quarta-feira, 7 de agosto de 2019

Esquecer Paris (Forget Paris) 1995


Forget Paris é um filme sobre basket? No genérico irrompem retratos de feras do calibre de Henri Cartier-Bresson ou do absurdo de Elliott Erwitt, ao som embalante de Billie Holiday. Corte, e um piano toca notas gravemente possantes, a câmara sobe numa grua e vemos outro tipo de feras que marcaram o desporto universal dos anos noventa, de Charles Barkley a David Robinson. Estranha mistura do que é artisticamente baixo e do que é artisticamente alto, estranha mistura documental e cinemática, para, passadas as decisões in extremis da bola, aparecer o árbitro interpretado por Billy Crystal a mostrar que quem tem um apito pode ser um dos homens mais poderosos nesta terra e meter monstros daqueles e multidões daquelas na sua ordem.
Forget Paris é um filme sobre as altas impossibilidades de um argumento cinematográfico apenas poder ser superado pelas altas impossibilidades que a vida confirma a cada momento. Onde os narradores em volta de uma mesa de restaurante encenam a narrativa e as emoções a seu bel prazer desse par improvável – a árbitro da NBA e uma jovem que trabalha numa poderosa empresa de aviação que se conhecem no enterro do pai do primeiro em Paris depois de voltas e reviravoltas do caixão. Um pai que parece querer entregar ao filho o que nunca entregou em vida.
Narradores que encenam a seu bel prazer, manipulando e ajustando a fita conforme o prazer e segurança a adquirir para a vida de cada um que está a contar, perfeitos realizadores. Forget Paris é sobre o individual no colectivo, as jogadas sumptuosas e os compromissos, a técnica e a poesia e a corrida de fundo, a generosidade e a inteligência. Quem quiser bater todos os recordes e nada ganhar, sempre tem os deportos solitários. Um filme sobre basket que parece ter a mesma orquestração e fôlego da vida corriqueira. Forget Paris é sobre o momento da perfeição inicial da criação do universo e sobre o seu explanar lento – um filme sobre a experiência e o movimento totais onde o mais mediático e a exepção esbarram com a regra e com a banalidade. O homem que aparentemente tem mais tomates na américa, o único capaz de mandar calar Shaquille O'Neal, e a menina parisiense mas americana que domina as rotas dos ares e do mundo, amam-se totalmente, não se conseguem ajustar, jogam e matam o seu “eu”, para descobrirem que esse é o cesto complexo que interessa. 
Pelo meio, mais Billie Holiday, danças à Gene Kelly, Cole Porter e Duke Ellington e Ella Fitzgerald que já viveram aquilo tudo, as camisolas dos lamentavelmente desaparecidos Seattle SuperSonics, o Billy Crystal que é a pessoa mais bonita de sempre a descer dos pedestais, o cúmulo do romantismo na declaração final e a balada dos créditos como pura piroseira. Forget Paris acata todas as coisas belas e tudo o resto inclassificável e não só nos confirma o cliché inelutável do jogo da vida como não o separa da poesia do instante mágico para todos conservado, à espera, disponível, para dez segundos ou para nunca. It's a kind of magic, cada um, o seu filme.
* texto do José Oliveira. Muito obrigado pela colaboração. Fica por aqui este ciclo.

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