocupada pelas mesmas razões. O realizador e o filme, embora tenham claramente um ponto de vista, apresentam os seus vários personagens com grande detalhe, recusando-se a julgá-los de imediato, seja ele qual for.
O filme foi escrito e rodado por muitos antigos artistas de Hollywood, anteriormente colocados na lista negra do Macartismo, o que tornava as questões do filme ainda mais pungentes. O filme, denunciado pelo crítico do New York Times Bosley Crowther, só aponta o facto de que o filme de Buñuel só poderia ser feito fora dos Estados Unidos, neste caso México, e reitera o sentimento de que no início dos anos 60, foram ainda mais conservadores do que em vários anos da década anterior.
Ganhou uma Menção Especial no festival de Cannes de 1960.
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quarta-feira, 3 de junho de 2015
Southern Gothic
Há um mundo gótico que tem pouco a ver com vampiros, cientistas loucos, ou locais amaldiçoados. Pelo contrário, é um mundo de obscuros segredos de família, histeria religiosa, e sexualidade pervertida.
O "Southern Gothic" começou como uma consequência exclusiva americana da literatura gótica, com autores como William Faulkner, Tennessee Williams, Carson McCullers e Flannery O’Connor, adaptando a negritude da tradição gótica para os seus livros. Tiraram-lhes a maioria das armadilhas sobrenaturais, mas mantiveram o sentido do macabro e do perverso, para definir um Sul dos Estados Unidos marcado pela pobreza, pela confusão em face da modernidade, após os efeitos da escravidão. A grandeza do Sul estava agora em decadência, e, em vez das mansões solitárias, bosques assustadores, e tímidos heróis da época Vitoriana, o "Southern Gothic" mostrava-nos plantações em ruínas, cobertas de musgo, e a ruína das velhas famílias que outrora governavam naquela região.
No mês de Maio, o British Film Institute realizou este mesmo ciclo, ao qual deu o nome "Southern Gothic: Love, Death and Religion in the American Deep South", Nenhum outro título poderia definir melhor o espírito destes filmes, e, nas próximas duas semanas, poderão segui-lo aqui no My Two Thousand Movies..
Aqui fica a lista dos filmes que poderão ver nos próximos dias:
- The Young One (1960, de Luis Buñuel)
- The Fugitive Kind (1960, de Sidney Lumet)
- To Kill a Mockingbird (1960, de Robert Mulligan)
- Hush...Hush, Sweet Charlotte (1964, de Robert Aldrich)
- Reflections in a Golden Eye (1967, de John Huston)
- The Beguiled (1971, Don Siegel)
- Wise Blood (1979, John Huston)
- Sling Blade (1996, Billy Bob Thornton)
- Shotgun Stories (2007, Jeff Nichols)
Por hoje é tudo. Fiquem atentos aos próximos dias.
O "Southern Gothic" começou como uma consequência exclusiva americana da literatura gótica, com autores como William Faulkner, Tennessee Williams, Carson McCullers e Flannery O’Connor, adaptando a negritude da tradição gótica para os seus livros. Tiraram-lhes a maioria das armadilhas sobrenaturais, mas mantiveram o sentido do macabro e do perverso, para definir um Sul dos Estados Unidos marcado pela pobreza, pela confusão em face da modernidade, após os efeitos da escravidão. A grandeza do Sul estava agora em decadência, e, em vez das mansões solitárias, bosques assustadores, e tímidos heróis da época Vitoriana, o "Southern Gothic" mostrava-nos plantações em ruínas, cobertas de musgo, e a ruína das velhas famílias que outrora governavam naquela região.
No mês de Maio, o British Film Institute realizou este mesmo ciclo, ao qual deu o nome "Southern Gothic: Love, Death and Religion in the American Deep South", Nenhum outro título poderia definir melhor o espírito destes filmes, e, nas próximas duas semanas, poderão segui-lo aqui no My Two Thousand Movies..
Aqui fica a lista dos filmes que poderão ver nos próximos dias:
- The Young One (1960, de Luis Buñuel)
- The Fugitive Kind (1960, de Sidney Lumet)
- To Kill a Mockingbird (1960, de Robert Mulligan)
- Hush...Hush, Sweet Charlotte (1964, de Robert Aldrich)
- Reflections in a Golden Eye (1967, de John Huston)
- The Beguiled (1971, Don Siegel)
- Wise Blood (1979, John Huston)
- Sling Blade (1996, Billy Bob Thornton)
- Shotgun Stories (2007, Jeff Nichols)
Por hoje é tudo. Fiquem atentos aos próximos dias.
terça-feira, 2 de junho de 2015
O Vampiro da Cinemateca (O Vampiro da Cinemateca) 1977
"O Vampiro da Cinemateca, de 1977, dirigido por Jairo Ferreira é um dos filmes mais experimentais do Cinema Marginal. Com uma linguagem que beira ao documentário, com voz off constante e cortante de Jairo, o filme faz uma montagem com diversas imagens de outras obras cinematográficas e de imagens filmadas com Super8 de Jairo.
Ele se posiciona como um crítico, tanto da cultura de massa, quanto de outras situações. Ele faz críticas também a cultura nacional, e ao cinema novo. Em um momento, ele diz: “O cinema novo é um cadáver gangrenado. Um movimento de direita que se julga de esquero, Glauber rocha diz que vai descobrir o certo através do errado, Glauber é uma instituição brasileira, ou seja, ele vai descobrir que ele é o novo lima Barreto na linha direta de rui Barbosa”. Isso mostra todo o desprezo do movimento marginal pelo cinema novo, ainda que este bebesse nas descobertas e obras daquele. Ainda falando sobre Glauber Rocha, maior expoente do cinema Novo, Jairo faz uma crítica direta “Não adianta Glauber, pode estribuchar. Você nunca vai ser o Maiakovski brasileiro”.
O filme não segue uma linha narrativa clássica, intercalando imagens que parecem aleatórias. O único personagem recorrente é o próprio Jairo, que parece fazer o papel do vampiro da cinemateca. O autor costumava chamar esse tipo de filme de “cinema de invenção”. Em certa hora do filme, ele diz “é preciso inventar novos signos”.
Com muitas referências a arte concreta, a antropofagia de Oswald de Andrade e ao cinema artesanal pré-marginal de Mujica, o Zé do Caixão, Jairo parece querer inventar um novo significado para a arte cinematográfica. Em certo momento, ele diz “estamos na trilha da antropofagia anti-colonialista, metalinguagem, sem linguagem, translinguagem, meta super 8, cinema concreto”. O filme é justamente um exemplo dessas abstrações de Jairo. O filme é metalingüístico, porque fala de cinema e seu papel, além de inserir imagens de outros filmes; é concreto, a medida que faz o cinema pelo cinema, a filmagem pela filmagem, o som pelo som – a arte pela arte- sem a necessidade de contar uma história, pregar uma ideia específica ou se propor a ser didático.
Gisela Mota, Nuvem de Películas
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A Herança (A Herança) 1970
"Adaptação de Hamlet, de Shakespeare, para o Centro-Sul brasileiro do início do século XX. Omeleto, um rapaz filho de senhores do sertão, vai para a capital com o objetivo de estudar e fazer-se doutor. O pai morre e ele volta antes do esperado, encontrando a mãe casada com o irmão do pai. O falecido volta do além e conta para o filho que foi assassinado, o rapaz promete vingança a fim de que a alma do pai possa descansar em paz.
Hamlet já foi interpretado por grandes atores como Lawrence Olivier, John Barrymore, Richard Burton e até Sarah Bernhardt e Asta Nielsen travestidas. E o filme foi dirigido por gente competente (ou quase) como Olivier, Kenneth Branagh, Tony Richardson, Grigori Kosintsev e Franco Zeffirelli. Mas certamente em nenhuma oportunidade foi adaptado de modo tão livre e atrevido como no Brasil de 1970, onde, em plena Boca do Lixo paulista, Ozualdo Candeias escreveu, dirigiu e fotografou A herança.
Tinha tudo para dar errado, a começar pelo elenco heterogêneo: um sex symbol popularesco (David Cardoso), um rouxinol da música brega (Agnaldo Rayol), uma atriz televisiva de rosto marcante e estilo denso (Bárbara Fazio), vários ilustres desconhecidos. Como se não bastasse, a tragédia do príncipe da Dinamarca é transposta para o meio rural brasileiro numa paródia do western italiano, na qual os nobres são transformados em caipiras ou fazendeiros. Ofélia, por exemplo, é uma bela mulatinha, e o trunfo da peça, a prosa poética do mestre Shakespeare, foi substituído por legendas nos monólogos interiores dos personagens. O resto é silêncio.
Mas, diria o dramaturgo, há mais coisas entre o céu e a terra do que supõe nossa vã filosofia. O resultado é mais que satisfatório, chega a ser surpreendente. A herança é ainda mais estranho que A margem, o primeiro longa do diretor, e não tem a explícita poesia deste; é de uma estranheza áspera, que chega a incomodar. Em certos momentos, estamos bem próximos das primeiras cenas de Deus e o Diabo, do Glauber, e quase sempre, da totalidade de Augusto Matraga, do Roberto Santos, inclusive no uso da música cantada como auxiliar narrativo.
Músicas emblemáticas (cirandas infantis, marchas fúnebre e nupcial, “Sertaneja” de René Bittancourt), lindamente tocadas como moda de viola. E ainda ruídos da natureza (ventanias, chuvaradas), vozes de animais, gargalhadas debochadas do protagonista. No único momento em que a palavra conduz a ação (no circo, onde Omeleto denuncia o assassinato do pai), temos uma canção caipira cheia de som e de fúria.
Apesar de tudo, o enredo shakespeariano está presente em quase todas as seqüências. Ao descobrir que o pai foi assassinado pelo tio, que casou com a mãe (revelação feita pelo fantasma do falecido), o protagonista finge-se de louco. Mais tarde, mata sem querer o pai de sua amada, que enlouquece e depois morre afogada. Na carni ficina final, morrem todos. Na peça, a herança vai para um parente. Na versão de Candeias, a fazenda é dividida entre os trabalhadores rurais. Ser ou não ser original, eis a questão."
João Carlos Rodrigues, Portal Brasileiro de Cinema
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segunda-feira, 1 de junho de 2015
Cancêr (Cancêr) 1972
Nas palavras do próprio Glauber, “o filme não tem história. São três personagens dentro de uma ação violenta. O que eu estava buscando era fazer uma experiência de técnica, do problema da resistência de duração do plano cinematográfico. Nele se vê como a técnica intervém no processo cinematográfico… Resolvi fazer um filme em que cada plano durasse um chassi, e estudar a quase-eliminação da montagem quando existe uma ação verbal e psicológica dentro da mesma tomada.”
Filme polémico de Glauber Rocha, que começou a filmá-lo em 1968, no mesmo ano de "O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro", e com parte do elenco deste. "Cancer" seria o seu primeiro filme underground, marcado por uma postura combativa contra as convenções sociais.
Filmado em quatro dias, levou quatro anos para ser montado, acabando por ser a única obra de Rocha ligada ao movimento do cinema marginal. Foi filmado com uma câmera Éclair de 16mm, segundo o realizador, para explorar ao máximo takes longos e sem cortes (inspiração de Straub).
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O Homem do Corpo Fechado (O Homem do Corpo Fechado) 1973
"Pela segunda vez, este filme é incluído entre os filmes característicos do Cinema Marginal brasileiro. No entanto, não se trata de uma obra que se filie a esse movimento, marcadamente paulista e carioca, mas que manteve relações com ele, na medida em que foi contemporânea e apoiou-se na mesma base de produção.
O filme é de 1972, quando já se esgotava o Cinema Novo e a produção cinematográfica nacional buscava outros rumos, pressionada pela censura do regime militar e pela necessidade de se autosustentar, oferecendo ao público um produto mais comunicativo e menos politizado.
Sendo uma produção de concepção intrinsecamente mineira, resultado de um movimento tardio de cineclubistas e críticos que se aventuravam na realização cinematográfica, imaginávamos um filme que tivesse a ver com o nosso substrato cultural. A inspiração que imediatamente nos conduziu foi a grande literatura de Guimarães Rosa e o universo mítico do Grande Sertão, que já tinham rendido um bom filme paulista, rodado em Minas, com gente mineira no elenco e na produção: A hora e a vez de Augusto Matraga, de Roberto Santos.
O homem do corpo fechado optou, porém, mais pelo páthos rosiano, o mundo do Grande Sertão, do que pelos dilemas metafísicos e existenciais tornados sensíveis pelo intelectual universalista que era Rosa. Ao contrário, o conflito fundamental foi buscado no cotidiano mineiro, mas solucionado à maneira dinâmica do western, com muitas cavalgadas, lutas corporais e duelos, tendo por fundo a geografia inóspita e o horizonte imenso.
A opção se mostrou acertada em todos os sentidos. O filme foi visto na época – avaliação que resiste até hoje – como uma obra genuinamente mineira, com características originais da nossa humanidade e do nosso ambiente natural e cultural, magnificamente traduzidas pelos elementos constitutivos da obra cinematográfica, como atuação, fotografia, música, cenários e figurinos, ordenados por uma direção e uma montagem vigorosas.
Isso só foi possível porque pudemos contar, para montar a produção em bases profissionais, com a infra-estrutura do cinema brasileiro daqueles anos, instalada no Rio e em São Paulo, que nos forneceu quadros e metodologias do Cinema Novo, da pornochanchada e do Cinema Marginal."
Victor Hugo, Portal Brasileiro de Cinema
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